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gamento do conselho, foi um acto arbitrario puramente seu, e que em si nada tem com o contencioso 1 Contencioso é sim o acto do conselho tomando conhecimento por aquelle modo tumultuario. Á responsabilidade tomada de não apresentar senão certas e determinadas suspeições, é um acto mera e exclusivamente de administração. Nem elle os apresentou de outra maneira, porque se estribou para os praticar no artigo, 234.° do codigo administrativo.

Cabe aqui fazer uma referencia ao que em outra occasião, mas ainda não ha muito, foi dito n'esta casa por um cavalheiro que tomou no debate, que então se agitava, uma parte talvez em fórma mais violenta, que não era de esperar dos seus anteriores habitos parlamentares; voltando se para este lado da camara, entendeu que d'aqui se haviam sustentado principios offensivos da liberdade na questão dos celebres tumultos do Natal. Disse que d'este lado se tinham apresentado idéas que offendiam não sei que principios de liberdade!

Na questão dos tumultos que tiveram logar em Lisboa, tumultos que obrigaram os membros do gabinete a saír por uma janella (tal era a violencia e pressão que sobre elles se exercia), e que pozeram em risco a vida e a propriedade de muitos cidadãos, os homens que tinham assento n'este lado da camara disseram ao governo que = sustentasse a segurança publica pelos meios que a lei lhe facultava =; dentro da lei, expressamente dentro da lei! (Apoiados.) Estão registadas as nossas palavras. Onde houve ahi offensa da liberdade!

Foi injustiça que se fez a este lado da camara, injustiça que eu não esperava de um illustre deputado que tem um espirito elevado, para querer desfigurar factos passados ha muito, mas que estão registados, e que os homens que aqui se sentam têem bastante consciencia de si para não deixarem desfigurar impunemente. Mal retribuido foi o acto de abnegação politica praticado então pelos homens que se sentavam d'este lado da camara, que podiam n'aquella occasião ter feito crua guerra ao gabinete, e crear lhe serios embaraços!... (Apoiados.)

Mas as injustiças que se fazem aqui, aqui têem tambem o devido correctivo. Sustentámos n'essa occasião a liberdade, mas não a liberdade da anarchia; essa é que se queria, mas essa é que o paiz reprova. Mas agora é chegada a occasião de perguntar tambem ao illustre deputado — qual é a sua opinião na presença de actos tão comprovados e tão offensivos dos principios constitucionaes? (Apoiados.) Serão elles a expressão do progresso? Não offenderão a liberdade? Triste progresso é aquelle que assim se manifesta e faz representar! Triste aberração dos espiritos para não reconhecerem o falso terreno em que estão! (Apoiados.)

A incompetencia da camara!

Pois a competencia politica da camara para julgar todos os actos da administração pôde ser posta em duvida? (Apoiados.) Onde estamos nós? Que subversão de principios! (Apoiados.) Quem ha que se atreva a administrar em vista de principios e idéas d'esta ordem? Pois não está consignada na lei do estado a fiscalisação por parte do parlamento? Não é essa fiscalisação superior a todas as outras? Não está na sua absoluta competencia tomar conhecimento de todos os actos irregulares, de todos os actos illegaes praticados na ordem da administração. A absoluta competencia politica do parlamento sobre a responsabilidade do governo por todos os actos de governação é indeclinavel, e ninguem lh'a pôde preoccupar. (Apoiados.)

Não invertamos os principios; é absurdo querer encobrir detrás de um tribunal a responsabilidade da administração. A constituição commette ao parlamento velar pelo cumprimento de todas as leis do estado. Determina que no começo das sessões elle aprecie como a administração politica e a administração geral têem sido conduzidas. E o acto addicional auctorisa o parlamento a nomear commissões de inquerito na latitude que elle entender (apoiados).

E agora faço eu uma pergunta aos homens que conhecem a administração, e conhecem-n'a de certo todos os que tem logar n'esta casa.

Se alguns funccionarios do ministerio publico, por exemplo, tiverem faltado ao cumprimento dos seus deveres por actos praticados em processos pendentes, para o governo tomar conhecimento da maneira por que aquelles funccionarios se conduziram; para tomar em relação á sua conservação ou demissão qualquer providencia, terá que esperar que terminem primeiro os processos pendentes dos tribunaes? Onde se sustentou um principio tão subversivo da administração e que estabeleça a impunidade n'uma tão larga escala? (Apoiados.) Ninguem ha absolutamente, que sustente um principio d'esta ordem (apoiados).

