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SESSÃO DE 4 DE MARÇO DE 1876

Presidencia do ex.mo sr. Joaquim Gonçalves Mamede

Secretarios — os srs. Francisco Augusto Florido da Mouta e Vasconcellos Barão de Ferreira dos Santos

SUMMARIO

Apresenta o sr. ministro do reino uma proposta de lei para ser auctorisada a camara municipal de Lisboa a contrahir um emprestimo para a canalisação e limpeza da capital. — Apresentação de representações e requerimentos por parte de alguns srs. deputados. — A pedido do sr. Barros e Cunha entra em discussão e é approvado o projecto de lei n.º 152 do anno de 1875. — Na ordem do dia continuou e concluiu a discussão da lei de receita, na especialidade.

Presentes á chamada 51 senhores deputados.

Presentes á abertura da sessão — Os srs.: Rocha Peixoto (Alfredo), Cardoso Avelino, Avila Junior, A. J. Teixeira, Cunha Belem, Pereira Carrilho, Mello Gouveia, Neves Carneiro, Zeferino Rodrigues, Barão de Ferreira dos Santos, Correia da Silva, Conde de Bertiandos, Eduardo Tavares, Fonseca Osorio, Francisco Mendes, Mouta e Vasconcellos, Pinto Bessa, Guilherme de Abreu, Paula Medeiros, Jeronymo Pimentel, Barros e Cunha, J. M. de Magalhães, Ribeiro dos Santos, Gonçalves Mamede, J. J. Alves, Matos Correia, Cardoso Klerck, Correia de Oliveira, Pereira da Costa, Namorado, Luciano de Castro, Pereira Rodrigues, Mexia Salema, Pinto Bastos, Julio de Vilhena, Luiz de Lencastre, Luiz de Campos, Camara Leme, Bivar, Manuel d'Assumpção, Rocha Peixoto (Manuel), Mello Simas, Mariano de Carvalho, D. Miguel Coutinho, Pedro Jacomo, Pedro Roberto, V. da Arriaga, V. da Azarujinha, V. de Carregoso, V. de Guedes Teixeira, V. de Sieuve de Menezes.

Entraram durante a sessão — Os srs.: Osorio de Vasconcellos, Braamcamp, Pereira de Miranda, Teixeira de Vasconcellos, Antunes Guerreiro, A. J. Boavida, A. J. de Seixas, Arrobas, Rodrigues Sampaio, Barjona de Freitas, Ferreira de Mesquita, Filippe de Carvalho, Francisco de Albuquerque, Francisco Costa, Van-Zeller, Illidio do Valle, Ferreira Braga, Vasco Leão, J. M. dos Santos, Lourenço de Carvalho, Freitas Branco, Pires de Lima, Pinheiro Chagas, Marçal Pacheco, Pedro Franco, Julio Ferraz, V. de Moreira de Rey, V. de Villa Nova da Rainha.

Não compareceram á sessão — Os srs.: Adriano Sampaio, Agostinho da Rocha, Falcão da Fonseca, Augusto Godinho, Sousa Lobo, Carlos Testa, Vieira da Mota, Conde da Graciosa, Forjaz de Sampaio, Vieira das Neves, Camello Lampreia, Quintino de Macedo, Palma, Dias Ferreira, Guilherme Pacheco, Figueiredo de Faria, Moraes Rego, Nogueira, Faria e Mello, Alves Passos, Cunha Monteiro, Placido de Abreu, Ricardo de Mello, Thomás Ribeiro.

Abertura — Á uma hora e meia da tarde.

Acta — Approvada.

EXPEDIENTE

Officio

Do ministerio da guerra, acompanhando, em satisfação ao requerimento do sr. deputado José Luciano, nota das quantias pagas á companhia real dos caminhos de ferro portuguezes por transportes militares durante o anno economico de 1874-1875, e nos seis mezes decorridos desde o 1.° de julho até ao dia 31 de dezembro ultimo.

A secretaria.

Representações

1.ª Da camara municipal do concelho do Sardoal pedindo auctorisação para que a receita especialmente applicada á viação municipal seja desviada por espaço de dez annos para ser applicada á realisação de uma fonte na villa sede do concelho. (Apresentada pelo sr. deputado D. Miguel Coutinho.) A commissão de fazenda.

2.ª Dos professores de instrucção primaria dos concelhos de Abrantes e Sardoal pedindo augmento de vencimentos. (Apresentada pelo mesmo sr. deputado.)

A commissão de instrucção publica.

3.ª Da camara municipal de Marvão, pedindo que por meio de uma lei seja ampliada e alargada a alçada e attribuições dos juizes ordinarios. (Apresentada pelo sr. deputado Klerck.)

A commissão de legislação civil.

4.1 Da camara municipal do concelho de Machico, pedindo que seja decretada a revogação da lei de 13 de maio de 1864 na parte respectiva á permissão da cultura e fabrico de tabaco na Madeira, ficando o pagamento de réis 70:000$000 a cargo exclusivamente dos povos dos Açores que se aproveitaram do beneficio. (Apresentada pelo sr. deputado Ferraz.)

A commissão de fazenda.

5.ª Da mesma camara municipal, pedindo que seja approvado com varias alterações o projecto de lei apresentado em sessão de 26 de janeiro proximo passado, pelos srs. deputados Simas, D. Luiz da Camara Leme e Ricardo Julio Ferraz. (Apresentada pelo mesmo sr. deputado.)

A commissão de legislação civil.

6.ª Da mesma camara municipal, pedindo que seja auctorisado o governo a pôr em execução por mais dez annos o decreto de 22 de julho de 1870 com relação a todas as dividas liquidadas até 1875. (Apresentada pelo mesmo sr. deputado.)

Á commissão de fazenda.

Declarações

' 1.ª Declaro que por motivo justificado deixei de comparecer ás duas ultimas sessões. Sala das sessões, 4 de março de 1876. = Antonio José Boavida.

2.ª Declaro que tenho faltado ás ultimas sessões da camara por motivo justificado. — D. Luiz da Camara Leme.

Mandaram-se lançar na acta.

SEGUNDAS LEITURAS

Projecto de lei

Senhores. — A classe dos correios das secretarias distado está muito mal remunerada, a exiguidade dos seus vencimentos não está de fórma alguma em harmonia com o serviço que prestam.

Grandes sacrificios, um aturado e penoso serviço, uma vida laboriosa e ás vezes até arriscada devem ter remuneração condigna e aos poderes publicos corre a obrigação de collocar esta classe na posição propria, digna e conveniente para que assim possa prestar o serviço que se lhe exige.

O que tem hoje de remuneração é pouco, e em outras epochas (em 1836), quando as circumstancias do thesouro eram mais precarias, a vida mais facil, os generos de primeira necessidade menos custosos, venciam os correios réis 360$000 de ordenado e 252$000 para despezas do cavallo ou forragem. Estes vencimentos diminuiram, e hoje o ordenado e o abono para despezas de cavallo são de tal fórma diminutos, que não são sufficientes para as necessidades dos correios por mais diminutos que sejam, por mais restringidos que se encarem.

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Por os motivos expostos, que se me antolham de clara intuição, venho propor-vos o seguinte projecto de lei.

Artigo 1.° O vencimento dos correios das secretarias distado é de 320$000 réis, e o abono para despezas de cavallo 250$000 réis.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Sala das sessões da camara dos senhores deputados, em 3 de março de 1876. = Luiz de Lencastre, deputado pela Figueira.

Projecto de lei

Senhores. — Valença, praça de armas estreitada n'um cinto de muralhas, tem por esse motivo o seu desenvolvimento material limitado á pequena area por ellas demarcada.

Tem successivamente augmentado a população d'esta villa e praça, e as edificações, restrictas sempre á mesma area, acham-se hoje consideravelmente acumuladas.

Ha pois n'aquella povoação falta de local para as indispensaveis edificações civis, e, entre estas, a que mais urgente necessidade apresenta é o de uma casa escola com as acommodações convenientes ao serviço de ensino de ambos os sexos, feito de presente em edificios de aluguer, os menos proprios para áquelle fim.

Dentro dos muros da praça existe um edificio, que constituia antes de 1837, anno em que foi incendiado, uma das dependencias da padaria militar, e que, desde então até hoje, que vão decorridos quasi quarenta annos, tem estado em ruinas, prova a mais convincente da sua inutilidade para o serviço militar ordinario.

A concessão, pois, do referido edificio, ou antes das quatro paredes velhas e do terreno rectangular que fecham, ha tanto tempo em abandono, para esse fim tão util, parece-me dever ser attendida, attentas tambem as condições excepcionaes d'aquella povoação.

Tenho portanto a honra de submetter ao esclarecido exame e approvação da camara o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° E concedida á camara municipal de Valença, districto administrativo de Vianna, um edificio em ruinas, que antes de 1837, anno em que foi incendiado, constituia uma das dependencias da padaria militar da mesma villa e praça.

Art. 2.° O edificio concedido será exclusivamente applicado á edificação de uma casa escola para ambos os sexos.

Art. 3.° Se passados tres annos depois da promulgação d'esta lei, não estiver feita a edificação de que se trata, o terreno reverterá para a posse e dominio da fazenda publica.

Art. 4.° Fica revogada a legislação em contrario.

Sala das sessões da camara dos senhores deputados, 3 de março de 1876. = O deputado pelo Porto, Illidio Ayres Pereira do Valle.

Projecto de lei

Senhores. — O conselho da Horta da ilha do Faial, capital do districto occidental dos Açores, foi dividido, posteriormente á publicação da lei de 23 de novembro de 1859, em quatro assembléas eleitoraes: da matriz, comprehendendo esta freguezia, Angustias e Conceição; de Pedro Miguel, composta da mesma freguezia, Praia do Almoxarife e Ribeirinha; dos Cedros, comprehendendo esta freguezia, Salão, Praia do Norte e Capello, e da Feteira, composta da mesma freguezia, Castello Branco e Flamengos.

Esta divisão, que tem subsistido até hoje, está reclamando uma modificação, em virtude da grande alteração que têem soffrido os meios de communicação n'aquelle concelho, depois que ella foi estabelecida.

Assim a freguezia do Capello, que hoje pertence á assembléa dos Cedros, está ligada com as freguezias de Castello Branco e Feteira pela estrada real, quasi construida, emquanto que se acham intransitaveis os caminhos que a communicam com aquella assembléa dos Cedros.

A freguezia dos Flamengos, que hoje pertence á assembléa da Feteira, está ligada com a da matriz, da cidade da Horta, por uma boa estrada municipal e real, emquanto que se acham intransitaveis os caminhos que a communicam com aquella assembléa da Feteira.

D'aqui resulta que muitos eleitores das freguezias do Capello e dos Flamengos deixam de exercer o seu direito de votar, pelo pessimo estado dos meios de communicação com as assembléas dos Cedros e da Feteira, o que não succederia, se os eleitores da primeira freguezia votassem na assembléa eleitoral de Castello Branco, e os da segunda na da matriz da cidade da Horta;

Considerando pois, que aos poderes publicos corre o dever de facilitar o exercicio do direito de votar; considerando que a alteração dos meios de communicação de um concelho não póde deixar de considerar-se como um dos casos que exige a modificação na designação das assembléas eleitoraes, o que reconhece o governo na proposta de lei do codigo administrativo, artigo 275.°, § 2.°; considerando que, ficando o mesmo numero de quatro assembléas, estas coincidem completamente com a divisão dos quatro juizos ordinarios da comarca e concelho da Horta, determinada por decreto de 12 de novembro do anno findo, publicado no Diario do governo n.º 259: temos a honra de submetter á vossa illustrada apreciação a seguinte proposta de lei.

Artigo 1.° O concelho da Horta da ilha do Faial, districto occidental dos Açores, será dividido, para todas as eleições politicas, em quatro assembléas eleitoraes: matriz, comprehendendo os eleitores d'esta freguezia, dos Flamengos, Conceição e Angustias; Pedro Miguel, composta dos eleitores da mesma freguezia, Praia do Almoxarife e Ribeirinha; Cedros, formada com os eleitores da mesma freguezia, do Salão e da Praia do Norte; e de Castello Branco, para os eleitores d'esta freguezia, do Capello e da Feteira,

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Sala das sessões, em 2 de março de 1816. = Filippe de Carvalho — Mello Simas.

Foram admittidos e enviados ás respectivas commissões.

