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que tambem na questão incidente que o sr. ministro da fazenda levantou na ultima parte do seu discurso, não em resposta á minha moção nem ás reflexões que eu tinha apresentado, mas como respondendo ou redarguindo ao relatorio da junta do credito publico que foi distribuido n'esta casa, e, não sei se diga, presuppondo ou prognosticando a apresentação de um projecto de reforma d'aquella repartição.

Eu não tenho a menor duvida em dizer com franqueza e lealdade a minha opinião, porque não me cega a posição politica a ponto de desapprovar os actos ou idéas do governo, quando com elles possa concordar. Na primeira parte das reflexões do nobre ministro da fazenda a este respeito estou inteiramente de accordo com elle, emquanto diz que = a junta do credito publico não pôde ser considerada mais do que qualquer dos ministerios, e que as contas da junta devem, fallando de jure constituendo e até certo ponto de jure constituendo, estar sujeitas ás mesmas regras que as dos outros ministerios =. Estou de accordo; e estes foram os principios que tratei de consignar na reforma de 19 de agosto de 1859. N'esta parte não tenho duvida em declarar que discordo das opiniões manifestadas pela junta do credito publico, em varias das suas consultas que estão juntas ao relatorio, embora respeite, como é dever meu respeitar, a sinceridade das convicções dos membros da mesma junta.

N'este ponto estou perfeitamente de accordo, e se alguma divergencia ha entre mim e o sr. ministro, direi logo qual é, quando me occupar da pequena questão do thesoureiro pagador; e chamo-lhe pequena, porque já ha um projecto de lei que revalida aquelle logar; e isto quereria eu que se fizesse a respeito de todos os pontos do regulamento que não estão auctorisados por lei (apoiados).

Mas esta é a questão da moção e eu não quero prejudica-la n'este incidente.

No que respeita á fórma que devem ter as contas da junta do credito publico, á fiscalisação que ao tribunal de contas incumbe sobre estas contas, ao julgamento do mesmo tribunal sobre as contas dos funccionarios ou agentes dependentes da junta do credito publico, as minhas opiniões são iguaes ás do sr. ministro da fazenda. Entendo que tudo quanto se fizer neste sentido é conveniente e vantajoso (apoiados).

Mas acrescentarei que sinto que o sr. ministro da fazenda aproveitasse a occasião para vir fazer, por assim dizer, um relatorio previo a respeito da reforma da junta do credito publico, lançar nos ares uma certa ameaça de reforma, reorganisação, substituição ou o quer que seja d'aquella repartição (apoiados). E direi tambem as rasões por que não posso applaudir que n'esta occasião viesse o sr. ministro tocar n'este ponto pelo modo como o fez.

Sou franco; não costumo occultar as minhas idéas nem as minhas opiniões. Direi o que penso a respeito d'esta instituição. Em these, em theoria estou de accordo com o sr. ministro. Tambem eu, como o sr. ministro, considero aquella instituição, tal como está organisada, uma instituição ex-crescente, anormal, que mal se coaduna com as boas regras de governo (apoiados). Em these, em theoria estou de accordo com o sr. ministro (apoiados), perfeitamente de accordo. Mas sinto que n'esta occasião se levantasse esta questão (apoiados). Parece-me que s. ex.ª não podia escolher occasião mais inopportuna para tratar o que se chama reforma á aquella instituição (apoiados).

Não é na occasião em que se fazem largos emprestimos, não é na occasião em que n'um anno se emittem 5.000:000 esterlinos de titulos de divida externa, e muitos contos de réis em divida interna, e no anno seguinte se repete outro emprestimo por metade d'aquella somma; não é quando as emissões se fazem umas por decretos, e outras por simples portarias, que nem publicidade têem no Diario de Lisboa (apoiados).

O sr. Ministro da Fazenda: — Peço a palavra.

O Orador: — Não é quando se dão estes factos, que convem levantar a questão de reforma da junta do credito publico (apoiados). Parece-me que o sr. ministro mal aproveitou esta occasião de tratar incidentalmente de uma questão tão grave como melindrosa (apoiados).

