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SESSÃO N.º 38 DE 17 DE MARÇO DE 1902 13

Causas extraordinarias, a causas passageiras, passadas as quaes se voltaria á nossa vida normal. Não devido a causas politicas, pois não soffremos luctas nem tivemos guerras que o justificassem. Tambem não gastamos com o fomento nacional e meios de communicação, no que diz respeito a obras publicas, quantias bastantes que nos desculpassem a existencia d'este enorme deficit. A existencia d'elle explica se apenas pelos processos administrativos seguidos até hoje por todos os Governos. Esta é que é a verdade nua, que não pode sequer pôr-se em duvida, por quanto vemos que nos ultimos 50 annos, de todo o augmento da nossa divida apenas se empregou no desenvolvimento da economia do país 30 por cento ou o maximo 40 por cento, do dinheiro que pedimos, se descontarmos a compra de navios, a indemnização de Berne e as expedições á Africa.

E mesmo que calculemos 10 por cento para a compra de navios, para a indemnização de Berne e para outros assumptos, o que é certo é que o que impende sobre os nossos Governos, é a má administração.

Desde 1852 para cá, 50 por cento do dinheiro que nos tem vindo de emprestimos tem-se gasto mal; e este facto é tão verdadeiro e a situação é tão triste que não ha ninguem que se não sinta apavorado com o dia de amanhã. (Apoiados).

Estes factos impõem-se pelos numeros, e são a verdadeira demonstração de como temos governado mal, e temos seguido um caminho diverso d'aquelle que deviamos seguir. (Apoiados).

Estamos á beira do negro abysmo, e sem mais demoras nem hesitações, devemos seguir já por outro caminho opposto.

A nossa situação, a situação de um Estado é como as condições economicas da vida de um individuo; se gasta mais do que tem, chega á conclusão de abrir fallencia.

Estamos em vespera de um convenio, e as bases d'esse convenio são hoje já mais ou menos conhecidas.

Não quero apreciar hoje esse convenio; elle virá ao Parlamento e merecerá approvação ou não merecerá. Mas o que desde já digo é que não considero que nelle haja qualquer clausula que directa ou indirectamente attente contra a nossa independencia, e digo isto desassombradamente porque confio ainda nos sentimentos do nosso povo português. (Apoiados).

O Ministro que apresentasse um convenio com taes bases, teria decerto de todos os portugueses o correctivo que merecia. (Apoiados).

Estamos em vesperas de um convenio, que não sei se já estará realizado; seja como for, o que é certo é que o Governo actual não prepara os espiritos, antes pelo contrario, gastando de mais, cria-lhe difficuldades.

Não é quando se augmenta assim a nossa divida que se preparam os espiritos para acceitar um convenio, e que se pode negociar em condições favoraveis.

Varios oradores d'esta casa teem dito que as despesas augmentam em todos os paises; que não é só em Portugal que se dá esse phenomeno.

É verdade que ha causas geraes que podem influir para que, no nosso país, o capitulo de despesas augmente.

Ninguem o nega; mas quando as despesas augmentam, augmentam as receitas, e o quantitativo em dinheiro de certo é augmentado em todos os paises, na Europa e na America.

A causa d'isso vem a ser uma causa geral que nada tem com o deficit.

A causa geral depende da administração publica, da maneira como o dinheiro se gasta, desenvolvendo determinadas industrias e as vias de communicação, e depende, alem d'isso, de que o dinheiro, o ouro e a prata, tem diminuido de valor, que segundo calculos scientificos, desce de 1 para 4 para o ouro, e na proporção de 1 para 6 para a prata.

Sendo assim, comprehende-se que o quantitativo do dinheiro augmente; mas isto não tem nada com o deficit.

Não devemos ir ao estrangeiro buscar os maus exemplos, mas os bons; não devemos ir ao estrangeiro procurar desculpas para os nossos actos; isso não se pode admittir, é um processo de administração que não se pode comprehender.

Uma grande parte do dinheiro que gastamos, e algum bom inutilmente, é innegavelmente gasto com os serviços publicos.

Nós gastamos mais com os serviços publicos do que nenhum outro país da Europa.

A França é uma das nações que despende mais em serviços publicos; pois Portugal gasta mais 30 por cento.

Este calculo precede as ultimas reformas dos differentes Ministerios, quer no uso ou abuso das auctorizações, como quiserem, quer nos decretos dictatoriaes.

Se nós julgarmos melhor a questão e quisermos apreciar quanto é que pagamos para os funccionarios, e quisermos fazer o calculo dos impostos que pagamos unicamente destinados aos funccionarios, chegamos a um resultado de numeros que nos apavora!

Quero eu fazer o calculo medonho, mas quero andar depressa porque a hora vae adeantada, e, numa sessão prorogada, os meus collegas agradecerão decerto a minha pressa de acabar.

Não posso deixar de fazer este pequeno calculo, para mostrar quanto paga cada português para o funccionalismo.

Refiro-me ao ultimo censo, publicado ha 10 annos, onde vejo que, nessa época, havia 50:466 empregados

Eu quero que existam ainda os mesmos, se bem que só o Governo actual augmentou esse numero em perto de 2:000. Se computarmos o ordenado medio de 250$000 réis a cada empregado, nós vemos que se gasta cêrca de 13.000:000$000 réis só com o nosso func-cionalismo, e dividindo esses 13.000.000$000 réis pelo numero de habitantes do continente, vê-se que cada individuo paga para o funccionalismo 2$800 réis.

Se isto não é phantastico, positivamente não sei então onde possam chegar os exageros.

A culpa será só dos Governos?

Desejo ser sereno na minha critica, e obedecer ao que me manda a minha consciencia:

Não é. (Apoiados).

A culpa é da ambição burocratica que temos, porque em cada português encontra se um candidato ao funccionalismo. Alguns que poderiam receber mais proventos em determinadas profissões que estão independentes do Estado, teem esta ambição, - especie de idiosyncrasia portuguesa, que é já um dos mais pittorescos symptomas da decadencia nacional dos espiritos.

É um mal de que enfermamos, e não sei bem como d'elle havemos de sarar. Se a culpa não é só do Governo, se impende tambem sobre nós, sobre a collectividade, país, o que é certo é que o Governo, em vez de remunerar bem a poucos funccionarios, como disse aqui o meu amigo o Sr. João Pinto dos Santos na sua ultima oração sobre o Orçamento, prefere alimentar este vicio despachando o mais que for possivel, fazendo o maior numero de funcionarios. Em Portugal, a percentagem dos funccionarios, por cada 100 individuos, é de 1/10, e como com o funccionalismo se gasta 23 1/2 a 24 por cento de todos os rendimentos a administrar, eu pergunto: se um individuo tivesse o rendimento de 1:000$000 réis, se gastasse só com os empregados da sua casa 230$000 ou 240$000 réis, se não lhe instituiam prudentemente um tutor? Decerto que sim, porque elle era um prodigo.

Pois assim é o Governo. Mas eu quero concretizar mais esta percentagem; quero demonstrar que mesmo que nós queiramos remediar esse mal immediatamente, pondo-se o Governo numa abstinencia cega de não empregar ninguem, não poderemos consegui-lo, e em parte pela nossa educa-