Está presente o sr. ministro da justiça, que conhece de certo estes assumptos; s. ex.ª que me contrarie se não são estes os principios triviaes de administração. Os tribunaes julgam os processos, mas da responsabilidade dos funccionarios conhece o governo, segundo as leis, independentemente de quaesquer processos pendentes, que seguem regularmente o seu destino. A responsabilidade dos funccionarios para com o governo é por todos os seus actos, e só o poder judicial é que tem a sua responsabilidade ligada a uma certa ordem de leis especiaes, pelas quaes é ao proprio poder que está confiada a sua correcção; mas ninguem dirá que os seus membros se forram á responsabilidade dos seus actos por estarem pendentes os processos a que estes dizem respeito. Similhante doutrina levaria a alargar indefinidamente os laços da responsabilidade dos funccionarios já hoje quasi cortados. Não foi feita uma syndicancia a uma relação do paiz? E não havia muitos processos pendentes n'esse tribunal? De certo que sim.

O governo procede sempre livremente para conhecer, da administração publica, mas principalmente a respeito dos funccionarios que elle pôde demittir. Toma conhecimento dos factos, aprecia se elles foram regulares ou não, e os processos Ía correm independentemente. São duas espheras de acção completamente distinctas. E se o não fossem a administração seria completamente impossivel.

Note a camara ainda que comquanto factos possa haver que sejam muito irregulares, e que tornem inhabeis para funccionarios os individuos que os praticaram, pôde succeder que esses factos não involvam a nullidade dos processos. Nem sempre nos negocios que não são de ordem publica as illegalidades envolvem a invalidade dos actos, mas esses factos nem por isso deixam de ser irregulares e levar á severa responsabilidade dos que os praticam.

Fallo diante de julgadores que sabem que estes principios não podem ser contestados. Não se allegue pois a irresponsabilidade, e não se allegue não só porque os factos a que me referi são completamente de pura administração, e não de administração contenciosa, mas porque ainda que o fossem, o governo era sempre competente para conhecer da maneira por que um empregado se tinha conduzido, a fim de o substituir ou corrigir quando entendesse necessario, e não o substituindo, tomava a responsabilidade dos actos praticados. E isso, sr. presidente, nada tem com os processos pendentes que seguem um outro caminho. O que acabo de expor nasce de um principio na ordem da administração civil, de um principio incontestavel que é a identificação dos funccionarios administrativos com o governo, identificação tanto mais certa, quanto que, para serem julgados judicialmente é preciso licença do governo para o seguimento dos processos. Nos paizes onde esta identificação não está tão ligada, como por exemplo em Inglaterra, tal licença não é necessaria. Mas ahi os funccionarios respondem mais directamente, têem responsabilidade mais directa em relação ao publico, em relação aos individuos que estão com elles em contacto, do que nos paizes de uma grande centralisação como infelizmente é o nosso.

Nos actos de administração ainda é necessario attender a um principio predominante, e é a faculdade que o governo tem de dissolver os corpos de administração local, e desde que tem essa faculdade de dissolver, tem faculdade de apreciar todos os factos que o possam levar a isso (apoiados).

Portanto, não venha argumentar-se com a irresponsabilidade ou com a incompetencia do parlamento, porque taes principios não se sustentam em nenhum dos campos onde os quizerem ir acolher (apoiados).

Mas, sr. presidente, este systema não é novo. O systema de cercear as attribuições parlamentares, é um systema conhecido de mais, systema que eu contrario, systema offensivo do principio representativo, opposto diametralmente a elle, porque o parlamento não é só um corpo de fazer leis, mas um corpo politico que tem a seu cargo conhecer e fiscalisar todos os actos da administração. Não queira pois o governo, não queira a camara, por uma conveniencia politica, por uma conveniencia meramente partidaria, prejudicar uma theoria incontestavel, sempre seguida e sempre acatada em todos os parlamentos e em todos os paizes (apoiados) onde existe systema representativo!

