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CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

SESSÃO EM 23 DE FEVEREIRO DE 1864

PRESIDENCIA DO SR. CESARIO AUGUSTO DE AZEVEDO PEREIRA

Secretarios os srs.

Miguel Osorio Cabral

José de Menezes Toste

Chamada — Presentes 61 srs. deputados.

Presentes á abertura da sessão — Os srs. Annibal, Vidal, Sá Nogueira, Quaresma, Brandão, Gouveia Osorio, A. P. de Magalhães, Mazzioti, Mello Breyner, Pinheiro Osorio, Magalhães Aguiar, Barão da Torre, Barão do Rio Zezere, Abranches, Almeida e Azevedo, Ferreri, Cesario, Claudio Nunes, Cypriano da Costa, Domingos de Barros, Poças Falcão, Barroso, Coelho do Amaral, Borges Fernandes, F. L. Gomes, F. M. da Cunha, Guilhermino de Barros, Medeiros, Silveira da Mota, Sant'Anna e Vasconcellos, Mendes de Carvalho, J. A. de Sousa, J. J. de Azevedo, Nepomuceno de Macedo, Sepulveda Teixeira, Torres e Almeida, Mello e Mendonça, Neutel, J. P. de Magalhães, Ferreira da Veiga, Galvão, Alves Chaves, Fernandes Vaz, Luciano de Castro, D. José de Alarcão, Costa e Silva, Frasão, José de Moraes, Julio do Carvalhal, Camara Falcão, Alves do Rio, Manuel Firmino, Mendes Leite, Sousa Junior, Murta, Pereira Dias, Miguel Osorio, Modesto Borges, Ricardo Guimarães, Charters, R. Lobo d'Avila, Simão de Almeida e Thomás Ribeiro.

Entraram durante a sessão — Os srs. Affonso Botelho, Garcia de Lima, Braamcamp, Abilio, Ayres de Gouveia, A. B. Ferreira, Correia Caldeira, Gonçalves de Freitas, Ferreira Pontes, Seixas, Arrobas, Fontes Pereira de Mello, Lemos e Napoles, Antonio Pequito, Pereira da Cunha, Pinto de Albuquerque, Lopes Branco, Antonio de Serpa, Zeferino Rodrigues, Barão das Lages, Barão de Santos, Garcez, Freitas Soares, Albuquerque e Amaral, Beirão, Carlos Bento, Cyrillo Machado, Conde da Torre, Fernando de Magalhães, Fortunato de Mello, Bivar, Fernandes Costa, Izidoro Vianna, F. Manuel da Costa, Gaspar Teixeira, Henrique de Castro, Blanc, João Chrysostomo, Mártens Ferrão, J. da Costa Xavier, Aragão Mascarenhas, Calça e Pina, Joaquim Cabral, Simas, Matos Correia, Rodrigues Camara, Lobo d'Avila, José da Gama, Silva Cabral, Sette, José Guedes, J. M. de Abreu, Casal Ribeiro, Sieuve de Menezes, Silveira e Menezes, Menezes Toste, Gonçalves Correia, Oliveira Baptista, Batalhós, Mendes Leal, Camara Leme, Pinto de Araujo, Monteiro Castello Branco, Moraes Soares, Fernandes Thomás, Teixeira Pinto e Visconde de Pindella.

Não compareceram — Os srs. Adriano Pequito, Soares de Moraes, Carlos da Maia, Antonio Eleuterio, David, Peixoto, Palmeirim, Barão do Vallado, Oliveira e Castro, Pinto Coelho, Conde de Azambuja, Drago, Abranches Homem, Diogo de Sá, Ignacio Lopes, Gavicho, Bicudo, Pulido, Chamiço, Cadabal, Gaspar Pereira, Pereira de Carvalho e Abreu, Gomes de Castro, Fonseca Coutinho, Albuquerque Caldeira, Ferreira de Mello, Coelho de Carvalho, Faria Guimarães, Veiga, Infante Pessanha, Figueiredo de Faria, Latino Coe lho, Alvares da Guerra, Rojão, L. M. Jordão, F. Branco, Affonseca, Moura, Alves Guerra, Rocha Peixoto, Vaz Preto, Marianno de Sousa, Placido de Abreu e Vicente de Seiça.

Abertura — Á uma hora da tarde.

Acta — Approvada.

EXPEDIENTE

1.º Uma declaração do sr. Bernardo Francisco de Abranches, de que faltou á cessão de hontem por incommodo de saude. — Inteirada.

2.º Um officio do ministerio do reino, acompanhando o alvará do secretario geral, servindo de governador civil do Porto, pelo qual se ordenou uma syndicancia á misericordia de Villa do Conde, servindo para ella informações verbaes e não escriptas. — Para a secretaria.

3.º Uma representação dos habitantes do extincto concelho de Azeitão, pedindo que se discuta o projecto de lei n.° 132 de 1861, que tem por fim o restabelecimento do seu concelho. — Á commissão de estatistica.

4.º Dos medicos e do cirurgião do hospital das Caldas da Rainha, pedindo que se lhes augmentem os seus ordenados. — Á commissão de administração publica.

5.º Da direcção do theatro do gymnasio dramatico, pedindo que se lhe conceda uma subvenção. — Á commissão de instrucção publica, ouvida a de fazenda.

6.° Da associação dos artistas de Coimbra, pedindo que se lhe conceda uma casa nacional, que existe n'aquella cidade, para estabelecimento da sua sociedade. — Á commissão de fazenda.

SEGUNDAS LEITURAS

PROPOSTA

Renovo a iniciativa do projecto de lei n.° 101, da commissão de fazenda d'esta camara, de 2 de maio de 1857, relativo á extincção da contribuição de 10 réis por alqueire de cereaes, que dão entrada na alfandega de Setubal, vindos pelo rio Sado. — O deputado por Setubal, Annibal Alvares da Silva.

Foi admittida e enviada com o projecto de lei á commissão de fazenda.

PROJECTO DE LEI

Senhores. — A economia nas despezas publicas é de certo a primeira regra de boa administração; mas este principio, aliás incontroverso, não se deve exagerar a ponto de sacrificar-lhe outro principio de administração e de justiça, não menos attendivel o respeitavel, qual é, que se não deve negar a ninguem a remuneração condigna dos serviços que presta, e da posição que, em virtude do emprego que exerce, tem de occupar na sociedade.

A verdadeira economia consistiria antes, a meu ver, em reduzir os quadros das repartições publicas ao menor numero de empregados, que fosse possivel, sem prejuizo do serviço, retribuindo porém convenientemente os que se julgasse indispensavel conservar, e que estivessem no caso de prestar bom serviço.

