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presidente do conselho de districto. Não sou da sua opinião igualmente, quando s. ex.ª pretende que ao governo devermos exigir responsabilidade pelos actos praticados pelo governador civil, pelo seu voto e procedimento como membro de um tribunal administrativo; mas em todo o caso reconheço que s. ex.ª, apartando de si as pequenas questões da eleição municipal de Villa Real, levantou um pouco mais o assumpto, tão arrastado até ahi, apreciando-o no seu ponto de vista e á luz dos seus principios, mas debaixo da inspiração de mais elevadas doutrinas, do que o sr. deputado que encetou o debate. A dissolução da camara de Alijó é um acto do governo, exclusivamente do governo, segundo a doutrina do artigo 106.° do codigo administrativo, commentado e explicado por successivas portarias, em que se estabelece a doutrina de que o governo é o unico juiz da conveniencia e opportunidade da dissolução das camaras municipaes. As camaras municipaes têem sido dissolvidas por conveniencia e utilidade publica, e todas o são por conveniencia publica, mas a differença é que umas vezes diz-se o motivo e declara-se o fundamento e a rasão da dissolução, outras vezes occultam-se essas rasões; mas em todo o caso, ou se declare ou não, é sempre a conveniencia publica o unico fundamento aceitavel para justificar estes golpes extremos e violentos na vida dos municipios. Não pôde allegar-se outro.

Estes são os principios: o governo dissolve quando o julga necessario. E elle o unico juiz da opportunidade e conveniencia d'aquella medida. Não sou eu que o digo. Tenho aqui umas poucas de portarias apontadas no codigo administrativo, nas quaes se estabelece sempre inalteravel o principio de que o governo dissolve as camaras municipaes quando o entende de conveniencia publica, e que elle é o unico juiz da opportunidade d'esse acto.

O governador civil propoz a dissolução, o sr. ministro do reino aceitou a proposta do governador civil, fê-la sua, e conseguintemente toda a responsabilidade hoje é do governo.

Não sei, nem me importa saber quaes foram os motivos allegados pelo governador civil para a dissolução da camara municipal de Alijó. Não o sei, porque nos documentos publicados no Diario não vi um só que o dissesse; mas fossem quaes fossem, é certo que o governo estava no uso do seu direito; fossem quaes fossem, o governo usou da uma prerogativa que lhe dá o artigo 106.° do codigo administrativo, o que ninguem lhe pôde contestar.

Mas diz-se: «O governador civil chamou para funccionarem na camara municipal alguns membros, que não tinham andado nas vereações anteriores, como determina o codigo administrativo». Não me parece que seja inteiramente exacta esta asserção, porque o sr. governador civil chamou individuos que tinham andado nas vereações anteriores, e segundo as informações que tenho, só um dos individuos é que não pertencia ás vereações anteriores.

Eu declaro francamente que entendo que o governador civil, emquanto houvesse um membro que tivesse andado nas anteriores vereações, devia chama-lo antes, e com preferencia a qualquer outro; no entretanto, como a maioria dos membros que foram nomeados, tinha entrado nas vereações anteriores, e como as funcções da camara municipal eram interinas, porque foi nomeada poucos dias antes de se fazer a eleição, eu não posso entender que Beja este um acto que de per si só possa constituir um processo de que resulte a condemnação do governo e do governador civil. Não fallo em documentos, porque os não tenho n'esta questão. As minhas informações são estas, e com toda a franqueza direi á camara qual é a minha opinião a este respeito.

A dissolução da camara de Alijó é um acto da responsabilidade do governo. O governo assume esta responsabilidade plena e inteiramente; por consequencia parece-me que o governador civil deve desapparecer da questão. E como se quer accusar o governo por ter usado da prerogativa que lhe concede o artigo 106.° do codigo administrativo?!

Eu já vi dissolver camaras municipaes por motivos futeis, e n'essa occasião, quando eu censurava o uso immoderado que o governo fazia do artigo 106.° do codigo administrativo, respondia-se-me com a latitude da prerogativa que é outorgada ao governo n'esse artigo.

