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SESSÃO DE 3 DE MARÇO DE 1876

Presidencia do ex.º sr. Joaquim Gonçalves Mamede

Francisco Augusto Florido da Mouta e Vasconcellos Barão de Ferreira dos Santos

SUMMARIO

Apresentação de representações, requerimentos, nota de interpellação, etc.. — Ordem do dia: approvação do tratado assignado em 11 de dezembro de 1875 entre Portugal e a republica de Transwall — Discussão e approvação da lei de receita na generalidade.

Presentes á chamada 53 senhores deputados.

Presentes á abertura da sessão — Os srs.: Agostinho da Rocha, Osorio de Vasconcellos, Rocha Peixoto (Alfredo), Braamcamp, Cardoso Avelino, Avila Junior, A. J. Teixeira, Cunha Belem, Pereira Carrilho, Rodrigues Sampaio, Mello Gouveia, Neves Carneiro, Zeferino Rodrigues, Barão dê Ferreira dos Santos, Correia da Silva, Forjaz de Sampaio, Eduardo Tavares, Filippe de Carvalho, Francisco Mendes, Mouta e Vasconcellos, Paula Medeiros, Palma, Illidio do Valle, Barros e Cunha, J. M. de Magalhães, Ribeiro dos Santos, Vasco Leão, Gonçalves Mamede, Matos Correia, Cardoso Klerck, Correia de Oliveira, Pereira da Costa, Namorado, Luciano de Castro, Pereira Rodrigues, Pinto Bastos, Julio de Vilhena, Luiz de Lencastre, Luiz de Campos, Camara Leme, Bivar, Manuel d'Assumpção, Pires de Lima, Rocha Peixoto (Manuel), Mello Simas,. Pinheiro Chagas, Mariano de Carvalho, D. Miguel Coutinho, Pedro Jacomo, Julio Ferraz, V. da Arriaga, V. de Carregoso, V. de Moreira de Rey, V. de Sieuve de Menezes.

Entraram durante a sessão — Os srs.: Pereira de Miranda, Teixeira de Vasconcellos, Antunes Guerreiro, A. J. de Seixas, Arrobas, Barjona de Freitas, Sousa Lobo, Conde de Bertiandos, Francisco de Albuquerque, Fonseca Osorio, Francisco Costa, Camello Lampreia, Guilherme de Abreu, Jeronymo Pimentel, Ferreira Braga, J. J. Alves, Dias Ferreira, Freitas Branco, Marçal Pacheco, Pedro Franco, Pedro Roberto, Thomás Ribeiro, V. de Guedes Teixeira, V. de Villa Nova da Rainha.

Não compareceram á sessão — Os srs.: Adriano Sampaio, A. J. Boavida, Falcão da Fonseca, Ferreira de Mesquita, Augusto Godinho, Carlos Testa, Vieira da Mota, Conde da Graciosa, Vieira das Neves, Pinto Bessa, Van-Zeller, Quintino de Macedo, Guilherme Pacheco, Figueiredo de Faria, Moraes Rego, J. M. dos Santos, Nogueira, Mexia Salema, Lourenço de Carvalho, Faria e Mello, Alves Passos, Cunha Monteiro, Placido de Abreu, Ricardo de Mello, V. da Azarujinha. t

Abertura — As duas horas da tarde.

Acta — Approvada.

EXPEDIENTE

Officios

Da camara dos dignos pares do reino, devolvendo a proposição de lei que auctorisa o governo a tornar extensivo ao coronel honorario conde de Claranges de Lucotte as disposições da lei de 11 de agosto de 1856, á qual não póde dar o seu consentimento.

Representações

1.ª Dos escrivães das administrações dos concelhos de S. Pedro do Sul, Oliveira de Frades, do districto de Vizeu, e de Sever do Vouga, Albergaria a Velha, Ílhavo, Vagos e Mealhada, do districto de Aveiro, contra o projecto da reforma administrativa. (Apresentada pelo sr. deputado visconde de Carregoso.)

Á commissão de administração publica.

2.ª Da camara e conselho municipal de Albergaria a Velha, contra a circumscripção judicial. (Apresentada pelo sr. deputado visconde de Carregoso.) A commissão de legislação civil.

3.ª Da camara municipal de Portel, contra a lei de 16 de abril de 1874, reforma comarca. (Apresentada pelo sr. deputado José Luciano.)

A commissão de legislação civil.

4.ª Dos empregados da secretaria da procuradoria regia junto da relação do Porto, pedindo que se lhes tornem extensivas as disposições do artigo 35.° e seus §§ do decreto organico da secretaria d'estado dos negocios de justiça. (Apresentada pelo sr. deputado Mexia Salema.)

A commissão de fazenda.

5.ª Da camara municipal do Funchal, contra o modo de cobrar a contribuição do tabaco no concelho e districto do Funchal. (Apresentada pelo sr. deputado Julio Ferraz.)

6.ª Da camara municipal do concelho de Mourão, districto de Evora, contra a lei de 16 de abril de 1874, reforma comarca. (Apresentada pelo sr. deputado J. M. dos Santos.)

A commissão de legislação civil.

Nota de interpellação Peço seja prevenido o sr. ministro da guerra de que desejo interpella-lo a respeito do fornecimento de 3:000 panos de palha de cevada arrematados em 1875 por um creado do visconde dos Olivaes, a rasão de 800 réis cada pano, havendo quem fizesse aquelle fornecimento a rasão de 720 réis cada pano. = José Luciano.

Requerimentos

Requeiro pela segunda vez me seja enviada com urgencia copia do processo de arrematação do fornecimento de 3:000 panos de palha, feita por um creado do visconde dos Olivaes, e especialmente da correspondencia trocada entre a respectiva direcção do ministerio da guerra e o director da padaria militar, não só a respeito d'esta arrematação, mas tambem sobre uma falsificação commettida na escripturação quanto á entrada no competente deposito dos mencionados 3:000 panos de palha.

Requeiro igualmente copia das informações da respectiva repartição do ministerio da guerra sobre ambos estes objectos. = José Luciano.

2.° Requeiro que, pelo ministerio das obras publicas, seja enviada, com urgencia, a esta camara, uma nota, por annos economicos, de despezas ordinarias e extraordinarias feitas com a secção photographica da commissão geodésica desde a sua origem até ao presente. = Mariano de Carvalho.

3.° Requeiro que, pelo ministerio do reino, se envie, com urgencia, a esta camara o seguinte esclarecimento:

Qual foi o producto liquido da tourada por curiosos dada em junho de 1875, na villa de Salvaterra de Magos, em beneficio da misericordia da mesma villa?

Quem recebeu esse producto liquido?

A pessoa que o recebeu já fez d'elle entrega no cofre da misericordia?

Se não, quaes as causas, e porque não tem a auctoridade administrativa procedido para a cobrança d'essa quantia? = Mariano de Carvalho.

4.° Requeiro que, pelos ministerios das obras publicas e do reino, seja enviado, com urgencia, a esta camara o seguinte esclarecimento:

Em algum dos annos de 1874 e 1875 foi pelo governo

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concedido algum subsidio para obras de uma ermida no sitio dos Marinhaes, concelho de Salvaterra de Magos?

Quem superintendeu por parte do governo n'essas obras, quem ficou por depositario do dinheiro?

Esse depositario já entregou o dinheiro todo com a devida applicação?

Estão pagos todos os fornecedores ou empreiteiros das obras d'essa ermida? = Mariano de Carvalho.

5.° Requeiro que, pelo ministerio da guerra, se mande com urgencia a esta camara uma copia do decreto, ordem ou officio, aviso, etc. pelo qual o regimento n.º 3 de artilheria de posição foi transformado em artilheria de campanha. = Mariano de Carvalho..

6.° Requeiro que, pelo ministerio do reino, sejam enviados a esta camara 03 seguintes esclarecimentos urgentes:

I Quaes são os vencimentos actualmente abonados e pagos ao actual reitor da universidade de Coimbra, qualquer que seja a sua proveniencia e origem;

,11 Em que disposições legaes se funda o abono de cada um d'esses vencimentos. = Mariano de Carvalho.

7.° Requeiro que me sejam enviados com urgencia, pelo ministerio da marinha, os documentos e projectos que haja, em relação aos pharoes maritimos dos Açores. = A. Osorio de Vasconcellos, deputado por Trancoso.

8.° Renovo o requerimento que fiz em 24 de janeiro proximo passado, a fim do governo, pelo ministerio da fazenda, mandar informar ácerca da concessão á irmandade da misericordia da villa do Pombal, de uma parte da cerca do extincto convento de Santo Antonio, a que se refere o projecto de lei do sr. deputado Ricardo de Mello Gouveia, sobre o qual tem a decidir a commissão de fazenda, em nome de quem faço esta instancia.

Sala da commissão, 2 demarco de 1876. = O relator da commissão, Visconde da Azarujinha.

SEGUNDAS LEITURAS

Projecto de lei

Senhores. — Desembaraçar, quanto possivel, as corporações municipaes das peias que lhes tolhem o livre e mais acertado emprego das suas receitas parece-me ser um principio justo e em harmonia com as idéas de verdadeira descentralisação.

Fundado n'este principio, entendo que sempre que as camaras municipaes se dirigirem á representação nacional, pedindo a faculdade de empregarem com mais vantagem qualquer verba de receita a que a lei determinara diversa applicação, verificada a justiça do pedido, lhe deverá elle ser deferido.

N'este caso está o pedido que a camara municipal do concelho do Sardoal faz em uma representação que tenho a honra de enviar para a mesa conjunctamente com o projecto de lei que adiante se segue.

Pede a camara a que me refiro auctorisação para desviar por espaço de dez annos a receita proveniente da contribuição de viação municipal, e applica-la á realisação de uma fonte na villa, séde do concelho.

Mostram os peticionarios as vantagens e urgente necessidade d'esta obra de preferencia ás estradas municipaes de menor importancia no caso sujeito.

Attendendo porém a que, se esta verba fosse toda desviada pelo espaço de tempo indicado, não haveria meio de prover aos concertos indispensaveis nas que estão concluidas, e attendendo por outro lado á urgencia da obra que se pretende realisar, tenho a honra de vos apresentar o seguinte projecto de lei, em que me parece resolver esta questão em harmonia com os interesses dos povos e sem gravame para o thesouro.

Artigo 1.º É auctorisada a camara municipal do Sardoal a contrahir um emprestimo da quantia necessaria para a realisação de uma fonte na villa d'este nome.

Art. 2.° O emprestimo de que trata o artigo 1.° será garantido com metade da receita destinada á viação municipal que por esta lei fica desviada para tal fim até ao complemento das quantias levantadas para a obra de que se trata.

Art. 3.° Fica revogada a legislação em contrario. Sala das sessões, 3 de março de 1876. = D. Miguel Coutinho.

Projecto de lei Senhores. — E incontestavel a utilidade que resulta para o serviço publico das leis que regulam as aposentações dos empregados que se impossibilitam por enfermidade physica ou moral.

Este principio vae, como merece, ganhando o respeito da opinião, e tomando o logar que lhe pertence na legislação patria.

É o mais regular e justo de occorrer ás exigencias do serviço das repartições do estado, substituindo os individuos que se invalidam, natural ou prematuramente, por algum dos infinitos accidentes da vida humana, que enfraquecem as faculdades do corpo ou do espirito; e se essas disposições beneficas podem considerar-se como triumpho do direito que assiste aquelles a quem favorecem, não se deve tambem deixar de olhar a sua adopção como uma homenagem ás idéas humanitarias d'este seculo. Repugna effectivamente ás noções mais triviaes de equidade e de justiça a hypothese de ser abandonado pela nação, na idade decrépita ou na doença incurável, o homem que fez profissão de a servir, e com effeito a serviu emquanto póde.

Proclamada a verdade do principio, é mister acata-la em toda a parte onde se manifesta, e não parece justo que se decretem destinos diversos em condições similhantes.

