SESSÃO BE 6 DE MARÇO DE 1888 693
Com respeito ao ministerio das obras publicas, o que se tem feito ali?
O sr. José Luciano de Castro, no discurso que pronunciou sobre este debate, disse que d'este lado da camara só se fallava na reforma da engenheria, e que se admirava que não faltássemos de outros assumptos relativos á pasta das obras publicas.
O br. Luciano de Castro, com esta observação, parece admittir implicitamente que a, reforma da engenheria representa um grande erro de administração.
Se a considerasse bem feita, de certo nos mostraria as excellencias d'ella e não nos chamaria a attencão para outras obras importantes da mesma pasta.
Nós não fallamos das medidas do ministerio das obras publicas, porque sobre muitas d'ellas estão annunciadas interpellações particulares, e não se podem discutir na resposta ao discurso da corôa.
Quando essas interpellações forem dadas para ordem do dia, a opposição saberá cumprir o seu dever, emittindo aqui com desassombro os resultados das suas investigações.
No ministerio dos negocios estrangeiros o facto mais saliente é a concordata com a Santa Sé sobre o nosso padroado no oriente. Não discutirei agora se o sr. ministro dirigiu bem ou mal as negociações diplomaticas sobre o assumpto.
Sómente estranharei que, vindo ultimamente de Ceylão uma representação de 2:041 chefes de familia a pedir para ficarem debaixo do nosso padroado, o governo não tivesse consentido que se enviasse ao Summo Pontifico essa representação, como propunha o digno par o sr. Thomás Ribeiro.
Se o cardeal Rampolla affirmára que em Ceylão só 7 chefes do familia protestavam contra a concordata, porque não se havia de remetter para Roma um documento que provava o contrario? O Papa, que attendesse ou não os christãos reclamantes, mas que ao menos estes não podessem dizer com verdade que as camaras portuguezas não tinham feito caso das suas supplicas.
O procedimento da camara dos dignos pares, rejeitando a moção do sr. Thomás Ribeiro para ser agradavel ao sr. ministro dos negocios estrangeiros, não é digno de louvor. Como muito bem notou um jornal ministerial, os nossos governos, quando negoceiam com quaesquer potencias, tomam uma attitude demasiada humilde e tolerante, receiosos sempre do levantar conflictos.
Não me parece isto de boa politica.
D'este exame rapido feito sobre as principaes medidas do governo, parece-me poder concluir se que não ha motivo para que o povo lhe esteja agradecido, visto que os impostos lançados foram empregados no desdobramento dos quadros do funccionalismo e em obras de questionavel utilidade e economia. Pelo contrario, o povo tem justificado motivo para odiar o ministerio, e tem já dado exuberantes provas dos seus sentimentos de indignação.
E, apesar de tudo, o governo teima em ficar!!
Com que fundamento? Com o fundamento no cumprimento do seu dever, diz o sr. presidente do conselho. Do seu dever?! Os progressistas foram sempre cumpridores dos seus deveres! .. Quando em 1879 levantaram a campanha, não só contra o partido regenerador, mas até contra a corôa, insultando o monarcha e querendo pôr escriptos no palacio da Ajuda, serviam-se de todos os recursos para subir ao poder, a fim de dotarem o paiz com a mais larga descentralisação, com a maior liberdade e com a mais economica e moral administração. Chegados lá, quando toda a gente esperava que cumprissem o seu dever, executando o seu programma de opposição, nada fizeram em beneficio do paiz, e cairam vinte e dois mezes depois, rasgando uma a uma as paginas d'esse programma. (Apoiados.)
Quando novamente, subiram ao poder, para cumprir o seu dever, o que fizeram? Elles, que não tinham discutido n'esta casa as reformas constitucionaes propostas pelos regeneradores, porque as achavam acanhadas e insignificantes, e que promettiam, logo que chegassem ao poder, fazer novas reformas politicos, de tal cousa não cuidaram, occupando-se apenas em desenvolver os quadros do funccionalismo. (Apoiados.)
Era este o seu dever patriotico e civico, pelo qual a patria se ha de confessar sempre agradecida. (Apoiados.)
O governo, permanecendo no poder, satisfaz somente um dever meramente egoista. Lucta pela vida, porque sabe que, quando caia, com elle se esphacela todo o partido; e, como quer existir por mais algum tempo, agarra-se ás cadeiras do poder, como um escalracho, e só de lá sairá quando vier um 19 do maio, como disse o sr. Marçal Pacheco, ou uma revolução. (Apoiados) O ministerio não quer sair d'aquellas cadeiras; mas, felizmente, e natural que alguem, vendo que isto não é governo, que não é mais do que o estrebuchar n'uma agonia lenta, lhe applique o golpe de misericordia.
Sr. presidente, vou tratar, em ultimo logar, de uma questão, para mim muito importante, e que já foi aqui levantada hontem pelo sr. Consiglieri Pedroso.
Quando s. exa. fallou das incompatibilidades parlamentares, eu applaudi-o vivamente, porque entendo que é do toda a urgencia a promulgação de uma lei sobre esse assumpto. (Apoiados.)
N'este ponto nada mais faço que sustentar as doutrinas de um homem publico, a cujo partido tenho a honra de pertencer, o sr. Vaz Preto.
No seu ultimo discurso, proferido na outra casa do parlamento, dizia s. ex.ª:
«Eu lembro-me, sr. presidente, e com saudade, do um digno par que já não existe, e cujas opiniões de seriedade, e de moralidade tinham n'esta occasião muito cabimento.
A constancia d'aquelle nobre caracter para a realisação das suas idéas revela a força da sua convicção. O par de que eu me lembro com saudade era o sr. visconde de Fonte Arcada, e vejo agora quanta rasão elle tinha em ser tão tenaz em certos principios.
«Elle queria uma lei de incompatibilidades parlamentares; eu julgo essa lei hoje uma necessidade urgente o impraterivel.
«Sr. presidente, eu, posto que não me lembro, quando discuto, se este ou aquelle ministro é director de .uma ou outra companhia, não posso deixar de concordar que só não póde ser bom ministro e bom administrador de emprezas particulares a um tempo, pois que os interesses do estado são contrarios aos d'essas emprezas.
«O estado quer obras feitas com economia e as que devam ser; e os empreiteiros querem muitos metros correntes a construir e bem pagos. Uma outra vantagem ha ainda com esta lei: havendo uma lei de incompatibilidades, não teriam logar essas suspeições que aviltam o parlamento e enlameiam o caracter dos homens publicos da todos os partidos. É necessario sair d'este lodaçal quanto antes. A lei de incompatibilidades ainda póde servir de dique por algum tempo a esta torrente caudal que ameaça tudo submergir.»
Effectivamente é urgentissima uma lei sobre incompatibilidades parlamentares. (Apoiados.)
O sr. Consiglieri Pedroso referiu-se hontem, n'esta casa á eleição do sr. presidente do conselho para governador do banco de credito predial. O sr. presidente do conselho, respondendo a essa accusação, disse que, se tinha acceitado esse cargo, foi porque o sr. Fortes tambem o tinha desempenhado. É preciso notar que o parallelo não é perfeito. O sr. Fontes fazia já parte do banco de credito predial como vice-governador; e quando foi nomeado governador não estava no ministerio emquanto que o sr. presidente do conselho foi nomeado governador quando não