E sabido que os ordenados da maior parte, se não de todos os empregos publicos, fixados em epochas anteriores á carestia que ha tempos a esta parte se observa em todos os artigos de primeira necessidade, não estão por fórma alguma em relação com as despezas inherentes á posição dos empregados do estado, e é indispensavel e urgente proceder, quanto antes, como já se tem praticado n'outros paizes, a uma revisão geral de todos elles, a fim de os harmonisar entre si, e com as necessidades do tempo. Mas se esta desproporção dos ordenados com as despezas dos empregos se nota em todos em geral, que diremos d'aquelles que, tendo sido estabelecidos em eras mais remotas, ainda hoje, quando tudo tem variado, se conservam os mesmos?

N'este caso estão os ordenados dos medicos do real hospital das Caldas da Rainha, fixados ha mais de meio seculo, o do primeiro medico em 250$000 réis, por aviso de 4 de outubro de 1802; o do segundo em 200$000 réis, por aviso de 12 de dezembro de 1803. O motivo d'esta distincção e differença de ordenados provinha de que n'outro tempo o segundo medico era apenas considerado como ajudante do primeiro; não acontecendo porém hoje assim, não tem esta distincção actualmente rasão alguma de ser; e deve desapparecer, como desappareceu o motivo que a justificava. A estatistica junta dos doentes tratados n'este hospital mostra não só que o trabalho e o serviço do chamado segundo medico em nada é inferior ao serviço e trabalho do primeiro, senão tambem que para ambos tem crescido muito o trabalho; e portanto iguaes devem ser tambem os ordenados de um e de outro, sendo ambos elevados á cifra de 300$000 réis, ad instar do que já se praticára com relação ao hospital de S. José, o que dá apenas o pequeno acrescimo de 50$000 réis para o primeiro medico e de 100$000 para o segundo.

Não se acha em circumstancias menos attendiveis e recommendaveis o logar de cirurgião d'aquelle pio estabelecimento do estado. Sendo fixado em 100$000 o ordenado d'este emprego, pelo alvará de 20 de abril de 1775, foi-lhe depois concedida, por portaria de 2 de maio de 1822, a gratificação de 50$000 réis, por já então se reconhecer a insufficiencia do vencimento e a necessidade de o augmentar; e como todos, á excepção do actual, solicitassem e obtivessem a confirmação d'esta gratificação, a junta administrativa do hospital, em attenção ao acrescimo de trabalho e aos serviços prestados por este empregado na clinica medica, arbitrou-lhe a gratificação de 100$000 réis, que tem recebido desde 1861, com annuencia do governo.

A medida pois que ora proponho em relação a este emprego, reduz-se unicamente a tornar permanente e legalisar esta gratificação, convertendo-se em ordenado certo; e se já em 1822 se reconheceu a exiguidade do ordenado estabelecido pelo alvará de 2 de abril de 1775, e foi concedida a gratificação de 50$000 réis, quando os cirurgiões não tinham os estudos e as habilitações scientificas que hoje têem, e quando as necessidades da vida eram tão diversas do que são hoje; se em 1861 a junta administrativa julgou conveniente arbitrar a gratificação de 100$000 réis a este empregado, e o administrador representou ao governo n'este sentido, indicando o mesmo augmento de ordenado que aqui proponho; e finalmente, se a medida tem já a seu favor o exemplo a maior do hospital de S. José, onde o ordenado dos cirurgiões foi ultimamente elevado a 300$000 réis, estou certo de que tambem n'esta parte não negareis a vossa approvação ao seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° Ficam de ora ávante equiparados entre si os ordenados dos dois medicos do real hospital das Caldas da Rainha, fixados ambos na quantia de 300$000 réis.

Art. 2.° É elevado á quantia de 200$000 réis o ordenado do cirurgião do mesmo hospital, cessando por isto a gratificação de 100$000 réis que até aqui percebia.

Art. 3.° Fica revogada a legislação em contrario. Sala das sessões da camara dos deputados, 20 de fevereiro de 1864. = O deputado, Antonio Carlos da Maia.

Foi admittido e enviado á commissão de administração publica.

O sr. Abilio Costa: — Vendo agora as notas tachygraphicas da sessão de 19, que tenho presentes, encontro n'ellas

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algumas inexactidões que attribuo antes á pouca clareza da minha voz que a outra causa.

Sr. presidente, quando na referida sessão se discutiam os projectos da fixação dos contingentes das contribuições directas, que entraram em discussão inesperadamente, eu, usando então da palavra, não disse ou não quiz dizer que os informadores louvados tivessem em algumas parochias recebido instrucções para arrolarem todas as casas que valessem 5$000 réis. Mas o que disse ou quiz dizer foi que determinando a lei de 30 de julho de 1860, artigo, que se inscrevam nas matrizes prediaes das terras de 5.º ou 6.º ordem todos os predios urbanos que renderem ou poderem render acima de 5$000 réis, alguns escrivães de fazenda tinham ordenado aos louvados que arrolassem todos os predios cujo valor excedesse 100$000 réis, sem lhe fazer distinguir a differença entre valor locativo e valor de construcção; e d'aqui tinha resultado acharem se inscriptos nas matrizes predios que nunca podem render 5000 réis, o que é uma manifesta infracção da lei e offensa dos direitos dos contribuintes mais desfavorecidos da fortuna.

Tambem disse que quando as relações dadas pelos louvados e que devem por elles ser assignadas para serem validas, segundo o artigo 8.º da lei de 7 de julho de 1862, não agradavam a alguns escrivães por diminutas, elles prescendiam d'ellas, e faziam as inscripções nas matrizes a seu bello prazer e arbitrariamente; e que se isto assim continuasse ficaria sem effeito a lei de 7 de julho de 1862, voltaríamos ao estado anterior, e as bolsas dos contribuintes ficariam á descripção dos escrivães de fazenda, alguns dos quaes, acobertando os seus interesses com o zêlo fiscal, eram pouco escrupulosos em faltar ao respeito devido aos direitos dos contribuintes.

Faço esta rectificação para que se me não attribuam pensamentos que não tenho.

O sr. Secretario (Miguel Osorio): — O sr. deputado Placido de Abreu foi desanojado, em virtude da resolução da camara, e encarregou-me de agradecer á camara a sua attenção para com elle.

O sr. F. L. Gomes: — Mando para a mesa dois pareceres da commissão do ultramar.

O sr. Sá Nogueira: — Peço a v. ex.ª que me reserve a palavra para quando estiver presente o Sr. ministro das obras publicas, porque quero interpellar s. ex.ª sobre a construcção do caminho de ferro do Porto a Braga, e sobre a construcção da ponte sobre o Tejo, em Abrantes, que deve ligar a estrada de Castello Branco com a estação do caminho de ferro no Rocio de Abrantes.

Aproveito esta occasião para pedir á illustre commissão de fazenda, que dê o seu parecer sobre um projecto de lei, apresentado por mim n'esta casa, e sobre o qual não foi possivel ainda haver um parecer; o projecto tem por fim a reforma do tribunal de contas. Eu sei que a commissão de fazenda tem muitos negocios a seu cargo, mas este é um projecto importante, e parecia me que devia merecer a sua attenção.