Alguns serviços da dependencia do ministerio das obras publicas, commercio e industria têem já nas suas leis orgânicas determinados os casos e as regras das aposentações dos empregados; sendo porém omissa esta providencia salutar na carta de lei de 11 de maio de 1872, que organisou o serviço administrativo e technico dos pinhaes e matas nacionaes, e fixou o quadro e vencimentos do respectivo pessoal, ficaram privados do beneficio das aposentações os empregados d'esta repartição, que entre todos os subordinados á acção do indicado ministerio é talvez a que mais requer um resoluto e robusto pessoal para a vida das selvas, e para os perigos e fadigas da fiscalisação e trabalhos do seu officio.

Perante a vossa illustração fôra ociosa, se não impertinente, a citação das leis estranhas, que protegem o serviço florestal com estas e outras vantagens necessarias ao conveniente desempenho das respectivas obrigações; mas não é fôra de proposito recordar que se, no ponto de que se trata, houve omissão de providencia nos regulamentos modernos, não carecemos da auctoridade da legislação estrangeira para dar credito ao principio que invocámos e achamos respeitado nos nossos antigos regimentos de matas e coutadas por varias disposições de aposentação, que não podem ter hoje applicação pela mudança completa que fizeram os tempos na legislação e serviço d'este ramo de administração.

Reparando portanto a indicada omissão da lei de 11 de maio de 1872; para acudir ás necessidades eventuaes do serviço da administração geral das matas do reino tenho a honra de submetter á vossa illustrada apreciação o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° São applicaveis ao pessoal do quadro de administração geral das matas do reino, as disposições sobre aposentações, contidas no artigo 42.6 e seus §§ do decreto de 31 de dezembro de 1868, que reorganisou o ministerio das obras publicas, commercio e industria.

§ unico. Os vencimentos de aposentação serão pagos pelo cofre da mesma administração geral das matas do reino, e incluidos na folha do pessoal em effectivo serviço.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario. Sala das sessões dos senhores deputados, 2 de março de

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1876. = João Maria de Magalhães, deputado por Leiria.

Foi approvada a ultima redacção do pertence ao n.º 11, sobre as entendas oferecidas ao orçamento da despeza.

A camara permittia que fossem publicadas no Diario do governo as representações apresentadas na sessão de hontem pelos srs. Luciano de Castro e visconde de Carregoso.

O sr. Camara Leme: — Mando para a mesa uma declaração, de que não tenho comparecido ás ultimas sessões por motivo justificado.

O sr. Barros 6 Cunha: — Devolvo para a mesa os documentos que me foram remettidos pelo ministerio das obras publicas, e que eu solicitei, ácerca do modo como se fizeram os contratos para a compra dos carris para o caminho de ferro do Minho; e declaro a V. ex.ª que, examinando esses documentos, conheci por elles que os contratos foram feitos com toda a regularidade, não havendo motivo algum para as queixas que as pessoas interessadas em fazer este fornecimento me dirigiram sobre o modo por que o governo procedeu na acquisição do material d'aquella linha.

Tenho a maior satisfação em fazer esta declaração á camara, sentindo ter-lhe tomado tempo, e molestado o sr. ministro das obras publicas, quando, pelas informações inexactas que recebi, me cheguei a convencer de que os interesses do estado não tinham sido fiscalisados, conforme deviam ser.

V. ex.ª e a camara podem ter a certeza de que eu teria a maior satisfação de que, em toda e qualquer questão para a qual, em cumprimento do meu mandato, tenha de chamar a attenção do parlamento, e da qual possa resultar desfavor para o governo, eu podesse concluir, como hoje concluo este negocio. (Apoiados.)

Vozes: — Muito bem.

O sr. Antonio José de Seixas: — Mando para a mesa um requerimento de Claudino Augusto Carneiro de Sousa e Faro, capitão de engenheria do extincto exercito da India, e director das obras publicas de Angola, pedindo a transferencia para o quadro da Africa occidental, contando-se lhe a antiguidade do posto que tem da data do decreto de 3 de julho de 1873, que o promoveu áquelle posto, e sendo considerado para todos os effeitos official de engenheria, sempre que exercer, como actualmente exerce, alguma commissão propria d'esta arma.

Peço a V. ex.ª que se digne enviar este requerimento á commissão competente.

O sr. Carlos Eugenio: — Mando para a mesa um requerimento da sr.ª D. Úrsula Maria da Costa, pensionista do estado, filha do fallecido capitão tenente da armada, Manuel da Costa, a qual vem pedir a esta camara que lhe seja concedida a transferencia da parte do monte pio official que pertencia a sua irmã tambem já fallecida.

Parece-me justissima a pretensão d'esta infeliz senhora para occorrer ás suas precarias circumstancias.

Remetto tambem alguns requerimentos em que diversos sargentos do corpo de marinheiros pedem que se lhes dê accesso no regimento colonial, visto que presentemente não podem ter accesso no exercito nem na armada.

E de inteira justiça o que pedem estes officiaes inferiores, para que não lhes fique cortada permanentemente a sua carreira.

Rogo a V. ex.ª que dê a este requerimento o destino competente.

O sr. Manuel d'Assumpção: — Mando para a mesa uma petição de José Maria Alves Branco, antigo empregado superior no ministerio da guerra com graduação de coronel, pedindo que seja melhorada a sua reforma como tem direito, o que prova pelas rasões expostas na mesma petição.

Peço a V. ex.ª que se digne dirigir esta petição á commissão competente.

O sr. Bivar: — Mando para a mesa um requerimento

de Silverio José da Cunha, coronel reformado, que pede com justos fundamentos a esta camara que lho seja melhorada a sua reforma.

Peço a V. ex.ª que se digne dar a este requerimento o devido destino.

O sr. Julio Ferraz: — Mando para a mesa tres representações da camara municipal de Machico, na ilha da Madeira.

A primeira pedindo a revogação da lei de 13 de maio de 1864, que estabeleceu a livre cultura do tabaco nas ilhas dos Açores e Madeira.

A segunda pedindo que se approve, com algumas modificações, o projecto apresentado na sessão de 26 de janeiro pelo sr. Seixas, e assignado pelo sr. Luiz da Camara Leme e por mim.

E a terceira solicitando uma medida que de algum modo attenue a situação precaria dos devedores á fazenda nacional, o que se conseguiria pondo em execução por mais dez annos o decreto de 22 de julho de 1870.

Peço a V. ex.ª que mande dar a estas representações o devido destino.

O sr. Illidio do Valle: — Mando para a mesa um requerimento do alferes reformado Antonio Pereira, pedindo que a camara dê o seu parecer sobre um projecto apresentado na sessão passada pelo sr. visconde de Sieuve de Menezes.

Mando igualmente para a mesa um projecto de lei que tem por fim conceder á camara municipal de Valença um edificio, que ha trinta annos se acha em ruinas e completamente inutilisado, para n'aquelle local se construir uma casa escola para ambos os sexos. A simples leitura do relatorio, que precede a proposta, fornece as mais solidas rasões para justificação da pretensão.

Tenho outrosim a acrescentar que á commissão da instrucção publica foi presente um requerimento assignado pelos srs. deputados Joaquim José Alves e Pedro Franco, pedindo que ella dê com urgencia o seu parecer sobre um projecto de lei para a reforma do ensino da pharmacia, que na sessão passada fóra apresentado por ss. ex.ªs

A commissão não desconhece a importancia do assumpto, nem a necessidade urgente de attender ao ensino d'este ramo de conhecimentos, ao qual se ligam tão valiosos interesses sociaes, e que tão descurado se acha entre nós. Estando porém incumbida do estudo de uma reforma completa de ensino sob proposta do sr. deputado Alfredo Peixoto, e devendo n'ella comprehender-se o ensino da pharmacia, parece á commissão mais conveniente estudar conjunctamente a proposta de s. ex.ª, para que o assumpto de que ella trata possa mais facilmente ser desde logo adaptado ao plano geral dos estudos.

O sr. Presidente: — Vae ler-se uma proposta que ficou hontem pendente, assignada pelos srs. Osorio de Vasconcellos e Pinheiro Chagas.

Leu-se na mesa e entrou em discussão a seguinte

Proposta

Proponho que os arestos consignados nas sessões de 30 de novembro de 1870 e 11 de maio de 1860 sejam insertos no regimento.

Sala das sessões, 2 de março de 1876. = Osorio de Vasconcellos = Pinheiro Chagas.

O sr. Visconde de Sieuve de Menezes: — Como V. ex.ª sabe, a commissão do regimento está tratando de dar parecer sobre um novo regimento; e como esta proposta contem materia muito intima com o objecto de que a commissão se occupa, pedia a V. ex.ª que consultasse a camara sobre se permitte que a mesma proposta seja remettida com urgencia á commissão, a fim de que ella, tomando-a em consideração, possa inserir um artigo a este respeito.

Consultada a camara, resolveu afirmativamente.

O sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros (An-

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drade Corvo): — Pedi a V. ex.ª a palavra para lhe rogar que consulte a camara se ella consente que um negocio, que pelos seus resultados immediatos eu considero urgente, póde entrar em discussão na primeira parte da ordem do dia de hoje.

O assumpto é o seguinte: ha um tratado com a republica do Transwaal. Este tratado, por um protocollo que d'elle faz parte, tem relação com a construcção de um caminho de ferro de Lourenço Marques para aquella republica.

Tudo quanto é necessario para se poder realisar este importantissimo melhoramento está dependente da resolução do parlamento; e se a camara consente em que tratemos desde já do assumpto, prestará um bom serviço, porque se ganhará um anno nos trabalhos.

Posso dar a este respeito esclarecimentos á camara, ou em sessão publica ou em sessão secreta, como a camara quizer; mas o que em todo o caso posso assegurar é que a urgencia d'esta resolução é grande, porque com elle se liga a construcção d'aquelle caminho de ferro, como já disse. Isto póde levar muito pouco tempo á camara, e não transtorna o andamento dos seus trabalhos. (Apoiados.)

Consultada a camara resolveu afirmativamente.

ORDEM DO DIA

O sr. Presidente: — A camara dos deputados vae constituir-se em sessão secreta por assim o exigir o bem do estado.

Eram ditas horas e tres quartos.

As tres e meia horas da tarde tornou-se a sessão publica.

O sr. Presidente: — Em sessão secreta foi approvado o tratado concluido e assignado em 11 de dezembro de 1875 entre Portugal e a republica da Africa meridional por 68 votos, que era o numero dos srs. deputados que estavam presentes.

O parecer approvado é o seguinte:

N.° 15

Senhores. — A resolução, favoravel para o nosso paiz, da pendencia que existia entre Portugal e a Gran-Bretanha, ácerca da posse da bahia de Lourenço Marques, veiu reclamar urgentemente medidas e disposições legaes que possam alargar os horisontes do commercio d'aquella nossa possessão ultramarina.

Desnecessário será encarecer a importancia que tem para a metropole tal commercio, bem como affirmar que a bahia de Lourenço Marques, não so pela sua situação geographica, mas por offerecer seguro abrigo a navios de todo o porte, é indubitavelmente a melhor da Africa austral e oriental, e pela sua proximidade das republicas de Transwal e do rio Orange o porto mais proprio e adequado para o commercio de importação e de exportação d'aquelles estados.

Regular, pois, os direitos civis e as immunidades dos cidadãos e dos agentes consulares, de conformidade com os principios do direito internacional moderno e com as clausulas do tratamento de nação mais favorecida; estabelecer liberdade de commercio, isentando do imposto de entrada os productos do solo e da industria dos dois territorios confinantes; e finalmente garantir o transito da exportação dos productos da republica da Africa meridional no territorio portuguez, assim como o das mercadorias de qualquer origem importadas pela referida bahia com destino aquella republica; são condições de grande vantagem e a synthese do novo tratado.