Sempre têem sido dissolvidas as camaras municipaes com o fundamento da doutrina do artigo 106.° do codigo administrativo, e nunca ninguem se lembrou de chamar ao governo inconstitucional, por entender que elle tivesse commettido um grande attentado contra as instituições ou violado as liberdades publicas.

Não quero resuscitar aqui questões passadas, mas se quizesse, podia citar factos e mostrar que a cada palavra que digo responde o testemunho eloquente de um acontecimento comprovado.

Vamos porém á questão.

«O governador civil de Villa Real, é no dizer da opposição, réu de altos e gravissimos crimes, pelos quaes deve ser condemnado irremessivelmente porque sujeitou ao exame do conselho de districto um requerimento para umas dadas suspeições e deixou de submetter ao mesmo conselho outras, e designadamente porque sanccionou o immoralissimo principio das suspeições politicas.»

Esta é a base principal das arguições que se têem feito ao governador civil. Eu vou encarar de frente a questão e dizer francamente, segundo costumo, a minha opinião sobre ella sem prevenção, dizendo o que entendo e declarando o meu voto sem contemplação com qualquer parcialidade politica, sem procurar agradar a nenhum dos lados da camara.

Declaro francamente á camara que, como liberal que sou, não aceito o principio das suspeições politicas (apoiados).

Na minha opinião não pôde haver n'um paiz, que é regido pelo systema constitucional, nenhum homens que se supponha indifferente ás cousas publicas. Se fosse necessario organisar um tribunal composto de homens indifferentes, talvez, segundo esta doutrina, que isso fosse impossivel.

Portanto, partindo do principio de que nos paizes que se regem constitucionalmente não se deve suppor a indifferença politica, é necessario tambem aceitar como bom e justo o principio das suspeições. N'isto creio que sou acompanhado por todos os homens liberaes, porque todos partilham igualmente a mesma doutrina, que é a base essencialissima do credo d'este grande partido (apoiados).

Mas é a primeira vez que se oppõem suspeições aos membros de um conselho de districto? É a primeira vez que se levantam questões de suspeição nos tribunaes administrativos? Não de certo. Quem é que julga os accordãos do conselho de districto? É o conselho d'estado. Não ha recursos pendentes no conselho á estado contra os accordãos do conselho de districto ácerca das suspeições? Ha, sem duvida. Pois porque não aguardam os illustres deputados a decisão d'esse tribunal, que ha de validar ou invalidar os accordãos do conselho de districto? (Apoiados.) Porque não havemos nós esperar que o conselho d'estado profira a sua decisão, e que annulle ou legalize os actos do governador civil como presidente do conselho de districto?

As suspeições politicas, como disse, não me parece que sejam um bom principio; mas as suspeições como foram postas, na hypothese de que estamos tratando, as suspeições á luz das doutrinas mais severas da jurisprudencia são defensáveis, e podem discutir-se com bons argumentos por um e outro lado.

E por esta occasião emprazo-o illustre deputado, o sr. Mártens Ferrão, para que diga, na primeira occasião que se lhe offerecer, qual é a lei d'este paiz onde estão taxadas as suspeições, como s. ex.ª affirmou. Não me presumo de jurisconsulto, e desejaria muito sê-lo, mas creio que não ha lei alguma que defina e taxe as suspeições, e até me parece impossivel que a houvesse.

A suspeição é tudo quanto pôde attentar que um juiz é parcial para julgar esta ou aquella materia. Sabe v. ex.ª qual é a lei que nós temos sobre suspeições? É a ordenação, livro 3.°, titulo 2:471.°, que falla especialmente d'este assumpto. E onde é que estão ahi taxada as suspeições? Os impedimentos estão taxados na ordenação, livro 3.°, titulo 24.°, mas as suspeições, mas as rasões em que se pôde fundar uma parte para arredar um juiz do julgamento de um processo pendente, essas não podem estar definidas em lei alguma. Podem estar exemplificadas, mas não taxadas. Suspeito é todo o juiz que não tem a imparcialidade requerida para com imparcialidade proferir a sua opinião e emittir o seu voto.

Querem saber qual é o principio que a similhante respeito estabelece a ordenação ao livro 3.º, titulo 24.°? É este: «Ê suspeito aquelle juiz que tiver parte ou interesse na questão sujeita á sua decisão».