Pedia tambem por esta occasião á mesa que me informasse se já vieram os esclarecimentos que pedi ha dias pelo ministerio da guerra, relativos aos officiaes do exercito que estão empregados em commissões estranhas ao mesmo ministerio.

O sr. Secretario (Miguel Osorio): — Ainda não vieram.

O sr. Guilhermino de Barros: — Pedi a v. ex.ª a palavra, para mandar para a mesa dois pareceres da commissão de fazenda, pedindo esclarecimentos ao governo ácerca de dois projectos de lei apresentados n'esta casa por dois srs. deputados.

Como estou com a palavra, e tendo o sr. Sá Nogueira pedido esclarecimentos á commissão de fazenda, relativamente ao projecto de lei que o mesmo sr. deputado apresentou n'esta casa com relação á reforma do tribunal de contas, direi que a commissão tem em muita attenção o projecto de lei que s. ex.ª apresentou, que se tem occupado d'elle algumas vezes; no entretanto não tem dado ainda um parecer definitivo sobre elle, porque é uma materia de muita importancia, e exige muita attenção; mas estou convencido de que a commissão dentro em pouco tempo dará o seu parecer sobre elle.

O sr. Silveira da Mota: — Vou ler á camara um projecto de lei que auctorisa o governo a contratar a construcção de um caminho de ferro desde Beja até Faro. Antes d'isso porém cumpre-me agradecer aos meus illustres collegas, os srs. Bivar e Coelho de Carvalho, a delicada benevolencia que tiveram para comigo, querendo esperar o meu projecto, para depois apresentarem o seu.

Eu bem sei que posso contar com o seu valiosissimo auxilio em tudo quanto se referir a vantagens e melhoramentos para o Algarve, do mesmo modo que ss. ex.ª podem ter a certeza de que me hão de sempre encontrar a seu lado nos uteis commettimentos a que os levar a sua alta intelligencia e inconcussa dedicação. Assim cumprimos para com os nossos constituintes um dever imprescriptivel, e evitámos o triste exemplo das facções do baixo imperio, que se anathematisavam entre si, quando o perigo de fóra era imminente. Passo a ler o projecto (leu).

A proposito da urgente necessidade de ser approvado este projecto, poucas considerações farei agora alem d'aquellas, que acabei de ler; lembro apenas á camara que este projecto não é simples e unicamente de vantagem para o Algarve, mas que estende os seus beneficios a todo o resto do paiz, pela poderosa e proficua influencia que vae exercer sobre as condições da nossa producção e incremento de todas as industrias. Honro-me e glorio-me de ser deputado pelo Algarve, e é por isso do meu dever cuidar do que lhe convem; mas prezo sobretudo defender e zelar os interesses do meu paiz (apoiados). Peço pois á camara e ás illustres commissões de fazenda e obras publicas, façam com que este projecto seja brevemente convertido em lei (apoiados).

O Algarve ganha principalmente, não só pelas condições de prosperidade, que estão inherentes ás faceis communicações; pelo incremento que ha de ter a agricultura, a industria e o commercio; e pelo desenvolvimento de todas as relações de ordem moral, economica e administrativa, mas especialmente, porque será talvez esse o meio mais efficaz para acabar um dos principaes flagellos, que atormentam aquella provincia; refiro-me á usura (apoiados), que ahi consome a maior parte do producto do trabalho honesto, e que ha de desapparecer, logo que os capitães abundarem em virtude da concorrencia.

Ainda ha uma outra circumstancia, alem das que já ponderei, para que a camara não possa deixar de adoptar este projecto. É ella, que sendo a provincia do Algarve, assim como a de Trás os Montes, as que pagam mais pontual e integralmente os seus tributos (O sr. J. A. de Sousa: — Apoiado), tributos de sangue e de dinheiro (apoiados), são tambem as que até hoje têem sido sempre menos consideradas pelos poderes publicos (apoiados).

O Algarve sobretudo, consinta-se-me dize lo (c digo-o sem offender os illustres deputados por essa provincia, que aqui têem exercido nobremente a sua missão); o Algarve, não sei por que erros ou por que maus fados, não só desde que existe entre nós o systema representativo, mas ainda antes dos graves acontecimentos de 1820 e 1833, foi sempre considerado mais como uma colonia, do que como provincia do paiz (apoiados).

A proposito de caminho de ferro não faço agora mais considerações, porque não devo cansar a attenção da camara. Ha porém outro projecto, tambem importantissimo para o Algarve, sobre o qual não posso deixar de repetir algumas ponderações.

No anno passado apresentei aqui um projecto de lei para ser elevado o lyceu de Faro á categoria de 1.ª classe. Este projecto parece-me não ser contestado pela illustre commissão de instrucção publica, que já por vezes tem mostrado reconhecer a injustiça que se dá para com o lyceu de Faro em relação a outros lyceus; mas não obstante isso a mesma illustre commissão ainda até hoje não se dignou dar sobre elle o seu parecer.

Disse n'uma das sessões passadas um dos seus conspicuos membros, o sr. dr. Quaresma, que o melhor era esperar que o governo apresentasse um projecto para reformar a instrucção secundaria; projecto que, segundo a opinião do illustre deputado, ha de remediar as injustiças que até hoje se têem dado com os differentes lyceus.

Entretanto permitta-me s. ex.ª que lhe diga que a sua resposta não pôde de maneira alguma satisfazer os deputados do Algarve. Eu sou insuspeito, porque defendo franca e lealmente o governo actual; mas os meus affectos partidarios não chegam a tal ponto que o repute optimo em todos os projectos apresentados, e sobretudo infallivel nos que porventura ainda tem que apresentar (apoiados).

Por consequencia, se eu fizesse parte da illustre commissão de instrucção publica, a minha opinião seria dar immediatamente parecer sobre o projecto, reservando para occasião opportuna a reforma radical que se espera da iniciativa do governo.

A promessa que o distincto deputado se dignou fazer, já na sessão do anno passado aqui foi feita; e apesar d'isso o projecto de reforma da instrucção secundaria não se apresentou, e o meu projecto (para ser considerado de 1.ª classe o lyceu de Faro) não teve parecer da illustre commissão.

Supponhamos porém que a proposta de reforma da instrucção secundaria é ainda n'esta sessão apresentada. Será isso motivo para que se não dê andamento ao projecto que offereci á illustrada apreciação da camara? Não o julgo assim, e cuido ter rasão, porque faltando pouco tempo para terminar a actual legislatura, parece-me mais exequivel resolver um projecto simples e de justiça incontroversa, do que discutir e approvar um projecto de reforma de instrucção secundaria, assumpto complicado, que exige muito estudo e serio exame.