As despezas de subsidio para a construcção da parte portugueza da linha ferrea, que ha de ligar a republica com a bahia, serão de certo cobertas pelo rendimento proveniente das taxas de importação e de exportação a que ficam sujeitos os ditos productos e mercadorias.

Assim, tão consideravel melhoramento poderá realisar-se

sem sacrificio para a provincia de Moçambique, nem onus para os cofres da metropole.

E porque a vossa commissão diplomatica examinou a proposta apresentada pelo governo, tocante a este assumpto, tem a honra de a converter no seguinte projecto de lei.

Art. l.° É approvado, para ser ratificado pelo poder executivo, o tratado concluido e assignado em 11 de dezembro de 1875 entre Portugal e a republica da Africa meridional.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Sala da commissão, em 14 de fevereiro de 1876. = Antonio Augusto Teixeira de Vasconcellos, presidente = Visconde de Villa Nova da Rainha = Pedro Jacomo Correia = Luiz de Almeida Coelho e Campos — Barão de Ferreira dos Santos = Julio Marques de Vilhena — Augusto Cesar Ferreira de Mesquita, relator.

O sr. Teixeira de Vasconcellos: — Requeiro a V.

ex.ª para entrar em discussão o parecer da commissão de verificação de poderes, relativo á eleição do sr. deputado eleito por Angola, Alberto Guedes Garrido.

O sr. Mariano de Carvalho: — Peço a palavra sobre este requerimento.

O sr. Presidente: — Este parecer foi hontem apresentado, mandado imprimir e distribuido hoje na sala.

O sr. deputado pede a dispensa do regimento para elle entrar em discussão, por isso tenho de consultar a camara.

O sr. Vasco Leão: — Mando para a mesa um parecer da commissão de legislação civil sobre uma proposição de lei vinda da camara dos dignos pares do reino.

O sr. Mariano de Carvalho: — A maioria da camara resolverá o que entender sobre o requerimento apresentado pelo sr. Teixeira de Vasconcellos, mas julgo do meu dever preveni-la de que desejo impugnar este parecer.

Só hoje me foi distribuido, e nunca imaginei que hoje mesmo entrasse em discussão, por isso não vim prevenido com os apontamentos e documentos necessarios para tal fim.

Se a camara quer que um ou mais deputados da opposição não possam entrar n'esta discussão e impugnar o parecer por não trazerem os apontamentos e documentos necessarios para isso, então vota o requerimento, mas se entende que é justo que elles discutam a eleição, então não vota o requerimento.

O meu desejo é declarar a V. ex.ª que preciso impugnar este parecer, e nunca imaginei que entrasse hoje em discussão. Apenas hoje me foi distribuido e eu tenho apontamentos e documentos que preciso apresentar á camara, mas não os tenho aqui, nem os podia ter, porque, repito, não esperava que já hoje entrasse em discussão.

O sr. Osorio de Vasconcellos: — Faço um additamento ao requerimento do meu illustre amigo, o sr. Teixeira de Vasconcellos.

Requeiro que os documentos que se referem a esta eleição sejam publicados, para que á vista d'elles, e depois d'elles examinados, se possa entrar em uma discussão larga, como deve ser.

Ha alguns dias tive a honra de mandar para a mesa uns documentos que naturalmente foram entregues á digna commissão de verificação de poderes, a qual, estou seguro d’isso, os havia de examinar.

Disse logo a V. ex.ª que não tinha lido esses documentos, porque me tinham sido entregues n'essa occasião, e esperava que a commissão os tivesse mandado publicar, ou tivesse pedido que fossem publicados juntamente com o seu parecer, como é costume, mas não o foram; portanto requeiro a V. ex.ª que esses documentos, que se referem a esta eleição, e que foram mandados por mim para a mesa, sejam publicados e distribuidos na camara.

O sr. Teixeira de Vasconcellos: — Eu não sabia nem podia saber se todos os srs. deputados estavam ou

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não habilitados para entrar n'esta discussão; suppunha que sim, e suppunha que já se tinha distribuido o parecer ha mais tempo.

Não quero de maneira alguma que se pense que eu desejava que este negocio passasse de assalto (apoiados), nem elle é d'essa natureza, nem precisa d'isso.

Portanto concordo perfeitamente em que se dê o tempo necessario para que cada um tome conhecimento do estado d'este processo eleitoral, e que a decisão seja tão justa como costumam e devem ser as decisões d'esta casa. (Apoiados.)

Quanto ao requerimento do meu amigo o sr. Osorio de Vasconcellos, não tenho duvida alguma em concordar com a impressão dos documentos, mas isso depende do volume d’elles; não sei, mas tal póde ser o volume, que equivalha a que se não possa tratar d'este assumpto durante a actual sessão legislativa, ou pelo menos muito tarde. Não sei qual o volume que elles têem, porque, como não pertenço á illustre commissão de verificação de poderes, não me passou pelas mãos senão o parecer d'essa commissão...

O sr. Osorio de Vasconcellos: — Referi-me unicamente aos documentos que mandei para a mesa.

O Orador: — Muito bem. N'esse caso não ha nenhuma difficuldade; e só requeiro que um contraprotesto, que mandei para a mesa, seja tambem publicado.

O sr. Osorio de Vasconcellos: — Desejo que fique bem consignado, que eu, fazendo este requerimento, não pretendi nem pretendo demorar a votação da camara ácerca d'esta eleição; porque não comprehendo que qualquer deputado se arvore no direito de fazer com que uma parte do territorio portuguez não esteja aqui representada, empregando para isso tricas parlamentares; não era esse o meu intuito. O que pretendo simplesmente, é que a questão seja bem esclarecida, a fim de que todos nós possamos votar com verdadeiro conhecimento de causa.

Em virtude, pois, do meu requerimento conclue-se facilmente que não pretendo que sejam publicadas as actas e os cadernos do recenseamento, e todos os mais documentos que se referem á eleição, e portanto não têem rasão de ser as observações, que de certo por eu ser mal comprehendido fez o illustre deputado, o sr. Teixeira de Vasconcellos.

Posta a questão n'estes termos, nada mais tenho a dizer, limitando-me apenas a pedir a urgencia na publicação d'esses documentos, a fim de que se for possivel sejam ámanhã distribuidos pelos srs. deputados.

Leu-se na mesa o seguinte:

Requerimento

Requeiro que os documentos que se referem á eleição de Angola sejam publicados e distribuidos aos srs. deputados. = Osorio de Vasconcellos.

O sr. Teixeira de Vasconcellos: — Não sei se V. ex.ª tomou nota de que eu requeri que, com esses documentos, fosse impresso um contra-protesto que apresentei quando mandei para a mesa o diploma do sr. deputado eleito.

Consultada a camara resolveu-se a favor da publicação dos documentos e do contra-protesto apresentado pelo sr. deputado Teixeira de Vasconcellos, sendo approvada a proposta do sr. Osorio de Vasconcellos.

O sr. Presidente: — Em vista da resolução da camara, mandam-te imprimir os documentos, e serão distribuidos pelos srs. deputados a fim de entrarem em discussão com o parecer da commissão de verificação de poderes, relativo á eleição a que elles dizem respeito.

Passa-se á segunda parte da ordem do dia que é a continuação da discussão do projecto de lei de receita, na sua generalidade. Acham-se inscriptos os srs. Mariano de Carvalho e Luciano de Castro.

O sr. Mariano de Carvalho: — Limito-me por agora a pedir uma explicação ao sr. ministro da fazenda que espero m'a poderá dar satisfactoria.

As notas e observações ás diversas verbas do rendimento do estado no anno economico de 1874—1875 dão de contribuição bancaria a quantia de 140:456$167 réis.

Esta verba compõe-se de duas verbas, uma de réis 92:924$200 pertencente ao exercicio de 1874-1875, e outra de 47:531$967 réis que pertence ao exercicio do 1873-1874; ha por conseguinte cobrada no anno de 1874-1875 uma verba de 47:531$967 réis, pertencente ao exercicio de 1873-1874.

Ora, se se recorre á conta de receita do exercicio findo de 1873-1874, acha-se que n'esse exercicio se liquidou apenas, de contribuição bancaria, 81:330$682 réis, quando a avaliação da receita era de 197:000$000 réis.

Desejo pois saber o seguinte:

Esta contribuição recae sobre um pequeno numero de contribuintes; não posso fixar o numero, mas não chega a tres duzias de contribuintes; mas como é que se explica, que esta contribuição, que recae sobre tão poucos contribuintes que estão sujeitos á acção fiscal do governo, não tenha sido possivel ser toda liquidada? Não sei como se possa explicar este facto, mas espero que o sr. ministro esclareça a camara a este respeito.

O sr. Ministro da Fazenda: — Não tenho bem presente o caso especial a que se refere o illustre deputado, mas tenho presentes outros casos que se dão em contribuições, porque uma grande parte d'ellas não se cobram nos annos em que poderiam ser cobradas e cobram-se nos seguintes. Entretanto parece-me que este facto, a que alludiu o illustre deputado, póde ter explicação em virtude da lei relativa ao banco de Portugal.

O Orador: — A lei do banco de Portugal é anterior. A questão é qual é o motivo porque não foi possivel liquidar toda a contribuição bancaria de 1873—1874, sendo poucos os contribuintes e estando sujeitos á acção fiscal do governo. Apenas se liquidou metade da mesma contribuição e por isso insurjo-me contra a falta de fiscalisação e falta de pagamento.

O sr. Ministro da Fazenda: — A questão é saber-se se se liquidou ou não o que devia liquidar-se.

O Orador: — V. ex.ª é que ha de saber, e por isso é que estou perguntando. Parece-me que faltaram 47:0000000 réis...

O sr. Ministro da Fazenda: — Cobraram-se no anno seguinte. Aqui estão.

O Orador: — Mas como é que se diz que no anno de 1873-1874 ficaram por cobrar 47:000$000 réis?

O sr. Luciano de Castro: — Dois assumptos me obrigaram a pedir a palavra. E o primeiro a conveniencia de fixar n'uma certa somma a representação da divida fluctuante dentro de cada anno economico; e o segundo o desejo de chamar a attenção do sr. ministro da fazenda, sobre a necessidade de reformar a legislação reguladora do real de agua.

Começarei pelo primeiro.

O governo póde ver-se obrigado no primeiro semestre do anno economico a representar uma parte da receita; mas esta representação tem um termo. Não póde o governo á sombra da disposição legal, que o auctorisa a representar a receita, levantar divida fluctuante sem nenhum limite ou restricção. Não póde nem deve ser.

O sr. ministro da fazenda podia acceitar a proposta do sr. Pereira de Miranda, que fixa em 2.000:000$000 réis a representação da receita no anno economico futuro. S. ex.ª no orçamento da despeza que apresentou á camara, n'uma nota que vem em seguida ao ministerio da fazenda, fixou na quantia de 1.500:000$000 réis a importancia maxima da representação da receita por meio da divida fluctante. O sr. Pereira de Miranda, acceitando aquella declaração, propoz que se fixasse a divida fluctuante em 2.000:000$000 réis.

Se o illustre ministro da fazenda não concorda com esta proposta por julgar demasiada a somma de 2.000:000$000

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réis, reduza-se, fixemos a representação da receita em 1.200:000$000 ou 1.500:000$000 réis; mas fixemos uma quantia, porque é isso uma garantia para o credito e para o publico. E para mim é mais alguma cousa. E uma garantia de que os governos não hão de continuar a abusar, como têem abusado, não só o actual, mas todos, da disposição legal, que permitte a representação das receitas pertencentes a cada anno economico por meio da divida fluctuante?

A divida fluctuante é isto; é o credito que o governo levanta sobre a representação da receita do anno economico.

Se a camara consente que o governo á sombra do artigo que permitte aquella representação de receita possa fazer operações de credito, sem nenhuma restricção, auctorisa d'este modo moralmentente o governo a fazer emprestimos, e a crear divida que mais tarde ha de ser obrigado a consolidar.