O sr. Avila Junior: — Por parte da commissão de guerra mando para a mesa o requerimento de Silverio José da Cunha, a fim ser remettido ao governo, para o tomar na consideração que merecer.

O sr. Guilherme de Abreu: — Tenho a honra de mandar para a mesa uma representação dos moradores das freguezias de Moure, Aguas Santas, Monsul, Verim, Ajude, Friande, S. João de Rei, Geraz, Ferreiros e Covellas, que constituiam o extincto concelho e julgado de S. João de Rei e actualmente pertencem ao julgado e comarca da Povoa de Lanhoso, pedindo que com ellas se forme um novo julgado, que tenha a sua sede na freguezia de Monsul, a mais central e populosa do grupo.

Parece-me justo o pedido e reservo-me para o sustentar, se necessario for, quando vier á discussão o respectivo parecer, limitando-me por agora a regar a V. ex.ª que se digne enviar esta representação á commissão competente, depois de publicada no Diario, como o têem sido outras sobre assumpto analogo.

O sr. Bivar: — Na sessão de hontem prestei toda a attenção ao discurso do illustre deputado por Silves, o sr. Barros e Cunha, mas tendo de me levantar para fazer uma pergunta a um nobre ministro, sobre negocios relativos ao Algarve, fui depois informado de que s. ex.ª no seu discurso se referiu a alguns actos do delegados do thesouro no districto de Faro, e ainda que o illustre ministro da fazenda fizesse justiça a este distincto funccionario, eu não ficaria em paz com a minha consciencia se n'este logar, em que áquelle distincto funccionario não se póde defender dos seus actos, eu não prestasse um publico testemunho do alto conceito em que o tenho, pela sua reconhecida honradez, e pelo esclarecido zêlo com que desempenha as funcções do cargo que lhe está confiado. (Apoiados.)

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O sr. Eduardo Tavares: — Mando para a mesa uma representação da illustre camara municipal de Cezimbra, na qual se queixa com justificado motivo da lei de 16 de abril de 1874, que auctorisou a nova divisão comarca.

Aquelle camara repete n'esta representação muitas das considerações que eu tive a honra de fazer na occasião em que se tratou aqui da respectiva discussão, e pede em nome do interesse dos povos d'aquelle municipio que ao menos sejam concedidas aos actuaes juizes ordinarios as mesmas attribuições que tinham antes d'aquelle lei, que tantas reclamações tem provocado n'uma grande parte do paiz.

Mando tambem para a mesa uma representação da corporação dos carteiros de Lisboa, pedindo que lhes seja extensivo o principio da reforma.

Esta representação vem assignada por todos ou por quasi todos os empregados de que se trata, e eu chamo a attenção da camara, e especialmente da commissão de fazenda, para esta desventurada classe, cujo trabalho tem cada vez augmentado mais com o desenvolvimento do commercio e da navegação, e que alem de receber magríssimos vencimentos, está excluida da vantagem da reforma, aliás concedida já a quasi todos os funccionarios do estado.

Peço a V. ex.ª que envie esta representação á commissão competente para a tomar na consideração que merece.

Como está presente o sr. ministro das obras publicas, chamo a attenção de s. ex.ª para o que vou dizer.

O vapor que faz a carreira entre Lisboa e o caminho de ferro do sul transporta tambem para o Seixal bastantes passageiros que se dirigem para aquelle ponto. Acontece, porém, e eu já fui testemunha presencial d'isto, que algumas vezes um empregado do caminho de ferro do sul, talvez o chefe da exploração, dá ordem para que o vapor, quando chega ao Barreiro, não siga para o Seixal, do que resulta que os passageiros, que tomaram os seus bilhetes no pensamento de ir para ali, ficam horas e horas sobre a ponte do Barreiro sem muitas vezes ter conducção para o Seixal, por isso que quando o Tejo está mais agitado não apparecem n'aquella paragem as pequenas canoas que n'outras occasiões para lá as transportam á sua propria custa.

Como disse, já por mais de uma vez se tem dado este facto, que me parece, não direi um vexame, mas ao menos um grande inconveniente para os passageiros que se dirigem para o Seixal, o que pagam para os deitarem n'aquelle ponto, e não em outro qualquer.

.Não faço estas reflexões com o intuito de aggredir ou offender o empregado do caminho de ferro que tem dado tal ordem, porque provavelmente ha de ter rasão ponderosa para assim proceder, mas V. ex.ª comprehende que não se póde nem deve faltar ao que se garante ao passageiro quando se lhe vende um bilhete para um determinado ponto, deixa-lo n'outro, para onde não quer ir; é um procedimento que, na verdade, não quero qualificar.

E indispensavel que estes factos se não repitam, e chamo portanto a attenção do nobre ministro das obras publicas sobre o assumpto, esperando que s. ex.ª remediará tal inconveniente em proveito dos passageiros que, depois de pagarem um bilhete para certo e determinado destino, não podem estar á mercê do primeiro empregado que os manda ficar n'outro para onde não querem ir.

O sr. Ministro das Obras Publicas (Cardoso Avelino): — Declaro ao illustre deputado que tomo nota das observações que s. ex.ª acaba de fazer, e depois de me informar do facto hei de providenciar para que o serviço se faça como deve ser feito, sem se faltar ás promessas que implicitamente se fazem aos passageiros que tomam bilhete para o Seixal.

O sr. Carlos Eugenio: — Mando para a mesa dois pareceres da commissão de marinha.

O sr. Secretario: — A commissão de redacção não fez

alteração alguma ao projecto n.º 15, que vae ser remettido para a outra casa do parlamento.

O sr. Mexia Salema: — E com a maior satisfação que desempenho o meu dever de representante da nação portugueza, mandando para a mesa uma representação, assignada por mais de 400 moradores da villa do Torrão, em que pedem a esta camara que seja realisado o pensamento exposto no projecto assignado pelos illustres deputados os srs. Namorado, Klerck e Mello Gouveia, e apresentado na sessão de 26 de janeiro, para a creação de mais 18 comarcas, sendo a sede de uma d'ellas n'aquella villa do Torrão, e composta das povoações que constára do mappa junto ao mesmo projecto.

As rasões em que fundam as suas aspirações e pedidos os representantes meus patricios são de summa importancia e por si se inculcam, sendo conhecidas, e estão tambem de accordo com as idéas que eu tive a honra de apresentar no meu breve discurso, quando se discutiu n'esta casa o projecto de lei que extinguiu os antigos juizes ordinarios.

Limito aqui as minhas observações, porque não quero ser taxado de suspeito pela affeição que tenho por aquella terra, em que tive o meu berço, e á qual se acha vinculada a naturalidade e fortuna da minha familia.

Peço a V. ex.ª que se digne enviar esta representação á commissão de legislação civil, e manda-la publicar no Diario do governo, como se tem feito a outras identicas.

O sr. Jeronymo Pimentel: — Mando para a mesa dois requerimentos dos ajudantes de campo do general da 4.ª divisão militar, a fim de serem enviados á commissão de guerra, esperando que o seu parecer seja favoravel á pretensão dos requerentes.

Estes militares pedem que lhes seja concedido um Cavallo praça para o desempenho. do serviço de que estão encarregados.

Estes militares tiveram cavallo praça até á publicação da lei de 10 de abril de 1874, em que foram considerados em commissão. Até esta data estavam todos arregimentados e tinham por consequencia cavallo pertencente ao quadro dos seus regimentos.

Veio posteriormente a lei de 9 de abril de 1875, que concedeu cavallo praça aos officiaes do estado maior que exercem commissões activas dependentes do ministerio da guerra.

Parece-me que a natureza do serviço que desempenham os ajudantes de campo dos commandantes das divisões militares exige que o estado lhes conceda cavallo praça. Não ha mais rasão para se conceder aos officiaes do estado maior o que se nega aquelles.

Parece-me pois que tornar extensiva a disposição da lei de 9 de abril de 1875 a estes officiaes é uma cousa justissima, e eu espero que a commissão de guerra attenderá este pedido.

O sr. J. J. Alves: — Mando para a mesa um requerimento que D. Maria da Luz Madeira faz a esta camara pedindo, em virtude das circumstancias precarias em que se acha, uma pequena pensão, attendendo aos serviços que seu pae prestou em favor da causa liberal e da dynastia reinante.

Este requerimento vem acompanhado de varios documentos que comprovam á justiça da pretendente, e estou certo de que a commissão á qual vae ser submettido o tomará na devida consideração.

Aproveitando este momento faço um pedido a todas as commissões d'esta camara, para que não demorem os pareceres sobre os differentes assumptos que lhes estão affectos, quer dos membros da camara, quer dos estranhos a ella.

Eu acho que é um dever nosso, e sempre preferivel resolver as pretensões embora desfavoravelmente, do que demora-las deixando os interessados no estado de duvida.

Com isto não tenho intenção de dirigir censuras aos meus collegas das differentes commissões, mas sómente

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avivar-lhes de que procedendo todos nós assim cumprimos o dever do cargo que nos está confiado.

O sr. Pedro Roberto: — Mando para a mesa um requerimento do capitão de engenheria Constantino José de Brito, pedindo que se lhe conte a antiguidade do posto de tenente da mesma arma desde 15 de janeiro de 1873.

Peço a V. ex.ª que mande este requerimento á commissão competente a fim de com a maior brevidade dar o seu parecer.

O sr. Cunha Belem: — Mando para a mesa alguns requerimentos de officiaes quarteis mestres dos corpos da guarnição de Lisboa, pedindo que se proponha alguma medida tendente a melhorar o vencimento d'estes funccionarios.

Abstenho-me agora de fazer quaesquer considerações, limitando a dizer que o pedido dos supplicantes é de toda a justiça.

Peço a V. ex.ª que tenha a bondade de os remetter á commissão competente, a fim de os tomar na devida consideração.

O sr. Antunes Guerreiro: — Mando para a mesa um requerimento de José Bonifacio da Costa, major reformado, pedindo melhoria de reforma, á similhança do que se decidiu a favor de Celestino Gomes de Oliveira.

Peço a V. ex.ª que tenha a bondade de remetter este requerimento á commissão de guerra a fim de dar o seu parecer.

O sr. Pinheiro Osorio: — Mando para a mesa uma representação da camara municipal do concelho de Taboaço. Este respeitavel corpo administrativo pede á camara dos senhores deputados a conservação da autonomia do seu concelho e a ampliação das attribuições dos novos juizes ordinarios, augmentando-se-lhes a alçada e incumbindo-se-lhes o processo dos inventarios de menor quantia.

Ambos estes pedidos me parecem ser, e na realidade são, de rigorosa justiça.

A illustre camara municipal aproveita a occasião para expressar a sua magua por não terem sido attendidos os seus desejos e aspirações na ultima circumscripção judicial, tendentes a ser creada uma nova comarca no concelho de Taboaço.

Eu acompanho a illustre camara municipal no seu sentimento, porque tambem fiquei penalisado quando vi que não era ali creada comarca alguma. Os meus amigos de Taboaço sabem que não descurei os seus interesses n'esse importante assumpto, pois me empenhei, tanto quanto me era possivel, para que fosse ali creada uma comarca, sem prejuizo das comarcas do circulo eleitoral que tenho a honra de representar n'esta casa. Entretanto o nobre ministro da iustiça, mostrando sempre a melhor vontade e disposição de attender ás conveniencias e bem estar dos povos de Taboaço, fez-me ver a impossibilidade que havia de ser ali creada uma nova comarca em face da lei e das informações officiaes, que eram contrarias a essa pretensão.

Respeitando, como me cumpre, os motivos que imperaram no animo de s. ex.ª, para proceder como procedeu, parecia-me todavia que a projectada comarca de Taboaço poderia existir conjunctamente com as comarcas de Armamar e S. João da Pesqueira, fazendo-se uma circumscripção diversa d'aquella que se fez ultimamente; e ainda me anima a esperança de que o governo, quando haja opportunidade, ha de fazer a vontade aos povos de Taboaço, fazendo reviver a sua comarca, e se o não tem feito até agora, é certamente por motivos ponderosos e sem duvida justos. E digo fazer reviver, porque, como é sabido, a comarca de Taboaço era muito antiga; existiu desde longos annos até á circumscripção judicial de outubro de 1855, em que foi extincta.

Quanto á conservação do concelho de Taboaço, a esse respeito não póde haver questão; não ha nem póde haver duvidas.