Insto por isso com a illustre commissão de instrucção publica, para que dê com a maior brevidade possivel o seu parecer sobre este projecto.

Entre os habitos d'esta camara ha um desprezo manifesto pela iniciativa dos deputados, desprezo que cão deve, que não pôde continuar a existir. Espero pois que o desejo de emendar este erro será ainda mais um motivo para que a eximia commissão trate com urgencia d'este assumpto, que é de maxima importancia para o Algarve, e que tambem interessa devéras ao paiz, para o que basta dizer respeito á instrucção do povo.

O sr. Quaresma: — Tenho pouco que dizer em resposta ao que acaba de expor o nobre deputado pelo Algarve. Se s. ex.ª não arguisse tão directamente a commissão de instrucção publica, eu me absteria, de certo, de tomar a palavra.

O sr. Silveira da Mota: — Eu não argui a commissão.

O Orador: — O illustre deputado accusou a commissão de instrucção publica, ou por outra, apontou um peccado da commissão; mas eu peço licença a s. ex.ª para lhe dizer que esse peccado estende-se a todas as commissões d'esta camara. Diz o nobre deputado que as commissões olham talvez com menos zêlo para os projectos de iniciativa particular, do que para os de iniciativa do governo =.

O sr. Silveira da Mota: — E um facto reconhecido por todos.

O Orador: — Assim será, mas...

O sr. Silveira da Mota: — Peço ao illustre deputado que note, que eu quando apontei esse facto, disse que era um dos habitos da camara.

O Orador: — Más o que eu quero dizer, é que a commissão de instrucção publica é aquella que menos tem com? mettido esse peccado. Ainda no anno passado, por exemplo, a commissão de instrucção publica apresentou o seu parecer sobre um projecto de iniciativa do sr. Feijó; e alem d'esse a commissão tem resolvido outros negocios particulares.

Emquanto ao projecto do illustre deputado, a commissão espera pelo projecto de reforma da instrucção secundaria, que o governo tenciona apresentar. E que se ganhava agora com o dar a commissão o seu parecer sobre um pequeno ponto d'essa reforma?

Entendamo-nos bem: se a commissão resolvesse em sentido negativo o nobre deputado de certo não gostava, e se a commissão resolvesse em sentido affirmativo, auctorisava-se immediatamente igual reclamação por parte de todos os lyceus que se julgassem em circumstancias identicas ás do lyceu de Faro.

Eu louvo muito os desejos do sr. Silveira da Mota. S. ex.ª, como representante do circulo de Faro, emprega todos os seus esforços para dar mais garantias de prosperidade e civilisação á provincia do Algarve. Mas é necessario que a commissão attenda a outras circumstancias.

Todas as reformas que se fazem em qualquer ramo de administração publica trazem necessariamente augmento de despeza. Quando se tratou do projecto sobre a reforma da instrucção primaria, a commissão desejou dar mais amplitude aquelle projecto, mas teve sempre em vista o menor augmento de despeza possivel.

Portanto não se podem tomar medidas de certa ordem sem que o governo nos diga se com effeito as forças do thesouro comportam o augmento de despeza proveniente d'essas medidas. Já se vê pois que a commissão de instrucção publica não pôde dar o seu parecer sobre o projecto do illustre deputado sem ouvir o governo, para que este lhe diga se os lyceus de Braga, Leiria e outros estão nas circumstancias de serem tambem elevados á categoria de lyceus de 1.ª classe, pois é claro que a commissão não deve fazer uma injustiça relativa, como faria, se elevasse o lyceu de Faro á categoria de lyceu de 1.ª classe, não concedendo igual garantia aos outros lyceus que se acharem em analogas circumstancias.

Isto é mais grave do que se pensa, estas são as minhas duvidas; e parece-me que o mais regular procedimento da commissão era aguardar o projecto de reforma da instrucção secundaria que o governo tenciona apresentar.

(Interrupção do sr. Silveira da Mota que se não ouviu.)

O Orador: — Entretanto, se a commissão quizer dar o seu parecer em separado sobre o projecto do nobre deputado, não serei eu de certo que me opponha a isso. É o que tenho a dizer.

O sr. Castro Ferreri: — Peço a v. ex.ª que, quando se acabar a discussão dos projectos que já estão dados para ordem do dia, relativos á annullação da reorganisação do exercito, e da extincção do monopolio do tabaco, faça entrar em discussão o projecto sobre a cultura dos arrozaes (apoiados).

À estes apoiados não dou eu a importancia devida (riso), e eu digo a rasão. Estes apoiados querem dizer que o projecto nunca virá á discussão (riso). Talvez assim seja; no entretanto mando o meu requerimento para a mesa, e peço desculpa á camara de algumas palavras que vou dizer para fundamentar o meu requerimento.

O projecto sobre a cultura dos arrozaes foi apresentado em 1862, em 1863 deu a commissão o seu parecer sobre elle, estamos em 1864, e ainda esse parecer não entrou em discussão!

Vozes: — Ordem do dia, ordem do dia.

O sr. Presidente: — Vae passar-se á

ORDEM DO DIA

CONTINUAÇÃO DA DISCUSSÃO SOBRE A PROPOSTA DE ADIAMENTO, APRESENTADA PELO SR. SANT’ANNA E VASCONCELLOS, DA PROPOSTA DO SR. PINTO DE ARAUJO ACERCA DAS ELEIÇÕES MUNICIPAES DO DISTRICTO DE VILLA REAL.

O sr. Presidente: — Continua o sr. Luciano de Castro com a palavra.

O sr. Luciano de Castro: —... (O sr. deputado não restituiu o seu discurso a tempo de ser publicado n'este logar.)

Leu-se na mesa a seguinte

PROPOSTA

A camara attendendo a que a divisão e independencia dos poderes é um dos principios essenciaes da nossa organisação politica;

Considerando que este principio seria altamente offendido se avocasse a si o julgamento das irregularidades que se dizem existir no processo das eleições municipaes do districto de Villa Real, que, segundo a legislação vigente, devem ser julgadas livremente pelos tribunaes administrativos;

Tendo em vista as explicações do governo, emquanto a ter mandado syndicar sobre os actos da responsabilidade do governador civil, que se dizem praticados antes e durante as mesmas eleições, e aguardando os esclarecimentos que o governo opportunamente deve dar ao parlamento, passa á ordem do dia. = José Luciano de Castro.

ADDITAMENTO A ESTA PROPOSTA

Depois da palavra eleições:

Resolve que seja nomeada uma commissão de inquerito para examinar se ao governo cabe alguma responsabilidade nos referidos acontecimentos, e passa á ordem do dia. = José Luciano de Castro.

Foram admittidas.

O sr. Sant'Anna e Vasconcellos (sobre a ordem): — Como a proposta do ar. Luciano de Castro abrange uma idéa mais lata do que a minha, é um additamento que involve a idéa da commissão de inquerito, peço licença para retirar a minha proposta.