A junta do credito publico em theoria, como está organisada, não duvido dizer, que é uma instituição anomala (apoiados). Mas a creação da junta do credito publico em 1837, e a sua reforma em 1843, partiu do principio da desconfiança; não da desconfiança contra as pessoas dos que eram ministros da fazenda, mas da desconfiança sobre o estado das finanças do paiz (apoiados), e as garantias dos credores do estado (apoiados).

Esta era a verdadeira idéa que presidiu aquella instituição. É imprudente na occasião actual tratar de substituir esta especie de fiscalisação, embora imperfeita, por outra especie de fiscalisação, que nós não sabemos qual será (apoiados) e que poderá, porventura não inspirar-nos credores a mesma confiança que inspira a actual(apoiados), e por consequencia ser fatal essa medida ao credito do paiz (apoiados), que a todos nós cumpre manter e sustentar, no que estamos e devemos estar sempre empenhados (apoiados). Referiu-se o sr. ministro da fazenda ás lutas, que, em diversas occasiões, os ministros da fazenda têem tido com a junta do credito publico. E exacto; tambem eu as tive (apoiados), tambem lutei, tambem encontrei ali graves difficuldades. Entretanto não julguei que isso me auctorisasse a trazer n'aquella occasião, por motivos identicos aos que expendo agora, a reforma da junta do credito publico (apoiados). Preferi sustentar o direito do governo, soffrer contrariedades, adiar mesmo alguma resolução, tomar uma medida de similhante ordem, porque taes medidas não se tomam ab irat (apoiados). E não é, porque a junta se mostra em divergencia com o ministro, que se deve logo apresentar uma especie de relatorio nebuloso ao parlamento, como preparando-o para destruir essa instituição.

Voto desde já quanto tenda a fazer entrar a junta do credito publico nas condições de qualquer outra das grandes divisões da administração (apoiados). Pelo que respeita ás contas, entendo que não deve ter privilegio (apoiado). N'isto não pôde haver duvida alguma. Mas, repito, que sinto que o sr. ministro da fazenda aproveitasse esta occasião para fazer um relatorio que ninguem lhe pedia sobre a extracção da junta do credito publico, porque me parece que a occasião não é opportuna para o fazer, e porque a opportunidade das medidas deve influir muito na resolução d'ellas (apoiados).

Creio que tenho, sobre este incidente, dito bastante para expor á camara as minhas idéas e opiniões. No meu entender não é opportuna agora a reforma da junta de credito publico, como o não era em 1859 e em 1860, porque tinhamos que recorrer largamente ao credito (apoiados), e não o é agora, porque não é na occasião em que estamos recorrendo e continuaremos a recorrer largamente ao credito, que convem que o governo apresente n'esta casa, embora com boas intenções, arbitrios que alterem ou modifiquem o principio estabelecido pela desconfiança, mas, diga-se a verdade principio de fiscalisação dos seus actos.

Quando as circumstancias variarem; quando as emissões pararem; quando não forem necessarios grandes emprestimos; quando o paiz se convencer, não pelos orçamentos apresentados, mas pelas contas dadas, que o deficit desappareceu, então direi não só que se reforme a junta do credito publico, mas que se extinga (apoiados).

Em toda a arte se entendeu n'este assumpto que não basta a fiscalisação parlamentar que se exerça sobre as contas, quando se exerce mais de dois annos depois dos factos a que se referem...

O sr. Ministro da Fazenda: — Lá está o tribunal de contas, aonde as contas devem ir.

O Orador: — Lá está o tribunal de contas, sim; mas pelo tribunal de contas não correm as emissões de divida. Ao tribunal de contas vão as contas depois de encerrado o exercicio, o exercicio encerra-se dois annos depois de aberto; e depois de encerrado, o processo que correm antes de vir ao parlamento é tão longo, que nós não temos ainda impressas (embora ha muito poucos dias viessem para esta casa) as contas de 1859-1860 verificadas pelo tribunal. Emquanto isto se não aperfeiçoar, emquanto este processo não caminhar mais rapido, a fiscalisação do tribunal de contas, aliás muito util, tem até certo ponto apenas um interesse historico, porque as cousas passaram-se ha tanto tempo, que, se ao mal se quizesse oppor um remedio, não se poderia applicar.