O concelho de Taboaço é muito Importante, tem em si os elementos necessarios para a vida administrativa, e por isso não póde ser extincto, muito embora aquelle concelho não forme só por si uma comarca judicial.

Estou informado de que o governo modificou a sua primitiva idéa de fazer a circumscripção dos concelhos igual á circumscripção das comarcas judiciaes, concordando assim com a opinião sustentada, no seio da illustre commissão de administração publica, de serem conservados todos os concelhos actualmente existentes.

E assim, os povos de Taboaço podem estar socegados, porque ninguem pensa em extinguir o seu concelho.

O outro pedido, que se refere a ampliação das funcções dos novos juizes ordinarios, tambem me parece justo, com uma restricção apenas, e vem a ser, que a ampliação das attribuições seja sé para os juizes ordinarios dos julgados que pertencerem a concelhos diversos d'aquelles em que estiverem as sedes das comarcas, ou dos julgados que estiverem a certa distancia das sedes das comarcas por fórma que se torne demasiadamente incommodo aos povos o concorrerem ali para os actos judiciaes mais frequentes e de menor importancia.

Com esta restricção presto o meu completo apoio tambem a este pedido, e ella não póde de fórma alguma prejudicar os povos de Taboaço, porque o seu julgado está exactamente nas circumstancias da excepção ou restricção que acabo de indicar.

Por agora nada mais digo sobre o assumpto d'esta representação, limitando-me a pedir á camara, que ella seja publicada no Diario do governo, e a V. ex.ª peço tambem, que depois tenha a bondade de a remetter ás illustres commissões de legislação civil e de administração publica.

O sr. Barros e Cunha (para um requerimento): — Pedia a V. ex.ª que, se fosse possivel, se entrasse já na discussão, mesmo antes da lei de receita, que é a ordem do dia, de um pequeno projecto de lei que ficou pendente da sessão passada, e que V. ex.ª já teve a bondade, a pedido meu, de dar para ordem do dia, de accordo com o sr. ministro das obras publicas, desde 21 do mez passado.

O sr. Presidente: — Qual projecto é?

O sr. Barros e Cunha: — É o projecto n.º 152, que diz respeito á viação publica na provincia do Algarve.

Consultada a camara, relativamente ao requerimento do sr. Barros e Cunha, foi logo approvado.

O sr. Ministro do Reino (Rodrigues Sampaio): — Mando para a mesa uma proposta de lei.

É a seguinte:

Proposta de lei n.º 39-0 Senhores. — O governo apresentou á camara dos senhores deputados, na sessão do anno proximo passado, uma proposta creando dezoito logares de amanuenses para os commissariados de policia civil da cidade de Lisboa; proposta que não chegou a ser convertida em lei, por se haverem encerrado as camaras sem que tivesse sido discutida na dos dignos pares do reino: a necessidade, porém, de prover aquelles logares, era urgentissima, por isso que, estando occupados no serviço do expediente dos mesmos commissariados um numero relativamente grande, de guardas, resultava d'ahi serem elles distrahidos do serviço de policia.

Os repetidos clamores da imprensa contra a falta de mantenedores da ordem, cujo numero na verdade rareava nas ruas da capital, e as reiteradas representações do governador civil do districto de Lisboa, compelliram o governo a nomear desde logo os individuos que deviam substituir nos referidos logares de amanuenses os guardas que tinham de passar a desempenhar o serviço que lhes competia.

Não estava o governo auctorisado para satisfazer a despeza que provinha da nomeação dos dezoito mencionados amanuenses, cujos vencimentos no exercicio de 1874-1875 importaram em 2:823$600 réis, e nos mezes que decorreram desde julho de 1875 até fim de janeiro proximo

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findo em 2:310(51600 réis, visto que a alludida proposta só agora teve a sancção legislativa por carta de lei de 27 do referido mez de janeiro.

Sendo portanto indispensavel legalisar as quantias acima designadas, e que foram despendidas com o serviço de que se trata, tenho a honra de submetter á vossa approvação a seguinte proposta de lei:

Artigo 1.° E legalisada a despeza já feita com o vencimento dos amanuenses dos commissariados de policia civil da cidade de Lisboa, na importancia de 5:134$200 réis, sendo 2:823$600 réis pertencentes ao exercicio de 1874-1875, e 2:310$600 réis despendidos desde 1 de julho de 1875 até 31 de janeiro de 1876.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Ministerio dos negocios do reino, em 3 de março de 1816. = Antonio Rodrigues Sampaio.

Foi enviado á respectiva commissão.

ORDEM DO DIA Leu-se na mesa e entrou em discussão o seguinte

Projecto de lei n.º 162 Senhores. — A vossa commissão de obras publicas examinou a proposta de renovação de iniciativa do projecto de lei da sessão de 19 de junho de 1867 do sr. deputado Francisco de Almeida Coelho de Bivar, apresentada em sessão de 12 de janeiro do corrente anno pelos srs. deputados Luiz Bivar, Marçal Pacheco e Palma, bem como o projecto de iniciativa do sr. deputado Barros e Cunha, apresentado na sessão de 11 de janeiro ultimo.

O primeiro d'estes projectos tem por fim fazer com que a estrada real transversal n.º 78, denominada «estrada do litoral do Algarve», tenha o seu terminus em Villa do Bispo.

O segundo porém estipula que o terminus da estrada do litoral seja na praça de Sagres, e que a estrada real n.º 76 continue de Monchique a entroncar no Alemtejo no ponto mais conveniente do caminho de ferro de Beja a Faro.

Foram tambem presentes á vossa commissão tres representações da camara municipal da cidade de Lagos, apresentadas a esta camara pelos srs. deputados Barros e Cunha, Carrilho e Bivar na sessão de 15 de fevereiro ultimo, nas quaes aquella camara pede que a estrada do litoral do Algarve termine em Sagres, bem como outra da camara municipal da Villa do Bispo, apresentada pelo sr. deputado Luiz Bivar em sessão de 12 do mesmo mez, em que pede que a mesma estrada termine n'esta villa.

O primeiro d'estes projectos já teve parecer favoravel da respectiva commissão da camara dos senhores deputados na sessão de 1867.

A primeira parte do projecto do sr. Barros e Cunha refere-se ao mesmo fim, com a differença de, em vez de terminar a estrada n.º 78 em Villa do Bispo, terminar na praça de Sagres.

A vossa commissão, reconhecendo que a Villa do Bispo é a sede do concelho extremo do litoral do Algarve, e que só por lapso se poderia na lei de 15 de julho de 1862 considerar como terminus da estrada do litoral d'esta provincia a cidade de Lagos;

Considerando que a commissão de obras publicas da camara dos senhores deputados na sessão de 1867 foi de parecer, de accordo com o governo, que o terminus da estrada do litoral do Algarve devia ser considerado na Villa do Bispo para os effeitos da citada lei;

Considerando que a ampliação proposta pelo sr. deputado Barros e Cunha é de utilidade publica por pôr a praça e bahia de Sagres em communicação com a cidade de Lagos;

Considerando tambem de grande vantagem o prolongamento da estrada de Villa Nova de Portimão a Monchique até entroncar no Alemtejo com o caminho de ferro do Beja a Faro;

Tendo em attenção as representações das camaras municipaes de Lagos e Villa do Bispo:

É de parecer, de accordo com o governo, que os referidos projectos sejam convertidos no seguinte projecto de lei:

Artigo 1.º A estrada real transversal n.º 78 será considerada para os effeitos da carta de lei de 15 de julho de 1862 como tendo o seu limite na praça de Sagres, sendo ponto obrigado da mesma estrada a Villa do Bispo.

Art. 2.° A estrada real transversal n.º 76 será considerada para os effeitos da mesma lei como terminando n'um ponto que os estudos julgarem mais conveniente do caminho de Beja a Faro.

Art. 3.° Fica revogada a legislação em contrario.

Sala da commissão, 29 de março de 1875. = João Ferreira Braga = Antonio Maria Barreiros Arrobas = Antonio José d'Avila = Ricardo Julio Ferraz = Lourenço Antonio de Carvalho = Augusto Cesar Falcão da Fonseca = Hermenegildo Gomes da Palma, relator.

Foi approvado sem discussão na generalidade e especialidade.

O sr. Presidente: — Continua a discussão da lei de receita na especialidade.

Entrou em discussão o

Artigo 1.°

O sr. Visconde de Sieuve de Menezes: — Mando para a mesa uma proposta com respeito á compensação dos tabacos nas ilhas dos Açores, proposta que vae assignada por todos os deputados açorianos e da Madeira.

Não leio esta proposta nem a fundamento, porque a sua justiça é tal, que me dispensa de a sustentar.

Leu-se na mesa a seguinte:

Proposta

Considerando que a lei de 13 de maio de 1864, que estabeleceu a livre cultura do tabaco nos Açores e Madeira, mediante o pagamento de 70:000$000 réis annuaes para o estado, comprehende no seu espirito um certo contrato entre os povos d'aquellas ilhas e o governo para pagarem a differença que possa haver para aquella quantia de 70:000$000 réis, se não attingir a esta somma todo o rendimento proveniente do tabaco;

Considerando que este rendimento nos primeiros quatro annos desde 1865 a 1868 excedeu muito a cifra dos 70:000$000 réis, porque produziu em

1865................................ 106:009$302

1866................................ 74:453$523

1867................................ 75:399$100

1868................................ 74:136$059

329:997$984

Differença para os 70:000$000 réis n'estes quatro annos que pagaram a mais as ilhas, 49:997$984 réis.

Considerando que nos annos seguintes a 1868 este rendimento tem diminuido por motivos completamente estranhos á vontade d'aquelles povos, sendo muito importante estas differenças, porque o tabaco apenas produziu para o estado em

1869.................................. 59:984$455

1870................................. 60:0890$65

1871................................. 52:312$963

1872................................. 45:435$752

1873................................. 44:927$883

1874................................. 38:676$385

Considerando que os povos d'aquellas ilhas já pagaram como compensação do tabaco para o estado o seguinte:

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Percentagem Réis

em 1870 compensação de 1869 5,257 10:015$546

em 1871 compensação de 1870 5,202 9:910$935

em 1872 compensação de 1871 9,886 17:687$037

em 1873 compensação de 1872 13,073 24:564$248

em 1874 compensação de 1873 16,210 25:072$117

e propõe-se para 1875 compensação de 1874, percentagem de 20,252, ou 31:323$615 réis.

Considerando que desde 1869 a 1874 nunca se deduziu na divida de tabaco aquelles 49:997$984 réis, que os povos pagaram a mais desde 1865 a 1869, e que é de justiça fazer-se este encontro, ou compensação, porque as maiores entradas de tabaco nos primeiros annos certamente concorreram para os grandes depositos que obrigaram a menores entradas d'este genero nos annos seguintes e por consequencia á diminuição de rendimentos:

Propomos que a verba de receita 31:300$000 réis seja eliminada do orçamento, ou pelo menos modificada, tomando-se como base para essa modificação as differenças que os povos devem em 1874-1875 em relação com o que pegaram a mais dos 70:000$000 réis em 1865 e 1869.

Sala da camara dos deputados em 19 de fevereiro de 1876. = Visconde de Sieuve de Menezes = Pedro Roberto Dias da Silva — Henrique Ferreira de Paula Medeiros = Filippe de Carvalho = Manuel Maria de Mello e Simas = D. Luiz da Camara Leme = Pedro Jacomo Correia.

Foi admittida.

O sr. Presidente: — Como esta proposta está assignada por mais de sete srs. deputados, eu convido um dos signatarios a retirar a sua assignatura para que ella fique em harmonia com o regimento.

O sr. Ricardo Ferraz: — Eu retiro a minha assignatura.

O sr. Ministro da Fazenda (Serpa Pimentel): — Na sessão precedente o sr. deputado Mariano de Carvalho, respondendo a algumas observações que eu fizera, tendentes a mostrar que nos ultimos annos as receitas cobradas têem excedido sempre as receitas calculadas no orçamento, citou dois annos em que s. ex.ª diz que esse augmento não se realisou.

Um d'esses annos é o de 1873-1874. Com effeito nas contas do exercicio findo, com relação ao anno de 1873-1874, vê-se que as sommas cobradas excederam as avaliadas em 1.298:000$000 réis.