Foi-lhe concedido que a retirasse.

O sr. Mazziotti: — Requeiro a v. ex.ª que consulte a ca-

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mara sobre se julga ou não esta materia suficientemente discutida.

Consultada a camara, julgou-se discutida por 70 votos contra 09.

O sr. Presidente: — Eu vou pôr á votação as diversas propostas, segundo a ordem por que foram apresentadas.

A primeira proposta que se apresentou é a do sr. Pinto de Araujo (leu-se); e a ella seguiu-se a do sr. Sant'Anna e Vasconcellos (leu-se).

Tem estado em discussão o adiamento. Ha ainda outras propostas do sr. Mártens Ferrão (leram-se); e uma do sr. Luciano de Castro, que foi agora additada (leu-se).

Ponho em primeiro logar á votação a proposta de adiamento feita pelo sr. Sant'Anna e Vasconcellos, e depois porei á votação a proposta do sr. Ferrão, e conjunctamente a do sr. Luciano de Castro para a nomeação de uma commissão de inquerito.

O sr. Casal Ribeiro (sobre o modo de propor): — Eu não hei de abusar dos termos restrictos em que me é concedida a palavra sobre o modo de propor, para de maneira alguma voltar á questão que a camara houve por bem encerrar. Entendo que a mais completa resposta á propugnação das eleições de Villa Real e da incompetencia da camara, feita pelo illustre deputado o sr. Luciano de Castro, foi dada pelo substancioso discurso do nobre orador, o sr. Mazzioti.

Limito-me a indicar o modo como, na minha opinião, cada um pôde exprimir o seu verdadeiro sentimento sobre a questão que nos tem occupado.

Ha sobre a mesa diversas moções. Umas contêem a expressão de principios, outras referem-se á solução que a esta questão convem dar.

Aquellas que contêem expressões de principios, emquanto a mim, pela sua natureza e pelas praticas d'esta casa, preferem a todas as outras; e tambem, segundo as praticas estabelecidas, devem se votar pela ordem em que foram apresentadas.

Está portanto em primeiro logar a proposta sustentada pelo meu nobre amigo e collega, o sr. Mártens Ferrão, na qual pede que a camara pronuncie o seu juizo sobre a gravissima questão das suspeições politicas; e em segundo logar a moção apresentada hontem pelo sr. Luciano de Castro sobre a incompetencia da camara. E não entro agora na apreciação da coherencia que houve entre os fundamentos d'aquella moção e o additamento hoje offerecido, o qual não sei como se lhe possa soldar (apoiados).

N'estes termos parece-me que o que convem votar primeiro é a proposta do sr. Mártens Ferrão sobre as suspeições politicas, e depois a do sr. Luciano de Castro sobre a incompetencia.

(Interrupção que não se percebeu.)

Ú Orador: — Agora tambem ha uma commissão de inquerito! Mas eu repito o que se tem aqui dito muitas vezes— as cousas são o que são, e não o que cada um de nós quer que sejam. Commissão de inquerito ou de exame, que vá conhecer — da responsabilidade que cabe ao governo! Esta proposta mata completamente a questão da incompetencia (muitos apoiados).

Eu voto pela proposta do sr. Mártens Ferrão e contra a de incompetencia do sr. Luciano de Castro.

As outras propostas referem-se á eleição de uma commissão, e até certo ponto são identicas no fundo. E eu folgava com o illustre orador que teve a fortuna de encerrar o debate, por esta rara e original harmonia, a que não sei por que milagrosa fórma parecíamos chegados agora os dois lados d'esta camara. Como e porquê não me cumpre agora averiguar. «Estamos de accordo», disse o illustre deputado. Queremos o mesmo que vós quereis — uma commissão que examine a responsabilidade do governo. Era o que propunha o sr. Mártens Ferrão.

Mas, oh crueldade inaudita! Apenas o sr. Luciano de Castro acabava de celebrar esta rara concordia, veiu logo lançar na discussão uma nova proposta, similhante no fundo, mas diversa na fórma da proposta que fôra apresentada pelo meu nobre amigo!

Havia finalmente accordo ácerca da nomeação da commissão. Indicava-se uma commissão, que não é commissão de inquerito, mas sim especial para examinar a responsabilidade do governo nos actos praticados no districto de Villa Real por occasião das eleições municipaes.

Não era isto o mesmo, era o opposto do adiamento proposto pelo sr. Sant'Anna. Não era esperar pela syndicancia que o governo tinha mandado fazer pelas suas auctoridades administrativas, que não tem importancia nem significação alguma. Era desprezar a syndicancia administrativa, reconhecer a gravidade dos factos e examinar a responsabilidade do governo.

A maioria concorda - bem. Mas para que altera a fórma? Para que busca outra redacção? Para que destroe a harmonia que momentos antes existia? (Apoiados.) Quem queria esperar pelo inquerito administrativo é que não pôde votar a proposta do meu illustre amigo, o sr. Mártens Ferrão, nem a nova proposta do sr. Luciano (apoiados).

O sr. Presidente: — Se me dá licença...

O Orador: — Vou terminar. Não canso a camara, e parece-me que não estou fóra da ordem, dizendo o que a proposta é (apoiados).

Já o disse quanto á substancia. Quanto á fórma, a proposta do sr. Ferrão é identica á que foi votada na camara alta com a annuencia e o voto do sr. presidente do conselho. Esta proposta foi apresentada antes da proposta do sr. Luciano de Castro, e por consequencia deve tambem ser votada em primeiro logar. A camara está no seu direito de recusar e rejeitar uma proposta identica á que na outra casa foi votada com a annuencia do sr. presidente do conselho. A camara pôde faze-lo; e o paiz ha de apreciar a significação d'esse voto. Mas o que não deve é inverter a ordem natural, e substituir a votação d'esta proposta por outra.

Pela minha parte declaro que voto pelas propostas do sr. Mártens Ferrão, primeira e segunda; mas se não passar a proposta do meu illustre amigo para a nomeação da commissão nos termos em que está redigida, o que muito me espantará sendo ella identica á que foi votada na outra casa do parlamento com a annuencia do sr. presidente do conselho, votarei em todo o caso a nomeação da commissão, registando a estravagancia e incoherencia das resoluções (apoiados).

O sr. Ministro da Marinha (Mendes Leal): — Não sei se v. ex.ª e a camara me permittem, que. eu discuta sobre este modo de propor? (Apoiados.)

Não sou obrigado, nem posso ser obrigado, senão a aceitar o incidente suscitado pelo illustre orador, no modo e pelo modo por que s. ex.ª o suscitou (apoiados). Presumo que não ha de ser prohibido ao governo exprimir sobre este incidente as suas opiniões (apoiados).

Uma voz: — Como deputado.