Mas não confundamos o exame do tribunal de contas, sobre actos consumados, com as emissões da divida publica, em que a junta do credito publico exerce, para assim dizer, uma acção preventiva.

O governo não pôde fazer a emissão de um só titulo de divida publica, é necessario que a junta a faça; o governo não pôde crear uma inscripção nem um bond, é necessario que a junta o crie. A junta tem de o crear em virtude da ordem do ministro, mas a junta examina se a ordem do ministro está em conformidade com a lei.

Não estou dizendo que as condições da actual organisação da junta sejam as melhores possiveis; mas digo, e não por motivos politicos, mas no interesse do credito publico, que a occasião é inopportuna para se alterar estas condições, em que os credores bem ou mal têem tido confiança; que a occasião é inopportuna para se alterar estas taes ou quaes garantias, que têem um valor.

Para se reformar, para se alterar a organisação d'aquella repartição, que é composta de membros nomeados pelas duas casas do parlamento, pelo governo e pelo juristas; para se intentar uma reforma d'esta ordem quando se tem recorrido tão largamente ao credito, e quando ainda ha de ser preciso recorrer a elle, não julgo occasião opportuna. Por este motivo, repito, é que em 1859 e 1860 não propuz j a reforma d'aquella instituição; por este motivo é que se I occupasse hoje o logar de ministro o não faria, porque nem tudo o que é bom é opportuno. Cada cousa tem a sua occasião.

Mas isto é um incidente, se o projecto vier nós o examinaremos; o que sinto é que o sr. ministro incidentemente, n'uma questão que nada tinha que ver com esta que se discute, viesse deixar um assumpto grave n'um certo nebuloso que me parece inconveniente.

Posto isto, passo a occupar me do que propriamente faz o objecto da minha moção.

Uma boa parte do seu discurso levou o nobre ministro fazendo o elogio da regularisação da contabilidade publica, da simplificação d'ella, da uniformidade que n'ella deve existir, da vantagem que ha na fiscalisação do tribunal de contas e na fiscalisação parlamentar, í Nestes pontos de doutrina não ha nem pôde haver entre nós divergencia. Pois porventura eu disse ou podia dizer alguem que era mau que a contabilidade, se regularisasse, que a contabilidade se simplificasse, que a fiscalisação se estabelecesse prompta e efficaz?

Perfeitamente de accordo n'estes pontos de doutrina. E não serei, eu que censure ao nobre ministro o ter n'este particular consideravelmente modificado as suas opiniões, porque quando as opiniões se modificam para melhor, eu applaudo sempre esta modificação. Não serei eu que censure o nobre ministro quando hoje considerarão altamente importantes estes objectos que respeitam á contabilidade publica. Não serei eu que censure o nobre ministro quando no seu regulamento insere claramente a definição de quaes são, por exemplo, as contas de gerencia e de exercicio que o governo tem obrigação pelo acto addicional de prestar annualmente á camara; definindo-as segundo os verdadeiros principios, dizendo quaes são essas contas que devem vir aqui dentro do primeiro mez da sessão legislativa; declarando que as contas que o governo tem de apresentar á camara não são unicamente a chamada conta geral do estado ou conta do thesouro da receita e despeza, mas que são tambem as contas de cada um dos ministerios, da ultima gerencia e do ultimo exercicio.

Não censuro o nobre ministro por ter escripto no seu regulamento o contrario do que sustentou ha um anno, quando n'esta casa pretendia que a obrigação imposta pelo acto addicional ao governo se limitava unicamente ás contas geraes do estado e não comprehendia as contas de gerencia e exercicio dos ministerios. A conversão do nobre ministro n'este ponto applaudo-a, aceito-a e approvo-a. Não é portanto este o nosso ponto de divergencia, não é nem pôde ser.

Que o regulamento geral de contabilidade de 12 de dezembro fosse feito no intuito de melhorar as condições da nossa contabilidade, nem eu nem ninguem o duvida. Pois póde-se porventura suppor que outras fossem as intenções do nobre ministro? Que n'esse regulamento haja disposições conformes com esse intuito, não duvido tambem; já d'isso dei testemunho. A questão pois não é esta, a questão, a principal questão é se ha ou não no regulamento disposições que estejam em contradicção com as leis que os regulamentos não podem alterar; e n'esta parte na doutrina e na applicação eu discordo do sr. ministro da fazenda.