Mas s. ex.ª notou muito bem que, tirando as receitas extraordinarias, que não podiam deixar de tirar-se, ficava um deficit, ou antes ficava a cobrança inferior ás avaliações na importancia de duzentos e tantos contos. O que porém o illustre deputado não disse é que entre as receitas avaliadas figura um excesso de 636:000$000 réis de juros de titulos de divida na posse da fazenda, e que se não encontra nas cobranças.

E isto foi o resultado de se ter incluido nas avaliações a importancia de 1.580:000$000 réis que corresponde a 50.000:000$000 réis de inscripções que havia na posse da fazenda; e como depois se fez o emprestimo para a consolidação da divida, deixaram de apparecer na receita os juros d'estes titulos, assim como desappareceu na despeza o encargo da divida fluctuante.

Porém a respeito das receitas ordinarias do thesouro, dos impostos directos e indirectos, dos proprios nacionaes e dos rendimentos diversos, ainda n'aquelle anno se deu o facto do serem as receitas muito superiores á avaliação. O apparecer na somma das receitas ordinarias, na conta do exercicio de 1873-1874, um algarismo inferior ás avaliações é unicamente devido a esta verba de 630:000$000 réis de juros de titulos na posse da fazenda, que pela consolidação da divida fluctuante deixaram de o estar.

A respeito dos impostos directos e indirectos, dos proprios nacionaes e dos diversos rendimentos, repito, deu-se n'este anno, como nos outros, excesso de cobrança sobre as avaliações do orçamento, o que prova que aquellas avaliações não foram exageradas.

No exercicio anterior de 1872-1873 não fallou o illustre deputado, nem podia fallar de certo, por isso que o excesso da cobrança sobre as avaliações foi de 2.294:000$000 réis, e a subtrahirmos a receita extraordinaria de réis 685:000$000, ainda se vê que as cobranças excederam as avaliações em mais de 1.600:000$000 réis.

Não sei se o illustre deputado se referiu tambem ao anno de 1871-1872. N'esse anno as avaliações não são da responsabilidade d'este governo, nem são verdadeiramente da responsabilidade da administração anterior; as auctorisações foram reguladas pelo orçamento de 1867 porque durante alguns annos não se discutiu o orçamento, e ficou vigorando o d'aquelle anno. Portanto no primeiro anno da gerencia d'este governo 1871-1872 não ha responsabilidade para o governo do excesso das avaliações sobre a cobrança, se o houve.

No exercicio de 1872-1873 já mostrei que houve um grande excesso da cobrança sobre a avaliação. No anno de 1873-1874 não apparece esse excesso na somma total da cobrança, pelo motivo que apontei, de saírem da posse do thesouro alguns milhares de titulos de divida publica consolidada; mas o excesso verificou se effectivamente na importancia de mais de 400:000$000 réis na cobrança dos impostos e nos vencimentos ordinarios do thesouro.

Quanto ao anno de 1874-1875, este exercicio não está findo; entretanto nós já sabemos, pelas contas da gerencia, que a receita effectivamente cobrada foi de réis 26.476:0000000 e deduzindo a receita extraordinaria do 2.800:000$000 réis, ainda assim fica a cobrança da receita ordinaria na importancia de 23.600:000$000 réis. Ora do mappa que vem nas contas do thesouro relativo ao exercicio corrente, se vê que a avaliação da receita d'este anno é de 21.900:000$000 réis, numero redondo réis 22.000:000$000 réis. Logo temos um excesso que já se vê não ficará longe de 1.600:000$000 réis.

Por consequencia fica provado que o orçamento da receita não é calculado inexactamente; é calculado com toda a prudencia, de modo que se vê, pelos rendimentos dos ultimos tres annos economicos, que a receita cobrada tem effectivamente sido superior, e muito superior, ás receitas orçadas.

Pedi unicamente a palavra para fazer esta especie de rectificação, e provar que nos ultimos tres annos as cobranças têem excedido em centenares de contos as avaliações. E na verdade, sendo um facto innegavel que a receita de anno para anno tem subido 1.200:000$000, 1.300:000$000, 1.500:000$000 réis, muito mal calculadas deveriam ser as receitas para que não ficassem muito inferiores á cobrança effectiva.

Repito, pedi a palavra para fazer esta pequena rectificação, e não para tratar da proposta que acaba de ser mandada para a mesa por alguns srs. deputados das ilhas, por isso que essa proposta tem de ir á commissão e ha de ser aqui depois discutida.

O Julio Ferraz: — Como fui obrigado a retirar a minha assignatura da proposta que ha pouco foi mandada para a mesa, mando para, a mesa a seguinte proposta.

Leu-se na mesa a seguinte

Proposta

Proponho a eliminação da verba de recita de 31:000$000 réis, como compensação para o tabaco nas ilhas, pelos mesmos fundamentos da proposta mandada para a mesa pelos meus collegas dos Açores, cuja assignatura retirei por exceder o numero das assignaturas marcadas no regimento. = Ricardo Julio Ferraz.

Foi admittida.

O sr. Mariano de Carvalho: —... (O sr. deputado não restituiu o seu discurso a tempo de ser publicado n'este logar.)

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O sr. Ministro da Fazenda: — Estou completamente de accordo emquanto á apreciação que fez o illustre deputado de que, se em vez de terem augmentado as receitas, ellas tivessem diminuido, aconteceria que então as receitas cobradas seriam inferiores ás avaliações como ellas são feitas. Mas o que se conclue d'ahi? Calcula-se pelo seguro, mas segundo as probabilidades. O governo tem calculado assim e não se tem enganado. Os seus calculos ainda têem ficado muito abaixo da realidade, o que prova que calculou com prudencia.

Emquanto ás sommas que foram gastas com a compra de armamento, tiradas do cofre dos recrutas, o governo não illudiu o paiz, nem a camara.

O governo quando disse que empregava no armamento os 1.400:0000000 réis pertencentes ao cofre dos recrutas, não illudiu o paiz, porque todos sabiam que aquella importancia estava já gasta, e que portanto para se lhe dar aquella applicação seria necessario recorrer á divida fluctuante. E tanto menos tentação poderia ter o governo de occultar este facto, quanto é certo que foram os governos anteriores que applicaram o producto do cofre das remissões ás urgências do thesouro, e não os censuro por isso. Em epochas difficeis, encontrando dinheiro de graça, preferiram servir-se d'elle a levantarem uma somma igual, pagando os juros exorbitantes que então se pagavam pelas operações do thesouro.

Por agora nada mais tenho a dizer.

O sr. Mariano de Carvalho: —... (O sr. deputado não restituiu o seu discurso a tempo de ser publicado n'este logar.)

Não havendo mais ninguem inscripto foi approvado o artigo 1.°, sendo remettidas as propostas á commissão e em seguida approvado o artigo 2.º

Entrou em discussão o

Art. 3.º

O sr. Alves: — Mando para a mesa uma proposta ao artigo 3.° Não faço considerações sobre ella, porque confio em que a commissão a estudará, e em occasião opportuna direi quaes foram as rasões que tive para a apresentar.

Leu-se na mesa a seguinte

Proposta

Proponho que ao artigo 3.° da receita do estado, impostos indirectos, se acrescente o seguinte:

§ unico. A parte dos emolumentos da alfandega de consumo, que em conformidade do artigo 2.° do decreto de 23 de junho de 1870 constitua provisoriamente receita do estado, fica substituida por uma deducção definitiva de 10 por cento sobre o total dos mesmos emolumentos. = J. J. Alves.

Foi admittida, e em seguida approvado o artigo 3.°, sendo a proposta remettida á commissão. Entrou em discussão o Artigo 4.°

O sr. Barros e Cunha: — Mando para a mesa uma proposta addicional a este artigo, que é a seguinte:

«Artigo 4.°, § unico. Exceptua-se a contribuição predial ordinaria, extraordinaria e especial, fixada para o anno civil de 1875, e distribuida ao districto de Faro, ficando annullada na sua totalidade, em attenção ao sinistro que feriu áquelle districto.»

Fundei-me para apresentar esta proposta á consideração da camara e do governo, unicamente no relatorio que serviu de base ao gabinete para as providencias extraordinarias com que acudiu á crise que affectou profundamente, e continua ainda a affectar, a provincia do Algarve.

No relatorio apresentado pelo governador civil se diz que ha concelhos d'aquelle districto onde as colheitas foram completamente annulladas e perdidas pela estiagem; outros em que a producção foi affectada em mais de metade, e outros em tres quartos; mas emfim, se é certo que nem um só dos concelhos da provincia do Algarve deixou de soffrer profundamente, o que se não póde é, por parte do governo exigir ao contribuinte o pagamento do imposto a que o estado não tem direito.

E não se diga que ao contribuinte fica o direito de reclamação por sinistro, porque não será tal allegação attendida, em vista do regulamento de 7 de agosto de 1860, sem uma lei especial que assim o ordene, alem de que essa caducou.

E no que não ha duvida é que, se para os casos ordinarios e designados na ordenação, liv. IV, a reclamação por sinistro é na realidade garantia completa a cada cidadão, o regulamento citado e a pratica excluem a irregularidade da estação, e esta calamidade, que abraça uma provincia inteira, o governo não deve esperar que o contribuinte venha requerer para se ter com elle a contemplação e equidade a que todos os cidadãos d'este paiz têem direito.

Eu vi que se apresentou n'esta casa um projecto de lei para que se diminuísse pequena parte da contribuição. Eu não teria duvida em o approvar, se antecipadamente o governo me não tivesse habilitado a propôr a annullação total. Em caso algum, porém, faria tal proposta sem que estivesse bem seguro que ella não importaria o privar os contribuintes de obterem a annullação da totalidade da contribuição a que lêem direito.

Parece-me, porém, que depois dos factos que se têem passado, e das explicações que o governo deu n'esta casa, e que alguns deputados agradeceram como favor subido, votar a camara que continue a cobrar-se os impostos que dizem respeito á producção agricola que o governo reconhece que se perdeu, é uma grande iniquidade.

Não me confessarei eu, que não tenho outros interesses no Algarve senão os dos eleitores, nem reconhecido nem grato a favores apparentes e nominaes, e entre o arbitrio de adoptar uma medida que póde de certo modo prejudicar os interesses do estado ou uma medida que póde affectar os interesses do contribuinte, prefiro provocar uma disposição legal que prejudique antes o thesouro do que os particulares, que já estão sufficientemente affectados pelas desgraças de que foram victimas.

E não me parece que, depois da declaração feita pelo illustre ministro, de que as circumstancias e a prosperidade do thesouro publico são tão lisongeiras que habilitam o governo mesmo a fazer propostas de importantissimos emprestimos de milhares e milhares de contos de réis, se deva regatear com aquelles infelizes contribuintes.

Parece-me portanto rasoavel a proposta que submetto á apreciação da camara e do governo, e a respeito da qual espero que a camara decidirá na sua imparcialidade como eu proponho e considero justo.

(Interrupção.)

Talvez sim, que obedeça a um sentimento de gratidão pessoal que, não pelos interesses mas pela convivencia que tenho tido com os habitantes do Algarve, dedico, é verdade, a todos n'aquella provincia a sympathia que póde ser que me deixe arrastar por sentimento a mais do que devo pelos dictames que deveria observar como legislador frio.

A camara e o governo sabem que eu tenho o defeito de ser um pouco enthusiasta, defeito de que desejo muito corrigir-me, mas já agora quasi que perdi a esperança de poder chegar á perfeição que porventura me fosse requerida para exercer como devo as minhas funcções de deputado, e até para não dar talvez mais do que devo da minha propria vida aos negocios que se discutem n'esta casa.

Mas o que digo ao illustre ministro é que, ou o governo não devia ter tomado as medidas que tomou ácerca da provincia do Algarve, e ter dado a importancia que deu ao relatorio do governador civil do districto a que já me referi, ou, para ser coherente, deve necessariamente adoptar a excepção que proponho.

Eu tive a honra de me dirigir ao sr. ministro da fazenda dias depois de se encerrar o parlamento no anno

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passado, e quando ainda não se podia cobrar nem era exigivel a contribuição do anno de 1875, pedindo a s. ex.ª que fizesse aquelles infelizes a graça de mandar suspender as execuções que estivessem em andamento para a fazenda haver o imposto dos annos anteriores.

O sr. Ministro da Fazenda — É verdade.

O Orador: — O sr. ministro respondeu-me, e respondeu-me muito bem, que não podia fazer isso, porque seria nem mais nem menos do que suspender processos, o que estava inteiramente fóra das suas attribuições.