O Orador: — Como deputado entendo que me devo cingir rigorosamente á letra do regimento; como membro do governo não posso dispensar me de dar as convenientes explicações quando ellas são necessarias.

Não trato de discutir as harmonias entre as differentes propostas apresentadas pela opposição. Parece-me que se alguns dos membros da camara quizessem fazer a analyse, o que não é opportuno, das propostas apresentadas por esse lado da camara, e achar a harmonia que se diz existir entre essas propostas, talvez não a encontrassem.

Segundo disse s. ex.ª, o governo, pela bôca do seu presidente, o sr. duque de Loulé, aceitou na outra casa do parlamento... o que? O principio do inquerito applicado á responsabilidade ministerial. Os termos em que foi aquella proposta formulada na outra casa não invalidam o fundo e essencia da questão, que é o principal. Mas os termos da mesma proposta aceitos e reproduzidos aqui pelo illustre deputado, o sr. Mártens Ferrão, permitta-me s. ex.ª que lhe diga, são inaceitaveis por parte d'esta camara ou por parte de outra qualquer, porque são illogicos...

(Interrupção.)

O Orador: — Peço perdão: não se trata de palavras, mas do sentido da proposta do sr. Mártens Ferrão. Ss. ex.as cuidam exclusivamente de palavras? O governo cuida exclusivamente de principios. O principio do inquerito é que foi aceito (apoiados). Foi aceito pelo governo porque o devia ser pelo seu pondunor. A fórma por que se pretende agora que seja aceito, não o pôde ser por camara alguma.

(Susurro.)

O Orador: — Se os illustres deputados não querem ouvir estão no seu direito; mas o governo tem obrigação de se explicar. É fórma, repito; e como tal mero accidente. Ninguem constitucionalmente se liga aos accidentes, mas aos principios.

Quando uma camara declara que deseja inquirir sobre taes e taes actos, não pôde nem deve começar por qualificar esses actos (apoiados). Esta é a verdade dos principios.

O governo, aceitando o principio do inquerito, aceitou o que devia aceitar e o que verdadeiramente se quiz fazer aceitar, porque se a camara estava já habilitada para qualificar os actos a que se referiu, não sei para que se pediria a commissão de inquerito, nem para que ella fosse necessaria (apoiados).

Na proposta apresentada e additada pelo sr. Luciano de Castro, não ha desharmonia nem incoherencia. Creio que tem havido em tudo isto uma grande confusão (apoiados).

O sr. Antonio de Serpa: — Apoiado.

O Orador: — Apoiada a confusão? (Riso. — Susurro.) Quer alguem a confusão? Convem-lhe? Mas se a confusão pôde convir a algum partido, de certo não convem nem deve convir a quem se assenta nas cadeiras do governo, nem á maioria que o apoia (apoiados).

Estabeleçamos as cousas claramente.

Que propoz primeiro o illustre deputado o sr. Luciano de Castro? Que havia incompatibilidade da camara para julgar os actos eleitoraes municipaes, por quanto pela lei estão estabelecidos os tribunaes regulares que devem julgar da validade d'esses actos. Que propoz depois? O inquerito relativo á sabida responsabilidade que a todo o governo compete e deve competir pelo cumprimento da lei.

O governo não declina essa responsabilidade que o parlamento pôde exigir. São duas especies completamente distinctas e esta camara distingue-as.

Mas porventura na maior parte das sessões decorridas se tem discutido a responsabilidade do governo? Não: tem-se discutido a validade dos actos e o modo por que elles se verificaram (apoiados). Quer dizer, tem-se discutido a responsabilidade da auctoridade subalterna que responde perante o governo, e pela qual responde o governo perante a camara. E n'isto que tem consistido a confusão. Importa acaba-la, deixando a cada um a responsabilidade que lhe compete na esphera e no grau que occupa (apoiados).

Não quero abusar da concessão de v. ex.ª e da camara, e por isso não vou mais longe nas minhas considerações.

Digo unicamente, que o governo aceita n'esta camara, como aceitou na outra pela bôca do sr. presidente do conselho, a commissão de inquerito como realisação do principio de responsabilidade, que o parlamento tem direito a pedir ao governo, pela unica fórma por que logicamente a camara a pôde aceitar.

O sr. Antonio de Serpa: — Como lá...

O Orador: — Singular insistencia! (Riso.) Já vejo que s. ex.ª tem um amor fatal aos adjectivos, está de tal modo abraçado a elles, que não pôde separar-se...

O sr. Antonio de Serpa: — Tenho amor aos factos.

O Orador: — Os factos são o que são, não o que se affecta. Os adjectivos ás vezes são maus, e n'esta occasião são pessimos, porque evidentemente se prova que não se mediu todo o seu alcance e valor, e que se sacrificou a um intuito de censurasinha, o espirito grave e circumspecto por que se deve dirigir o parlamento de uma nação (interrupção que não se percebeu). Os illustres deputados podem fazer os ápartes que quizerem; a nação, que não está á parte (muitos apoiados dos bancos da opposição), a nação que não está á parte, e que ss. ex.as julgam á parte na sua politica de epithetos, ha de avaliar devidamente se procede segundo a logica, e no rigor dos principios constitucionaes, uma camara que diz querer inquirir, e começa por qualificar aquillo mesmo que ainda ha de inquirir (muitos apoiados dos bancos da maioria).

O sr. Presidente: — Eu lembro ao sr. ministro que a materia está julgada sufficientemente discutida.

O Orador: — Perdoe V. ex.ª: creio que a materia já estava discutida quando fallou o sr. Casal Ribeiro.

Vozes: — É verdade.

O Orador: — E se o illustre deputado sobre o modo de propor suscitou um novo incidente, creio que o governo não pôde ser inhibido de dar explicações, sobretudo quando essas explicações não offendem ninguem (apoiados).

Já tinha dito a v. ex.ª que não ía mais longe nas minhas considerações.

Desejo só deixar bem evidenciado, que não confunde o governo o que pertence á responsabilidade dos tribunaes ordinarios que, segundo as leis, devem julgar da validade dos actos eleitoraes municipaes, com a responsabilidade que o mesmo governo tem e deve ter perante o parlamento. Note a camara bem isto, porque me parece, ao revez do que se inculca, o governo achar-se na situação mais logica e mais accorde com os principios constitucionaes.

O governo quer responder, não se exime a responder, deseja que o façam responder; mas tambem deseja que não se confundam doutrinas diversas e principios distinctos. Seria deploravel a confusão, porque levaria á subversão total dos mesmos principios!

Não sei se tive a fortuna de me explicar claramente. Em todo o caso creio que ninguem me ha de condemnar por me referir a uma proposta, sim approvada na outra casa do parlamento, mas já textualmente adoptada n'esta casa (apoiados).

O sr. Presidente: — Pedia aos srs. deputados que occupassem os seus logares.

