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DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

O sr. Mendes Leite foi companheiro inseparavel, amigo intimo e confidente particular do grande tribuno d'esta terra, do nosso mais eloquente orador, de José Estevão.

E bastava este só titulo para o recommendar á nossa consideração, se os seus dotes pessoaes o não fizessem estimavel e estimado tambem.

O sr. Mendes Leite não é novo na vida publica.

Desde 1872 até janeiro de 1877 foi governador civil de Aveiro, e os seus actos foram largamente apreciados n'esta casa.

É natural de Aveiro, onde tem residido largos annos, e não ha sido estranho ás intrigas politicas da localidade, antes pelo contrario pertence e está filiado n'um bando a cujas indicações obedece cegamente.

Nos quatro annos que foi governador civil lembrou-se pouco que era chefe do districto, para se lembrar muito que era soldado arregimentado de uma facção partidaria.

Quando o sr. Fontes adoeceu dos dentes (Riso.) foi o primeiro a pedir a sua demissão.

Veiu o sr. marquez d'Avila e nomeou para o substituir o sr. José de Beires, magistrado sisudo...

O sr. Ministro do Reino (Rodrigues Sampaio): — Apoiado.

O Orador: — Magistrado que se mostrou sempre estranho ás pequenas intrigas politicas da localidade, e tratou unicamente da administração, que tão descurada havia sido e ainda é n'aquelle districto.

Voltou novamente o sr. Sampaio para o governo, e o sr. Mendes Leite foi reconduzido.

O facto era significativo.

A reconducção era incitamento para o sr. Mendes Leite continuar no mesmo caminho que havia seguido; era approvação antecipada dos caprichos e extravagancias politicas, que elle se lembrasse de fazer, iguaes e similhantes ás que tinha feito durante quatro annos.

Á vista d'isto, de que nos serve a nós, deputados da opposição, fazer reclamações?

Que temos a esperar?

Nada, absolutamente nada.

O sr. José Luciano engana-se, se espera ser attendido, quando pede regularidade na administração do districto de Aveiro.

Deve-se lembrar de quem é o governador civil, e qual é o ministerio que está á frente dos negocios publicos. (Apoiados.)

Ha dias, quando n'esta casa se discutiu o imposto de consumo, um orador, cuja palavra tem prestigio e auctoridade, descreveu em traços energicos os grandes incommodos, os contrariados de toda a sorte, os arbitrariados tremendos a que está sujeito o eleitor que tem a veleidade de exercer livremente os seus direitos politicos.

O quadro era tão exacto que ninguem achou senões que lhe oppôr.

E de facto o que vemos nós em Portugal ha largos annos?

Um cidadão qualquer julga-se lesado nos seus direitos civis, appella com confiança para os tribunaes, está certo que os magistrados hão de proteger a sua pessoa, a sua honra e os seus haveres.

Se esse mesmo cidadão, ou outro qualquer, quer, porém exercer os seus direitos politicos contra as indicações da auctoridade, esta em logar de ser, como era de rasão, o seu dedicado e zeloso protector, bem pelo contrario é o seu mais decidido e encarniçado perseguidor.

Todos conhecem o facto, todos o confessam, ninguem o dissimula, ninguem o ignora.

Mas em logar de se congregarem todos para acabar este systema de hypocrisia, e vir, emfim, a verdade, deixam-se sem reforma as instituições más e viciosas que temos, que são a principal causa de tão grande calamidade, a qual se vae aggravando cada vez mais, sem que tratem de a extinguir aquelles que para isso tem a força e os recursos necessarios. (Apoiados.)

Já ouvi fallar n'esta casa, e com elogio, das candidaturas officiaes. A doutrina pareceu-me heterodoxa, e de ninguem recebeu applausos.

A mim tambem me desagradou, porque detesto os meios termos, e a theoria das candidaturas officiaes é apenas meia franqueza.

Eu quereria que se fosse mais longe. Se o governo actual não quer desistir do systema sophistico e capcioso em que tem andado, o melhor é dispensarem-se candidaturas e eleições.

Acabe-se com a urna, e de hoje para o futuro os deputados, os procuradores ás juntas e os vereadores municipaes sejam despachados pelo poder executivo como o são os funccionarios publicos.

Era um systema commodo. Tinha o merito da franqueza, virtude tão nossa, tão portugueza, e tão justamente apreciada pelos nossos maiores. Com elle lucrava o erario e a moralidade publica.

Acabava a comedia e começava a seriedade. E livres da sua principal tarefa, os agentes do governo podiam então tratar de uma bagatella, a que se chama administração.

Talvez o paiz aproveitasse mais.

Tenho dito.

Vozes: — Muito bem.

O sr. Ministro do Reino: — Realmente eu estou quasi convencido de que estou coacto. Estou quasi coacto pela amabilidade do illustre deputado que acabou de fallar; estou coacto pela honra que elle fez ao governador civil de Aveiro, meu velho e antigo amigo, homem a cujo lado tive a honra de estar n'esta camara em 1852 quando se discutiu o acto addicional, que propoz a abolição da pena de morte em crimes politicos, finalmente o companheiro de José Estevão, e em quem não tem encontrado os seus adversarios senão o defeito de ser fiel ao seu partido.

Para mira isto é uma virtude, comtanto que o amor partidario o não leve a abusar do seu logar, ou a infringir as leis; não o levando a isso o amor partidario, parece-me que é uma virtude.

Coagiu-me tambem o illustre deputado pela honra que me dispensou tratando-me com tanta affabilidade, e coagem-me tambem as leis que sou obrigado a cumprir.

Não me parece que a missão do governo seja sempre prevenir e evitar. Parece-me que muitas vezes a prevenção demasiada é tyrannia, e que no exercicio do direito eleitoral é violencia contra a liberdade d'esse direito.

Tambem não me parece que fizesse mal o governo em montar a machina administrativa. Parece-me que os meus adversarios não deixaram de o fazer, e ninguem os censurou por isso, porque era o dever d'elles; se o não fizessem, creio que procederiam muito mal, e não serviriam nem a causa publica nem a d'elles.

O sr. Pires de Lima: — Perdão; eu não fallei em machina administrativa, fallei em machina eleitoral.

O Orador: — Foi um equivoco meu, que já rectifico.

O illustre deputado fallou em machina eleitoral, não fallou em machina administrativa; mas eu creio que a machina eleitoral na sua opinião pouco diverge da machina administrativa. (Vozes: — Pois é isso.)

Os agentes são os mesmos.

O sr. Pires de Lima: — Isso é que eu lamento.

O Orador: — Pois por os agentes serem os mesmos, não fiz bem em montar a machina administrativa?

Eu não estou aqui para promover as candidaturas dos meus adversarios. (Apoiados.)

Não comprehendo essa missão.

Ponham-me fóra d'aqui, que eu não hei de vir depois, se poder vir, censural-os por isso.

Parece que querem inverter a ordem das cousas.

Isso não póde

Sessão de 7 março de 1878