O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

1162

annunciava a minha interpellação disse que não vinha aqui aproveitar o ensejo para levantar as questões do trabalho nacional e official. Quero manter-me na situação em que me colloquei. Não aproveitarei o ensejo, porque entendo que tem cada cousa o seu logar e a sua hora, e que a hora e o logar hoje não são proprios para tratar essas questões. Noto porém que o illustre ministro, por uma talvez louvavel sinceridade, foi muito longe declarando quaes são as suas doutrinas economicas, que naturalmente devem ser as doutrinas do governo.

S. ex.ª sustenta umas certas doutrinas a respeito das questões economicas, e sabem todos que eu sustento as doutrinas contrarias.

Para mim o desenvolvimento da industria carece de umas certas condições; para s. ex.ª carece de outras. Estamos portanto n'este ponto em perfeita discordancia, o que não obsta a que estejamos de accordo em outros.

Como eu disse, não quiz levantar agora a questão do trabalho; mas lamento que s. ex.ª tendo declarado os preços por que sáem no paiz as construcções navaes, não explicasse quaes as causas por que os preços são altos, e quaes as causas por que as construcções são más; pois não basta dizer que o trabalho official produz mal e é caro. Convem declarar as causas que para tal effeito concorrem.

Não adoro o trabalho official. Talvez por que não tenho sempre o cuidado de responder a tudo quanto de mim se diz, sejam as minhas opiniões injustamente apreciadas. Talvez alguem imagine que sou favoravel ao trabalho official, talvez alguem acredite que eu quero a intervenção do estado em todas as grandes construcções e eu quero só o que rasoavelmente se deve desejar e promover. O trabalho official apresenta-se na nossa terra por diversas maneiras, e algumas das suas manifestações, sendo em minha opinião extremamente repugnantes, observo com assombro que os homens que sustentam as doutrinas contrarias ás minhas, aceitam essas manifestações, applaudem-as e nunca se revoltaram Contra ellas. Eu vejo que a industria official se apresenta a concorrer no mercado com a particular, faz annuncios pomposos e declara triumphantemente que esmagou a industria particular, e noto que os homens que sustentam as doutrinas da liberdade ampla da industria e do commercio nunca se ergueram a clamar contra esta tyrannia official.

Não se inquiete o illustre ministro da marinha, que não levarei muito longe estas considerações. A questão é antiga e ha de voltar; mas agora não convem que nos demoremos com ella. A questão industrial é antiga, mas grave; veja s. ex.ª o que se tem dito nas ultimas sessões do parlamento francez, nos discursos brilhantes do sr. Forcade, ministro do commercio, do sr. Thiers e de outros, proclamando uns as doutrinas que eu sustento, e defendendo outros a opinião que o nobre ministro adoptou.

Não tome o illustre ministro como aggressão á sua pessoa nem ao governo, o que se diz hoje aqui ligeiramente, e mais tarde se desenvolverá quanto for necessario.

Faço uma referencia simples a um facto conhecido. Não discuto agora a questão industrial, e menos ainda a questão da industria official. Deixo porém apontado um facto, porque terei algum dia de me referir a elle para pedir providencias aos membros do governo. Por agora convem guardar esta reserva e ninguem por isso me ha de querer mal. Os partidarios de uma doutrina que se diz absolutamente contraria á minha, assistem impassíveis ás manifestações mais completas da protecção, manifestações pelas quaes a industria official esmaga e destroe a industria particular. Essas manifestações apparecem todos os dias nos jornaes em annuncios pomposos, e os adversarios da iniciativa official, que tudo querem dever á iniciativa particular, deixam passar essas manifestações e calam-so! Eu tambem me tenho calado, porque entendo que não é chegada a hora de fallar. Tarde ou cedo ha de soar essa hora.

Declarou o sr. ministro que são exactas as noticias relativas á compra de um navio para a nossa esquadra por 180:000$000 réis. Apreciou s. ex.ª de certo, antes de se resolver, as condições do navio, as circumstancias do thesouro o as conveniencias industriaes. Não faço observações sobre este ponto, que pessoas mais competentes farão. Louvo a franqueza do illustre ministro, porque póde agora ser o seu procedimento apreciado, e acredito que essa apreciação ha de ser imparcial e segura.

