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DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

réis, reduza-se, fixemos a representação da receita em 1.200:000$000 ou 1.500:000$000 réis; mas fixemos uma quantia, porque é isso uma garantia para o credito e para o publico. E para mim é mais alguma cousa. E uma garantia de que os governos não hão de continuar a abusar, como têem abusado, não só o actual, mas todos, da disposição legal, que permitte a representação das receitas pertencentes a cada anno economico por meio da divida fluctuante?

A divida fluctuante é isto; é o credito que o governo levanta sobre a representação da receita do anno economico.

Se a camara consente que o governo á sombra do artigo que permitte aquella representação de receita possa fazer operações de credito, sem nenhuma restricção, auctorisa d'este modo moralmentente o governo a fazer emprestimos, e a crear divida que mais tarde ha de ser obrigado a consolidar.

A divida fluctuante não póde ser levantada senão nos limites da representação da receita. Ir mais longe é um abuso da lei, que mais tarde nos poderá custar caro.

O orçamento do estado deve ser organisado por fórma que sejam attendidas todas as despezas que podem ser previstas. Para as despezas extraordinarias e imprevistas ha os creditos extraordinarios. Na falta d'esses creditos extraordinarios poderia o governo reunir o parlamento.

Portanto não ha necessidade de se recorrer á divida fluctuante a não ser para representar as receitas do anno economico. Admittindo a pratica de levantar com o nome de divida fluctuante fundos sem restricção alguma, não se fixando um limite a essas operações de credito, como mais tarde essa divida ha de ser consolidada, a camara está a votar, por assim dizer, desde já os emprestimos necessarios para essa consolidação.

Parece-me, pois, que é conveniente pôr um limite á divida fluctuante, para que uma vez o governo seja obrigado a não levantar mais divida fluctuante do que aquella que for necessaria para a representação da receita dentro do anno economico.

O orçamento votado d'esta maneira, sem este limite, é uma completa illusão.

O governo, quando quer fazer qualquer despeza, não auctorisada, fa-la sem escrupulo, gasta tudo o que lhe apraz, e depois de feita a despeza vem ao parlamento pedir um bill de indemnidade, quando a opposição lhe recorda esse dever constitucional.

Assim não é possivel haver fiscalisação séria da applicação dos dinheiros publicos, porque o governo na auctorisação para a representação das receitas acha meio facil de levantar fundos para quaesquer despezas, ainda mesmo não auctorisadas.

Isto não póde ser.

Isto não é um orçamento regular. Um orçamento em que o governo, e não me refiro ao actual governo, refiro-me a todos os governos, porque o abuso é antigo, encontra um artigo em virtude do qual, sob pretexto de representar a receita publica, póde levantar todos os fundos que quizer para todas as despezas que lhe lembrarem, não é serio.

N'estas condições não póde haver fiscalisação efficaz sobre a gerencia dos dinheiros publicos. (Apoiados.) (Susurro.)

Eu peço a V. ex.ª que mantenha a ordem na casa. (Apoiados.)

Eu não estou a fallar para me divertir; fallo no desempenho do meu mandato, e é deploravel que não sejam os membros d'esta camara, mas os de uma camara estranha a esta, que venham perturbar as nossas discussões.

Isto não póde ser. Eu não fallo, repito, por divertimento, fallo no desempenho do meu mandato; e se V. ex.ª não póde manter a ordem declare-o francamente, porque então

deixo de pedir a palavra, e todos nós faremos o mesmo. (Apoiados.)

O sr. Presidente: — Chamo a attenção da camara. Peço ordem. -

O Orador: — Ainda direi duas palavras sobre o objecto principal que me obrigou a tomar a palavra, que é chamar a attenção do sr. ministro da fazenda para a necessidade de melhorar a legislação reguladora do real de agua.

A camara não faz idéa da desordem e anarchia a que chegou a legislação relativa ao real de agua. Não se cabe quaes são as penas que se devem applicar. Não se sabe qual é o processo, em virtude do qual essas penas hão de ser applicadas. Não se sabe se é o processo criminal, se é o processo civil e criminal estabelecido na novissima reforma judiciaria. Não se sabe até qual é a verdadeira incidencia do imposto. Ainda ha pouco se deu em Coimbra um incidente, sobre o qual eu chamo a attenção do sr. ministro da fazenda.

Os empregados fiscaes exigiram o real de agua por uns objectos mandados de presente a um cavalheiro d'aquella cidade.

O contribuinte requereu o deposito do imposto e recorreu para os tribunaes judiciaes. Estes deram raso ao contribuinte e mandaram levantar a importancia depositada com o fundamento de que a legislação do real de agua não comprehendia nas suas disposições os presentes. Eu creio que os tribunaes judiciaes procederam bem. E todavia os empregados fiscaes continuam a exigir o imposto.

Não se póde admittir que continue assim uma legislação tão cahotolica e desordenada.

Não se póde admittir que o real de agua continue a cobrar-se á custa de vexames, demasias e injustificaveis exigencias por parte dos empregados fiscaes. É necessario que a lei seja clara, expressa e inequivoca.

O regulamento mandado celebrar pelo sr. ministro da fazenda não satisfaz, e a rasão é porque o governo não se julgou habilitado a poder tomar resolução alguma sobre certos pontos que careciam para serem convenientemente decididos da intervenção parlamentar.

Sei que sobre aquelle regulamento foram ouvidos os fiscaes da corôa, que o sr. ministro da fazenda procedeu com toda a cautela ouvindo as pessoas competentes sobre a materia; mas em todo o caso não posso deixar de dizer a V. ex.ª que o fim do illustre ministro não foi conseguido, porque a legislação continua da mesma maneira, cahotica, incoherente, absurda, e talvez ainda peior do que anteriormente. E preciso pois que o governo peça ás camaras auctorisação para melhorar a legislação reguladora d'este imposto.

E possivel que o sr. ministro se não julgue auctorisado, como creio não deve julgar-se, para fazer reformas profundas n'aquella legislação; mas eu aproveito a occasião para lembrar a s. ex.ª que não deixe encerrar a sessão sem pedir auctorisação para tratar seriamente d'este assumpto. E foi para isto principalmente que eu tinha pedido a palavra. Penso que faço n'isto um bom serviço, e maior o poderá fazer o sr. ministro acceitando o meu alvitre. " •

Este imposto ainda hoje é regulado por disposições, em grande parte obsoletas. As portarias e disposições regulamentares lêem agravado o cabos e a obscuridade das antigas provisões.

Parece-me, por conseguinte, que s. ex.ª não pode ter duvida, embora não tenham vindo representações a esta camara, de no interesse do fisco e dos contribuintes pedir á camara auctorisação para poder, depois de ouvir as auctoridades competentes, publicar um decreto com força legislativa para terminar e decidir todas as duvidas que actualmente difficultam e obscurecem a interpretação e observancia da legislação do real de agua.

Tenho concluido.

O sr. Ministro da Fazenda: — Já em outra sessão