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674 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

cura as causas da superioridade dos anglo-saxões sobre a França; e tão notavel é este livro, que foi procurado avidamente, tanto nas cidades mais populosos como nas aldeias mais insignificantes, não havendo jornal noticioso, litterario, politico, que se não referisse ao livro de Edmond Domolins com as palavras mais lisongeiras.

Querem v. exa. saber o que nesse livro se diz a proposito da representação dos funccionarios do estado?

«Pela sua situação, são os funccionarios bons representantes com vantagem para o paiz?

«Merecem elles occupar um tão grande numero de cadeiras na camara?

«São elles bons juizes dos interesses publicos?

«Qual é o interesse publico?

É que a governação do estado marche regularmente. Pelo contrario o interesso dos funccionarios é que a governação seja tão cara quanto possivel. Quanto mais o orçamento augmentar, tantos mais logares haverá á disposição do estado, e, por consequencia, mais funcções a exercer.

Todos os annos, quando se discute o orçamento, e em face do deficit crescente, se notam algumas veleidades de economias. Mas, á medida que se passa á discussão dos artigos e que os capitulos do orçamento se desenrolam, o sentimento da camara modifica-se.

Os 95 funccionarios para os quaes o orçamento é a galinha dos ovos da oiro são impellidos pelo mesmo movimento irrevistivel. Elles defendem o patrimonio de que têem vivido e sobre o qual voltarão quando deixarem de ser deputados. E n'este movimento de resistencia elles são naturalmente acompanhados pelos seus camaradas da camara que pertencem ás profissões liberaes, e que esperam, elles tambem, quando lhes faltem os subsidios de deputados, escavar uma pequena reforma no orçamento, como o rato da fabula no seu queijo da Hollanda. E como no parlamento as profissões que alimentam o orçamento são menos representadas do que as que d'elle vivem, o orçamento acaba por ser votado e as economias continuam a ficar para as calendas gregas.»

Não foi este o pensamento que inspirou o sr. João Franco. S. exa. tinha confiança nos empregados publicos, mas reconheceu que era preciso reduzir a sua representação para trazer ao parlamento os representantes das principaes forças productoras do paiz.

Este notavel escriptor, como disse, procurou as causas da superioridade dos anglo-saxões sobre a França, e o que mais impressionou o seu espirito foi a melhor distribuição do pessoal politico pelas differentes classes sociaes.

O espectador collocado no alto de uma galeria e olhando para a assembléa italiana, para a camara dos deputados franceses, para o reiachatag allemão e para a camara dos communs em Inglaterra não encontram differença sensivel, pensando que estes paizes se governam do mesmo modo e praticam o mesmo systema, differindo apenas no numero dos seus representantes.

Ha, porém, aquillo que se vê e aquillo que se não vê, como diria Bastiat; o que se vê, é uma apparente similhança entre os assembléas dos mesmos paizes, parecendo que praticam o mesmo systema parlamentar, e o que se não vê, são as categorias sociaes entre as quaes é escolhida a representação nacional.

Todas estas camaras têem representantes da industria, do commercio, da agricultura, do exercito, da marinha e do clero, funccionarios e representantes das profissões liberaes, mas o seu numero varia consideravelmente de umas para outras, de modo a dar predominio a uma ou outra classe. E como os interesses das diversas classes são diversos e por vezes contrários, o melhor parlamento será aquelle em que estiverem mais largamente representados elementos de riqueza publica e os elementos estaveis da nação. (Apoiados.)

Se v. exa. reduzir a traçado graphico os numeros que na camara dos communs inglezes representam a industria, o commercio e a agricultura, e os que representam o exercito, a marinha e o funccionalismo publico, e se sobre-poser esse traçado pela ordem decrescente da sua importancia ou extensão, v. exa. encontrara um pyramide truncada, a cuja base corresponde a representação da agricultura e a cujo corte a dos funccionarios publicos.

É o contrario do que succede em França.

Na camara dos deputados francezes encontra-se o predominio das profissões liberaes e por tal fórma que o seu numero é só por si igual ao de todas as outras classes.

N'este facto encontra Demolias a mais forte rasgo de inferioridade politica e economica da França.

Em Inglaterra ha uma larga representação das profissões usuaes e d'ellas é que vivem todas as outras. Póde viver-se sem exercito, póde viver-se sem juizes, sem marinha, sem clero, sem funccionarios, mas não se póde viver sem agricultura, que vae buscar ao solo os elementos indispensaveis á subsistencia; sem industria, que fabrica objectos necessarios á vida nem sem commercio, que leva uns e outros a toda parte onde aquelles faltam. (Muitos apoiados.)

Em Portugal como na França havia uma exigua representação das classes de trabalho, das classes productivas, d'aquellas de que todas as outras vivem, das piasses, emfim, que devem constituir as condições essenciaes da vida da nação.

Foi n'este ponto de vista, sr. presidente, que o meu illustre amigo e querido chefe o sr. João Franco se inspirou, ao organisar a sua lei de 21 de maio de 1896.

Sr. presidente, eu já aqui disse uma vez e repito agora, nós estamos em vespera talvez de terriveis provações.

Só pelo desenvolvimento do nosso commercio, da nossa industria e da nossa agricultura poderemos resistir á crise grave que tantos perigos encerra; d'ahi a rasão por que é preciso trazer ao parlamento os representantes d'essas forças productoras; d'ahi a rasão de conveniencia de trazer aqui o seu conselho, a sua experiencia, o seu saber, que hão de produzir grandes resultados na formação dos às destinadas a dominar a crise grave que atravessâmos.

Não nota v. exa. um consideravel numero de diplomados?

Não nota v. exa., que dia a dia cresce o numero dos medicos, dos advogados, dos engenheiros?! Não vê v. exa. que está n'isto um dos grandes males que affectam a nacionalidade portugueza?! (Apoiados.)

É que se sacrifica a aptidão para as profissões usuaes, dando-se preferencia ao diploma scientifico, e por tal fórma, que hoje é raro encontrar um filho que continue a profissão usual, que enriqueceu e honrou seu pae; e não é raro ver-se o filho de um grande agricultor amanuense de uma secretaria; um filho de um grande industrial a promover em qualquer comarca da provincia; não é raro ver-se o filho de um grande commerciante a fazer medicina barata em qualquer aldeia sertaneja. E porque? Porque o commercio, a industria, a agricultura não têem tido no nosso paiz a consideração que merecem como condição essencial á nossa vida economica. (Apoiados.)

Qualquer pae que queira dar ao filho consideração no mundo politico tem de o mandar ou procurar um diploma scientifico ou á cata de um emprego publico. E, assim, emquanto as nossas forças economicas, emquanto as condições essenciaes da nossa vida definham, dia a dia, os aspirantes a funccionarios publicos anceiam o alargamento do orçamento e os representantes das profissões liberaes, entre os quaes se notam, pelo seu grande numero, os medicos, junto das classes pobres, pela qualidade da sua profissão, pela independencia que essa profissão lhes dá, vão fazendo, o que não deixa de ter importancia, politica democratica, exactamente como na França onde os medicos avolumam a representação dos radicaes, com grande perigo para a estabilidade d'aquella republica, (Apoiados.)