Estimo tambem que fizesse mais outra declaração de que -não tenciona suspender o serviço do arsenal da marinha; ao contrario, tenciona continuar as construcções e até activa-las quanto seja possivel pelos meios que tem á sua disposição. Estimo esta declaração, e estimo-a tanto mais quando ella é a resposta ao que se tem dito em contrario. Convem que o governo responda em taes termos e n'este logar, para que lá fóra se conheça a opinião do ministro, da qual elle toma toda a responsabilidade perante o paiz.

Mas se o trabalho no arsenal ha de continuar, queremos nós que elle continue nas circumstancias desfavoraveis em que o apresentou o sr. ministro, dizendo que é mau e caro? Quererá o paiz, quererá a camara que o trabalho seja mau e caro? Se o trabalho é mau e caro, o meio de acudir ao mal seria reformar as condições do serviço, ou fechar o arsenal.

O sr. Ministro da Marinha: — Eu não disse que o trabalho era mau e caro, absolutamente fallando. Eu disse que ali não tinhamos meios para certa ordem de trabalhos. No mais fazem-se tão bem como n'outra qualquer parte. A questão é de machinas a vapor.

O Orador: — O sr. ministro disse, e naturalmente disse a verdade, que as nossas construcções saíram más e caras; disse que os navios construidos no arsenal portuguez exigem frequentes reparos, que têem sido feitos em arsenaes estrangeiros; disse que as nossas officinas têem produzido obra má e cara, fallando de madeiras podres, e de trabalhos incorrectos, e para corroborar o que dissera apresentou documentos em que fundou a comparação entre o custo e a qualidade dos navios construidos no arsenal de marinha e nos estaleiros inglezes. Da comparação concluiu s. ex.ª que no arsenal o custo é mais elevado e a obra menos perfeita.

Peço que se ouça bem o que eu digo para que não se interprete depois de modo inteiramente diverso.

O sr. ministro declarou que as construcções navaes, que nós fazemos, são caras e más. Declarou que lá fóra o trabalho é mais barato e melhor, e para a demonstração apresentou algarismos.

Se é verdade, como creio, tudo quanto se affirma, parece-me evidente que a s. ex.ª compete indagar as causas que elevam os preços, averiguar a origem do mal, e tomar providencias para que as construcções sejam boas e baratas.

As officinas do estado devem servir de exemplo ás officinas particulares, devem ser officinas modelos em que todos aprendam, devem acompanhar o progresso da arte no seu desenvolvimento. Explica se assim a sua instituição, e justifica se a sua conservação.

Se as officinas do estado, consideradas assim, devem servir para lição e ensino á industria particular, pessima será essa lição, se ellas existirem com defeitos graves e nas condições em que esta o arsenal, segundo diz o illustre ministro.

Peço portanto ao sr. ministro da marinha que cuide de propor á camara as medidas necessarias para que no arsenal da marinha se consiga o resultado que todos nós desejâmos, para que se consiga que as construcções sáiam boas e baratas, e não caras e más como aquellas de que nos fallou.

S. ex.ª diz tambem que não podemos construir machinas de vapor e caldeiras É, até certo ponto, verdade, não temos os elementos precisos para fazer certas obras, não estão organisadas as officinas com esse intuito. Mas s. ex.ª entende que devemos. abster-nos de fabricar as machinas e as caldeiras, e eu entendo que devemos habilitar-nos para as produzir. É esta a minha idéa, e a de s. ex.ª é contraria.

O sr. Ministro da Marinha: — E qual o meio?

O Orador: — O que tem sido empregado por muitas nações que estavam no mesmo caso da nossa. Nações que não tinham industria, dizendo-se a respeito dellas que eram puramente Agricolas e por isso não podiam ser industriaes, transformaram-se completamente, tornaram-se industriaes.

Olhem para a Europa central. Era agricola, e hoje é industrial; transformou-se completamente...

O sr. Ministro da Marinha: — Por que meios?

O Orador: — Pelos meios que eu julgo convenientes, e que o sr. ministro reprova. As nossas doutrinas estão em frente uma da outra.

