694 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS
pertencia, creio em, áquelle banco, e sendo presidente do conselho. (Apoiados.)
Disse mais s. exa. que não tinha pedido votos para a sua eleição.
Mas nada importa isso, porque toda a gente sabe que são os amigos que fazem estas eleições, sem ser necessaria a nossa intervenção. O que é certo, porém, é que o sr. José Luciano foi eleito governador do banco por ser presidente do conselho.
Disse ainda s. exa. que era incapaz do atraiçoar os interesses do estado para favorecer companhias.
Nós não collocâmos a questão n'esse terreno pessoal. Simplesmente ponderâmos que s. exa. tem obrigação, como ministra, de zelar os interesses do estado, o que lhe compete, como governador, proteger os interesses do banco que dirige
S. exa. é honesto e capaz de não prejudicar nem o estado nem a companhia; mas a honestidade do seu caracter não póde obstar á promulgação de uma lei de incompatibilidades. Da mesma fórma que ha um regimento das camaras para dirigir os deputados nos seus trabalhos, apesar de se contar com a boa educação de todos; da mesma fórma que os deputados são inhibidos de votar nos assumptos que lhes digam pessoalmente respeito com o receio de que possam antepor os seus interesses ás conveniencias geraes, assim tambem é indispensavel que não possam os ministros exercer logares, cujos interesses possam ser contrarios aos do estado, seja qual for a honestidade e seriedade da pessoa collocada nos conselhos da corôa.
As leis repressivas da liberdade fazem-se para corrigir desmandos, não se contando com a honestidade de ninguem. Se se partisse da hypothese de que todos são honrados, eram inuteis os codigos penaes, e todas as leis prohibitivas.
E não basta ser-se honesto, é preciso tambem parecel o.
Em que posição fica o sr. presidente do conselho para a opinião publica, n'aquella hypothese hontem formulada pelo sr. Consiglieri Pedroso? Dentro em pouco está a terminar o exclusivo que o banco tem de emittir obrigações prediaes.
Suppondo que esse exclusivo é prejudicial á nação o só util para o banco, como o sr. Laranjo disse outro dia no congresso agricola, e como é facil demonstrar.
O sr. Laranjo: - Peço a palavra.
O Orador: - Não sei como s. exa. ha de zelar os interesses da nação e os interesses do banco.
Não sei como s. exa. ha de proceder para não desagradar a ambas as entidades que representa.
Se favorece o exclusivo, zela os interesses do banco, mas desagrada á nação; se o não favorece, zela os interesses do estado, mas desagrada á companhia. (Apoiados.)
E, ainda que se prove a justiça da concessão do exclusivo ao banco, sempre haverá quem malsino o procedimento de s. exa., dizendo que pediu á maioria e ao partido em que milita que fizesse tal concessão, unicamente com o fim de justificar o banco de que faz parto.
Vou confirmar esta minha supposição com um exemplo notavel, devendo declarar primeiramente que, citando-o no parlamento, não quero admittil-o como verdadeiro, mas pretendo somente adduzir mais um argumento em favor da lei das incompatibilidades que defendo.
Refiro-me é nomeação do sr. ministro da guerra para um logar do conselho fiscal da companhia real dos caminhos de ferro portuguezes.
Sr. presidente, v. exa. não ignora que na outra casa do parlamento se tem discutido, na resposta ao discurso da corôa, a concessão da linha de Cascaes á companhia real, sustentando muitos dignos pares que tal concessão não obedece aos preceitos da arte da guerra, o accusando o sr. visconde de S. Januario por ter modificado as opiniões anteriormente emittidas com relação a essa linha.
Pois alguns jornaes, e nomeadamente o Seculo, já têem dito que a nomeação de s. exa. para director da companhia tinha muita relação com o seu procedimento a respeito da concessão do caminho de ferro de Cascaes.
Não me faço aqui echo de calummas. Apresento este facto para mostrar que é urgente, que é inadiavel tomar-se uma medida qualquer subiu este assumpto.
E não me diga o illustre deputado o sr. Eduardo José Coelho, que a lei de incompatibilidades é que dá origem a suspeições, porque é exactamente o contrario o que a pratica nos demonstra.
Se o sr. ministro da guerra não fosse director ou membro do conselho fiscal da companhia dos caminhos de ferro do norte e leste, ainda que s. exa. tivesse mudado de opinião acerca do traçado do caminho de ferro de Cascaes, com certeza que não ao lembrariam de malsinar o seu procedimento, com certeza que haviam de attribuir ás suas idéas estrategicas qualquer modificação que só fizesse n'aquelle traçado; mas como se dá essa circumstancia da compatibilidade, attribuem já ao sr. visconde de S. Januario um acto menos digno e menos nobre.
Ora, desde que isto assim é, visto que estas suspeições estão quotidianamente a pesar sobre os homens publicos, e urgente que se proveja de remedio, estabelecendo uma lei de incompatibilidades.
Se entenderem que é necessario tomar uma medida radical, estabelecendo incompatibilidades para deputados, pares, ministros, etc., etc., se entenderem que ha n'isso uma grande conveniencia, não tenho a menor duvida em subscrever para ella; o que e necessario desde já é que haja incompatibilidade para se exercer o logar de ministro distado e ao mesmo tempo o logar de director de companhias poderosas. Vejo n'estas accumulações um grande inconveniente, alem de muitos outros.
Amanhã um presidente do conselho de ministros, ou qualquer homem importante, conseguindo ser director das companhias dos caminhos de ferro, do gaz, das aguas, etc., etc , póde tornar-se um dictador, porque tem nas suas mãos os elementos mais poderosos que constituem a sociedade portugueza.
E portanto forçoso pôr um dique a tudo isto. E esta occasião é muito propicia, porque, como já disse o meu illustre collega o sr. Marçal Pacheco, nunca uma onda de lama alagou a sociedade portugueza, como actualmente. E visto que esta conjunctura é propicia, é necessario que se apresente qualquer medida de incompatibilidades; e se tanto for preciso, eleve-se o ordenado de ministro a 5:000$000 ou 6:000$000 réis; mas que não sejam governadores de bancos, nem estejam dirigindo ao mesmo tempo os interesses do estado e os interesses das altas companhias.
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem.
(O orador foi comprimentado por muitos srs. deputados.)
Leu-se na mesa a seguinte.
Moção de ordem
A camara, considerando que o governo perdeu o apoio da opinião publica, convida-o a sair do poder, e continnúa na ordem do dia. = 0 deputado, João Pinto.
Foi admittida.
O sr. Barbosa de Magalhães: - Mando para a mesa, por parte da commissão de administração publica, um parecer sobre o projecto apresentado pelo srs. deputados Almeida e Brito e Poças Falcão.
O sr. Abreu Castello Branco: - Começo por ler a minha moção de ordem.
(Leu.)
Conheço a preciosidade do tempo, e por isso bem pouco roubarei á camara. Não tenciono fazer um discurso longo, não só porque não sei fazer discursos, mas ainda porque, se soubesse fazel-os, evitaria que fossem muito extensos,