O sr. Ministro da Fazenda — Apoiado.

O Orador: — Resignei-me então, mas hoje o poder legislativo e o governo têem o direito de remediar por lei este caso gravissimo, que não espero que nenhum dos srs. ministros ouse pôr em duvida, e do qual não receio que tentem diminuir a importancia.

Sr. Presidente, resolva a camara este negocio como entender, mas não enganemos ninguem.

Não desejo tornar a tomar a palavra, e devia ter respondido logo ás considerações com que o sr. ministro da fazenda fez a honra de refutar as minhas apreciações ácerca da administração da fazenda publica, porque póde dizer-se que a minha hypothese foi mais essa do que pôr em duvida especialmente o progresso e vantagem que tem tido a contabilidade publica entre nós ha annos a esta parte.

Mas o sr. ministro usou do expediente que já referi á camara, que tem sido adoptado por esta situação, de transformar as questões mais incolores e mais innocentes em questões politicas!

S. ex.ª attribuiu-me que tinha apresentado á camara, como unico remedio para se chegar á ultima perfeição das nossas finanças, a revolução! Eu disse apenas que, se continuássemos por este declive, teria a revolução de vir dar remedio ao desgoverno e ás consequencias que d'elle deviam dimanar. Isto não devia ser novo para o nobre ministro, não era a primeira vez que este facto succedia entre nós, como não é a primeira vez, nem será talvez a ultima, que estes casos se repitam em muitas nações da Europa.

Não basta dizer-se que a esta minha asserção responde a prosperidade publica e a elevação no preço dos nossos fundos. (Apoiados.) Elevados estiveram os fundos em França, e em muitas outras nações têem estado em preços elevados. Os paizes apresentam-se descuidados e satisfeitos, e os illustres ministros sabem que, quando menos se espera, calamidade muito séria, isto é, a revolução, vem dar remedio aquillo que os governos, pela reflexão e cuidado, e a representações legaes e constitucionaes dos paizes, deviam ter muito antecipadamente previsto e remediado. Mas se por acaso for conveniente ao illustre ministro attribuir-me essa phrase, e precisa de declaração assignada por mim, não tenho duvida em dar-lh'a.

Não ha duvida nenhuma que os documentos publicos, que hoje estão ao alcance dos membros do parlamento, são muito mais perfeitos e bem confeccionados do que eram antigamente, nem pretendo de modo algum atacar pessoalmente o sr. ministro nem o sr. relator da commissão, quando eu considero ha muito tempo que este defeito está mais no systema do que no modo de confeccionar estes documentos. E ao relator da commissão, o sr. deputado por Tavira, Antonio Maria Pereira Carrilho, devo eu muito no que sei ácerca da nossa contabilidade publica dos tempos mais obscuros.

Quando tive necessidade de examinar n'uma certa epocha o estado em que se achava a fazenda publica, o illustre deputado que se senta á minha esquerda, o sr. Carrilho, e o illustre deputado que se acha na extremidade d'esta bancada, o sr. Pedro Roberto, contribuiram tanto quanto foi possivel, e com o maior desvêlo e amisade para me ministrarem documentos e informações, de que, sem o seu auxilio, não poderia de certo ter conhecimento; porque ha no ministerio da fazenda e na nossa contabilidade antiga segredos que unicamente os illustres deputados sabem, e só elles me poderiam ter explicado, como o fizeram, habilitando-me depois d'isso para navegar e marchar pelas florestas invias da contabilidade publica, com a facilidade que de certo não poderia ter obtido de outra fórma.

Devo este testemunho de lealdade aos meus adversarios, não lh'o quero negar, porque não é esse o meu costume; não acho vantagem alguma em pôr em duvida o merecimento de qualquer individuo, ou seja elle membro d'esta camara ou não, ou da opposição ou da maioria; e declaro a V. ex.ª e á camara que lhes devo a maior gratidão pelo muito que me auxiliaram.

Não póde porém este preceito, que costumo observar e desejo observar imparcialmente para com todos, privar-me do cumprimento do dever que me é imposto pelo cargo de representante da classe popular; não póde isso, digo, inhi-bir-me do meu direito de investigar e fazer todas as diligencias para que estes documentos, se harmonisem tanto quanto é possivel com os interesses do paiz, sem olhar ás conveniencias momentâneas da situação que dirige os negocios publicos; e o que digo é que o governo sacrifica mais as conveniencias publicas, evitando os riscos que deve correr no serviço da sua patria, para servir os interesses do seu partido.

Isto foi o que disse, e é a este facciosismo partidario que unicamente as revoluções costumam pôr cobro. Os illustres ministros sabem-no perfeitamente, porque dois d'elles já militaram commigo na revolução.

Pretendeu o sr. ministro da fazenda corrigir a demonstração que eu tinha feito, de haver entre o deficit calculado e o deficit realisado uma prodigiosa differença; isto é, que tinha sido calculado em 1.287:000$000 réis, quando tinha havido na realidade um deficit na importancia do 6.180:000$000 réis.

Effectivamente eu não fiz senão o que sr..ministro da fazenda apresentou á camara, sommei e comparei, nem podia fazer outra cousa. Para isso não me soccorro senão aos documentos publicos.

O orçamento vinha calculado d'uma certa maneira, o resultado foi diverso, mas o sr. ministro da fazenda quer que eu acceite como receitas tudo aquillo que levantou para fazer face ao que o sr. ministro chamou despeza extraordinaria; mas isso na minha opinião é o que eu chamo fraude.

Portanto todas estas receitas, que não são provenientes dos verdadeiros rendimentos do thesouro, attenuam o deficit real, mas nem deixam de ser emprestimos, nem, calculada a receita ordinaria com a despeza ordinaria, o deficit é maior nem menor do que a quantia designada no calculo no orçamento, ou realisado nas contas do thesouro.

Sei que para o attenuar o sr. ministro podia vender inscripções, ou recorrer a algum outro meio, para fazer face ás despezas.

Podia vender as obrigações para applicar o seu producto ao caminho de ferro do Douro e Minho.

Podia vender titulos de divida publica; tinha letras do thesouro pagáveis em certo e determinado praso, ou outra qualquer medida; mas o que não ha duvida alguma, é que esses recursos extraordinarios são recursos de credito, que servem para occorrer ao deficit real.

O que não ha duvida nenhuma é que o sr. ministro não chama deficit senão aquillo que fica a descoberto depois de lançar mão d'estes recursos extraordinarios para poder fazer face ás despezas; mas eu chamo deficit a tudo, porque todas essas sommas provenientes d'aquelles recursos se hão de reembolsar.

Eu agradeço ao illustre ministro a benevolencia, ou condescendencia com que s. ex.ª acceitou uma reflexão que fiz unicamente para adoptar na contabilidade publica um systema uniforme; e a reflexão que lhe fiz ácerca do modo de descrever as verbas com que os bancos contribuem

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para o pagamento das classes inactivas; que essa verba podia tambem lançar-se na receita não de impostos, mas de outra proveniencia.

E peço licença tambem para dizer, que não seria mau, quando se faz o orçamento, como quando se fazem as contas, descrever ao mesmo tempo a importancia d'esta verba de divida

Em conclusão, quanta mais clareza melhor. Não ha duvida que podemos chegar a melhor perfeição n'este documento, que considero da maior importancia para que o paiz tome a serio o fiscalise a sua despeza, para ver e conhecer por que preço compra as condições de civilisação a que tem direito de chegar.

E não é de certo pondo de parte as leis de instrucção primaria, a reforma administrativa, a reforma dos impostos, e as reformas politicas, e, emfim, tudo que é necessario tornar praticável para a vida de uma nação, digo, não é adiando o preenchimento e satisfação d'estas necessidades, que os srs. ministros fazem os serviços que o paiz tem direito a exigir da missão que lhes está encarregada.

Não digo isto para molestar ou ferir o governo; digo unicamente porque é necessario dar ao paiz idéa definida e clara d'aquillo que elle tem a esperar da opposição, em frente da attitude que o governo actual tem tomado.

Effectivamente, de dia para dia, vae diminuindo a grande distancia que havia entre a receita e a despeza, e é provavel que em epocha proxima se chegue a equilibrar os rendimentos publicos com os gastos nacionaes; mas eu não sei qual é a rasão porque não havemos de fazer alguma cousa para transformar em realidade o que por ora não é senão aspiração muito remota, e era isso o que esperava do illustre ministro da fazenda.

A situação não é má. Mas porque a situação não é má, não póde ser boa e não póde ser ao mesmo tempo legal? E necessario que a situação seja má, illegal e que se chame legal a tudo quanto vae em despezas extravagantes que se afastam do que considero necessidades impreteriveis da administração publica? (Apoiados.)

O illustre ministro tambem adoptou o systema de argumentação que se tem adoptado n'esta casa: para se defender de momento das accusações que se fazem, argumenta com os defeitos dos partidos e com as faltas das administrações anteriores.

Este systema é mau, muito mau, é detestavel. (Apoiados.) Não sei se por acaso pratico alguma vez o que n'este momento estou a classificar como grande defeito e inconveniencia, se o faço não é senão quando sou provocado.

Quando me provocam, não resisto muitas vezes a ir acobertar-me com o exemplo das auctoridades que me fazem censura, e só n'esse caso, o que se não deu com o illustre ministro, se tornaria desculpavel este modo de argumentar.

O illustre ministro da fazenda disse-me: «que se nós voltássemos para traz e se adoptassemos outra fórma de agrupar tanto os rendimentos como as receitas publicas, chegaríamos a uma conclusão differente.»

E para isso, o illustre ministro referiu-se a 1860 e 1865, epocha em que o partido a que tenho a honra de pertencer, geriu os negocios publicos; e referiu s. ex.ª que n'essa epocha os orçamentos e receitas se elevavam arbitrariamente em 2.000:000$000 réis a mais do que era possivel imaginar, e que assim chegámos a ter um deficit real muito maior do que os deficits calculados. Não ha duvida a esse respeito, e não podia pôr em duvida similhante facto, visto que no folheto que corre impresso, e que o illustre minislro me fez a honra de ler, se encontram as minhas opiniões a este respeito o tudo quanto ha na nossa gerencia financeira nos ultimos annos até 1870.

O que porém não póde contestar-se é que foi o sr. Lobo d'Avila, ministro do partido historico, primeiramente, e depois o sr. Anselmo Braamcamp, quem apresentou e transformou em lei o regulamento de contabilidade, para cohibir e cortar este vicio.

E não se diga que todas as receitas que ha no paiz foram propostas pelo actual governo com resistencia dos partidos que estão d'este lado da camara, porque nós não militámos nunca ao lado dos 50:000 peticionarios.

Quando se propozeram aqui as leis tributarias, alguem levantou a bandeira da resistencia ao pagamento dos impostos; mas não foi o partido historico. Em qualquer partido dos mais liberaes ha sempre uma parte que deseja caminhar mais, e outra que deseja caminhar menos; mas os actos officiaes d'esse partido affirmam os seus chefes.

Eu estava n'essa epocha ao lado dos srs. Andrade Corvo e Casal Ribeiro, redigindo um jornal que se chamava a Civilisação; mas não trato da minha pessoa.

O sr. duque de Loulé, que foi chamado para formar o ministerio que substituiu o gabinete demissionário, apresentando-se n'esta casa á frente d'esse ministerio disse — nós vamos seguir a politica dos nossos antecessores; o caminho é patente; segui-lo é facil, parar é morrer. Esta é a politica do partido historico. Não fizemos nunca resistencia ao pagamento dos impostos. O sr. duque de Loulé dirigiu-se aquelles que tinham idéas exageradas, com mão robusta rasgou a bandeira dos 50:000 peticionarios e o partido historico fez executar as medidas que o gabinete demissionário, iate é, o partido regenerador, não tinha podido converter em lei. Por consequencia, o partido historico não é um partido revolucionario, nem partido que resista ao pagamento dos' impostos; é um partido que deseja obtemperar e seguir quanto é possivel as faculdades tributarias do paiz sem se aventurar a commettimentos grandiosos e de nenhum modo justificados.