Creio que este ponto fica demonstrado evidentemente. Agora tenho que referir-me, ainda que rapidamente, a um outro campo em que foi encarada a defeza, supposto que apenas esboçada pelo illustre deputado, o sr. Guilhermino de Barros. O illustre deputado entendeu que os actos de suspeição apresentados pelas auctoridades administrativas estavam ao abrigo das disposições de uma portaria de 14 de agosto de 1840 ou das ordenações a que ella se refere.

Sr. presidente, eu não espero ver por parte do ministerio, ou dos seus amigos, que a velha ordenação filippina seja arrastada para esta discussão para sanccionar as suspeições politicas! Não espero ver que o codigo da epocha da dominação castelhana, da nossa escravidão ao estrangeiro, venha ser arvorada em lei politica, que não é nem nunca foi, para sanccionar as violencias contra as liberdades garantidas na lei fundamental do estado (apoiados). Não espero ver a lei filippina a regular e a limitar o uso da liberdade politica, ella que nasceu n'uma epocha em que essa liberdade havia desapparecido, e sido absorvida nas demasias do poder absoluto. Não, sr. presidente, as ordenações não trataram do que não conheciam, do que não existia no seu tempo; são leis civis e de administração civil n'essa epocha em que estavam baralhadas a administração civil e judicial, mas não são, nem nunca foram, leis politicas. E, quando o tivessem sido, teriam caído n'essa parte em frente do codigo politico que hoje nos rege, e em face dos principios fundamentaes em que assenta a lei fundamental do estado. Não espero, digo, ver trazer a ordenação filippina para sustentar as suspeições politicas, porque isso seria a maior aberração do espirito.

Que resta pois? Resta que não temos em materia de administração senão suspeições civis. Em materia de administração não ha, á face dos principios, senão suspeições civis. É a jurisprudencia seguida nos paizes em que, como no nosso, a lei administrativa não tratou d'esta materia. Em França, por exemplo, onde as leis administrativas não trataram das suspeições civis, na jurisprudencia administrativa tem-se seguido como principio as suspeições do codigo do processo civil, de 1806; são essas suspeições meramente civis que são applicadas nas funcções administrativas. Esta é a jurisprudencia seguida em Hespanha, na Belgica e em todos os mais paizes que tomaram por norma o direito francez; entre nós segue-se o mesmo. E é isto unicamente o que diz a portaria de 1841, e nada mais.

Mas as suspeições civis são taxativas entre nós pela jurisprudencia inalteravelmente seguida por todos os auctores, sem excepção de um unico, que tenha escripto sobre este assumpto.

Eu não quero agora fazer uma dissertação n'esta materia, que seria alheia ao debate. Direi apenas que, nos paizes onde existe o systema de suspeições civis, porque outros ha onde hoje não existe, como é a Inglaterra, onde não se pôde oppor suspeição alguma, seja na ordem judiciaria, seja em qualquer outra; mas nos paizes onde os ha, é certo que se começou por uma grande latitude na apresentação das suspeições; passou-se bem depressa a um systema mixto; a lei taxava algumas, os tribunaes podiam applicar outras não determinadas na lei, se os achavam procedentes; foi este o systema da ordenança franceza de 1660; no regimen da convenção a faculdade de suspeitar foi ampla sem mesmo exigencia de motivos; mas o codigo de 1806 acabou com esse systema e com o anterior, e as suspeições ficaram unicamente taxativas. Este é o systema francez e o de todas as nações que o tomaram por modelo.

Mas entre nós o systema das ordenações foi o da sua epocha; as suspeições em parte foram taxadas pela lei; em parte ampliadas segundo o juizo dos tribunaes; era o systema da epocha, e que foi seguido pela ordenança franceza, a que me referi. Mas entre nós a jurisprudencia tem ido até onde haviam chegado as leis nos outros paizes, e hoje, as suspeições civis, e não ha outras, são completamente taxativas, parte pela lei, parte pela jurisprudencia immemorial. Não ha um só auctor que entenda o contrario. Umas são certas e determinadas nas leis, outras pela praxe e jurisprudencia continuada, seguida e sanccionada por todos. Por consequencia em administração não temos senão as suspeições civis, e estas taxadas; mas essas são completamente alheias da materia que se trata, porque na nossa administração civil não podem haver nem podem ser reconhecidas suspeições que não sejam civis: e não foi d'estas que cogitou o governador civil. E para que?