Mas para se conseguirem construcções boas e baratas é necessario que se tomem providencias. Estarão organisadas as officinas do arsenal como deveriam estar para uma regular producção? Têem ellas o pessoal technico convenientemente habilitado? Tem-se organisado o serviço de modo que possa realisar-se o necessario aperfeiçoamento nas construcções? Aproveita-se devidamente o trabalho dos artífices, aproveitam-se as aptidões, regula-se devidamente a aprendizagem como em estabelecimentos do estado se deve regular?

São estes os problemas que é preciso resolver, e a que s. ex.ª de certo attenderá, não se contentando com declarar á camara que o paiz não tem agora elementos para fazer construcções navaes boas o baratas!

Por esta occasião chamo a attenção de s. ex.ª para a cordoaria nacional, que é um estabelecimento a transformar, e perfeitamente absurdo, no estado actual da industria.

Já ninguem hoje admitte nas grandes officinas o trabalho manual para fazer cabos de diversas grossuras. Em officina do estado, que deve ser exemplar, não podemos consentir que o trabalho continue em taes condições.

Querem que o estado deixe de produzir o que se produz ali? Não terei duvida em votar a suppressão da verba destinada para a cordoaria.

Mas, se querem votar uma verba para a cordoaria, é preciso que essa verba seja applicada em transformar aquella officina, em lhe dar a fórma que deve ter na epocha actual. Nem eu sei que de outro modo se deva manter uma fabrica do estado.

O sr. Ministro da Marinha: — Onde esta a differença?

O Orador: — A differença esta em que o trabalho manual foi completamente abandonado, e substituido pelo trabalho de machinas, ali perfeitamente impossivel. O edificio é enorme, porque, pelo systema antigo, eram necessarios grandes salões, de grandissimo comprimento, e no systema de construcção moderna, como a machina se accommoda em pequeno espaço, não é preciso tamanho edificio. Modificadas as condições d'esta industria, uma parte do edificio serviria para outras officinas.

Não é esta a occasião propria para desenvolver mais este assumpto. Nem eu quero desviar a camara dos outros assumptos importantes de que deve hoje occupar-se.

Por isso, limito-me a agradecer ao sr. ministro as explicações que me deu, e a declarar que tenho muito sentimento de que s. ex.ª fosse tão sincero, revelando fóra de tempo as suas tendencias anti-proteccionistas, quando eu tinha arredado a questão da protecção para apenas fazer umas singelas perguntas.

Respeitando muito a sua opinião, não me conformo com ella; e se essa opinião é, como penso, a do governo, declaro que farei a maior opposição possivel ao governo, sempre que sobre taes assumptos houver discussão.

O sr. Ministro da Marinha: — O illustre deputado tratou agora de um objecto de que me não tinha prevenido, qual é o do nosso estabelecimento da cordoaria.

Como digo, não venho munido dos documentos com que me parece poderei provar que a cordoaria é talvez um estabelecimento, não digo montado como todas as melhores cordoarias de outras nações da Europa, mas onde os trabalhos que ali se fazem sáem bons e de muito boa qualidade e mais baratos do que no estrangeiro.

Apenas entrei para o gabinete fui visitar aquelle estabelecimento e suas officinas; assisti aos trabalhos, e procurei pôr-me ao facto do proveito que resultava de tal estabelecimento. Vi que os cabos e lonas, fabricados na cordoaria, são de muito boa qualidade, e que supportam a comparação com os artefactos analogos feitos no estrangeiro, e que sáem mais baratos.

Effectivamente ha ali uma grande parte dos trabalhos manuaes, mas ha muito tempo que se trata de mudar esse trabalho, e ha mesmo encommendas de machinas de vapor para substituir este trabalho manual, e de uma calandra que ha de ser tambem movida pela mesma machina que seja de construcção mais moderna.

Mas no estado em que se acha o estabelecimento hoje, os resultados são estes a que me refiro. Os nossos productos ali são de muito boa qualidade e mais baratos do que se podem comprar no mercado.

Agora, quanto á extincção d'aquelle estabelecimento, não me parece que ella seja util. Não sei se effectivamente se têem inventado machinas e apparelhos, por meio dos quaes é possivel fazer grandes cabos e amarras; mas estou persuadido de que em nenhum paiz estrangeiro se trataria de desmanchar uma edificação tão magnifica como esta é (apoiados).