Nos relatorios da India ingleza, que não são tão volumosos como os dos governadores das nossas provincias ultramarinas, nem precisam de ser modificados e corrigidos no ministerio da marinha, attribue-se principalmente á economia que se tem effectuado na sua administração desde que a India passou a ser governada pela nação ingleza em logar logar de o ser por uma companhia, o estar aquella vastissima e importante região coberta de linhas ferreas, de canaes e ter-se divulgado ali a instrucção publica.

E agora cabe tambem dizer, que no anno de 1861, a que o illustre ministro se referiu, na gerencia que então estava confiada ao sr. marquez d'Avila e de Bolama, se vendiam effectivamente inscripções.

Mas, o sr. ministro não póde deixar de reconhecer o seu relatorio, publicado com data de 4 de novembro de 1861, no qual se demonstra que estes meios de que o illustre estadista lançou mão eram para pagar os encargos das operações financeiras necessarias para occorrer aos compromissos dos caminhos de ferro, legados pelos seus antecessores.

Portanto já o governo vê que vieram a pesar sobre o partido historico os encargos legados pelo partido regenerador.

Não digo que esses encargos não sejam de todo o ponto justificados, digo sómente que é injusto accusar-nos por os nossos orçamentos ficarem sobrecarregados com encargos que pertenciam exclusivamente á responsabilidade do partido regenerador.

O primeiro advogado das economias era o sr. Antonio de Serpa. Aqui estão os seus discursos contra os actos do actual sr. presidente do conselho de ministros Fontes Pereira de Mello; e eu não sei como é que s. ex.ª ha de provar que as economias, que então eram boas, hoje são más.

Pois eu digo aos srs. ministros que deixem de fazer estradas? Eu digo lhes que parem nos melhoramentos publicos? Eu o que lhes digo é que façam estradas, mas que façam as estradas que poderem fazer, e não mais do que as que poderem fazer, sem pedirem ao paiz recursos ne-

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cessarios para isso, é isto o que lhes digo, e fique assim assentado de uma vez para sempre.

O sr. marquez d'Avila e de Bolama tinha feito um contrato com o Union Bank para vender nunca a menos de 44 por cento e 1 por cento de commissão dos fundos necessarios para occorrer ás obrigações a que tinha necessidade de satisfazer; e creio que não era uma má operação. Antes a considerei muito vantajosa. Devia o mesmo banco adiantar ao governo £ 100:000, 1/2 por cento acima ao juro ao Bank of England

Depois, quando entrou o sr. Lobo d'Avila, a reclamação dos banqueiros que desejavam ter o lucro dos emprestimos, foi que, por combinações do Stock exchange, tão severa, principalmente para impedirem as propostas mais vantajosas do Union Bank, o sr. Lobo d'Avila teve de fazer os emprestimos por intermedio dos banqueiros e com a usual publicidade, e direi que o melhor d'elles foi o que o sr. Lobo d'Avila, ministro do partido historico, realisou em 1863. Os fundos creio que estavam a 48, mas emittidos os d'essa operação a 48, subiram immediatamente a 50, pela primeira vez. (Apoiados.)

Vou pôr termo a estas considerações.

A camara deve saber que tenho como possivel e realisavel entre nós o systema representativo, tenho-o como o mais util, como o mais vantajoso de todos os governos. Mas é bom que contribua o governo para essa realidade, cumprindo irreprehensivelmente com os seus deveres constitucianaes; é bom que todos concorramos para não fazer perigar, correr risco, não comprometter mais alguma cousa do que as pastas e as cadeiras dos ministros.

O governo deve ser o governo da nação, e não deve ser o governo de um partido (apoiados); o governo não póde ser, não se póde transformar em governo de um partido (apoiados). E se isto é apoiado, para que é que n'esta casa todos os dias se pergunta, se uma questão, ainda a mais alheia á politica, se é ou não questão politica para decidir as votações? Eu já vi aqui, n'uma isenção de impostos, um illustre deputado da maioria levantar-se e perguntar ao sr. presidente do conselho, que então era ministro da fazenda — para saber como hei de votar, diga V. ex.ª se faz d'isto questão politica. Isto foi n'uma questão de isenção de impostos! Em parte alguma do mundo tal questão póde ser politica? Tal pergunta póde fazer-se?

Vejamos bem para onde caminhámos; não estejamos a illudir o paiz. Muitas outras nações têem estado em circumstancias tão... como aquellas em que se acha a nação portugueza, e esses governos, confiando quanto podiam confiar nas forças de que dispunham...

Não basta unicamente a força para manter indefinidamente a situação que se tem desacreditado, ou pelos seus actos, ou porque, em fim, a opinião publica está fatigada de lhes dar a sua indifferença e de os tolerar.

Temos entrado n'um caminho de arbitrariedades criminoso. Os illustres ministros não mandam metter a gente na cadeia, mas eu preferiria isso, porque chegavamos mais depressa, mais cedo a uma solução. (Riso.) Mas não se importam; estão cobertos pelo que elles chamam a representação legal do paiz, e que não é senão a representação illegal do governo; não ha meio nenhum de se tornar effectiva a responsabilidade em que os srs. ministros incorrem, porque sabem antecipadamente que a sua responsabilidade fica absolvida desde que se corre ao voto do parlamento. Gastam o que querem, como querem, desviam o dinheiro publico da sua devida applicação, da sua applicação legal; não se importam, não lhes dá cuidado, porque, dizem elles — em quanto tivermos o apoio da maioria estamos no nosso direito e podemos fazer o que nos aprouver; quando houver necessidade, quando tivermos exorbitado ficâmos absolvidos com um bill de indemnidade.

Foi assim que em toda a parte do mundo governos constitucionaes, muitas monarchias chegaram á sua completa e total ruina. E quando mr. Ossemer, passando o alfinete pela carta de París, fazendo grandes transformações n'aquella capital, toda a gente dizia: isto vae magnificamente; ha credito, na bolsa movem-se sommas enormes em operações em cada dia. E qual foi o resultado? O resultado foi o que teve a Hespanha e Napoles anteriormente a este. O que aconteceu foi que um governo que tinha muito mais força e credito do que nenhum, o mais popular que tem tido a França, o governo de Luiz Filippe, desappareceu de um momento para outro.

Por consequencia peço ao governo, porque ainda tem alguns dias de sessão diante de si, que trate do robustecer os seus actos, que trate de transformar em lei as propostas de grande interesse publico que foram aqui apresentados como norma da sua administração, e que jazem abandonadas nos tumulos das respectivas commissões; que trate de transformar isso em realidades, que trate de se robustecer e de governar, se póde, mas para utilidade publica e para utilidade da nação, para utilidade do povo portuguez, e não unicamente para se manter n'esses logares.

Tenho concluido.

Leu-se na mesa a seguinte

Proposta

Artigo 4.° § unico. Exceptua-se a contribuição predial ordinaria, extraordinaria e especial fixada para o anno civil de 1875, e distribuida ao districto de Faro, a qual fica annullada na sua totalidade em attenção ao sinistro que feriu aquelle districto. = Barros Cunha.

Foi admittida

O sr. Ministro da Fazenda: — Quando na sessão passada o sr. Barros e Cunha tinha dito que estavamos á porta do abysmo, e que só a revolução podia emendar os erros do governo, eu pedi a palavra e no que disse em resposta a s. ex.ª não quiz accusar o illustre deputado de ter ameaçado o governo com a revolução; eu não fiz mais do que referir-me ás suas palavras e aos seus argumentos, e direi agora tambem que não comprehendo os exemplos que nos citou das revoluções em França, a proposito do orçamento e da questão de fazenda.

As revoluções de 1830, de 1848 e 1870 tinham rasões muito conhecidas, que não foram devidas á irregularidade das finanças, que eram prosperas e bem administradas, sobretudo nas duas primeiras epochas. No tempo da restauração foram geridas pelos financeiros mais notaveis d'aquelle paiz, o barão de Louis, o conde de Corveto e o sr. de Villele, auctoridades reconhecidas e respeitaveis em materias de finanças. Não só n'aquelle paiz, mas em todos os paizes constitucionaes o estado de regularidade das finanças é devido á imitação das reformas feitas em França tudo no tempo do ministerio Villele. Em 1848 eram excellentes as finanças e não foram ellas a causa da revolução. As finanças do segundo imperio já senão podem comparar ás dos regimens precedentes, mas em todo o caso não foram ellas a causa da revolução de 1870.

Diz o illustre deputado que eu tenho o mau systema de argumentar com os defeitos dos meus antecessores, com os defeitos das administrações passadas. Parece me que o illustre deputado é injusto. Eu não argumentei com os defeitos dos meus antecessores; eu argumentei, e não, posso deixar de argumentar com a historia. Pois nós podemos examinar as finanças de hoje, sem fallarmos nas de hontem, avaliar o nosso estado financeiro actual sem o compararmos com o dos annos precedentes?

Mas o meu fim não foi, de modo nenhum, arguir as situações passadas; apontei os factos e mostrei que n'aquella epocha houve factos era relação às arguições que se faziam ao governo, que eram muito mais sujeitos aquellas arguições, e mostrei que nós não levávamos o paiz, como o illustre deputado disse, para a miseria e para o abysmo; assim como levaram aquelles ministros, apesar de terem praticado em muito mais larga escala os factos que o illustre deputado julga reprehensiveis.

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Mas diz o illustre deputado, arguindo-me de argumentar com os defeitos dos meus adversarios, que s. ex.ª tambem assim pratica quando é provocado, Ora eu pergunto, quem é que costuma aqui ser constantemente provocado, se são os illustres deputados da opposição, se é o governo?

Não argui o governo que geriu os negocios publicos desde 1860 a 1865. Disse que esse governo n'uma epocha de prosperidade financeira, tendo o producto dos impostos augmentado, tinha augmentado quasi na mesma proporção as despezas ordinarias. Isto é facto, não é uma arguição, e trouxe este facto para provar quanto mais lisonjeira é a situação financeira actual, em que tendo as receitas augmentado mais consideravelmente durante um periodo igual, as despezas augmentaram apenas metade d'esta somma. Ouço dizer que n'aquella epocha as despezas se aggravaram em consequencia dos caminhos de ferro. Não é exacto; refiro-me mesmo ás despezas ordinarias do ministerio, que nada tem com os caminhos de ferro.

O governo a que eu pertenci em 1859 e 1860 honra-se muito com o ter dotado o paiz com os caminhos de ferro do norte e de leste e com o de Evora e Beja, que foram votados e começados a construir em 1860. Mas não é ás despezas com os caminhos de ferro que eu me refiro, mas ás despezas ordinarias.

(Interrupção do sr. Luciano de Castro, que se não percebeu).

Pois tivemos de um e outro periodo as despezas da junta do credito publico que n'aquella epocha cresceram em virtude das emissões para construir os caminhos de ferro. E ainda assim na despeza ordinaria, e só n'essa despeza ordinaria dos ministerios se vê que o augmento foi muito maior, foi o dobro do que no periodo igual dos ultimos annos da actual administração.

Rectificarei tambem uma asserção que apresentei aqui na sessão passada e a que se deu uma interpretação menos exacta.

Quando eu disse que actualmente nós temos receitas ordinarias sufficientes para pagar as nossas despezas ordinarias, replicaram, mas ha despezas que no orçamento se chamam extraordinarias e que não têem nada de extraordinarias, como é a conservação de estradas e muitas outras. É verdade. Mas o que eu disse ou o que de certo queria dizer é que as nossas receitas ordinarias chegam hoje para pagar as despezas ordinarias e mesmo as que se chamam extraordinarias e que vem descriptas no orçamento. Repito, as nossas receitas ordinarias chegam para pagar as despezas ordinarias e mesmo as que são impropriamente chamadas extraordinarias e vem descriptas no orçamento.

Sr. presidente, disse o illustre deputado, e disse muito bem, que o governo não deve ser governo de um partido e sim governo de paiz. Completamente de accordo, e nós sustentamos que os nossos actos têem por fim a utilidade do paiz, e não a utilidade ou a conveniencia de um partido. Em questão de tolerancia e de não exclusivismo, o governo actual pede meças a todos os governos. (Muitos apoiados.)

Não quero alongar esta discussão. Estamos todos repetindo o que já temos dito.

Emquanto á proposta apresentada pelo sr. deputado pelo Algarve, é natural que o illustre deputado se interesse pelos seus constituintes; não posso agora fazer mais do que repetir o que já disse n'esta casa quando se apresentou uma proposta analoga. Essa proposta está na respectiva commissão, á qual vae tambem esta emenda, e quando vier o parecer teremos occasião de tratar d'esse negocio.