A divida fluctuante não póde ser levantada senão nos limites da representação da receita. Ir mais longe é um abuso da lei, que mais tarde nos poderá custar caro.

O orçamento do estado deve ser organisado por fórma que sejam attendidas todas as despezas que podem ser previstas. Para as despezas extraordinarias e imprevistas ha os creditos extraordinarios. Na falta d'esses creditos extraordinarios poderia o governo reunir o parlamento.

Portanto não ha necessidade de se recorrer á divida fluctuante a não ser para representar as receitas do anno economico. Admittindo a pratica de levantar com o nome de divida fluctuante fundos sem restricção alguma, não se fixando um limite a essas operações de credito, como mais tarde essa divida ha de ser consolidada, a camara está a votar, por assim dizer, desde já os emprestimos necessarios para essa consolidação.

Parece-me, pois, que é conveniente pôr um limite á divida fluctuante, para que uma vez o governo seja obrigado a não levantar mais divida fluctuante do que aquella que for necessaria para a representação da receita dentro do anno economico.

O orçamento votado d'esta maneira, sem este limite, é uma completa illusão.

O governo, quando quer fazer qualquer despeza, não auctorisada, fa-la sem escrupulo, gasta tudo o que lhe apraz, e depois de feita a despeza vem ao parlamento pedir um bill de indemnidade, quando a opposição lhe recorda esse dever constitucional.

Assim não é possivel haver fiscalisação séria da applicação dos dinheiros publicos, porque o governo na auctorisação para a representação das receitas acha meio facil de levantar fundos para quaesquer despezas, ainda mesmo não auctorisadas.

Isto não póde ser.

Isto não é um orçamento regular. Um orçamento em que o governo, e não me refiro ao actual governo, refiro-me a todos os governos, porque o abuso é antigo, encontra um artigo em virtude do qual, sob pretexto de representar a receita publica, póde levantar todos os fundos que quizer para todas as despezas que lhe lembrarem, não é serio.

N'estas condições não póde haver fiscalisação efficaz sobre a gerencia dos dinheiros publicos. (Apoiados.) (Susurro.)

Eu peço a V. ex.ª que mantenha a ordem na casa. (Apoiados.)

Eu não estou a fallar para me divertir; fallo no desempenho do meu mandato, e é deploravel que não sejam os membros d'esta camara, mas os de uma camara estranha a esta, que venham perturbar as nossas discussões.

Isto não póde ser. Eu não fallo, repito, por divertimento, fallo no desempenho do meu mandato; e se V. ex.ª não póde manter a ordem declare-o francamente, porque então

deixo de pedir a palavra, e todos nós faremos o mesmo. (Apoiados.)

O sr. Presidente: — Chamo a attenção da camara. Peço ordem. -

O Orador: — Ainda direi duas palavras sobre o objecto principal que me obrigou a tomar a palavra, que é chamar a attenção do sr. ministro da fazenda para a necessidade de melhorar a legislação reguladora do real de agua.

A camara não faz idéa da desordem e anarchia a que chegou a legislação relativa ao real de agua. Não se cabe quaes são as penas que se devem applicar. Não se sabe qual é o processo, em virtude do qual essas penas hão de ser applicadas. Não se sabe se é o processo criminal, se é o processo civil e criminal estabelecido na novissima reforma judiciaria. Não se sabe até qual é a verdadeira incidencia do imposto. Ainda ha pouco se deu em Coimbra um incidente, sobre o qual eu chamo a attenção do sr. ministro da fazenda.

Os empregados fiscaes exigiram o real de agua por uns objectos mandados de presente a um cavalheiro d'aquella cidade.

O contribuinte requereu o deposito do imposto e recorreu para os tribunaes judiciaes. Estes deram raso ao contribuinte e mandaram levantar a importancia depositada com o fundamento de que a legislação do real de agua não comprehendia nas suas disposições os presentes. Eu creio que os tribunaes judiciaes procederam bem. E todavia os empregados fiscaes continuam a exigir o imposto.

Não se póde admittir que continue assim uma legislação tão cahotolica e desordenada.

Não se póde admittir que o real de agua continue a cobrar-se á custa de vexames, demasias e injustificaveis exigencias por parte dos empregados fiscaes. É necessario que a lei seja clara, expressa e inequivoca.

O regulamento mandado celebrar pelo sr. ministro da fazenda não satisfaz, e a rasão é porque o governo não se julgou habilitado a poder tomar resolução alguma sobre certos pontos que careciam para serem convenientemente decididos da intervenção parlamentar.

Sei que sobre aquelle regulamento foram ouvidos os fiscaes da corôa, que o sr. ministro da fazenda procedeu com toda a cautela ouvindo as pessoas competentes sobre a materia; mas em todo o caso não posso deixar de dizer a V. ex.ª que o fim do illustre ministro não foi conseguido, porque a legislação continua da mesma maneira, cahotica, incoherente, absurda, e talvez ainda peior do que anteriormente. E preciso pois que o governo peça ás camaras auctorisação para melhorar a legislação reguladora d'este imposto.

E possivel que o sr. ministro se não julgue auctorisado, como creio não deve julgar-se, para fazer reformas profundas n'aquella legislação; mas eu aproveito a occasião para lembrar a s. ex.ª que não deixe encerrar a sessão sem pedir auctorisação para tratar seriamente d'este assumpto. E foi para isto principalmente que eu tinha pedido a palavra. Penso que faço n'isto um bom serviço, e maior o poderá fazer o sr. ministro acceitando o meu alvitre. " •

Este imposto ainda hoje é regulado por disposições, em grande parte obsoletas. As portarias e disposições regulamentares lêem agravado o cabos e a obscuridade das antigas provisões.

Parece-me, por conseguinte, que s. ex.ª não pode ter duvida, embora não tenham vindo representações a esta camara, de no interesse do fisco e dos contribuintes pedir á camara auctorisação para poder, depois de ouvir as auctoridades competentes, publicar um decreto com força legislativa para terminar e decidir todas as duvidas que actualmente difficultam e obscurecem a interpretação e observancia da legislação do real de agua.

Tenho concluido.

O sr. Ministro da Fazenda: — Já em outra sessão

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tive occasião de responder a outros illustres deputados ácerca da questão da fixação da divida fluctuante. A proposta ou emenda apresentada n'esse sentido ha de ir á commissão de fazenda, e ella virá de novo á discussão d'esta camara para ser apreciada.

Mas o illustre deputado diz muito bem, que é necessario que quando o parlamento vota o orçamento do estado não fique completamente ao arbitrio do governo o poder fazer despezas fóra da lei. De accordo; mas aqui não se trata de despezas, trata-se dos meios para poder fazer despezas. Está claro que o governo não póde, não deve fazer despezas alem das legaes.

Diz o illustre deputado que o governo, quando tratar de fazer alguma despeza extraordinaria, recorra aos creditos extraordinarios. De accordo; mas abrir creditos extraordinarios é apenas auctorisar despezas; e para fazer essas despezas extraordinarias é necessario crear divida fluctuante, quando não chega para ellas a receita ordinaria. Sem esta faculdade é inutil a auctorisação para abrir creditos extraordinarios.

O illustre deputado disse que a não fixação da divida fluctuante até certo ponto auctorisava o governo a fazer despezas alem das que estavam auctorisadas por lei. Em primeiro logar direi que o governo não póde fazer despezas alem das que estão auctorisadas por lei, e quando alguma circumstancia extraordinaria o obriga a fazer despezas extraordinarias, tem de vir pedir a sua legalisação á camara. Mas isto não tem nada com a fixação da divida fluctuante.

Esta divida serve para representar a receita dentro do anno economico, e para supprir o deficit das receitas quando o ha, e ainda para occorrer aos creditos extraordinarios, que o governo póde abrir nos casos marcados na lei. E para occorrer a estas circumstancias, todas eventuaes, é difficil fixar a divida flutuante de modo que não ponha embaraços á administração publica, quando aquellas circumstancias se derem. E tanto mais quanto o governo não tem hoje os recursos que tinham os governos n'outra epocha, que era a auctorisação ampla da venda de titulos de que os governos usavam largamente, e o que mais é sem o conhecimento do publico, senão muitas vezes depois de terminar a gerencia de cada anno.

Emquanto á questão do real de agua, eu digo que o illustre deputado tem rasão em dizer que este imposto, alterado por leis successivas de 1871 e 1872, não está ainda regulado de maneira que esse regulamento seja satisfactorio. O regulamento que mandei fazer, e que se está executando, não póde ser tão perfeito como seria se o governo tivesse faculdades especiaes para alterar n'alguns pontos a legislação vigente; o governo tratou de fazer um regulamento dentro das auctorisações legaes. Entretanto, posso dizer ao illustre deputado que me parecem muito exagerados os vexames, as demazias, as intolerâncias, os abusos que diz praticados por parte dos agentes fiscaes. As instrucções que elles têem é para se restringirem ao regulamento, que é perfeitamente legal, e que não dá logar a que se exerçam esses vexames e essas demazias; mas este imposto, como quasi todos os impostos, mas sobretudo este que é lançado sobre o consumo, é pouco sympathico ás populações. O governo tem leito da sua parte para que não se exerçam vexames, e para que se tenha o mais possivel em attenção as reclamações dos contribuintes quando ellas sejam legaes e com fundamento; e esta brandura com que o governo tem feitio executar este regulamento tem produzido bom resultado, que é que o producto do imposto tem augmentado sem se levantarem as queixas que tem havido n'outras epochas, e sem provocar resistencias que tragam comsigo o contrario do que se tinha em vista, isto é, a impossibilidade de cobrar o imposto ou a sua diminuição em vez do seu augmento.

Eu bem sei que ás vezes certos espiritos são seduzidos pela idéa de fazer uma cousa mais perfeita, e de arrecadar

logo tudo quanto um dado imposto póde e deve dar, e estou persuadido de que este imposto póde dar, quando todos o paguem integralmente, o dobro ou proximamente da receita que ordinariamente se tem arrecadado; mas eu prefiro que o imposto renda menos, e que a lei se execute com toda a brandura para que o contribuinte se vá acostumando sem reluctancia a pagar o que deve pagar. (Apoiados.) Antes isto do que para receber logo tudo provocar resistencias e não receber nada.

E um facto que o regulamento carece de ser alterado, mas para ser alterado convenientemente precisa-se fazer uma lei, e eu tenho-me já occupado de trazer uma proposta á camara, mas tenho hesitado, porque é necessario vencer certas reluctancias dos povos para obrigar os contribuintes d'este imposto a pagarem aquillo que, segundo os termos rigorosos da lei, devem pagar.

Quanto aos tribunaes, disse o illustre deputado que umas vezes elles decidem por uma maneira, e outras por outra; o poder executivo não tem nada com isso. Era bom que todos decidissem da mesma maneira, que todos encarassem a questão do mesmo modo, e era bom que os regulamentos e as leis fossem tão claros que nunca houvesse duvidas. Mas não é facil chegar a esta perfeição. Uma das cousas que tem dado logar a duvidas na execução do regulamento é não ter ficado bem definido se as multas devem ser impostas pelo poder judicial, mas este assumpto não póde ser regulado definitivamente senão por uma lei, e já disse os motivos pelos quaes tenho hesitado em a propôr ao parlamento.

O sr. Freitas Branco: — Mando para a mesa um parecer da commissão dos negocios ecclesiasticos.

O sr. Barros e Cunha: — Sr. presidente, penso hoje da maneira que pensava quando outros ministros occupavam estes logares, ácerca da necessidade que o parlamento tem de equilibrar por uma vez as receitas em harmonia com as despezas que o mesmo parlamento vota.

Por muitas sessões successivas trouxe á camara propostas que foram assumpto de debate, para convidar differentes ministerios que têem antecedido o gabinete actual, para que se adoptasse a norma indispensavel e actualmente muito reclamada pelas circumstancias em que se acha o thesouro da nação portugueza occorrendo, por meio do imposto, com receitas convenientes ás despezas da nação.

