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DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

estado em que está o nosso exercito, que realmente não é o mais lisonjeiro, ao actual ministro da guerra.

S. ex.ª, tão lido na historia militar contemporanea do paiz, não prestou toda a sua attenção para o que o sr. Fontes tem feito como ministro da guerra.

Devo dizer francamente a v. ex.ª e á camara que, depois de 1834 a não ser Agostinho José Freire e barão da Ribeira de Sabrosa, não conheço realmente ministro algum que tivesse mostrado mais solicitude nem mais zêlo pelas cousas militares que o sr. Fontes. (Apoiados.)

V. ex.ª e a camara, me relevarão, se eu tambem a largos traços expozer o que o sr. Fontes fez, e o que encontrou pela primeira vez que foi ministro da guerra no nosso paiz, quando tive a honra de ser seu cheio de gabinete.

A primeira vez que s. ex.ª geriu a pasta da guerra, o que encontrou?

Depois de um grande esforço do sr. visconde da Luz, por exemplo, a arma de artilheria, que é hoje, considerada como uma das primeiras do exercito, e que seria a unica se podesse ser transportada a todos os terrenos, apenas possuia quatro ou seis baterias de artilheria do systema francez.

Peço ao illustre deputado que se informe do que existe hoje na arma de artilheria.

Temos actualmente mais de cem bôcas de fogo de campanha. (Apoiados.)

S. ex.ª achou tudo por fazer. É preciso dizer a verdade. O nobre ministro não podia de repente e em pouco tempo pôr o exercito no estado de esplendor que todos nós desejâmos.

Estou certo que s. ex.ª, permanecendo mais tempo no ministerio, havia de emprehender outras reformas importantes.

Na occasião da guerra que houve entre a Dinamarca e a Prussia, o nosso exercito ainda se achava armado com as antigas armas de carregar pela bôca, e foi por iniciativa do nobre ministro que o nosso exercito deveu o possuir as armas do systema moderno.

S. ex.ª, apesar de encontrar resistencias nas commissões encarregadas de dar o seu parecer sobre assumpto de tanta importancia, passou por cima d'essas difficuldades e dotou o exercito com armamento de carregar pela culatra; estabeleceu os campos de instrucção e manobra, instituição importante, e v. ex.ª, sr. presidente, lembra-se de certo quanto o nobre ministro foi combatido, por ter querido derramar no exercito a instrucção pratica de que tanto carece.

V. ex.ª sabe que o campo de Tancos custou bastantes contos de réis, e que tem sido quasi inutil; apenas o sr. ministro da guerra transacto mandou para ali uma brigada. Eu não conheço, em tempo de paz, outro modo de instruir os exrecitos senão por este meio, o que mereceu o elogio de um illustre general, já fallecido, que todo o paiz respeitava pelos seus altos serviços e nobre caracter: refiro-me ao sr. marquez de Sá da Bandeira.

Mas o sr. Fontes não se limitou só a estes melhoramentos para o exercito. Logo que entrou para o ministerio da guerra, s. ex.ª tratou immediatamente de nomear uma commissão de distinctos militares, com exclusão da minha pessoa, para tratar da organisação do exercito e de algumas leis organicas, taes como a lei de promoções, que eu reputo essencial. O codigo militar, que é hoje lei do paiz, foi da iniciativa do sr. Fontes, bem como o regulamento interno dos corpos, e outros melhoramentos indispensaveis para a disciplina e instrucção do exercito.

Agora, se o illustre deputado me pergunta se o exercito está nas condições de que carece, e em que era necessario que estivesse, eu concordo que não.

Realmente nós despendemos com este primeiro elemento da força publica, segundo o orçamento que está affecto á camara, para cima de 4:000 contos de réis.

A força publica em Portugal, da maneira por que é constituida, está longe de attingir uma boa, racional e economica organisação. O seu principal elemento — o exercito activo — não está convenientemente organisado para a guerra, consumindo tão importante verba na receita publica, sem que comtudo a independencia nacional esteja assegurada por um completo systema de defeza.

É notorio o que no principio d’este seculo succedeu a Portugal, que, por haver deixado caír em desamparo as suas, aliás excellentes, instituições militares, recebeu a affronta de ver entrar sem resistencia as altivas aguias francezas no territorio nacional, affronta que depois vingámos á custa de grandes sacrificios, afugentando-as de pincaro ora pincaro para alem dos Pyrinéus.

O levantamento em massa, sem exercito permanente que o auxilie, expediente para que muitos appellam, seria o mais deploravel de todos os systemas, como muito bem disse o marechal Niel no parlamento francez, opinião já escripta nos excellentes livros do illustre marechal Gouvion de Saint-Cyr.

No começo d'este seculo, como muito bem disse o illustre deputado o sr. Pinheiro Chagas, teve Portugal um systema militar tão perfeito, como aquelle que pouco tempo dopois foi adoptado pela Prussia. Essa organisação, que tanto tem sido admirada, teve origem em Portugal.

Confesso, sr. presidente, que não acredito nas allianças nem nos auxilios das nações poderosas. O exemplo da Dinamarca, que foi esmagada, apesar do seu heroismo, por duas nações poderosas, foi bem caracteristico. O meu particular amigo o sr. conde do Casal Ribeiro disse-o ha poucos dias n'um breve e eloquente discurso na camara dos dignos pares, e eu concordo plenamente com a opinião de s. ex.ª

O exercito, como está organisado, não póde passar rapidamente do estado de paz ao de guerra, principio fundamental a que deve satisfazer toda a boa e racional organisação militar, e para o qual eu chamo a attenção dos poderes publicos.

A reserva é diminuta e não tem a conveniente organisação.

Não é só urgente e necessario organisar o exercito nas condições expostas, é indispensavel ainda infundir-lhe o espirito militar que tem perdido e que constitue a sua principal força.

O systema militar que elevasse rapidamente o exercito ao pé de guerra, sobretudo em relação á arma de infanteria, que attendesse á instrucção pratica e theorica do todas as armas, onde, por successivas graduações se passasse desde o ensino individual até ao collectivo, seria aquelle que mais conviria adoptar.

Sem isto, qualquer despeza que façamos com esta tão util instituição é improficua. (Apoiados.)

Mas, se ainda não chegámos a esse estado de perfeição, a responsabilidade não cabe ao sr. Fontes, porque s. ex.ª tem tratado constantemente de elevar o exercito a esse grau de aperfeiçoamento a que é instante eleval-o.

O illustre deputado que me precedeu, lembrou muito bem as nossas instituições antigas; e realmente pena foi que essas instituições militares deixassem de existir, porque na organisação de 1806 feita pelo conde de Lippe lá estava implantado o serviço obrigatorio.

Essas nossas instituições militares, tirando-lhe o caracter feudal, seriam as mais proficuas.

Mas o espirito do povo não está ainda bem compenetrado d'essa utilidade; e provavelmente é o que assusta os governos; porque v. ex.ª sabe perfeitamente que a estes melhoramentos se oppõem idéas que estão inveteradas no espirito publico, e que só o tempo e a discussão podem apagar.

Eu sou muito apologista do serviço obrigatorio. Em 1862 apresentei aqui um projecto onde vinha consignado esse principio equitativo, justo e que imprime nos exercitos o caracter nacional. Projecto que não foi attendido, porquanto a iniciativa do deputado é quasi sempre nulla.

Hoje o serviço obrigatorio não póde ser contestado. Está