Logo todo o argumento apresentado pelo sr. Guilhermino de Barros cáe por a base, porque essa portaria ou as leis a que ella se refere, porque as portarias não fazem lei, não têem applicação de qualidade alguma ás circumstancias actuaes.

Eu devo, sr. presidente, tirar por fim uma consequencia geral e logica de todos os actos da auctoridade administrativa a que me tenho referido, e é que todos estes factos violentos, irregulares e offensivos das leis e dos principios constitucionaes com o fim manifesto de actuar sobre a liberdade do voto, partiram inquestionavelmente da administração (apoiados); esta serie não interrompida de factos illegaes levam indubitavelmente a esta conclusão (apoiados).

Considerada assim a questão já V. ex.ª vê d'onde é que partiu a pressão contra a liberdade do voto, e por outra parte ao que fica reduzida a defeza que parece apresentar se por parte dos individuos que pretendem sustentar, creio eu, a competencia ou legalidade com que procedeu aquella auctoridade. A evidencia em estes dois pontos importantes não pôde ser posta em duvida.

Mas eu deixo, esta ordem de factos irregulares, illegaes e violentos praticados pela auctoridade administrativa, e deixo a debaixo da triste impressão de que não se ha de levantar um só dos ministros da corôa n'esta casa para condemnar os principios em que assentou uma doutrina e uma pratica tão subversiva da ordem e da liberdade! (Apoiados.) Fallo debaixo d'esta triste impressão e profundamente convencido de que a discussão está de mais no nosso parlamento! Que esta discussão é aqui uma inutilidade! Que a propugnação dos bons principios é uma cousa vã e perdida, porque hoje não ha senão a rasão politica, a rasão partidaria assoberbando todos os actos, e todos os principios de administração e de liberdade! (Muitos apoiados.) Registo este triste quadro, não para que elle sirva de exemplo e de pretexto a qualquer outro governo para não levantar a responsabilidade dos seus actos, e estigmatisar os factos offensivos da lei, quando elles se lhe apresentem (apoiados). Mas registo para que o paiz o julgue e para que nenhum outro governo caminhe pela mesma senda!

Actos tumultuarios junto da urna!

Direi só duas palavras a este respeito, porque estou fatigado, e não quero ficar com a palavra reservada para outra sessão.

Actos tumultuarios junto da uma! Quaes são esses actos? e quem os praticou? Os documentos officiaes dizem-n'o bem claro (apoiados). Mas para mim é indifferente saber quem os praticou; basta-me só saber da sua existencia para exigir d'elles a responsabilidade ao governo, e perguntar-lhe pelas providencias que tomou (apoiados). Actos tumultuarios junto da uma! Não são asserções gratuitas, são factos confessados pelas proprias auctoridades administrativas. Não é um queixoso que venha dizer — attentaram contra mim... não; são os actos da auctoridade, são os factos e violencias praticados pela comitiva de uma auctoridade administrativa, disparando tiros sobre cidadãos que passavam livremente sem offender pessoa alguma! Não provoco a responsabilidade por o tiro se ter dado, ainda que o podia fazer, porque não sei como, individuos sem serem constituidos em auctoridade, podessem andar armados pelas ruas de uma villa. Mas pergunto pela responsabilidade da auctoridade, deixando impunes taes factos! Pois já disparar-se um tiro da comitiva da auctoridade administrativa sobre quem livremente transita é cousa indifferente? (Apoiados.) Mas é a propria auctoridade que não se peja de narrar este facto. Ainda mais. Em face da uma estava disposto uma especie de acampamento militar; forças por toda a parte, e a liberdade entre bayonetas! Assim é que se fez a eleição, segundo o testemunho não suspeito da auctoridade administrativa que escreveu correspondencias como se fossem os detalhes de uma batalha campal!

Mas para mim ha um facto mais que todos notavel, que tem a confirmação do proprio illustre deputado que me precedeu n'este debate — o testemunho insuspeito da auctoridade administrativa; e o de um individuo que não conheço, mas que o illustre deputado elevou em auctoridade, e de