22 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS
continua a ser encargo da Camara Municipal de Lisboa; mas essa receita será constituida por uma verba sempre igual á do anno corrente, com mais 20:000$000 réis em que são collectadas as companhias de seguros, segundo o artigo 6.° do referido decreto.
Note V. Exa. que a contribuição, que a Camara dá, fica sempre fixa, não dará mais do que dá hoje; mas com certeza, no anno futuro, o Sr. Presidente do Conselho ha de augmentar a dotação do servido, e assim successivamente; e o Thesouro é que dará o resto d'aqui para o futuro. (Apoiados).
Vamos agora, Sr. Presidente, á hygiene publica. Temos o augmento confessado, no pessoal, material e despesas diversas, de 51:620$376 réis.
Eu tenho vergonha effectivamente, depois de ter ouvido falar medicos tão distinctos, como são os Srs. Egas Moniz e Clemente Pinto, de occupar d'este assumpto, não tendo competencia technica; em todo o caso não deixarei de referir-me a cousas que me fizeram impressão.
Veja a Camara: encontrei algumas despesas que deixam de ser mencionados no orçamento, por exemplo: o regulamento de 24 de dezembro de 1901, no artigo 172.° determina que haverá até tres analystas com vencimento annual não excedente a 300$000 réis, e no orçamento não está inscripta verba para tal despesa.
O Sr. Montenegro já notou a circumstancia curiosa de haver em Coimbra um sub-delegado de saude auxiliar, que ganha mais do que o delegado: este ganha 200$000 réis e o auxiliar vence 400$000 réis!
Não encontrando explicação para este facto curioso, fui procurá-la ao relatorio que precede o decreto regulamentar de 24 de dezembro; e ahi se diz que o augmento do pessoal da delegação de saude de Coimbra se justifica, não só pela importancia da cidade, mas tambem pela grande população escolar derivada de todo o reino. O que, porem, não explica é o motivo por que o sub delegado auxiliar tem vencimentos superiores aos do delegado effectiyo. Ora, não se comprehende a excepção a favor de Coimbra, com esquecimento de outras cidades. Eu pergunto se Braga não é uma cidade de uma importancia igual, pouco mais ou menos, á de Coimbra, e se não tem uma população fluctuante muito importante, que ali concorre, não só para a frequencia dos institutos escolares, mas tambem para gosar os panoramas do formosissimo Bom Jesus, havendo a mais a que vão de passagem para o Gerez?
Quero, porem, conceder que a população fluctuante de Braga não seja igual á de Coimbra; mas ha outras cidadades, como é a da Figueira da Foz, em que ella é superior. Na Figueira, durante alguns meses do anno, passam milhares de pessoas. O mesmo acontece nas Caldas de Vizella, na Povoa de Varzim, em Espinho, no Gerez, e ainda em outras povoações onde nem sequer ha um subdelegado de saude, como, por exemplo, na ultima que citei.
Por consequencia, se em Coimbra havia já um delegado de saude, podia dispensar-se o auxiliar, e, sobretudo, com vencimento dobrado.
Continuando na minha viagem, passo agora junto de um edificio antigo, um pouco desmantellado, e enegrecido pelo tempo.
Faz-me lembrar um velho convento, ou antiga cathedral.
Num angulo de parede veio uma pequena cavidade encaxilhada em bordo de madeira. Por cima, cravado na parede, um velho ferro enferrujado, do qual pende uma lampada. Não me lembra o nome do pequeno retabulo que acabo da descrever. No centro d'este, em vez de uma imagem de santo ou symbolo christão, desenha-se a physionomia nutrida de um clinico e uma inscripção que diz: nspecção das aguas miserias - 1:2000$000 réis.
Não seria bem dispensada esta inspecção, que só tem por fim a criação de um logar largamente renumerado?
Não temos, pelo regulamento de 24 de dezembro, assegurada a inspecção das referidas aguas?
Diz esse regulamento nas alineas e f) do n.° 20.° do artigo 53.°:
(Leu).
Aqui está, pois, a inspecção commettida aos administradores dos concelhos e aos sub-delegados de saude.
A inspecção dos balneareos, a sua fiscalização, e a interferencia nos processos de licença para a exploração das aguas medicinaes, são attribuições dos sub-delegados e dos delegados de saude, segundo os artigos 74.° e 76.° do mesmo regulamento.
Alem d'isso, ha ainda os directores clinicos dos estabelecimentos hydro-medicinaes.
Se por esta forma estava assegurada a inspecção das agus mineraes, para que era preciso nomear um inspector?
Mandavam-se inspeccionar por quem tem essas funcções determinadas no regulamento, e já não era necessario o tal individuo cujo retrato se divisa no pequeno retabulo que descrevi, a 1:200$000 réis por anno. (Apoiados).
Acho tambem uma cousa curiosa na despesa dos serviços do Real Instituto Bacteriologico de Lisboa, e para a qual vou chamar a attenção da Camara.
No orçamento, no serviço de hospitalização anti-rabico, a verba para alimentação é de 1:840$000 réis, e a de combustivel para cozinha é de 72$000 réis; e no serviço anti-diphterico, a verba para alimentação é de 1:500$000 réis, e a de combustivel para cozinha sobe a 110$000 réis!
Estes comem menos, mas gastam mais em combustivel!
Isto mostra como é feito o Orçamento. Está cheio de erros e de falsidade. (Apoiados).
As despesas com a hygiene publica não são feitas só pelo Estado, sobrecarregam tambem as Camaras Municipaes e as Juntas Geraes dos districtos insulares.
Ha varias disposições no regulamento de 24 de dezembro que assim o determinam, e não as leis todas para não cansar a Camara.
Segundo o artigo 55.° do referido decreto, é obrigatorio para as camaras municipaes, alem de outros encargos, installar um serviço municipal de desinfecção publica, custear as despesas da inspecção sanitaria das meretrizes e o seu tratamento, quando não possam recebê-lo em hos-
pital da localidade, pagar a gratificação ao sub-delegado e saude, proceder á extincção dos ratos na canalização publica, e á destruição dos mosquitos nas regiões palustres, etc.
Devem ser curiosos de ver-se os pobres vereadores municipaes nesta engraçada faina de destruir mosquitos!
Tambem pelo § 2.° do artigo 145.° as camaras são obrigadas a pagar as desinfecções de domicilios e de objectos contaminados ou suspeitos, requisitadas pelos governadores civis; pelo artigo 161.° a installar um posto completo de desinfecção nas capitaes de districto, incumbindo esse encargo ás juntas geraes, onde as houver; e pelo § 1.º do artigo 191.° a contribuir com uma verba annual para as despesas do serviço vaccinogenico.
Alem d'estes, são muitos mais os encargos dos municipios com os serviços de hygiene publica; e, portanto, alem da verba que o Estado gasta, ha outras, e muito importantes que, se não constam d'este orçamento, sobrecarregam o contribuinte. (Apoiados).
Agora temos as verbas para a benificencia publica.
Segundo a proposta Ministerial a nova despesa com estes serviços subia a 119:865$100 réis. Com as alterações da commissão, desceu para a conta mais redonda de 100:661$165 réis.
Noto eu com certa estranheza, que ha aqui uma verba da 20:000$000 réis que o Estado dá como subsidio para o fundo especial destinado á defesa sanitaria contra a tubercalosa.