Discordo do sr. ministro da fazenda na doutrina, porque, se com elle reconheço que não é sempre facil marcar as raias entre lei e regulamento, reconheço tambem que ha principios e regras que attribuem á lei o que á lei pertence, e ao regulamento o que lhe pertence, e que não é conveniente ter tão pouco escrupulo como s. ex.ª disse, e mostrar tão pouco cuidado quando se trata de marcar essas raias entre a lei e o regulamento. Não é bom ter tão pouco escrupulo, não é bom deixar de tratar esta questão, porque não é bom confundir os poderes. E isto para mim tambem não são só doutrinas, são praticas.

Eu já disse que em 1859 um dos motivos por que não publiquei o regulamento geral de contabilidade, foi porque me não julguei habilitado para o fazer pela maneira pela qual estava concebido, porquanto havia alteração das leis vigentes. Assim pratiquei, e assim desejava que o sr. ministro praticasse.

Mas se é bom ter estes escrupulos, levantar estas duvidas, esta mesma discussão o mostrará.

O sr. ministro, na sessão anterior em que fallou sobre este objecto, reconheceu o intuito e a moderação com que eu tinha trazido esta questão á camara; e creio que ainda hoje dou d'isso testemunho. Entretanto rejeitou a fórma em que a questão tinha sido apresentada.

O que pedia eu á camara? O exame por uma commissão, nada mais do que o exame.

Eu peço o exame; o sr. ministro pede a accusação. Eu peço a commissão de fazenda; o sr. ministro pede a commissão de infracções.

Que empenho é este que tem o illustre ministro da fazenda de e sentar no banco dos réus, quando ninguem lá o chama? Podemos acreditar que é sincero? Pela minha parte não o acredito; é tactica, e tactica antiga e velha. Aggrava-se a questão; reveste-se de um apparato tenebroso, para influir na consciencia dos juizes e afastar d'elles a imparcialidade.

A questão não é de censura, nem eu a tratei como tal; porque, se ha prescripções que não estão de accordo com as leia vigentes, ou são contrarias a ellas, não creio que fosse intenção do sr. ministro violar as leis, altera-las a seu talante.

Não julgo que o caro seja de gravidade bastante para pedir censura; e, se entendesse que o era, havia de propo-la francamente, porque o costumo fazer sempre assim, e porque a minha posição politica é bem clara e definida n'esta casa.

í Não proponho censura, proponho exame, e nada mais; proponho que a varias disposições do regulamento geral de contabilidade de 12 de dezembro de 1863 se applique o principio que «e applicou á disposição que continha a creação do logar de thesoureiro pagador da junta. Reconhecendo o sr; ministro que este logar não podia existir sem lei; trouxe ás côrtes um projecto para que se interpretasse a lei (a fórma é curiosa, mas pouco importa ao fundo da questão) da junta do credito publico, declarando que existia já um thesoureiro pagador, presupposto, imaginario, mas que não era até agora uma entidade real.

A questão do thesoureiro pagador é hoje uma questão pequena, porque está pendente um projecto que cria o logar. Mas a respeito d'esta entidade que o ministro presuppoz e que na sua opinião eu presuppuz tambem, permitta-me que decline a honra de tão fertil e inventiva imaginação. Não posso aceitar as honras da associação que o nobre ministro quer formar comigo, sendo nós dois os Isaías e Jeremias d'esta especie de Messias da contabilidade, que se chama thesoureiro pagador. Para propheta nunca me achei com geito, nunca prophetisei nem mesmo um thesoureiro pagador. Guarde o nobre ministro para si só este distincto officio.

Citou se a decreto de 19 de agosto de 1859; e n'elle nem se presuppõe nem se adivinha esta entidade, que não estava na nossa legislação.

No decreto de 19 de agosto de 1859 diz-se o seguinte no artigo 11.°:

«Compete ao tribunal de contas julgar em unica instancia as contas dos thesoureiros, exactores, recebedores e pagadores de todos os ministerios, da junta do credito publico e de todas as repartições que tiverem a seu cargo a arrecadação, administração e applicação de rendimentos computados no orçamento geral do estado.»