Não digo mais nada a este respeito. Quiz apenas tocar n'um ponto a que o illustre deputado se referiu, e dizer que a cordoaria dá productos muito bons e que sáem mais em conta do que se "fossemos compra-los aos mercados estrangeiros.

O illustre deputado parece que tentou fazer-me uma censura por eu ter respondido muito francamente; mas se teve tal idéa, parece-me que terá de fazer essa censura mais vezes, porque todas as vezes que fallar hei de faze-lo do mesmo modo. (Vozes: — Muito bem.)

Eu não disse as causas por que esses navios saíram mais caros, e peço que me não obrigue a dize-las pelo mesmo defeito que tenho de ser franco. Hoje porém estão arredadas as causas que para isso se deram, e os navios não sáem por tal preço, e não é necessario ir construir a Inglaterra; tudo depende do modo de construcção.

Não digo mais nada.

O sr. Presidente: — Alguns srs. deputados pediram a palavra para tomar parte n'esta interpellação. Vou consultar a camara sobre se quer que lhes dê a palavra (apoiados).

Foi approvado.

O sr. Ministro das Obras Publicas (Canto e Castro): — Pedi a palavra pai-a mandar para a mesa duas propostas de lei que passo a ler (leu).

Aproveito a palavra para declarar que estou prompto a responder á interpellação annunciada pelos srs. deputados Faria Guimarães e José de Moraes, ácerca da não construcção da ponte sobre o Douro, e da construcção da estação da Granja. Quando V. ex.ª fixar dia e hora, estou prompto a responder.

O sr. Presidente: — Então terá logar esta interpellação na primeira parte da ordem do dia de ámanhã.

Agora tem a palavra sobre o incidente o sr. Testa.

O sr. Testa: — Sr. presidente, no assumpto que ha pouco so tratou n'esta casa, qual foi uma interpellação dirigida ao sr. ministro da marinha e ultramar pelo sr. Fradesso da Silveira, tenho eu a considerar dois objectos; uma questão industrial, e uma questão technica de marinha. Tal é a que diz respeito á compra de um navio para a marinha de guerra.

Eu não estava até certo ponto prevenido para entrar n'esta interpellação, pois ignorava que ella tivesse logar, mas devo sempre estar preparado para entrar na questão technica, pela minha profissão de official de marinha. Portanto n'esta qualidade, e porque sendo membro da commissão consultiva de marinha, tinha não uma, mas duas vezes dado o meu voto contra a compra do navio de que se trata; pareceu-me que estes dois predicados me collocavam em obrigação de explicar os motivos que me haviam levado á persuasão de que a acquisição d'este navio não era conveniente para a marinha portugueza, a qual segundo a confissão do sr. ministro já abunda em pessimos navios.

Parecia-me que devia haver toda a cautela e todo o empenho, sempre que se pensasse em adquirir alguns novos vasos, que estes fossem de natureza tal, que podessem dar á nossa força naval, senão a importancia, pelo menos um certo typo de consideração que têem todas as marinhas das outras nações; porque infelizmente a nossa marinha de guerra tem-se conservado, não digo estacionaria, mas quasi que tem caminhado em retrocesso; e muitas vezes se não fosse a honra que resulta de pertencer a uma marinha que hasteia nos seus topes a bandeira portugueza, deviamos cobrir as faces de vergonha, por não sabermos como responder ás perguntas que se nos fazem sobre as cousas da marinha de guerra, no que diz respeito a acompanharmos seus progressos. Este estado de cousas vem talvez de faltas accumuladas que tenham produzido os resultados que hoje lamentámos.

Quanto á interpellação que teve logar, confesso que não sabia que ella havia de effectuar-se, pois já hoje declarei que, por motivo de doença, estive impossibilitado de vir á camara ha duas ou tres sessões; todavia tendo lido nos jornaes que o sr. ministro da marinha estava disposto a comprar, ou que tinha passado ordem para se comprar uma corveta, tive logo desejo de vir á camara annunciar uma interpellação a s. ex.ª, a fim de lhe perguntar se era ou