E qual é a doutrina recebida a respeito de suspeições diante dos conselhos de districto? Peço licença á camara para ler. Tem se -lido tanto, que não commetterei grande peccado lendo tambem algum pouco:

«O conselho de districto (diz o sr. Ottolini, procurador geral da corôa, na sua consulta de 31 de julho de 1839, citada na ultima edição official do codigo administrativo), conhecendo e decidindo questões, em que vão envolvidos direitos do estado e dos particulares, é um verdadeiro tribunal, e seus vogaes, como julgadores, que são, e tão sujei tos á regra geral da nossa legislação, de que nenhuma disposição do codigo, ou de outra lei os exceptuou, e podem consequentemente ser averbados de suspeitos. A doutrina contraria daria logar a que as decisões d'estes corpos fossem muitas vezes dictadas pela prevenção, perdendo assim a força moral tão necessaria nas decisões administrativas como nas judiciarias. Acresce que segundo a nossa legislação antiga se averbavam de suspeitos os tribunaes administrativo», como o desembargo do paço, conselho da fazenda, mesa da consciencia e ordens, junta do estado da casa de Bragança, etc. e por identidade de rasão deve igual direito caber hoje contra os corpos administrativos com relação ás suas decisões.»

Aqui está consagrada a doutrina das suspeições por prevenção, e abonada com a opinião do distincto jurisconsulto, o sr. Ottolini, que era então procurador geral da corôa...

(Interrupção do sr. Casal Ribeiro que não se percebeu.)

O Orador: — Não é argumento supremo...

O sr. Casal Ribeiro: — Argumento supremo é o requerimento para fechar a discussão (riso).

O Orador: — Peço perdão ao illustre deputado. Creio que n'esta questão não se podem queixar de pouca liberdade de fallar (apoiados). O illustre deputado que abriu a discussão fallou durante quatro sessões successivas (apoiados), e eu não, porque não tinha a honra de estar aqui, mas os meus collegas, com uma paciencia seraphica, ouviram-n'o callados e socegados; não se podem portanto queixar. Não havemos de discutir eternamente este assumpto. Outros mais graves estão chamando a nossa attenção.

Eu não aceito o principio das denominadas suspeições politicas, mas entendo que, se o querem condemnar, não é este de certo o modo mais conveniente; formule se n'uma proposta de lei, discutamo-la e votemo-la; mas emquanto vigorar a portaria de 14 de agosto de 1840, que admitte e regula as suspeições nos conselhos de districto, emquanto prevalecer a doutrina sanccionada pela jurisprudencia administrativa a que acabo de me referir, não podemos estranhar que os tribunaes administrativos tomem resoluções ou profiram accordãos como os de que tractâmos.

Mas dizem: «Se não temos lei, temos os principios liberaes, os grandes principios em que se firma e apoia o systema constitucional». Mas os tribunaes não se regulam pelos principios politicos que cada qual phantasia a seu sabor; os tribunaes applicam as leis existentes. A sua missão pára aqui.

A camara permittir-me ha que eu diga do passagem, que me espanto d'este santo horror e d'estes meticulosos escrupulos da opposição ácerca de uma eleição municipal, que [ pela vez primeira é discutida no parlamento.

Para muito estava eu prevenido, mas confesso que não estava prevenido para tanto. Todos os dias se aprende. Sr. presidente, eu admiro, pasmo, espanto me dever a opposição levantar-se indignada contra o governo por causa dos pretendidos excessos commettidos durante a eleição de Villa Real. A opposição era a unica que não podia atirar pedras para os bancos do governo, porque devia olhar mais para o seu passado, e ver que n'esta materia lhe não tocava o papel de accusadora.

Tenho diante de mim os pareceres sobre as eleições, não municipaes, porque o exame de eleições municipaes é, como já disse, a primeira vez que cá vem; mas os pareceres sobre anteriores eleições de deputados, que são da competencia exclusiva da camara. O padecer, por exemplo, sobre as eleições de Villa Real no anno de 1851, que foram julgadas pela camara dos deputados no mez de janeiro de 1852.

