SESSÃO N.º 38 DE 17 DE MARÇO DE 1902 21
dos heroicos, mas o que não temos é meios para o sustentar nem d'isso temos necessidade. É certo que precisamos d'elle para a defesa das nossas colonias, e não para figurar em procissões e intervir em eleições. (Apoiados).
Apesar da nossa valentia militar, não nos poderiamos defender, se houvesse um ataque ás nossas fronteiras.
Em sessão de 30 de abril de 1901, o Sr. Hintze Ribeiro, em resposta a um notavel discurso do Sr. Francisco Beirão sobre as auctorizações, em que se comprehendia a da reorganização da Policia Civil, dizia que era indispensavel augmentar a Policia de Lisboa e do Porto, porque ella era tão pouca que não se podia destacar, sendo preciso recorrer ao exercito.
Todavia, nas eleições geraes e municipaes de 1900 foi destacada a Policia Civil para todas as assembléas eleitoraes do país onde havia candidatos da opposição a combater. S. Exa. sabe a maneira como a Policia interveiu nos actos eleitoraes, impedindo a entrada dos eleitores progressistas nas casas das assembléas, ou desviando violentamente a opposição de junto da urna. (Apoiados).
O Sr. Presidente do Conselho sabe isto muito bem, e não pode ignorar que havia policia de mais, sendo, portanto, desnecessario augmentar os corpos de Policia Civil.
Manifestando uma opinião meramente pessoal, concordo com a reorganização e augmento de todos os corpos districtaes de Policia, mas deveria reduzir-se o exercito, que é um dos maiores sorvedouros do Orçamento do Estado.
Bastaria que d'este se conservassem nucleos de instrucção militar e os contingentes precisos para as expedições coloniaes.
Outra verba augmentada com 200$000 réis, é a da despesa com os inqueritos e syndicancias aos corpos e corporações administrativas, e a isso já se referiu o meu illustre amigo o Sr. Albano de Mello. S. Exa. disse, e muito bem, que no futuro anno não serão ordenadas syndicancias ás camaras municipaes, porque são na sua grande maioria de feição governamental. É essa a verdade. Ha dois annos é que seria mister elevar esta verba; e, foram tantas as syndicancias, que talvez fosse ainda mesquinho o augmento de 20:000$000 réis.
As syndicancias fizeram-se, não com bons intuitos de corrigir erros de administração, mas somente porque o Governo queria obter as presidencias das mesas eleitoraes. (Apoiadas).
Deram-se casos curiosissimos. No concelho de Marco de Canavezes succedeu o que eu vou contar a V. Exa. e á Camara.
A Camara Municipal, cujos vereadores eram cavalheiros de incontestavel probidade, zelosos administradores do municipio, foi mandada syndicar.
Sabe V. Exa. o tempo que a illustre commissão de inquerito gastou no exame dos documentos, das actas, da escripturação, contas, etc.? 45 minutos!
Fez-se uma syndicancia á Camara Municipal em menos de uma hora, e depois foi dissolvida. Havia parecer da Procuradoria Geral da Coroa contrario á dissolução, mas o Sr. Ministro do Reino dissolveu-a, porque isso era indispensavel para os interesses politicos dos seus apaniguados.
Aquella commissão de syndicancia tinha, por certo a algibeira muito pouco provida, senão demorar-se-hia um pouco mais de 45 minutos na realização do inquerito. Talvez fosse por isso que o Governo propôs o augmento d'esta verba.
Continuando o passeio, paro deante de um predio, que deve ser magnifico, segundo a descripção que d'elle nos fez ha dias o Sr. Arthur Montenegro: é o palacio destinado ao Juizo de Instrucção Criminal.
A verba destinada ao aluguer da casa parece-me ser importante; mas alem d'isso ha dois serventes, quando, até aqui, havia só um. Augmentou-se outro. Serventes de mais, e juizes de menos!
Já outro dia, numa pergunta que fiz ao Sr. Presidente do Conselho, me referi a esse facto.
São dois os juizes auxiliares do Juiz de Instrucção Criminal. Por decreto de 24 de dezembro ultimo foi substituido um d'esses juizes, que era um integro magistrado, representando a substituição uma inqualificavel violencia.
Quando o novo juiz se apresentou a tomar posse, o Sr. Conselheiro Veiga dispensou-o do serviço!
Eu perguntei ao Sr. Presidente do Conselho se não havia serviço que fazer, ou se não era competente o funccionario nomeado, ou se o Sr. Juiz Veiga quisera favorecê-lo com a dispensa.
Respondeu-me S. Exa. que o Sr. Juiz Veiga dera posse áquelle funccionario, mas que, não havendo serviços a desempenhar, o dispensara. Pode admittir-se isto? Pois comprehende-se que, quando se estão a encher as repartições de empregados publicos, dizendo-se que são necessarios, porque ha mais serviços a desempenhar, aquelle funccionario não fosse admittido a tomar conta do seu logar?
A razão devia ser muito differente d'aquella que se allegou; mas é mais para estranhar que se vá augmentar o quadro d'aquella secretaria com um novo servente, quando diminuiu o numero dos juizes, com prejuizo do serviço e sem allivio do Orçamento.
Sr. Presidente: encontramos agora a policia de repressão da emigração clandestina. A este respeito eu direi que o Orçamento não está exacto. É certo que estava na occasião em que foi organizado; mas agora já não, porque o commissario aposentou-se; esta verba de despesa está mais sobrecarregada com o novo pessoal.
Este corpo de policia de repressão da emigração dá pouco resultado: emigram em geral os rapazes que fogem ao serviço militar; e o que deveria promover-se era que elles tivessem attractivos no país para não terem necessidade de sair. D'essa forma já não procuravam em país estranho aquillo que encontravam na sua terra.
Mas com a policia de repressão da emigração nada se consegue; e eu conto á Camara um facto que commigo succedeu, ha 14 annos, quando tive a honra de governar um districto do norte do país, com larga zona fronteiriça.
O vice-consul de Portugal em Verin, em Hespanha, communicou-me que tinham sido presos 8 rapazes, que parecia pretenderem seguir para o Brasil sem os documentos precisos para emigrar. Pedi-lhe que m'os fizesse apresentar, e mandei-os entregar á auctoridade judicial. Não se encontrou qualquer prova de culpabilidade, porque, em taes circumstancias, os emigrantes sabem acautelar-se e fingir que vão apenas a Hespanha procurar trabalho por um prazo curto. Portanto o juiz de direito deu-lhes a liberdade.
Recommendei aos administradores dos concelhos a que pertenciam que os tivessem sob a vigilancia da policia. Pois, passados 8 dias, tinham todos emigrado para o Brasil, saindo d'essa vez a salvo.
É verdade que nesse tempo não havia ainda a policia especial de repressão da emigração clandestina; mas, se a houvesse, succederia o mesmo. Sae sempre quem quer sair.
Encontramo-nos agora com o corpo de bombeiros de Lisboa.
O serviço de extincção de incendios é inteiramente novo no Orçamento do Estado, e custa a medica quantia de 85:735$000 réis.
Ha no pessoal uma verba nova de 61:506$000 réis, e no material e despesas diversas 24:229$000 réis.
Bem sei que o Sr. Presidente do Conselho, ou alguem que por acaso me respondesse, diria «que estas verbas veem da Camara Municipal!» É certo que veem, mas o decreto respectivo de 17 de agosto de 1901 determina o seguinte:
(Leu).
Portanto, a dotação do serviço de incendios na capital