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APPENDICE Á SESSÃO N.º 38 DE 17 DE MARÇO DE 1902 27

Discurso proferido pelo Sr. Deputado José Dias Ferreira, que devia ler-se a pag. 11 da sessão n.º 38 de 17 de março de 1902

O Sr. José Dias Ferreira: - Sr. Presidente: pedi a palavra, não para discutir o Orçamento, mas para dirigir ao Sr. Ministro do Reino e Presidente do Conselho uma pergunta sobre assumpto de grande importancia.

Antes de mais nada, porem, quero fazer os meus cumprimentos ao Sr. Presidente do Conselho pelas theorias novissimas que acaba de expor sobre liberdades.

Não quer S. Exa. entregar o julgamento d'estas questões aos juizes para não estragar a magistratura judicial.

Mas se os juizes se estragam com o julgamento das questões politicas, porque lhes commettem o julgamento das nossas proprias eleições?

Nós estamos aqui em nome do povo, mas por decisão do Tribunal de Verificação de Poderes, que é todo composto de juizes, que julgam os processos das eleições dos deputados.

Essencialmente politicas são as questões de recenseamento; e todavia as questões de recenseamento pertencem aos juizes.

Os auditores administrativos foram criados, porque emfim sempre nos dão vinte e um empregados a mais!

Não é só de pão que vive o homem, vive tambem dos empregos; e em Portugal não ha partido sem empregos.

O artigo 251.° do Codigo Administrativo, que parece ser o encanto do Sr. Presidente do Conselho, precisava, como muitos outros artigos de lei que por ahi ha similares e parallelos, da capitis diminstio maxima!

Taes preceitos devem ser condemnados a pena cruel e afrontosa, sendo riscados das paginas da legislação nacional!

A apprehensão e a repressão de jornaes, no sentido de obrigar todos os jornalistas a serem bem falantes, não é mais que uma utopia.

Em todo o caso se os jornalistas sairem fora das disposições legaes a competencia é dos juizes.

Deus nos livre de que o poder executivo assumisse tambem o direito de julgar!

Sei bem que na epoca que atravessamos e no logar onde estou não representará demasiada correcção falar em liberdades do povo.

Por isso não discuto o procedimento do Governo com a imprensa.

Mas não podia deixar em silencio a extraordinaria theoria do Sr. Presidente do Conselho.

Costa Cabral, que era um homem de governo ás direitas, e tambem adversario implacavel da liberdade de imprensa, fez em 1845 á opposição na Camara dos Dignos Pares a fineza de não lhe permittir a publicação dos discursos no Diario das Côrtes.

Interpellando um Digno Par a mesa pela falta da publicação dos discursos, Costa Cabral pediu logo a palavra e declarou que por aquella irregularidade só elle era responsavel, porque fôra elle quem dera a ordem á Imprensa Nacional prohibindo a publicação d'aquelles discursos, porque eram incendiarios, excitavam as paixões populares, e provocavam a desordem.

Mas Costa Cabral não se inculcava como liberal puritano, e punha francamente o que elle chamava a ordem acima das regalias populares.

Costa Cabral era dos taes monarchistas mais monarchicos que o monarcha, cujos actos deviam ser combattidos, e cujas convicções como sinceras, não podiam deixar de ser respeitadas.

Entrando no assumpto para que pedi a palavra, desejava que o Sr. Presidente do Conselho informasse a Camara e o país acêrca das providencias que tenciona adoptar com respeito á questão de salubridade publica, sobretudo em Lisboa e no Porto.

Annunciam os jornaes que foi nomeada uma commissão encarregador de propor ao Governo as providencias necessarias para evitar alguma epidemia, a que Lisboa está sujeita pela má canalização, sobretudo dentro dos predios particulares.

Como para falar nas questões de saude não é preciso ser technico, bastando ter senso commum, sempre direi que em Lisboa, como no Porto, são pontos capitães no interesse na saude publica o maior rigor na fiscalização dos generos expostos á venda e a canalização geral e particular.

Na falsificação dos generos alimenticios os abusos quasi não conhecem limites; e a canalização particular, sobretudo nos predios antigos, é em geral pessima.

Quem no verão viver fora de Lisboa, basta-lhe entrar na cidade para ao simples olfato perceber que a cidade está cercada de um pantano; e as paredes exteriores dos predios denotam desde logo que os canos não são impermeaveis.

É preciso pensar nos meios de evitar uma epidemia, que, depois de alastrada, não poderá, antes de ter feito muitas victimas, ser facilmente vencida.

Para o saneamento da cidade de Lisboa não basta o grande medico dos ventos do quadrante do norte.

É uma cidade onde ainda se conservam fossas ao pé de canalização que as podia evitar!

Do Porto tenho as mesmas, senão peores informações.

O Porto está comprehendido na categoria das quatro ou cinco cidades da Europa em que a percentagem da mortalidade é maior; e não é no meio de uma epidemia que se hão de tomar as providencias radicaes para o saneamento das duas grandes cidades.

Ora o publico, desde que vê nomeada uma commissão, por mais reconhecida que seja a competencia dos technicos, calcula logo que é para se não fazer nada.

Para tranquillidade da Camara e do país desejava, pois, que o Sr. Presidente do Conselho indicasse as providencias que tenciona tomar para o saneamento das duas cidades de Lisboa e Porto, e sobretudo, ou ao menos, para as primeiras necessidades da salubridade publica dos dois grandes centros de população.

Vozes: - Muito bem, muito bem.