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DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

estabelecido em quasi todas as nações da Europa, e se elle é necessario para os paizes grandes, eu reputo-o indispensavel para os paizes pequenos como Portugal.

E quer v. ex.ª saber a opinião de um illustre militar, a quem ainda agora se referiu o sr. Pinheiro Chagas, o barão Stoffel, antigo addido militar na Prussia, a respeito do serviço obrigatorio, quando trata de expor o estado da organisação militar franceza e o da organisação prussiana, indicando os defeitos que encontrava na organisação do paiz que representava?

Eis aqui o que elle diz:

«A Prussia apresenta o mais bello exemplo de justiça pela applicação do principio do serviço obrigatorio para todos os cidadãos, principio sobre o qual se firmam as suas instituições militares. Como se póde querer comparar a organisação militar prussiana, fundada em um principio tão justo e tão fecundo nas suas consequencias, com a organisação franceza, que tem a nodoa odiosa da substituição por dinheiro, causa de desmoralisação para o exercito e para a nação?... São graves os perigos d'este funesto systema.»

Dizia isto aquelle illustre militar, e pouco mais ou menos por essa occasião expunha o marechal Lamorcière no parlamento francez, que a substituição por dinheiro não era mais que comprar um diploma de cobardia.

Já v. ex.ª vê, sr. presidente, que a minha opinião e as minhas aspirações são tambem pelo serviço obrigatorio, que alem das vantagens que apresenta, quebra na mão dos governos a arma eleitoral, que tanto prejudica o recrutamento e as suas regulares operações.

O recrutamento, como muito bem diz um moderno esoriptor militar, é para o exercito o mesmo que a nutrição é para o corpo humano. Quando a nutrição não é sã e abundante o corpo definha e morre.

Depois de 1834 temos tido varias organisações.

Tivemos uma organisação em 1834, outra em 1837, outra em 1842, outra em 1849, outra em 1863, outra em 1864 e outra em 1865. Algumas d'estas organisações foram até feitas em virtude de auctorisações concedidas a alguns governos do partido historico, e v. ex.ª e a camara sabem perfeitamente quaes os seus resultados.

As organisações depois de 1834 têem sido só feitas conforme as sympathias que uma ou outra côr politica tem por esta ou por aquella arma.

Póde portanto dizer-se que não temos hoje organisação militar, nos limites em que esta se deve forçosamente entender; pois nenhum paiz póde aspirar á honra de dizer que possue tal organisação, se não estiver habilitado para manter no interior a sua segurança e para se valer de todas as forças vivas de que podér dispor.

É exactamente no tempo de paz que nós podemos cuidar das cousas militares, seguindo o aphorismo muito sabido do illustre marechal Jomini, que diz «que os exercitos preparam-se na paz para servirem na guerra».

Eu entendo que se podia talvez começar por implantar entre nós o principio do serviço obrigatorio, elevando um pouco mais o contingente do exercito, e que os soldados que não fossem precisos para preencher as vacaturas do exercito fossem licenciados para a reserva, depois de adquirirem a conveniente instrucção nos corpos de infanteria.

Eu desejaria que á imitação do que fez a Prussia, das infelizes campanhas de 1806 e 1807, perdendo a Grande Polonia e tudo quanto possuia na Westphalia e na Franconia, e ficando reduzida á metade do seu territorio, vexada pelas duras condições que lhe impozera o vencedor de Iena e de Eylau, ameaçada de uma aniquilação completa, organisou um exercito forte com os restos do que tinha sido derrotado.

Frederico Guilherme III incumbiu este trabalho ao general von Schanrhorst.

Para illudir o tratado de Tilsitt, recentemente celebrado e a fim de preparar para a guerra um grande numero de cidadãos, sem despertar as suspeitas da Franca, adoptou o systema de recrutamento proposto por Krumper, o qual consistia em fazer succeder sem interrupção os contingentes uns aos outros e em licenciar as recrutas apenas terminavam a sua instrucção militar, o que permittiu completar, em principios de 1813, os quadros dos corpos.

Depois de pouco mais de meio seculo, veiu a Prussia vingar nos campos de batalha de Sédan e Metz as humilhações por que tinha passado nos campos de batalha de Iena e de Eylau, com usura nunca vista nos annaes da historia militar de todas as epochas.

Eu tomarei a liberdade de chamar a attenção do nobre ministro da guerra para o que acontece em outros paizes pouco mais ou menos como o nosso.

A nota que vou ler é tirada de um auctor muito illustrado e que tem grande reputação na Europa; traz a relação das populações com os exercitos permanentes, e por onde se vê que paizes que têem populações inferiores á nossa, sem maiores recursos, conservam comtudo exercitos muito superiores e com bellissimas organisações.

A Belgica para uma população de 4.000:000 de habitantes tem um exercito de 40:000 homens em tempo de paz e 85:000 em tempo de guerra.

A Dinamarca para uma população de 1.700:000 habitantes tem um exercito de 38:000 homens em tempo de paz e 60:000 em tempo de guerra.

A Hollanda para uma população de 3.500:000 habitantes tem um exercito de 62:000 homens em tempo de paz e 90:000 em tempo de guerra.

A Suissa para uma população de 2.500:000 habitantes tem um exercito activo de 85:000, uma reserva, sem ser no papel, de 45:000 homens. Com a landwehr perfaz 160:000 homens.

Na Prussia em 1688, epocha da morte do grande eleitor, a força do exercito era de 29:000 homens, sobre uma população de 1.500:000 habitantes. Em 1786 a 1808 tinha esta nação um exercito de mais de 200:000 homens para uma população de 8.500:000 habitantes.

O exercito em Portugal é muito inferior em comparação com estes dados estatisticos!

Não é só em relação á organisação militar, pelo que respeita á organisação da reserva, que ha a tratar; o nosso exercito reclama tambem as attenções do sr. presidente do conselho de ministros para outros pontos, a alguns dos quaes s. ex.ª já tem dispensado a sua reconhecida iniciativa.

Vou fallar, por exemplo, a respeito da instrucção do exercito, e como sempre é bom que se saiba como as cousas passam no nosso paiz, direi que a respeito da instrucção do exercito, o sr. ministro da guerra encarregou uma commissão composta de officiaes muito distinctos, a que pertenceu o sr. Latino Coelho, e a que pertenceram outros distinctissimos militares, sem me incluir eu n'este numero, para elaborar um trabalho n'este sentido, e a mesma commissão desempenhou-se muito bem d'esta difficil tarefa.

Este projecto foi estudado debaixo de todos os pontos de vista, respeitando-se o principio da antiguidade.

Era um projecto realmente muito bem elaborado; o seu relatorio foi redigido por um dos primeiros talentos do paiz, o meu particular amigo, o sr. Latino Coelho, e é um primor de linguagem.

O sr. Fontes, depois da commissão lhe apresentar o seu parecer, deixou os conselhos da corôa. Succedeu a s. ex.ª o sr. marquez de Sá, que tinha tambem a peito a defeza do paiz, cabendo ao sr. Fontes inaugurar tão importantes trabalhos.

Este projecto foi convertido em lei a 10 de dezembro de 1868, e pouco depois, não sei porque conveniencias politicas, foi suspensa, por um simples aviso na ordem do exercito; essa lei, que estabeleceu certos principios, taes como tempo de serviço, moralidade, idade, aptidão physica e aptidão militar, ficou em esquecimento.

Sinto não ver presente o illustre deputado o sr. Luciano

Sessão de 9 de março de 1878