Diz assim:

«De todos os documentos se deprehende que a força armada cumpriu as instrucções do governador civil; elle proprio assim o confessa em seus officios.

«A tropa foi collocada de modo, que bem claramente se conhece que o seu fim era colher de emboscada os ditos cidadãos, e espanca-los; se o fim fóra só o fazer dispersar os grupos, nada mais era necessario do que collocar a força na ponte, e ahi, quando chegasse o grupo, manda-lo dispersar, e entrar dividido na villa. A tropa porém foi collocada da maneira seguinte, como consta dos officios: uma parte na ponte e outra parte sobre os dois lados da estrada (muito alem da ponte), que vem de Matheus, de modo que via e não era vista pelo grupo do povo, quando recolhesse; e sentinellas collocadas sobre os lados da ponte, de maneira que a força estava collocada nos tres angulos de um triangulo, e quando o povo esteve no centro d'este triangulo, foi agora mettido pela tropa que o carregou, e fez os ferimentos que constam do auto de corpo de delicto, processo B dos remettidos pelo governo.

«O governador civil recorre a uma inattendivel defeza, quando explica o procedimento da tropa e os ferimentos, dizendo que, sendo onze e meia da noite, e vendo que ainda não tinham voltado de Matheus, e que d'aquella hora em diante já não era perigosa a entrada do grupo na villa, por toda a povoação estar já recolhida, mandára ordem para retirar a tropa; mas que chegando, e executando-se essa ordem no proprio momento em que o povo estava no centro do triangulo, foi isso a causa da desordem e ferimentos! Tendo no seu officio, primeiro dos documentos mandados pelo governo, negado os ferimentos, depois no officio, processo B. dos remettidos pelo governo, diz:

«Nem eu, nem ninguem d'esta villa, ignora que desgraçadamente alguns ficaram feridos, mas é certo que se attribuiram esses ferimentos, e por confissão dos proprios que os receberam, ás quedas que deram, fugindo precipitadamente através da escuridão da noite.

«Suppondo que foram feitos por violencia, porque motivo se não tentaram querelas contra os seus perpetradores?

«Eu já tive occasião de dizer a v. ex.ª que, por ordem minha, se mandou retirar a força da ponte, porque, sendo já onze horas da noite, me persuadi que o bando dos que saíram da villa em tumulto, voltaria de madrugada, e então não encontraria pelas ruas com quem se tomar.

«Alem da força que estava na ponte, o capitão que a commandava collocou alguns soldados a maior distancia, no adro de uma capella, que fica um pouco desviada da estrada que vem de Matheus.

«Recebendo a força ordem de retirar, um alferes, que estava na dita capella, recebeu ordem para unir, e n'esta occasião atravessaram os soldados, na sua marcha, por entre os grupos que tinham ido a Matheus, e que já estavam de volta.

«Eu não duvido que alguns soldados, ao passar por entre os grupos, dessem algumas coronhadas; parece-me isto acreditavel, estando a noite tão escura, e podendo elles a seu salvo faze-lo.»

Não me consta que fosse demittido o governador civil que commetteu ou deixou commetter estes attentados.

Diz mais:

«Auto de corpo de delicto. — 1.º Queixoso — ferimento com instrumento perfurante.

«2.° Tambem feridas na cabeça com instrumento cortante.

«3.° Mostra que lhe foi arremessado um golpe com instrumento prefurante, que lhe rasgou o alburnoz na parte direita sobre o ventre.

«4.° Ferimento na mão: mostra ser feito com instrumento contundente.

«5.° Ferimento na cabeça, feito com instrumento cortante, ferida grave, que porém ao momento do corpo de delicto se conhece não ser mortal, contusão na face, que mostra ser feita com instrumento contundente.

«Os acontecimentos foram no largo de Santa Thereza, freguezia de Matheus, e perante é juiz eleito, e portanto competente é feito o auto de corpo de delicto.

«O governador civil, no seu officio de resposta, occulta esta circumstancia.

«O primeiro queixoso declara ter conhecido tres officiaes, e ter ouvido a voz de carregar sem que os offendidos tivessem dado a menor causa á resistencia, e que foram cerca-