O sr. Sant'Anna e Vasconcellos mandou para a mesa uma proposta de adiamento. O sr. Mártens Ferrão apresentou um additamento a esta proposta, para que, no caso de ser approvado, se declare que elle não poderá exceder a trinta dias. O mesmo sr. deputado mandou para a mesa a moção que se acabou de ler para se passar á ordem do dia, e terminou o seu discurso apresentando uma proposta para se eleger uma commissão de inquerito.

O sr. Luciano de Castro principiou o seu discurso com a moção que se acabou de ler para se passar á ordem do dia, aditando-a depois com a proposta para a nomeação de uma commissão de inquerito.

O sr. Sant'Anna e Vasconcellos retirou a sua proposta de adiamento. Pergunto ao sr. Mártens Ferrão se quer votação sobre todas as suas propostas?

O sr. Mártens Ferrão: — Eu pedi a palavra sobre o modo de propor ha muito tempo, e v. ex.ª inscreveu-me.

O sr. Presidente: — Eu gostaria, e creio que gostariam os srs. deputados, que a palavra sobre o modo de propor se não estendesse (apoiados). A palavra sobre o modo de propor tem-n'a o sr. Mártens Ferrão, e depois o sr. Casal Ribeiro. Eu pedia que acabassemos a votação (apoiados).

O sr. Mártens Ferrão: — V. ex.ª dá-me a palavra?

O sr. Presidente: — Tem a palavra, mas peço-lhe que seja breve.

O sr. Mártens Ferrão: — Eu estou no uso, costumo e longa pratica de não serem necessarias para mim na tribuna as advertencias da presidencia (apoiados); ha oito ou nove annos que tenho tido aqui constantemente um logar, e ellas sempre têem sido escusadas a meu respeito; costumo conter me dentro dos fóros que me pertencem, e estes defendo os todos; não costumo nem exorbitar nem ceder.

Pedi a palavra unicamente sobre o modo de propor, e é sobre o modo de propor que vou fallar.

Em primeiro logar quero declarar, que, com a nova feição que a discussão tomou, e em vista das duas propostas para a nomeação de uma commissão a fim de inquerir da responsabilidade do governo, o adiamento apresentado pelo sr. Sant'Anna não pôde subsistir (apoiados); e propondo-se a retirada do adiamento apresentado pelo illustre deputado, já se vê que falta materia onde possa recaír o meu adiamento.

Por outro lado direi sobre o modo de propor (e não posso deixar de me referir succintamente ao que disse o sr. ministro da marinha) que folguei de ver que não tendo o governo tomado parte no debate, emquanto esteve aberto, depois da materia discutida, veiu tomar a palavra e discutir! (Muitos apoiados.) E estou certo que o silencio por parte do governo teria sido hontem quebrado, se o sr. ministro da marinha se achasse n'esta casa: faço justiça á elevação de idéas do sr. ministro, e estou seguro que se hontem estivesse presente, s. ex.ª teria fallado, comprehendendo assim o seu dever de ministro parlamentar.

Folguei d'esta nova pratica, que testemunha a favor do nobre ministro da marinha que se achava agora presente e quiz fallar, mas que depõe contra o silencio dos seus collegas quando não podiam nem deviam ficar silenciosos. Mas, sr. presidente, n'esta occasião a discussão por parte do governo é já serôdia e contraria á ordem e regularidade dos debates (apoiados). O governo devia sim discutir, mas

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era quando o debate estava aberto, e não depois d'elle encerrado.

Agora a questão é como se hão de votar as moções que estão na mesa.

Discutiu-se por parte do governo o valor d'essa moção, e os termos em que ella se acha concebida; creio que isto já era fóra da discussão, porque o debate estava encerrado, e para mim ou nada valem aqui os termos da moção, ou se valem aqui, tambem valeram na outra casa do parlamento. Se valem, a moção está na mesma situação e nas mesmas circumstancias em que foi collocada pela outra camara, votada por ella e pelo nobre presidente do conselho, se não valem, não vale a pena discuti-la agora. A questão é a mesma para lá e para cá, e a votação não pôde offerecer duvida.

O governo entende que a moção como está formulada por mim não pôde ser aceita porque envolve uma censura, mas ella é textualmente a que foi votada na camara dos pares. Foi pois ali uma censura, ou uma censurasinha, como disse o nobre ministro. Esta confissão é importante. Direi a minha intenção franca e claramente.

Quando hontem fallei disse que censurava os factos, e que deixava a apreciação da responsabilidade do governo para ser considerada pela commissão, como facto de summa gravidade. Mas no que era relativo aos factos que se tinham passado havia uma prova clara e positiva nos documentos officiaes apresentados á camara.

Portanto a proposta envolvia a condemnação de factos illegaes e offensivos da liberdade da uma que se tinham praticado, e concluia depois por pedir a nomeação de uma commissão para julgar se o governo tinha ou não responsabilidade n'estes factos. Foi isto o que propuz. O nobre ministro quiz inverter os termos d'esta proposta, foi tarde! E eu não discuto o valor d'ella porque o debate está encerrado. Mas se os termos valeram na camara dos dignos pares, valem aqui (muitos apoiados), se não valeram lá, não valem aqui (apoiados), a posição para o governo é que é peior depois que fallou, porque veiu confessar o valor que a moção teve na camara dos dignos pares (apoiados).

Quanto á fórma de propor á votação as propostas, concordo com o que disse o meu illustre amigo, o sr. Casal Ribeiro.

Não entendo que se discuta aqui a validade das eleições, e n'este ponto já um sr. deputado que hoje fallou fez justiça á maneira por que eu colloquei a questão. Não se discutiu a validade das eleições, e não ha senão as duas moções de doutrina que a camara deve votar primeiro, segundo a ordem da sua apresentação, e as duas moções para a nomeação da commissão pela camara. Depois da moção contra as suspeições politicas que eu apresentei, e que deve ser votada primeiro que qualquer outra, porque é ordem do dia motivada, e porque foi a primeira apresentada, ha a moção de doutrina apresentada pelo sr. Luciano de Castro sobre a incompatibilidade da camara, e separada d'esta moção do sr. Luciano de Castro ha tambem do mesmo sr. deputado a proposta para a nomeação de uma commissão de indagação, proposta que eu tinha já feito antecedentemente.

Eis-aqui está qual é a ordem das propostas. A moção do sr. Pinto de Araujo, essa é para depois: essa é a moção sobre que se abriu o debate, e nós separámos essa questão; foi uma moção para abrir o debate, e aquellas a que eu me referi são uma conclusão do debate.

Não quero discutir a materia, e v. ex.ª verá que me limitei ao objecto preciso que se podia discutir; se tivesse seguido o nobre ministro muito poderia eu ter discutido, mas eu gosto discutir quando se discute, mas não quando o debate está encerrado.