O que posso dizer é que o governo tem feito o que lhe tem sido possivel para melhorar as circumstancias difficeis d'aquella provincia (apoiados), que foi aggravada com uma grande calamidade.

Todos sabem que o governo, alem de soccorrer immediatamente as classes mais desgraçadas, aquellas que não têem senão o salario de cada dia, desenvolvendo as obras publicas, concedeu um adiantamento de sementes aos proprietarios.

Mas posso, alem d'isto, assegurar ao nobre deputado que já se tomou uma medida, que não é do dominio publico, porque ainda hontem foi assignado no ministerio a meu cargo o respectivo despacho — a prorogação do praso para as annullações por sinistros, que muito póde contribuir para aliviar os contribuintes do Algarve que mais tenham soffrido com a falta da producção agricola. Aquelles que não tiveram rendimento algum das suas terras podem conseguir a annullação das suas contribuições, e os que só tiveram uma parte poderão ver annullada a parte correspondente das suas collectas.

O sr. Barros e Cunha: — O governo considera necessarias e indispensaveis as rectificações. Desejo tambem contribuir, tanto quanto me seja possivel, para tornar bem clara a minha idéa.

Sei que é quasi commum o citar-se o dito de um celebre financeiro e estadista, o Barão de Louis: «Dae-me boa politica e dar-vos-hei boas finanças». Uma banalidade que não corresponde de modo algum á importancia que se lhe dá.

Eu, pelo contrario, direi: «Dai me boas finanças, e dir-vos-hei boa politica». E temos em portuguez um rifão muito mais mais conceituoso do que tudo quanto os estadistas e philosophos podem ter inventado: «Casa onde não ha pão, todos ralham e ninguem tem rasão». (Apoiados.)

Isto é muito mais verdadeiro do que nenhum dos outros.

Mas não citei ao illustre ministro, senão por incidente, que os desastres que tinham recaído sobre as differentes nações tinham por causa a sua desordem financeira. O que disse foi, se o illustre ministro apresentava um argumento de que tinha muito credito, de que as receitas cresciam, de que havia tranquillidade, para defender o seu orçamento e a sua utilidade no governo, que tratasse, pela sua parte, e por parte do poder executivo, de transformar em realidade as medidas que o governo tinha apresentado como indispensaveis para a governação publica, e que tinha abandonado, como tem abandonado, tanto quanto tem podido, a questão financeira.

Pois o crescimento das receitas, o desenvolvimento do commercio, deve-se ao governo?

Pois o governo quer attribuir a si, ás suas pessoas, á sua permanencia n'aquelles logares, o rendimento das alfandegas?

Isto não é verdade, nem os srs. ministros podem querer incorrer no ridiculo de apresentarem similhante asserção.

Então porque temos caminhos de ferro, porque temos aberto canaes, porque temos fabricas, é isto devido aos actuaes srs. ministros?

A grande questão é aproveitar as circumstancias e prosperidade que temos para converter tudo isso em utilidade commum; é só o que peço e nada mais.

Se podemos pagar, se ha riqueza, para que havemos de ter deficit, para que havemos todos os annos fingir no orçamento que não temos deficit, e nas contas do thesouro apresentar-se um deficit, para voltarmos ás mesmas circumstancias, que foram de tal gravidade, que nem sequer desejo recordar-me repetidas vezes d'ellas, porque tenho medo de me habituar á possibilidade de que tornem a apparecer outra vez, e espero ainda que a camara dos deputados, em muito curto espaço de tempo, se não n'esta sessão, ao menos na proxima, se convencerá de que não lhe é licito continuar inactiva diante das ameaças que temos, pelo crescimento indefinido da divida fluctuante, muito principalmente se os deputados tornarem a reunir-se n'esta casa para verem as contas futuras á vista das propostas que vejo pairar sobre o horisonte parlamentar.

Não sei se a citação de revolução veiu ou não para a

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discussão do orçamento. As revoluções não pedem conselho nem licença a ninguem para apparecerem; apparecem quando lhes convem, e ordinariamente aquellas que são mais serias não se annunciam com muita antecipação.

Os srs. ministros sabem perfeitamente que de um momento para o outro, de uma noite para uma madrugada, apparecemos em revolução, a qual não sei se se tinha annunciado.

De repente ouvi uma salva de artilheria no Castello da cidade, e perguntando o que havia, disseram-me que uma revolução tinha rebentado n'aquella madrugada, e que o ministerio estava demittido.

Pergunto se os elementos que serviram para fazer aquella revolução não poderão servir para fazer outra que convenha a certos individuos e a certos poderes? Um bello dia lembram-se de fazer uma revolução em outro sentido, e é bom acautelar-mo-nos emquanto é tempo; é prudente, e eu peço que me não obriguem a dizer mais do que aquillo que desejo dizer.

(Interrupção.)

Nós estamos ha muito tempo, desde 19 de maio de 1870, em um governo pessoal e illegal, isto é, em uma serie de conspirações e embuscadas mais ou menos encobertas, mais ou menos claras.

Todos nós sabemos isto, e estamos muito contentes julgando que o paiz não o sabe; acceitâmos este facto e estamos muito contentes, porque parece que o paiz não sabe. O paiz sabe-o perfeitamente; conhece-o tão bem como nós.

Voltemos ao Algarve, que é o meu principal interesse e o meu mais instante dever.

O illustre ministro poz em duvida que houvesse comarcas e circumscripções administrativas no districto de Faro, em que toda a colheita e lavoura tivesse sido annullada. Sobre este ponto, peço a s. ex.ª que tenha a bondade de ler o relatorio que está publicado a paginas 261 ater 265, e ahi verá que muitos d'estes concelhos perderam totalmente a colheita e não chegaram a ter a palha da semente que tinham lançado á terra. E para estes, pelo menos, se o illustre ministro não quer ir tão longe, peço-lhe que não tenha duvidas.

Não desejo, sr. presidente, praticar alguma offensa na distribuição da justiça, peço que seja adoptada a disposição que eu propuz.

Eu tenho que insistir em que seja adoptada a medida que me parece melhor.

O illustre ministro sabe a grande distancia em que se acham os contribuintes da sede da comarca e que deve tornar-se muito dispendioso e difficil o facto da reclamação. Eu peço que se tenha muito em vista este negocio. E não se preocupe o illustre ministro com os interesses dos empregados fiscaes, e de elles serem feridos se se adoptar a minha disposição; para isso o illustre ministro póde propôr remedio, o qual me promptifico desde já a apoiar se por acaso tiver necessidade, que não tem, d'este supporte que lhe offereço; o governo tem a camara toda á sua disposição; tem na camara apoio para tudo, assim muito mais o deve ter para uma medida d'esta ordem; sobretudo porque os sentimentos de humanidade de que são dotados os illustres deputados farão com que s. ex.ªs concordem commigo n'este ponto.

Não sei soprar o frio e o calor ao mesmo tempo. Não estou habilitado a isso. A provincia do Algarve soffre; a minha obrigação é promover, no seio da representação, tanto quanto é possivel, uma medida legislativa, ou todas as medidas legislativas conducentes a minorar o seu soffrimento; depois d'isto a responsabilidade é do governo e da camara, se acaso julgarem que o pedido ou a reclamação que lhe faço não deve ser attendida.

O sr. Ministro da Fazenda: — Pedi a palavra unicamente para dizer ao illustre deputado que acaba de fallar, não em relação ás suas considerações financeiras, mas em relação ás suas considerações politicas, que, quando s. ex.ª disse que estamos n'um governo pessoal, avançou uma proposição que não póde de maneira alguma demonstrar, e mesmo a que a camara não póde de nenhum modo assentir. (Apoiados.)

N'um paiz em que a imprensa é liberrima, n'um paiz em que a representação nacional está aqui a intervir nos negocios publicos, n'um paiz onde ultimamente a uma tem sido muitas vezes e livremente consultada, não se póde dizer assim que se está n'um governo pessoal. (Apoiados.)

Isto não indica que este governo é o melhor dos governos possiveis, porque a nação póde enganar-se, mas, repito, em vista d'estes factos não podemos ouvir dizer que estamos n'um governo pessoal (apoiados), sem protestar solemnemente contra similhante asserção.

O sr. Luciano de Castro: —... (O sr. deputado não restituiu o seu discurso a tempo de ser publicado n'este logar.)

O sr. Ministro da Fazenda: — Nós não temos systema representativo!!

Creio que não preciso adduzir argumentos para contradizer esta asserção; basta-me apontar para os illustres deputados. O que representam ss. ex.ªs n'esta camara? Não será a sua presença e os seus discursos uma prova de que temos systema representativo? Não foi a eleição que trouxe os illustres deputados a esta casa, em virtude d'esse systema? De certo que não foi o governo que os mandou eleger.

Eu não digo que todas as instituições não se possam aperfeiçoar, que o systema, aqui como era toda a parte, não esteja isento de todos os defeitos. O que sinto é que, quando o illustre deputado foi ministro no tivesse corrigido muitos d'estes defeitos.

E a respeito de dictaduras, não me parece que este governo seja d'aquelles que mais accusado deva ser de as ter praticado. (Apoiados.)

Este governo tem trazido á camara alguns projectos que ainda não foram discutidos, mas tem trazido muitos outros já convertidos em lei; porém em outros tempos não se fazia cousa alguma senão por dictadura. (Apoiados.)

Isto não era bom, fomo-nos aperfeiçoando, e creio que temos conseguido alguma cousa; não temos conseguido tudo; não se diga que não temos systema representativo!

Quando eu disse que a divida fluctuante, que o sr. deputado Pereira de Miranda tinha querido fixar, se referia só á representação da receita dentro do anno, não quiz dizer que havia outra divida fluctuante que não podia fixar se e que se referia a despezas illegaes; referia-me á despeza com os caminhos de ferro do Minho e Douro, V que supponho ser a despeza mais legal possivel, por isso que está votada por lei expressa. Mas as despezas com esta obra importante mostrei eu que em certos casos podem exigir temporariamente a creação de divida fluctuante, e aqui está um caso não previsto pela proposta do sr. Pereira de Miranda.

Todos sabem o que representa a actual divida fluctuante. Não representa despezas ordinarias. Representa réis 1.400:000$000 réis legalmente despendidos com a compra de material de guerra, representa mais de 700:000$000 réis, divida atrazada á junta do credito publico, que recebemos em herança das administrações passadas; representa 200:000$000 réis a 300:000$000 réis gastos a mais com estradas, alem da verba ordinaria proposta annualmente, e representa ainda as sommas gastas para acudir á fome da provincia do Algarve, para legalisação de cujas despezas o governo trouxe uma lei ás camaras. Eis-aqui as despezas illegaes e os esbanjamentos para os quaes a opposição diz que o governo quer a divida fluctuante.

O illustre deputado quiz refutar uma comparação que eu tinha feito, dizendo que a receita ordinaria dos ministerios não tinha crescido no periodo de 1860 a 1865 na importancia de 4.000:000$000 réis, mas unicamente em réis 1.000:000$000, porque o augmento dos 3.000:000$000

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réis era nos encargos da junta do credito publico, em resultado dos emprestimos para caminhos de ferro. Faça o calculo como quizer, exclua ou não exclua o augmento dos encargos da divida publica. Mas comparando os augmentos da despeza ordinaria ou só dos ministerios, ou d'estes e da junta n'aquelle periodo, e no periodo da gerencia do actual governo, ha de sempre encontrar que n'aquella epocha a despeza ordinaria e permanente cresceu muito mais do que no periodo actual.

O illustre deputado, na melhor boa fé de certo, foi tão exagerado nas suas apreciações, que até disso que o governo tinha feito divida fluctuante para as despezas extraordinarias de vinte annos. A paixão conduz a estas exagerações, que se refutam por si mesmas.

O sr. Barros e Cunha: — Levantei-me unicamente para dizer ao sr. ministro da fazenda e ao governo, que sustento a asserção que s. ex.ª me attribuiu e que eu proferi, de que o governo era pessoal.

Arranjem-se os illustres ministros como quizerem; mas desde que o governo não governa em conformidade com as leis, que despreza completamente todas as prescripções legaes, que se não apressa mesmo em dar contas ao parlamento dos actos illegaes que pratica, e que se contenta que uma votação ephemera venha apparentemente cobrir a sua responsabilidade, como tem acontecido em questões que se têem tratado n'esta casa, chamem a isto como quizerem: governo immoral, pessoal, corrupto, corruptor, porque foi assim sempre que classifiquei os actos praticados pelos governos que têem seguido este caminho.