Estas propostas, como quasi todas as propostas, foram consideradas então ou como moções de censura, ou como moções politicas que deviam determinar a queda do ministerio.

Em consequencia d'isso foram acompanhadas sempre de promessas de que no anno seguinte ou n'esse mesmo anno o governo, por propostas especiaes, trataria de elevar as receitas aquillo que era reclamado pela necessidade das despezas da nação.

Mas foram rejeitadas.

Portanto desisti, mau grado meu, e com grande pezar, de provocar a attenção do ministerio actual, e da camara a que tenho a honra de pertencer, para este assumpto importantissimo.

Se, porém, ha ministerio que não possa nem deva ter desculpa de não cumprir com este imperioso dever inherente ao encargo que voluntariamente assumiu, é o ministerio actual; e a não ser por uma circumstancia que já por vezes tenho ouvido annunciar na presente sessão de que unicamente governa um partido, e que toda a nação portugueza se consubstancia na permanencia d'esse partido á frente dos destinos publicos, não vejo desculpa para o actual sr. ministro da fazenda.

E menos desculpa lhe vejo, quanto a sua capacidade financeira de muito tempo e antes de s. ex.ª entrar na pasta da fazenda, dava logar a esperar d'elle mais alguma cousa do que o rotineiro expediente a que s. ex.ª principalmente se tem soccorrido, mantendo uma situação perigosa, e muito perigosa, á qual não vejo remedio algum senão no reme

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dio que necessariamente lhe ha de dar a revolução. (Apoiados.)

(Sensação na assembléa.)

Estou cansado de demonstrar á camara que o orçamento do estado...

(Havia alguma agitação na assembléa.) (Pausa.)

Peço perdão, não sei se por acaso desagradei a algum dos meus collegas. Não tenho desejo algum de incorrer no desagrado de pessoa alguma, estou emittindo a minha opinião com a independencia e imparcialidade com que a tenho sempre emittido. É necessario que a camara saiba que n'estas questões nem aos meus proprios amigos politicos usei nunca fazer favores. As circumstancias do thesouro eram de feição para que de uma vez para sempre do assentasse como norma invariavel o que entre as nações' bem administradas não é já hoje uma virtude, mas sim uma condição da vida normal d'essas nações, de votar receitas ou de não fazer despezas alem d'essas receitas. (Apoiados.)

Nós já invertemos tudo, até principiámos a votar despezas antes de votar receitas (apoiados), antes de saber se temos meios para fazer face a essas despezas. (Apoiados.)

Sendo um dia deputado da opposição, n'esta casa, o sr. Carlos Bento da Silva, vi apresentar, como questão prévia, a necessidade que havia de que primeiramente se soubesse qual era a receita para se saber depois se se devia ou não votar uma despeza que excedia muito a possibilidade de poder ser acompanhada pela elasticidade d'essa receita.

Declaro que me admirou, mas admirou me de um modo desagradavel, o ver rejeitar uma proposta tão sensata. Hoje ninguem ousaria arriscar-se a fazer tal proposta, porque se transformou em regra o que outr'ora se fazia por excepção. (Apoiados.)

Hoje o sr. ministro da fazenda, respondendo ás muito sensatas considerações com que o meu amigo, o sr. José Luciano, veiu sustentar a proposta do sr. Pereira de Miranda, proposta de que tambem foi iniciador n'esta casa o sr. Carlos Bento, para que se fixasse a divida fluctuante, eu vi que o sr. ministro da fazenda disse: «Para que serve fixar a divida fluctuante? O governo tem de fazer certas despezas, e fixar ou deixar de fixar a divida fluctuante é completamente indifferente».

O sr. Ministro da Fazenda: — Peço perdão, mas não disse isso.

O Orador: — Se V. ex.ª não disse isto, pelo menos as consequencias do seu argumento são estas: o governo, pelos creditos extraordinarios, declara qual a despeza que tem de fazer, mas depois ha de levantar os meios por qualquer modo.

O que quer isto dizer? Não quererá dizer que a fixação da divida fluctuante é absolutamente inutil? - Se não é isto, se o sr. ministro sente outra cousa, porque não se submette a esta util norma de administração publica, porque não acceita e. ex.ª a proposta? Deve acceita-la.

Investindo, porém, com a pouco gloriosa tarefa de chamar a attenção do parlamento e do paiz para que se occupe a serio das questões de interesse nacional, que não podem ser tratadas com a leviandade com que são tratadas n'esta casa, e é esta a minha obrigação de representante de contribuintes, porque estou aqui representando uma parte dos contribuintes da nação portugueza, que têem direito a saber como eu zêlo as exigencias que o thesouro faz aos particulares, digo que este caminho é perigoso, e muito perigoso, porque as despezas não têem limite, os orçamentos são uma falsidade, uma illusão completa, e eu já demonstrei, e está publicado sem contradicção nos Diários das nossas sessões, que entre os deficits calculados, isto é, entre a idéa que o parlamento fórma quando vota a receita e despeza do estado, e a realidade que depois se apresenta

nas contas do thesouro, ha uma differença tal que nos deve conduzir a uma ruina inevitavel.

Nós não temos meios, nem é possivel te-los, para continuarmos a calcular que a receita publica ha de ser de réis 23.000:000$000, e fazermos uma despeza de réis 29.000:000$000 é preciso que nos limitemos aquillo que é possivel esperar das receitas pelo resultado das cobranças dos annos anteriores, e não estejamos a fazer orçamentos artificiaes para animar despezas extravagantes, que nos devem tornar a dar circumstancias afflictivas e difficuldades que o passado nos habilita a prever.

E não se diga que houve ministros que proclamaram a bancarota, que estivera este paiz a ponto de acceitar a bancarota como unico recurso (apoiados); e nem diga o sr. ministro que isso foi norma de nenhum governo, porque o não foi de nenhum: faço justiça aquelles governos de quem fui adversario tenaz. Mas as circumstancias eram taes, a falta de credito era de tal ordem dentro e fóra do paiz, creada pelas despezas estravagantes feitas pela situação actual até 1867, era de tal natureza, que foi necessario que á frente doa negocios publicos estivessem homens bafejados de patriotismo, individuos de excepcional probidade para poderem conjurar, por meio de economias, de impostos e de sacrificios sobre todos os cidadãos, o gravissimo risco, á beira do qual esta nação se achou. (Apoiados). E não desejo que estas circumstancias se renovem.

Em toda a parte do mundo onde ha orçamentos, onde as leis se executam segue-se uma regra invariavel nas despezas publicas, a qual os meus honrados amigos, o sr. José Luciano de Castro, Braamcamp e outros membros d'esta casa, têem, por muitas vezes, apontado ao actual governo como indispensavel, e que desejaria fosse adoptada n'esta sessão, que é fazer julgar pelo tribunal de contas as despezas. E em muitos paizes ha o julgamento das contas, capitulo por capitulo. Por exemplo, na Inglaterra no dia 31 de março todos aquelles individuos que têem recebido do thesouro meios para fazer quaesquer pagamentos entram no banco de Inglaterra com os saldos, com as sobras dos meios que receberam do thesouro, e as suas contas são tomadas pelo thesoureiro geral, e depois julgadas por um tribunal especial para serem conferidas voto por voto para saber se se cumpriram as formalidades legaes, isto é, se foi consultado o procurador da corôa, o conselho do thesouro, se foram consultados os conselheiros legaes do poder executivo quando essas despezas excedem o voto parlamentar. Sem isto a responsabilidade dos individuos não caduca, nem elles são absolvidos d'essa responsabilidade. Assim ss faz em toda a parte, e assim desejo que se faça, ou venha a fazer mais tarde no nosso paiz. (Apoiados.)

Mas d'esta maneira, calculando as despezas pelo modo que são calculadas, não póde ser. E eu considero que o orçamento da receita não póde de maneira nenhuma discutir-se separadamente do orçamento da despega, e peço perdão se me refiro a um assumpto que já está votado; não quero invalidar a resolução da camara, quero unicamente chamar a sua attenção, e a attenção do pais, para este gravissimo ponto da nossa vida pratica. Nós não podemos estar indefinidamente a crear divida fundada sem limites. Não póde ser; se isto continua, em dez annos teremos de dar 15.000:000$000 réis á junta do credito publico, e absorver n'esse capitulo a totalidade da receita publica.

Isto é muito serio. E a principal questão de que o parlamento se deve occupar.

Sei que se tem chegado até a censurar, e tive a honra de receber essas censuras impressas, uma especie de fanatismo, de zêlo fanatico que tenho pelos interesses do thesouro.

Felizmente posso ter esse fanatismo, porque não recebo cousa alguma do erario, e talvez que até a minha popularidade ganhasse alguma cousa se em logar de instar con-

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stantemente com todos os ministerios, como tenho instado, para que se equilibrem as receitas com as despezas, porque eu não peço outra cousa, pedisse os effeitos contrarios.

Não digo aos governos que não gastem o que se deve gastar, só lhes peço que nos digam quanto é que se precisa gastar e como é que se ha de occorrer ás despezas. O que não quero é deixar tudo ao arbitrio dos governos.

E espero, sr. presidente, que ainda ha de vir tempo em que não ha de ser possivel que um ministro da fazenda se sente n’aquelles logares tendo por norma o deixar ao acaso e á ventura os interesses do thesouro nacional.

Espero que ainda ha de ser impossivel que os governos deixem de reconhecer que, se os cidadãos tem obrigação de pagar o que devem pagar para as despezas publicas, a elles compete o rigoroso dever de lhes dizer com toda a verdade quaes são essas despezas; e d'ahi ha de vir necessariamente para o contribuinte, para o povo portuguez em geral uma salutar regra de vida politica e de vida civil, porque ha de fazer com que elle dê mais attenção a tudo e principalmente ao uso que se faz do obolo que vae depor nas recebedorias das comarcas e dos concelhos para as despezas, que até hoje têem corrido por um perfeito arbitrio ou caprichoso desleixo e abandono, não digo do actual governo, mas de quasi todos os governos que se têem sentado n’aquelles logares, porque não têem responsabilidade.

Disse o sr. ministro da fazenda que o governo tem hoje menos arbitrio do que tinha n'outro tempo, porque então se vendiam titulos de divida publica e hoje não se vendem esses titulos.

Eu entendo que o arbitrio é o mesmo. Que nos importa a nós que o sr. ministro venda titulos ou contráhia divida fluctuante? (Apoiados.)

Pois o sr. ministro, porque dá a estas operações a fórma de divida fluctuante, é que a paga da sua algibeira? Não é, somos nós todos, é a nação que a ha de pagar. Por consequencia, a fórma para nós é completamente indifferente.

O mais que d'ahi póde resultar é que d'aqui a pouco isso ha de dar logar a que o actual ministerio, se se conservar por mais um anno no poder, tenha a gloria de por mais uma vez, e n'um curto praso, consolidar uma enormissima divida fluctuante. (Apoiados.)

E este o resultado que á ahi se tira. Outro resultado não vejo eu, confesso francamente, a não ser, continuando este systema, de lançar desde já as bases para elle ou para os seus successores de uma nova gloria de consolidar ainda outra grande divida fluctuante.

De maneira que este abuso do que o governo diz que se tinha despojado o poder executivo, tem-n'o o sr. ministro da fazenda á sua disposição debaixo de uma fórma que elle considera mais popular e muito mais legal, qual é a de vender os fundos, fazendo-os passar primeiro pelo túnel da divida fluctuante.

Mais nada.

As nações não podem continuar n'este caminho, e os paizes mais bem administrados estão hoje adoptando como regra invariavel o inverterem a sua divida fundada no que se chama annuidades termináveis, isto é, em divida amortisavel.

Muitos dos emprestimos modernos que, como o sr. ministro da fazenda sabe, as nações, como a Italia, por exemplo, que se achavam em gravissimas difficuldades ha muito poucos annos, contrahiram ultimamente, têem quasi todos esta feição. (Apoiados.)