Requeiro pois que a minha moção seja a primeira que se ponha á votação, e quanto ao mais concordo perfeitamente com a indicação do sr. Casal Ribeiro, que me parece ter sido tambem a indicação de v. ex.ª, porque quer que se vote pela ordem chronologica das propostas, e pela ordem chronologica a primeira a votar é a minha.

Aqui está a maneira por que entendo que esta pequena questão se deve resolver.

Nada mais tenho a dizer.

O sr. Sant'Anna e Vasconcellos (para um requerimento): — Requeiro que v. ex.ª consulte a camara sobre se esta questão sobre o modo de propor está discutida.

Julgou-se discutida.

O sr. Mártens Ferrão: — Peço votação nominal sobre a minha proposta. Foi approvado.

O sr. Quaresma: — Requeiro que se prorogue a sessão até se concluir este negocio. Vozes: — Não é preciso.

O sr. Presidente: — Vae proceder-se á votação. Feita a chamada

Disseram approvo os srs. A. B. Ferreira, Correia Caldeira, Gonçalves de Freitas, Gouveia Osorio, Ferreira Pontes, Seixas, A. Pinto de Magalhães, Fontes Pereira de Mello, Mello Breyner, Pereira da Cunha, Pinheiro Osorio, Lopes Branco, A. de Serpa, Zeferino Rodrigues, Barão das Lages, Barão de Santos, Baião da Torre, Freitas Soares, Almeida e Azevedo, Beirão, Carlos Pinto, Ferreri, Cyrillo Machado, Conde da Torre, Domingos de Barros, Poças Falcão, Fortunato de Mello, Bivar, Izidoro Vianna, Borges Fernandes, F. L. Gomes, F. M. da Costa, Gaspar Teixeira, Henrique de Castro, Mártens Ferrão, Aragão Mascarenhas, Joaquim Cabral, Matos Correia, Neutel, J. Pinto de Magalhães, José da Gama, J. M. de Abreu, Casal Ribeiro, Sieuve de Menezes, Silveira e Menezes, Camara Falcão, Camara Leme, Manuel Firmino, Mendes Leite, Murta, Pinto de Araujo, Modesto Borges, Fernandes Thomás, Simão de Almeida, Thomás Ribeiro, Teixeira Pinto e Visconde de Pindella.

Disseram rejeito os srs. Affonso Botelho, Garcia de Lima, Annibal, Vidal, Braamcamp, Abilio, Ayres de Gouveia, Sá Nogueira, Quaresma, Brandão, Arrobas, Mazzioti, Lemos e Napoles, Antonio Pequito, Pinto de Albuquerque, Magalhães Aguiar, Barão do Zezere, Garcez, Albuquerque e Amaral, Abranches, Cesario, Almeida Pessanha, Claudio Nunes, Cypriano da Costa, Fernando de Magalhães, Barroso, Coelho do Amaral, Fernandes Costa, Guilhermino de Barros, Blanc, Silveira da Mota, Sant'Anna e Vasconcellos, Gomes de Castro, Mendes de Carvalho, J. A. de Sousa, João Chrysostomo, J. da Costa Xavier, J. J. de Azevedo, Nepomuceno de Macedo, Sepulveda Teixeira, Calça e Pina, Rodrigues Camara, Mello e Mendonça, Lobo d'Avila, Galvão, Silva Cabral, Fernandes Vaz, Alves Chaves, Luciano de Castro, D. José de Alarcão, Costa e Silva, Frasão, Menezes Toste, Gonçalves Correia, Oliveira Baptista, Batalhós, Mendes Leal, Julio do Carvalhal, Alves do Rio, Sousa Junior, Pereira Dias, Miguel Osorio, Monteiro Castello Branco, Ricardo Guimarães, Chartres, R. Lobo d'Avila e Moraes Soares.

Ficou portanto rejeitada a proposta por 67 contra 67 votos.

O sr. Presidente: — Vae votar-se a proposta do sr. Luciano de Castro.

O sr. Camara Leme: — Peço a palavra para um requerimento antes de se fechar a sessão.

O sr. Secretario (Miguel Osorio): — A proposta é a seguinte (leu).

As ultimas palavras da proposta foram substituidas por estas (leu).

Vozes: — É uma proposta nova.

O sr. Luciano de Castro: — Pedi a palavra para declarar que apresentei as duas propostas na occasião em que fallava, e creio que tinha o direito de as emendar e alterar.

Peço a v. ex.ª que considere como eliminadas as ultimas palavras da minha primeira proposta, e substituidas pelas que ultimamente mandei para a mesa.

A minha proposta está na mesa acrescentada com as palavras que hoje mandei; entendi que era desnecessario escrever tudo em um papel, mas a proposta, repito, é só uma.

Posta á votação a proposta do sr. Luciano de Castro foi approvada por 68 votos contra 57.

O sr. Presidente: — Todas as outras propostas ficaram prejudicadas.

O sr. Camara Leme (para um requerimento): — Pedi a palavra para um requerimento, e tem elle por fim pedir a v. ex.ª que queira dar para a primeira parte da ordem do dia de ámanhã o parecer da commissão de guerra n.° 8, que trata da proposta apresentada pelo sr. ministro da guerra, annullando a reforma do exercito (apoiados).

Este objecto é importantissimo, ha corpos do exercito que funccionam em virtude da ultima reforma, e outros em virtude da organisação que estava em vigor, anteriormente a essa reforma; ha uns que se regulam pela organisação moderna, e outros pela organisação antiga. Vozes: — Está fóra da ordem.

O Orador: — Estou fundamentando o meu requerimento. Não se sabe como se ha de proceder. Já a camara vê que isto é um objecto importante, que não pôde continuar assim.

O sr. Presidente: — Eu peço ao illustre deputado que attenda que fez um requerimento, e um requerimento não tem discussão (apoiados).

O Orador: — Estou fundamentando o meu requerimento. O sr. Presidente: — Mas esse mesmo requerimento não tem logar, porque o projecto a que se refere o illustre deputado já está dado para ordem do dia.

Tenho tambem a dizer ao illustre deputado o sr. Beirão, que não posso dar lhe a palavra que pediu para explicações, porque não fallou sobre a materia.

O Orador: — Eu peço a v. ex.ª que ponha á votação o meu requerimento.

O sr. Presidente: — Não é preciso, porque já está na ordem do dia.

O Orador: — Sei que está dado para ordem do dia, mas eu peço a v. ex.ª que submetta a votação da camara o meu requerimento.

O sr. Ministro da Fazenda (Lobo d'Avila): — O projecto a que se refere o illustre deputado está ha muito tempo pedido para a discussão pelo meu collega o sr. ministro da guerra; não sei para que é essa teima do illustre deputado. Vozes: — Ordem, ordem.

O sr. Presidente: — A ordem do dia para ámanhã é a continuação da que estava dada.

Está levantada a sessão.

Eram quatro horas da tarde.

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