Não sei se este governo é menos pessoal do que era em outros epochas; mas o que sei é que por menos do que isto já o illustre ministro que está n'aquelle lado (apontando para a esquerda) pediu a abdicação da Senhora D. Maria II. (Riso.) Pois o decreto de 10 de fevereiro de 1842, por que estivemos a batalhar annos e annos, é menos solemne do que o espirito do seculo, que o chefe do estado nos veiu prometter, e que está no archivo da commissão? Desde que todos estamos de accordo e desejamos fazer a reforma da carta, então é que o governo considera que não -é util nem opportuno faze-la!!

Não foi reconhecido já, desde o chefe do estado até ao ultimo representante do paiz, que era necessario pôr as nossas instituições em harmonia com o espirito do seculo?

Pois ha quatro annos que o espirito do seculo desappareceu! (Riso.)

A reforma administrativa não sei se era necessaria para honrar as gloriosas tradições da parochia; mas o que sei é que está completamente obliterada e esquecida ha quatro annos, estando plenamente no direito de ser honrada por voto da representação nacional na reforma do sr. ministro do reino.

Tenho pena de dizer estas cousas, mas fui accusado outro dia por ter lutado com o meu honrado collega o sr. Adriano Machado, que sinto não ver presente, pura evitar que passasse aqui uma lei de recrutamento que o sr. ministro do reino houve por bem revogar por uma portaria. Mas não foi esse o motivo principal dos meus esforços; lutei principalmente para que não passasse a indemnisação á companhia dos caminhos de ferro do norte e leste, que lhe dava oitenta e seis annos em logar de trinta e cinco.

Estive aqui a lutar, é verdade, com sacrificio meu para que se não votasse áquelle grandissimo escandalo (apoiados), e pelo orçamento do estado se mostra que os rendimentos do imposto de transito são ainda muito mau importantes do que aquillo que a opposição affirmava!

Mas nós que temos estado na frente d'este governo, inoffensivos, para lhe deixar realisar o programma que considerava necessidade indispensavel para a administração o boa gerencia dos negocios publicos: nós que desejamos contribuir e concorrer para a civilisação d'esta terra, vemos que ha cinco annos que tem esquecido as suas propostas mais importantes e não tem tempo de converter as suas idéas em realidade!

E havemos de tolerar aqui de braços cruzados que esta situação se prolongue e continue? Para que?

Para rasgar as leis?

Para comprometter as instituições?

Para que? Eu não sei se isto é normal e se isto é governo representativo. Eu chamo a este estado uma completa ficção do governo representativo (apoiados); chamo-lhe um sophisma completo, provado, o mais impudente, do governo representativo. (Apoiados.)

Não sei se é governo pessoal; sei que por uma insurreição militar passámos da legalidade, por tunneis que desconheço e sufficientemente obscuros, á situação em que nos achamos. E não julgo que as causas se tenham passado constitucionalmente. (Apoiados.)

Mesmo a substituição do ministerio presidido pelo sr. marquez d'Avila pelo ministerio actual, não me consta que fosse outra cousa senão um accordo clandestino completamente sonegado á acção parlamentar. (Apoiados.)

A transformação de uma sessão extraordinaria assim classificada nos documentos officiaes, em sessão ordinaria, não sei que possa ser considerada senão como um escarneo completo da soberania nacional. (Apoiados.)

Não sei que se lhe possa chamar outra cousa.

A camara votou que uma sessão declarada extraordinaria pelos documentos officiaes, era a mais ordinaria de todas as sessões para se livrar á tutela que o sr. marquez d'Avila exercia nos abusos e arbitrios que o governo lhe apraz de praticar. Está no pleno uso do seu direito; mas eu quero que ao menos me deixem a liberdade de classificar estes actos conforme entender e assumo toda a responsabilidade das minhas opiniões e das minhas palavras para todos os effeitos que aprouver ao poder legislativo, aos tribunaes ou á Camara dos deputados, conforme julgar mais conveniente. (Apoiados — Vozes: — Muito bem.)

O sr. Ministro da Fazenda: — Eu tinha pedido a palavra para protestar contra a asserção de que estamos em governo pessoal; mas desde o momento em que o illustre deputado declarou que a injuria não passava das pessoas dos ministros, apenas direi que estamos já no habito de ser injuriados.

O sr. Osorio de Vasconcellos: — O classificar os actos praticados por aquelles que são responsaveis por elles, não é atacar as instituições, antes pelo contrario é dar provas manifestas de que se respeitam essas instituições. (Apoiados.) Por isso mesmo que essas instituições são respeitaveis e respeitadas, é que convem que por parte dos seus executores não se pratiquem actos que são manifestamente hostis ás mesmas instituições, e que as vão minando na sua propria essencia (apoiados), actos emfim que merecem justamente a classificação que se lhes tem dado. (Apoiados.)

Nós não discutimos homens, não discutimos o chefe do estado, que temos obrigação de respeitar; discutimos actos, avaliámos as instituições. (Apoiados.)

Ora, sr. presidente, com todo o desassombro eu vou dizer duas palavras ácerca do assumpto.

Nós temos um governo constitucional, nós vivemos sob um systema parlamentar; o governo diz que acata cautelosamente todas as instituições politicas do paiz, e todavia por parte do governo não se levanta ninguem a mostrar como as accusações palpáveis e evidentes feitas pelo sr. Luciano de Castro não têem cabimento.

(Aparte do sr. ministro dos negocios estrangeiros.)

Ora essa?!... V. ex.ª póde pedir a palavra, e com o uso d'ella é que ha de responder; com esse áparte exclamativo é que não responde de certo, nada prova. (Muitos apoiados.)

(Aparte do sr. ministro dos negocios estrangeiros.) Não é só livro a exclamação, é livre tudo; tudo é liber-

Sessão de 4 de março

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DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

rimo, e a prova são exactamente os factos que nós temos increpado. É até livre a impenitencia! (Apoiados.)

S. ex.ªs, membros do governo, são tão livres nos actos que praticam, que não recuam perante tudo aquillo que se lhes afigura conveniente á propria causa, sem que se arreceiem do castigo. (Apoiados.) É constitucional tudo o que lhes é conveniente...

(Aparte do sr. ministro dos negocios estrangeiros.)

E conveniente ao paiz; está claro, clarissimo. Tudo que é conveniente ao governo, é conveniente ao paiz, e reciprocamente. Già era scritto. (Riso.)

Continuarei, dizendo a V. ex.ª que o meu intuito não é entrar n'este debate; só pedi a palavra quando o sr. ministro da fazenda disse que conhecia que as nossas instituições não eram absolutamente perfeitas, mas que estava na nossa mão o torna-las melhores por meios adequados, isto é, por meios constitucionaes, porque não quero conhecer outros

A opposição, Sr. presidente, tem sentido e lamentado que um dia seja talvez necessario empregar para este fim meios que não sejam puramente constitucionaes. (Apoiados.)

Por isso mesmo tambem eu pergunto ao governo qual é a rasão porque, tendo apresentado a reforma da carta ha quatro annos, a deixou dormir um tão largo e profundo somno no seio de uma commissão, que aliás já não existe. E, se o proprio sarcophago está desfeito, não admira muito que o cadaver desapparecesse. (Vozes: — Muito bem.)

O espirito do seculo reclamava instantemente ha quatro annos a reforma das nossas instituições; o espirito do seculo, tendo por interprete a voz respeitavel do respeitado chefe do estado, vinha ao seio da representação nacional e dizia: o codigo fundamental das nossas instituições politicas carece de uma reforma.

Ora, sr. presidente, se porventura nós não temos o systema parlamentar, se porventura, o paiz, em virtude do modo por que as cousas estão organisadas, ha de sempre eleger aquelles que lhe forem impostos pelo governo que estiver presente, se nós vivemos na contemplação admirativa da candidatura official, porque n'este paiz não ha outra cousa senão candidatura official (apoiados), se a eleição, sendo como. é a base do systema, não é senão a viciação: da vontade nacional, que não sabe nem póde manifestar-se, pergunto eu qual é a rasão porque os srs. ministros, sendo, como dizem que são, sacerdotes do verdadeiro systema constitucional, não acceitaram, depois de a terem promovido, a reforma da carta constitucional? (Apoiados.)

A contradicção não póde ser mais clara e manifesta. (Apoiados.)

Eu quiz apenas levantar este protesto sem pretender offender quem quer que seja, nem homens nem instituições. A mim compete-me respeitar tudo que é respeitavel, mas entendi que era do meu dever, da minha consciencia acompanhar os srs. deputados, e mostrar que infelizmente n'este paiz o systema parlamentar é uma ficção.

O remedio é urgente, e é necessario que se applique quanto antes.

Vozes: — Muito bem.

Foi approvado o artigo 5.°, e em seguida foram approdos sem discussão todos os mais artigos do projecto.

Entrou em discussão o mappa da receita do estado para o exercicio de 1876-1877, e foi approvado em todos os seus artigos sem discussão.

O sr. Carrilho: — Mando para a mesa um parecer da commissão de fazenda.

O sr. Presidente: — A ordem do dia para segunda feira é a continuação da de hoje e mais o parecer n.º 29, relativo á eleição de Angola, e o projecto n.º 36.

Está levantada a sessão.

Eram cinco horas e um quarto da tarde.

PARECERES

N.° 40-E

A vossa commissão de marinha tendo examinado o requerimento em que os aspirantes a facultativos da armada e do ultramar, pedem para ser igualados em vencimentos e honras aos guardas marinhas, allegando as difficuldades do seu curso e as despezas de alimentação e matriculas; e tendo tambem considerado devidamente a informação que a respeito de tal requerimento é dada pelo ministerio da marinha, em officio de 23 de março de 1875, na qual se pondera a pouca rasão que assiste aos requerentes no parallelo que pretendem estabelecer entre si e os aspirantes a officiaes combatentes; porque estes ultimos só são promovidos a guardas marinhas, quando completam o curso, e não durante elle como desejam os aspirantes a facultativos; e mostrando mais, como são já grandes as vantagens que o estado concede aos aspirantes a facultativos e que perigoso seria para a disciplina e boa ordem do serviço dar-lhes divisa de officiaes e honras correspondentes, quando por lei são obrigados a ir servir no corpo de marinheiros, caso não completem os estudos e tenham prejudicado o estado com a perda dos subsidios concedidos; conformando-se plenamente com tão valiosas rasões, é de parecer que não tem logar a pretensão dos supplicantes.

Sala das sessões da camara dos senhores deputados, 2 demarco de 1876. = Z). Luiz da Camara Leme = Joaquim José Alves — Joaquim José Gonçalves de Matos Correia = José Frederico Pereira da Costa = Carlos Testa = Carlos Eugenio Correia da Silva, relator.

N.° 40-F

Senhores. —: A vossa commissão de marinha, tendo attentamente examinado os requerimentos dirigidos a esta camara em 10 de dezembro de 1870, 18 de março de 1871, e 18 de janeiro de 1875, por Francisco Pedro, ex guardião da armada, requerimentos em que se queixa de ter sido injustamente exonerado do seu cargo e despedido do serviço por portaria do ministerio da marinha de 6 de abril de 1870, e pede para ser reintegrado no posto de guardião em attenção a bons e longos serviços, e a não ter dado motivo para tal demissão; vendo tambem a copia do officio da secretaria do commando geral da armada em data de 2 de abril de 1870, declarando o dito Francisco Pedro absolutamente incapaz de exercer o posto de guardião, pela sua completa ignorancia da arte de marinheiro e provada inhabilidade, officio este em que se fundamentou a portaria de demissão, segundo informou o ministerio da marinha, ao qual em tempos foram por esta camara pedidos esclarecimentos; é de parecer que, não deve esta Camara por lei especial mandar reintegrar o supplicante no posto de guardião da armada, mas que sejam os seus requerimentos remettidos ao governo para que os tome na consideração que entender.

Sala das sessões da camara dos senhores deputados, 2 de março de 1876. = D. Luiz da Camara Leme = Joaquim José Gonçalves de Matos Correia — Joaquim José Alves = José Frederico Pereira da Costa = Carlos Testa = Carlos Eugenio Correia da Silva, relator.

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