A Inglaterra, que, apesar de eu ter o defeito de citar repetidas vezes, não perde por isso todo o merecimento que tem em relação á sua administração, adoptou agora systema invariavel de extinguir, de abolir, de diminuir, como tem diminuido, na importante somma de muitos milhões de libras sterlinas, a sua divida fundada.

Mas não preciso ajuntar ás demonstrações, que já foram feitas pelos meus honrados amigos deputados da opposição, senão a demonstração que nos dá o ultimo anno das contas do thesouro.

1874-1875

Receita:

Calculada Realisada

Impostos directos____ 6.030:000$000 6.187:000$000

Impostos indirectos... 11.208:000$000 12.639:000$000

Sêllo e registo...... 1.932:000$000 2.110:000$000

Próprios nacionaes e

rendimentos diversos 2.384:000$000 2.071:000$000 Reposições.......... 194:000$000

Somma......... 21.554:000$000 23.201:000$000

Deficit............. 1.267:000$000 6.188:000$000

22.821:000$000 29.389:000$000

Despeza ordinaria:

Divida publica...... 10.128:000$000 10.135:000$000

Ministerio?.......... 11.355:000$000 13.299:000$000

Somma......... 21.483:000$000 23.654:000$000

Despeza extraordinaria 1.338:000$000 5.735:000$000

22.821:000$000 29 389:000$000

(Interrupção.)

Gosto muito das interrupções, e muito estimaria que a camara me interrompesse toda ao mesmo tempo. (Riso.) Mas pergunto: para que é que serve á camara dos deputados receber aqui documentos, negando-se depois a sua authenticidade, e pondo-se em duvida ás consequencias que d'elles se tiram?!

(Interrupção.)

Sei perfeitamente que se fizeram caminhos de ferro; mas isso quer dizer, que se venderam obrigações para se fazer esses caminhos, e que essas obrigações hão de ser depois amortisadas...

(Interrupção do sr. Carrilho que se não percebeu.)

Certamente que se faz em todos os paizes, mas isso não destroe o argumento de que o deficit real e de 6.188:000$000 réis. (Apoiados.) Isto não se póde destruir.

Mas os illustres deputados estão a querer forçar-me a que diga mais do que na realidade desejo dizer.

O sr. Mariano de Carvalho já demonstrou n'outro dia quanto excederam nos calculos as despezas ordinarias, e como o governo chama extraordinarias ás despezas de cada dia; e eu tenho aqui a mesma demonstração de que s. ex.ª se serviu.

As despezas ordinarias lêem crescido sempre que está na gerencia dos negocios publicos o actual gabinete, e diminuido sempre que, por uma circumstancia talvez infeliz para este paiz, outros ministros se acham n'estes logares. (Apontando para as cadeiras do governo.)

Por exemplo, nós vemos que em 1865 a 1867, sendo ministro o sr. Fontes, subiu a despeza ordinaria em réis 3.010:000$000; porém quando foram ministros os srs. Braamcamp, Carlos Bento, conde de Samodães e outros cavalheiros, teve uma diminuição de 1.354:000$000 réis.

Não digo que a economia seja regra a que unicamente deve recorrer o governo, não se trata unicamente de fazer economias, e algumas d'ellas phantasticas.

No que não ha, porém, duvida alguma é que é possivel nas circumstancias difficeis fazerem-se economias. E, se eu considero que nas circumstancias faceis, quando não queiram fazer economias, pelo menos não têem necessidade alguma de exagerar as despezas como o actual ministerio tem feito. (Apoiados.) E a prova é que ha tres annos que s. ex.ªs succederam nos negocios publicos tem a despeza ordinaria augmentado 2.592:000$000 réis! E não sei em quanto virá ella a augmentar se s. ex.ª continuarem, para felicidade d'este paiz, á testa dos negocios publicos. (Apoiados do lado da maioria.) Apoiadissimo, digo eu, e creiam os illustres deputados que não me incommoda nada que os srs. minis

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tros actuaes ali estejam. Eu gosto de ser opposição, mas o que desejava principalmente muito era que os srs. ministros, que ali estão sentados, me contrariassem unicamente a mim, sem contrariarem os interesses do paiz, porque isso me tirava das difficuldades e do trabalho que tenho de vir aqui propugnar pelos interesses publicos, por obrigação que tenho de os defender. (Apoiados.) Eu não estou aqui para fazer a corte a nenhum governo, nem nunca o estive. (Apoiados.) Todos sabem perfeitamente que votei contra o sr. duque de Loulé, e que votei contra os ministros do meu partido com o mesmo desprendimento com que voto contra os ministros actuaes. (Apoiados.)

Assim como votei a favor ou contra os ministros meus amigos politicos, do mesmo modo voto a favor ou contra este gabinete quando assim o entendo na minha opinião.

Se me dão licença direi, que tenho a intima e profunda convicção de que é necessario tomar a ferio as nossas funcções. E a nossa obrigação essencial, a do parlamento, a da camara popular, é fiscalisar as despezas publicas. (Apoiados.) E votar com parcimonia os sacrificios á nação (apoiados), os quaes sacrificios não devem ser votados senão quando uma nececessidade instante, e de todo o ponto justificada o reclame. (Apoiados.)

Se essas circumstancias existem proponha o governo as leis, e não venha dizer, como tem dito, com grande inexactidão, no discurso de Sua Magestade, na abertura de quasi todas as sessões legislativas, que o governo não precisa recorrer ao imposto. E porque é que não precisa? Não precisa, porque deixa aos seus successores, porque deixa para a responsabilidade nacional do povo portuguez remir a facil popularidade que o governo conquista com duas linhas aliás pouco proprias do augusto chefe do estado.

O meu illustre amigo, o sr. Braamcamp, e todos os cavalheiros da opposição que se lhe seguiram, e creio que eu mesmo alguma cousa contribui para isso, demonstraram que o arbitrio e a illegalidade estavam na ordem do dia (apoiados); que as despezas publicas não podiam de maneira alguma ser sujeitas nem á Fiscalisação, nem limitadas, porque o actual gabinete, e mesmo um áparte que ha pouco se fez o justifica, porque o actual ministerio adoptou por norma, e diviza gastar muito. (Apoiados.)

E bom gastar muito, mas é necessario ter para gastar. (Apoiados.)

Não basta dizermos — os nossos principios, a nossa politica, a nossa bandeira é gastar, é fazer caminhos de ferro por toda a parte, no paiz e fóra d'elle, navios couraçados, peças de artilheria, tudo emfim; fazer como a Turquia tem feito, que na occasião em que em Londres se perguntava quantos dividendos mais poderia a Turquia pagar? Respondia — mandando encommendar dois couraçados e oitenta peças de artilheria!

E lá tem as consequencias!

Ha nações que têem antecipadamente marcado o itinerario que as ha de levar á sua inevitavel ruina, e eu não desejava que entrássemos n'esse caminho.

Temos cem peças de artilheria, precisâmos de muitas mais, porque para a nossa força, cem é nada, precisâmos duzentas. Fortificar Lisboa hoje com as peças de alcance modernas, entende-se fortificar desde Setubal até Peniche, pelo menos, até ás linhas de Torres Vedras, e para j isto é necessario organisar o pessoal correspondente, um j exercito importante, porque as peças não dão fogo por si, precisam de artilheiros.

E não supponham os illustres deputados que não desejo que estejamos bem armados, para que ninguem possa pensar em fazer-nos a menor offensa. (Apoiados.)

Portanto vejamos bem para onde é que caminhamos; e se por acaso temos necessidade de nos collocar n'essas condições bellicosas, tratemos d'isso, mas dizendo tambem quanto é necessario pagar. (Apoiados.)

A questão não está unicamente em vir aqui apresentar-se um orçamento artificial, e depois, á sombra d'esse orçamento, adormecer o espirito publico, e dizer-lhe — não é preciso pagar mais nada, temos peças, couraçado, fortalezas blindadas, emfim, os torpedos que pediu o meu illustre collega e amigo, o sr. Osorio de Vasconcellos; podemos indefinidamente absorver na dotação da divida fundada todos os recursos nacionaes. Isto não é possivel, porque as faculdades tributarias do povo portuguez têem certo limite, e é necessario estudar e ver bem até onde esse limite póde auctorisar o descuido do poder executivo e da representação nacional, sem a cumplicidade da qual de certo que o poder executivo não se abalançaria a estes ousados e gloriosos commettimentos.

Mas demonstrado, como está, que ácerca das despezas continuámos como d'antes, vamos a saber o que ha ácerca das receitas.

Não sei a que regra se soccorre o governo para formular o orçamento da receita.

A respeito do orçamento da despeza sei eu; o governo gasta e não se importa, mas a respeito do orçamento da receita, de certo que não sei. Umas vezes nos impostos indirectos o governo calcula pela media dos tres ultimos annos, outras vezes despreza o orçamento dos tres ultimos annos, sendo as circumstancias as mesmas, e adopta por exemplo o ultimo anno, ou o segundo, ou o primeiro, ou o que bem lhe parece.

(Interrupção.)

Peço perdão; mas isso dá em resultado que na alfandega municipal de Lisboa, onde se demonstra que houve uma receita extraordinaria de 200:000$000 réis no ultimo anno, proveniente da importação de cereaes, o que é uma calamidade, deve essa desgraça tornar-se permanente, e se espera que ella continue! O governo calculou era 1:523:000$000 réis a receita da alfandega municipal; mas sendo o rendimento dos ultimos tres annos a regra que se deve adoptar, importam elles em 4.016:000$000 réis. O termo medio é 1.338:000$000 réis; parece-me que se não deve calcular em mais; mas sendo a proposta 1.523:000$000 réis, augmentou-se 185:000$000 réis na receita da alfandega municipal.

(Interrupção.)

Acho muito mau calculo, e muito maus os regulamentos que serviram de base á elaboração do orçamento, que auctorisam que ha de ser proveniente o crescimento das receitas do estado de factos, que em toda a parte affectam a fortuna particular, as calamidades publicas.

(Interrupção do sr. Carrilho.)

Isso serve só para habilitar o thesouro a fazer um deficit mais viável atravez da representação nacional!

Temos em seguida os direitos sanitários, nos quaes tambem não vejo rasão para se considerar de augmento permanente, e se formos a calcular o rendimento dos ultimos tres annos, ha um augmento de 3:400$000 réis a mais.

Tambem se não póde dizer que o rendimento dos emolumentos das alfandegas está definido, e ha de continuar no progresso que tem tido; e o augmento é de mais de 6:000$000 réis.

A respeito do caminho de ferro do sul, a proposta do governo calcula em 400:000$000 réis; mas ainda mesmo calculando no augmento de kilometros que estão a mais em exploração, rasão nenhuma ha para habilitar o governo a propôr 400:000$000 réis, quando o maximo que elle poderia propôr era 385:000$000 réis.

O imposto especial do vinho pela barra do Porto, tambem tem um augmento de mais de 14:000$000 réis; e aqui é extraordinario que d'esta vez se quizesse fazer uma excepção á regra geral, porque na confecção do orçamento do estado nem sempre se adoptou o rendimento dos ultimos annos.

O sr. Carrilho: — Está enganado.

O Orador: — Se estou enganado, o illustre deputado póde pedir a palavra e demonstrar isso.

Os direitos do importação, a proposta apresentada par-

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ticipa do mesmo defeito que participa o imposto municipal, e eu calculo que por muito que a receita das alfandegas cresça, ella não póde de maneira nenhuma habilitar o governo a suppor que esse rendimento se elevara a réis 6.030:000$000. Desejo muito que seja até de 7.000:000$000 ou 8.000:000$000 réis; mas o facto é que os tres ultimos annos produziram, comprehendendo os cereaes,17.068:000$000 réis.

