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DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS
municipaes, em todos os orçamentos das juntas de parochia e em todos os orçamentos de irmandades e confrarias. Porque rasão não fazemos nós ao orçamento do estado aquillo que com tanto cuidado applicámos aos orçamentos municipaes?
Se o systema se não muda, póde o paiz mudar do ministros quantas vezes quizer; se o systema fica o mesmo, a administração não ha de produzir differença muito sensivel.
Portanto, a questão é saber se ha quem saiba, quem possa e quem queira, se ha quem se proponha a mudar o systema que nos leva directamente á ruina, e que nos approxima da bancarota.
Esta calamidade é que eu pretendo evitar, porque, se tiver de a soffrer, importa-me pouco soffrel-a com o nome do sr. Carlos Bento ou do sr. Antonio de Serpa. Para mim a questão não é dos nomes que assignam as diversas portarias e decretos; essa questão é insignificantíssima; o que me importa são os decretos, são os actos governativos. Em todos os que sou obrigado a ler, o que não leio, nem me importa, é o nome do ministro que os referendou. Não ha nome que torne boas disposições más, nem que por a assignar prejudique uma medida excellente.
E por isso que eu digo que nos cumpro apenas, como remedio unico, mudar de systema. Não faltam investe paiz homens; n'esta casa ha os primeiros e maiores talentos; e vejo-os tanto na opposição como na maioria. Não nos faltam competências para a execução; falta-nos talvez quem queira mudar o systema, e sem isso não vejo remedio possivel.
Logo que tivermos substituido o systema actual por outro mais legal e mais conveniente, teremos dado um grande passo. A questão não é de homens, é de idéas; o é em favor de idéas que eu me levanto. O meu desejo, todo o meu empenho seria que esta camara sé pronunciasse toda a favor da necessidade de se mudar, mais que de ministros, de systema de governar e de meios de governo.
Nós temos o tribunal de contas, que no nome corresponde perfeitamente ás instituições dos outros paizes. Não são os nomes que nos faltam.
Pelos nomes, nós temos todas as instituições legaes e necessarias, e talvez mais do que as necessarias; nominalmente temos tudo, mas de facto, quando se procura a realidade das cousas, pouco ou nada existe. Quando na organisação do tribunal de contas se procura a principal das suas attribuições, aquella por que se torna indispensavel a sua existencia em todos os governos constitucionaes, a disposição não se encontra, ou pelo menos o seu cumprimento falta completa e absolutamente.
Nós vemos a acção do tribunal de contas applicada a, insignificancias ridiculas, a julgar contas de irmandades e de confrarias, emquanto as contas dos ministerios, sempre em grande atrazo, ainda que sejam bem julgadas, não produz tal julgamento effeito algum, util ou apreciavel.
E ha emquanto a estas contas um caso phenomenal. O tribunal de contas, parecendo ter sido instituido para viveiro permanente de ministros, apresenta os mesmos homens juizes em causa propria, julgando as suas proprias contas e a sua propria gerencia. Isto não é serio.
Sr. presidente, eu resolvi e tomo apenas sobre mim a responsabilidade de similhante resolução, que emquanto este ou outro qualquer governo não quizer organisar a contabilidade da fazenda publica, de modo que a responsabilidade dos ministros possa tornar-se effectiva, e de fórma, que, a gerencia dos dinheiros publicos seja apreciavel ao primeiro momento, ou rapidamente; emquanto não podermos ler contas da gerencia, não com tres ou cinco annos de atrazo, mas sim com a, mesma brevidade com que tomos hoje as notas da divida fluctuante; e podemos tel-as, muito bem no fim de cada, mez; emquanto qualquer partido, este ou outro qualquer governo, não entrar no verdadeiro caminho, eu recuso não só o augmento do imposto, mas até o imposto antigo, o nego absolutamente todos os meios!.
E note v. ex.ª que eu não pretendo especular com esta recusa do meios a este ou a qualquer outro governo, procurando a falsa, popularidade de não votar augmentos de impostos e muito menos de não querer imposto algum. Contra taes idéas protesto ou protestam a intelligencia e ilustração que sou obrigado a reconhecer em mim mesmo, e protestam as minhas idéas ha longos annos expendidas n’esta casa.
Ao mesmo tempo que proclamo a necessidade de recusar o imposto antes do devidamente estabelecida a fiscalisação da sua applicação, logo que se estabeleça, proclamo a necessidade maxima, instante e urgentissima, de equilibrar o orçamento do estado, votando toda a receita necessaria para a despeza, que deve reduzir se ao indispensavel, mas que devo ser sempre coberta, pelos recursos ordinarios.
Mas eu penso, o um grande numero do pessoas com as quaes tenho relações são do mesmo parecer, que o aumento parcial e sempre insuficiente do imposto, longe de ser remedio, é o peior dos males. Muitos contribuintes recusam-se a este aggravamento de imposto, que não salda o deficit, porque a experiencia mostra que ao passo que se augmenta a receita, em 500:000$000 réis, augmentam-se as despezas em 1.200:000$000 ou 1.500.000$000 réis.
O augmento mais ou menos problemático da receita tem servido sempre como meio infallivel para levantar dinheiro a. credito e augmentar a despeza.
A verdade é esta.
Muitos contribuintes que não se recusariam a um sacrificio maior mas decisivo, que trouxesse o remedio completo, lêem toda e a mais justificada repugnancia no aggravamento dos encargos que, longe de trazerem a salvação do paiz, cada vez compromettem mais as nossas finanças. (Apoiados.) Essa repugnancia tambem eu a, experimento.
Portanto, não recuso o imposto em absoluto, mas recuso absolutamente todo o imposto, e nego todos os meios, emquanto não for reformada e fiscalisada a gerencia, que póde e deve ser sujeita ao maximo rigor.
Ao mesmo tempo que proclamo e reclamo os meios de fiscalisar a gerencia, e para esse caso affirmo instantemente a necessidade urgente e indispensavel de se equilibrar o orçamento; emquanto faço isto eu, em cujo animo não ha suspeita, que por fórma alguma possa ser desagradavel ou offensiva ao caracter dos membros do ministerio, o que vejo fazer?
Vejo, com grande admiração, que os que censuram, ha muito mais tempo do que eu, a má gerencia financeira do actual governo; os que propõem e reclamam inqueritos ás secretarias; os que procuram os elementos para a accusação criminal dos ministros da corôa; votam-lhes os meios, e n'este augmento de imposto, se recusam a elevação da percentagem a, 20 por cento, offerecem e até propõem o augmento de 10. Isto é realmente incomprehensivel.
Pois a quem assim administra e gere a fazenda publica, de que lhe serve o augmento da percentagem em 10 ou 20 por cento?
Vae por acaso o governo actual dar ao augmento de 10 por cento melhor ou mais legitima applicação, do que tem dado aos impostos antigos e á receita anterior?
Não é evidente e da primeira intuição que quanto mais se, augmentam os meios, sem se regularem as condições de fiscalisação da, sua gerencia, a um governo que tem dissipado ou applicado mal os rendimentos do paiz, maior arma se lhe fornece para fazer n'um campo mais largo o mesmo que tem 'feito n'um campo mais restricto?
Declaro a v. ex. A que a logica desappareceu, ou sobre esta casa paira um mysterio que a minha ignorancia ou a minha innocencia me não permittem decifrar.
Em todo o caso a atmosphera é a mesma, ou muito pa-
Sessão de 21 de fevereiro de 1879