O termo medio é..................... 5.689:000$000

A proposta calcula................... 6.030:000$000

A mais............................. 341:000$000

Nas ilhas tambem o augmento é do 10:000$000 réis, desejo muito que seja até de 6.000.000$000, 7.000:000$000 ou 8.000:000$000 réis; mas o facto é que não precisâmos de estar calculando exageradamente as receitas publicas para illudir a credulidade do paiz, e por outro lado estar lançando no sorvedouro da divida fluctuante as quantias de que o governo carece para occorrer ás despezas do estado.

Acho que é melhor ter excesso de receita do que excesso de despeza.

Por esse lado admiro muito a coragem fria com que os ministros da fazenda querem assumir e tomar sobre si uma responsabilidade de tal magnitude.

O real de agua, que fui assumpto de considerações, aliás muito fundadas, do sr. Luciano de Castro, vem calculado em 774:000$000 réis. Estou convencido de que deve produzir mais pelos meios que o sr. ministro da fazenda nos disse que tencionava empregar, isto é, promovendo a cobrança do imposto de modo que as resistencias sejam as menores possiveis.

Parece entretanto que. é exagerar demasiadamente a possibilidade d'esta receita elevando-a no continente a mais de 700:000$000 réis. Este calculo é resultado de esclarecimentos que pude colher, particularmente no tempo em que ía ás secretarias tratar de negocios publicos com os differentes ministros, e especialmente pedir ao sr. ministro da fazenda providencias ácerca da aggressão e vexame de que usava no districto de Faro, obrigando os almocreves de Monchique e Lagos a tirar guias, a fim de poderem transitar os seus vinhos.

Eu sei que o sr. ministro da fazenda mandou as mais instantes recommendações para que tal vexame se não fizesse; porém, o facto é que os pobres almocreves foram de tal maneira acossados e perseguidos pelos agentes fiscaes, que os proprietarios que vendiam vinhos nas suas adegas acharam-se nas circumstancias de não ter almocreves que quizessem compra-los sem que lhes dessem guias dos generos que levavam; aliás soffriam apprehensões, que comtudo eram depois reparadas pela interferencia do poder judicial, porque felizmente n'este paiz o poder judicial ainda é independente e tem meios de pôr limites ás demazias dos agentes do fisco.

E certo, porém, que esse vexame tem continuado, porque no districto de Faro ha uma legislação especial porque se regula, que é unicamente o arbitrio e nada mais. E como no ministerio da fazenda se calcula unicamente pelos resultados da receita sem curar dos gravames de quem paga, e parece que este vexame tem sido productivo para os interesses do thesouro, creio até que o delegado do thesouro foi galardoado e honrado por uma portaria, e não sei se se lhe destina no futuro recompensa publica votada pela representação nacional.

Eu estimarei muito que o sr. ministro da fazenda, com as theorias de quem concordo ácerca da necessidade de regularisar por lei o que é hoje unicamente devido ao arbitrio moderador de s. ex.ª e dos empregados superiores do seu ministerio, determine, em harmonia com as disposições votadas pelo parlamento, quaes são e quaes não são as obrigações e deveres dos differentes contribuintes em todas as partes da monarchia, para não estarmos a applicar disposições excepcionaes e contradictorias, variando de um districto para outro, e muitas vezes de comarca para comarca dentro do mesmo districto.

O rendimento do imposto do pescado vem calculado em 112:000$000 réis approximadamente,.e tambem me parece que ha exageração, porque esse imposto nada nos indica que deva crescer.

A mesma cousa se segue em relação ao rendimento do tabaco. Tambem me parece que o rendimento do tabaco se acha muito exageradamente calculado, e que este rendimento não deve ser avaliado em mais de 2.300:000$000 réis.

Esta teima que tenho invariavelmente seguido de considerar como a mais importante de todas as questões, a de regularisar o nosso systema de contabilidade publica e de tornar accessivel a todos as regras por que o governo proceda em relação ao patrimonio nacional, leva-me ás seguintes conclusões.

A votação do orçamento, conforme disse o sr. José Luciano de Castro, pelo systema actual, é a mais inutil de todas as funcções do parlamento; e, se não, veja o illustre ministro da fazenda como é que defende uma verba que vem descripta nos proprios nacionaes e rendimentos diversos, na importancia de 385:000$000 réis, receita creada por lei, que é aquella que auctorisou o governo a contratar com os bancos um emprestimo para pagar ás classes inactivas.

Se ha n'este mundo emprestimo claro, com juro e amortisação, feito por um individuo com outro individuo, é certamente este.

Para vermos isso, não precisámos mais do que recorrer á nota que illustra o orçamento da despeza.

O que vemos nós n'esse orçamento? Vemos que o estado recebe todos os annos dos bancos, para pagar ás classes inactivas, umas certas sommas, que essas sommas montam já a quatro mil e tantos contos, e que hão de ser embolsadas pelas prestações que o estado continuará a pagar depois que a mortalidade tenha extincto a origem da despeza a que esse emprestimo é destinado.

Pois ha emprestimo com juro e amortisação mais claro e definido do que este?

Como é que o sr. ministro da fazenda apresenta isto como sendo um rendimento? D'onde lhe vem similhante rendimento?

Eu pedia que me dissessem, para definir bem o que tenho aprendido, o que me têem ensinado e tenho visto praticar em toda a parte, se acaso sou eu ou o governo que tem idéas falsas a este respeito.

Se isto não é rendimento, para que vem o governo diminuir 385:000$000 réis nos encargos, para os quaes tem de recorrer ao credito? Como é que esta somma vem figurar nos rendimentos diversos na receita, e na despeza como augmento de divida contrahida com os bancos?

Na realidade não sei se ainda no meu tempo, ou durante o tempo em que tenha logar n'esta casa, conseguirei que este documento venha formulado com a seriedade que é requerida, não só pela representação nacional, mas pelo proprio governo.

Eu devo dizer uma cousa: o systema parlamentar, da maneira como se está cumprindo entre nós, é uma perfeita illusão, é uma mentira: nós estamos aqui a representar uma comedia diante do paiz; tudo isto é artificial e convencional, e não póde continuar assim.

V. ex.ª julga que lá fôra alguem acredita na seriedade do parlamento?

Não acredita. Se acreditasse, não digo isto com intenção de offender ninguem, porque se se acreditasse não se teria feito n'este paiz o que se fez com relação ás ultimas eleições geraes, que tres ou quatro mezes antes d'ellas se realisarem se publicava, n'uma folha affecta ao governo, a lista dos deputados que haviam de ser eleitos. E vieram invariavelmente á camara.

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V. ex.ª bem viu que o paiz acceitou a publicação que se fez do quaes deviam ser os deputados, que sairiam eleitos tres ou quatro mezes depois. Vieram todos.

Já se vê que se a opinião publica tomasse a serio a representação nacional não fazia caso d'aquella publicação. Não digo que o governo não trouxesse aqui grande maioria; podia traze-la.

O governo n'aquella epocha, emfim, era bafejado com uma certa popularidade, mantinha a paz, as receitas publicas elevavam-se, os fundos subiam, a rua dos Capellistas estava contente; portanto podia trazer maioria; mas, repito, inalteravelmente vieram todos os deputados que tinham sido indigitados. Parecia-me que estava n'um consistorio em que o summo pontífice tinha preconisado quem haviam de ser os futuros cardeaes.

Isto não é bom para ninguem, nem para o governo, porque ao governo não lhe convem, nem os ministros podem estar contentes vivendo uma vida publica artificial, nem para a opposição, nem para o paiz, e muito menos para as instituições liberaes, porque, ou se hão de firmar n'uma base real, e se hão de firmar na respeitabilidade dos dois corpos que as representam nas duas casas do parlamento e no poder moderador, isto é, no chefe do poder executivo, ou então ha de vir o remedio, venha elle d'onde vier.

Hoje V. ex.ª sabe muito bem, e a camara sabe, e o governo tambem sabe, que ha um descontentamento geral, um mal estar que precede quasi sempre, e que tem precedido em toda a parte, as grandes crises politicas.

O governo pessoalmente, pelas suas pessoas, é bemquisto; os ministros distinguem-se pessoalmente pela sua bondade; mas essa grande bondade, direi eu, é que tambem se tem exagerado um pouco, e se elles fossem um pouco mais severos e menos condescendentes com os seus proprios amigos, esteios mais fortes da situação a que presidem, creio que melhor serviço fariam á causa nacional. E eu que sou um pouco propenso, porque tenho vivido ha muitos annos no parlamento e assistido a situações exageradas, a opposições violentas, declaro a V. ex.ª que me não acho bem commigo era que se possa suspeitar de que não emprego todos os meios para fazer ao actual governo a opposição mais decidida e energica com as poucas faculdades de que disponho.

E com isto peço desculpa á camara do tempo que lhe roubei.

Vozes: — Muito bem.

O sr. Ministro da Fazenda: — Estamos ás portas do abysmo! Caminhámos para uma ruina completa! Nada nos póde já salvar senão a revolução!

Estas idéas felizmente não são geraes (apoiados), e parece-me mesmo que o numero das pessoas que as professam é muito limitado. Eu vejo, apesar d'este abysmo, da ruina completa das nossas finanças, apontada pelo illustre deputado, que o credito do estado cada vez se confirma e consolida mais.

Parece que estão todos cegos, e só os illustres deputados é que vêem a ruina para onde nós vamos.

O illustre deputado, em cuja sinceridade muito acredito, por mais de uma vez e durante a gerencia de differentes ministerios diz que tem feito todos os seus esforços para crear recursos, a fim de estabelecer a igualdade entre a receita e a despeza.

Isto é muito louvavel.

Porém eu entendo que não convem n'este momento trazer á camara nenhuma proposta de augmento de impostos; porque estou convencido, e cada dia a experiencia m'o confirma, de que os impostos que nós temos, bem administrados hão de dar muito mais do que a creação de novos impostos.

Que vemos nós durante os ultimos quatro annos? Vemos 1.300:000$000, 1.400:000$000 e 1.600:000$000 réis de excesso de receita de anno para anno.

Já se vê que obtemos assim uma somma igual á que

poderia produzir um novo imposto, e isto sem vexames para os contribuintes, e as resistencias e perturbações economicas que trazem sempre comsigo as novas imposições.

Mas diz o illustre deputado que 03 orçamentos são uma illusão completa; mas se são illusão, é ella cada vez menor, porque o deficit marcado no orçamento, e sobretudo o deficit das contas, é cada vez menor; cada vez a receita e a despeza se vão approximando mais.

Disse mais o illustre deputado que no ultimo anno tivemos de receita 24.000:000$000 réis e de despeza réis 29.000:000$000, havendo uma differença de perto de réis 6.000:000$000; mas aqui estão as contas e ninguem dirá que o deficit foi de 6.000:000$000 réis; o deficit foi, quando muito, de 2.000:000$000 réis.

Ha alguns annos é que elle era de 6.000:000$000 ou 7.000:000$000 réis, mas agora é de 2.000:000$000 réis; e se ámanhã o governo quizer póde equilibrar a receita com a despeza completamente, porque o illustre deputado sabe, bem como toda a camara, que as receitas ordinarias no ultimo anno já chegaram para todas as despezas ordinarias e ainda para as chamadas extraordinarias do orçamento; e se houve deficit foi por causa das despezas verdadeiramente extraordinarias a que houve necessidade de occorrer.

A questão é saber se se deviam fazer estas despezas extraordinarias; na nossa opinião entendemos que sim, mas na opinião do illustre deputado ellas não deviam ter sido feitas, e se não se fizessem, tinhamos chegado ao completo equilibrio das receitas e despezas publicas. Estas despezas extraordinarias foram principalmente a compra de armamento e outro material de guerra e obras de viação publica.

Mas esta idéa não é só nossa, e o illustre deputado que nos cita tantas vezes os paizes estrangeiros, e que ainda n'uma das sessões passadas nos citou a Italia, deve saber que n'aquelle paiz ha um grande deficit, e que elle poderia ter acabado, ou, pelo menos, ter-se reduzido muito, se os distinctos estadistas que ali gerem os negocios publicos não entendessem que, apesar do deficit, deviam despender grandes sommas em caminhos de ferro e outros melhoramento?.

Ali ha um deficit immenso, mas acontece que o deficit vae cada vez diminuindo, e os seus economistas e os seus estadistas dizem que com os melhoramentos que todos os dias vão dando á agricultura e ao commercio esperam, dentro de pouco tempo, ver equiparada a receita com a despeza.

Ha pouco tempo o nosso desequilibrio do orçamento era de 6.000:000$000 réis, e isto na occasião em que se não compravam armamentos para o exercito, nem navios para a marinha, nem se construíam caminhos de ferro, nem nenhuns outros melhoramentos, e hoje está o deficit reduzido a 2.000:000$000 réis, apesar das despezas extraordinarias com estes importantes melhoramentos.

Só a compra dos armamentos importou em mais de réis 1.000:000$000, e isto alem das despezas extraordinarias que se tem feito em estradas, despezas que nós entendemos que são uteis para o paiz. (Apoiados.)

E só esta, e não as despezas ordinarias, a causa do deficit no ultimo anno.

Mas em todo o caso a situação não me parece má, porque o deficit vae diminuindo successivamente todos os annos e podia acabar ámanhã, e póde acabar hoje, logo que cessem apenas algumas das despezas extraordinarias, porque as receitas ordinarias chegam para as despezas effectivas em todos os serviços publicos descriptos no orçamento.

Mas disse o illustre deputado «quando estes ministros estão no poder as despezas crescem sempre, e não acontece o mesmo quando estão os outros».

Eu vou provar ao illustre deputado o contrario, comparando o periodo de 1860 a 1865 com o de 1871 até

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hoje. Desde o anno de 1860-1861 até o de 1864-1865, a receita ordinaria cresceu effectivamente 4.700:000$000 réis, graças, em grande parte, ás leis de fazenda da iniciativa do sr. Casal Ribeiro.

Mas as despezas ordinarias subiram infelizmente quasi na mesma proporção, subiram cerca de 4.000:000$000 réis. Durante a gerencia do actual governo, depois do terminado o anno economico do 1870-1871, o producto dos impostos tem augmentado 5.500:000$000 réis, mas a despeza ordinaria não augmentou nem metade, muito menos de metade d'esta somma. Isto consta de documentos publicos das contas do thesouro sobre a despeza effectiva em cada gerencia. Não eram os actuaes ministros os que governaram n'aquella epocha.

O sr. Barros e Cunha: — Apoiado, aceito tudo.

O Orador: — O illustre deputado acceita, porque é justo nas suas apreciações; mas foi menos justo quando disse que as despezas cresciam quando estes ministros estavam no poder, e quando estavam outros não cresciam. N’esta parte é que não foi completamente exacto.

(Interrupção do sr. José Luciano, que não se ouviu.)

Diz o illustre deputado que foi para pagar as despezas, que nós deixámos com os caminhos de ferro que cresceu a despeza de 1860 a 1865. As desposas com os caminhos de ferro não entram n'essa conta porque foram feitas por emprestimo extrordinario. Fallo sómente das despezas ordinarias.

No periodo de 1860 a 1865, graças ás reformas financeiras dos seus antecessores em grande parte, cresceu a receita ordinaria, é verdade, mas subiu a despeza ordinaria quasi na mesma proporção. Agora subiram muito mais, felizmente, as receitas, e as despezas apenas subiram menos de metade do augmento das receitas, e proximente metade do que subiram n'aquella epocha.

O illustre deputado notou que o calculo do orçamento da receita não era completamente exacto, e citou algumas verbas.

Devo dizer ao illustre deputado, que o regulamento geral da contabilidade determina que as receitas se calculem pelo termo medio dos tres ultimos annos ou pelo ultimo anno, o que ordinariamente se faz quando os rendimentos annuaes parecem attestar uma fórma de progressão crescente ou decrescente.

Ora se eu quizesse calcular como se calculava n'outras epochas, n'essas epochas que se nos citam como modelo, podia augmentar este orçamento em mais de 2.000.000$000 réis de receita.

Vou dizer ao illustre deputado como é que se calculava na epocha a que me refiro. Tratava-se, por exemplo, de uma verba de 2.000:000$000 réis.

Nos ultimos tres annos o augmento da receita de anno para anno tinha sido de 200:000$000 réis; este orçamento é para dois annos depois do ultimo exercicio; no ultimo anno a verba era de 2.000:0000$000 réis, logo d'aqui a dois annos temos a acrescentar os 200:000$000 réis d'este anno e 03 do outro anno, e augmentava-se aquella verba com 400:000$000 réis. Isto está n'um orçamento, mas não é nos orçamentos que eu tenho apresentado a esta camara.

O sr. Mariano de Carvalho: — Foi no orçamento do sr. conde de Valbom.

O Orador: — Foi n'um orçamento qualquer. Se eu quizesse seguir o mesmo principio, só os direitos da alfandega davam-me 1.000:000$000 réis, porque estes têem subido 500:000$000 réis em termo medio nos ultimos annos, e juntando duas vezes esta quantia, aqui estava aquella verba com 1.000:000$000. Fazendo isto em duas ou tres verbas mais, augmentava o orçamento da receita com 2.000:000$000 réis.

Este orçamento póde ser accusado de muitas imperfeições, mas não póde ser accusado de que a receita seja calculada com exageração; e a prova é que hoje, sete meses

depois de acabado o anno economico, quando se fizeram estes calculos, já as receitas excedem todas quantas sommas o illustre deputado apresentou como avaliações exageradas.

E bom que o orçamento seja o mais approximado da verdade, mas creio que o orçamento assim é muito mais proximo da verdade do que se se fizessem as restricções que apresentou o illustre deputado.

Eu acho que nós devemos continuar a seguir o habito de calcularmos sempre pelo seguro, e as receitas effectuadas hão do augmentar consideravelmente, como felizmente têem augmentado nos ultimos annos sobre as previsões do orçamento.

Emquanto á ultima observação que fez o illustre deputado a respeito da receita proveniente dos contratos feitos com os bancos e companhias, peço licença para dizer que o orçamento não podia deixar de descrever aquella receita, porque é uma receita certa, o que póde fazer-se é incluir essa receita em outro capitulo, mas o resultado é o mesmo, e em nada altera o deficit. A questão é estar n'este capitulo com o titulo de rendimento, ou estar em outro capitulo.

Se o illustre deputado quer, cria-se um novo capitulo, e ficámos todos satisfeitos, o o orçamento fica na mesma, e o deficit como está.

Este documento parece-me estar redigido como costumam estar todos os documentos d'esta natureza, e não creio que se afaste muito da verdade provavel, e se se afastar é para menos, do que será a realidade, como tem acontecido nos ultimos annos.

Não me julgo obrigado a seguir o illustre deputado em todas as considerações que não dizem respeito immediato ao assumpto de que se trata.

Quanto, porém, ao que o illustre deputado disse com respeito ao delegado do thesouro de Faro, tenho a dizer que não conheço pessoalmente aquelle empregado, mas as informações que tenho a seu respeito, e o que me consta pelo desempenho do seu serviço, é que é um empregado muito zeloso e muito probo.

O sr. Barros e Cunha: — De accordo.

O Orador: — Aproveito a occasião para mandar para a mesa uma proposta de lei.

A proposta é a seguinte.

Proposta do lei n.º 39- A

Senhores. — O estado de salubridade na capital está reclamando a mais seria attenção dos poderes publicos. Ás considerações de humanidade juntam-se as da economia publica para aconselhar as resoluções que tendam a diminuir a mortalidade e o enfraquecimento da população dentro da cidade de Lisboa, que a outros respeitos parece caminhar para o seu engrandecimento. A opinião dos homens de sciencia e o exemplo de outras grandes cidades estão indicando como causa principal das más condições de salubridade publica em Lisboa a falta de um systema de canalisação geral subterrânea, que remova as causas de infecção que resultam da imperfeita e incompleta canalisação actual, cuja má disposição em alguns casos augmenta em vez de diminuir os motivos de insalubridade.

Tendo a camara municipal de Lisboa reconhecido a indeclinavel necessidade do attender a estas considerações, e não podendo pela insufficiencia dos seus recursos ordinarios occorrer ao custeamento das obras importantes que a sua solicitude pelos interesses do municipio julga de maxima conveniencia, tem o governo a honra de submetter ao vosso esclarecido exame a seguinte proposta de lei:

Artigo 1.º E auctorisada a camara municipal de Lisboa a contratar, nas melhores condições offerecidas em publica licitação, as obras indispensaveis para o completo esgoto e limpeza da cidade por meio de um systema de canalisação geral subterrânea, o de um cano collector, e a levantar por

Sessão de 3 de março

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DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

meio de emprestimo, amortisavel dentro do praso de cincoenta annos, as sommas necessarias para esse fim.

Art. 2.º Quando os proprietarios não fizerem nos seus predios os reparos e melhoramentos indispensaveis, ordenados pela camara municipal, com o fim de pôr em boas condições a canalisação parcial em harmonia com o systema da canalisação geral, poderá a camara proceder a taes obras, sendo os seus creditos privilegiados e equiparados aos mencionados no numero 1.º do artigo 887.° do codigo civil.

Art. 3.° Para habilitar a camara municipal de Lisboa a satisfazer os encargos do emprestimo auctorisado pelo artigo 1.° pagará o governo á mesma camara uma prestação de 50:000$000 réis no primeiro anno, a contar da data da negociação definitiva do mesmo emprestimo, de réis 100:000$000 no segundo, de 150:000$000 réis no terceiro e de 200:000$000 réis nos seguintes até á completa amortisação, dentro do praso fixado no artigo 1.°

Art. 4.° Na proposta de lei da receita do estado proporá o governo annualmente a creação da receita indispensavel para occorrer pontualmente ao pagamento determinado no artigo precedente.

§ 1.° Para satisfazer o pagamento no primeiro anno é o governo auctorisado a cobrar o imposto addicional de 3 por cento sobre os rendimentos da alfandega de consumo de Lisboa.

§ 2.° Este imposto addicional só poderá ser cobrado desde a data da negociação definitiva do emprestimo auctorisado no artigo 1.°, e depois de adjudicada a construcção das obras a que é destinado.

§ 3.° Quando a cobrança da receita creada em virtude d'esta lei for inferior em qualquer anno á prestação que o governo tiver de pagar á camara municipal, sairá o resto da mesma prestação dos rendimentos geraes do estado, e este resto, ou o excesso, quando o houver, serão levados em conta na creação da receita nos annos seguintes.

Art. 5.° Fica revogada a legislação em contrario.

Ministerio dos negocios da fazenda, gabinete do ministro, em 3 de março de 1876. = Antonio de Serpa Pimentel.

O sr. Mariano de Carvalho: —... (O sr. deputado não restituiu o seu discurso a tempo de ser publicado n'este logar.)

Leu-se na mesa a seguinte

Proposta

Proponho que se eliminem do orçamento da receita as seguintes verbas:

Compensação dos direitos do tabaco nas ilhas. 31:300$000 Dividendo das acções da companhia dos canaes da Azambuja...................1:192$000

Contribuição da provincia de Macau....... 32:000$000

Prestação da misericordia de Lisboa para a

cadeia da capital..................... 2:400$000

Contribuição das provincias ultramarinas para

o emprestimo de 1.750:000$000 réis..... 140:000$000

206:892$000

Mariano de Carvalho.

O sr. Presidente: — Como não ha mais ninguem inscripto, vae votar-se a generalidade.

Foi approvada em seguida a lei da receita na sua generalidade.

O sr. Presidente: — A proposta do illustre deputado é remettida á commissão, para ser tomada em consideração.

A ordem do dia para ámanhã é a continuação da que vinha para hoje.

Está levantada a sessão. Eram quasi seis horas da tarde.

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