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DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS
É conhecida de todos a insistencia que o principe de Bismark tem feito para introduzir n'aquelle paiz o monopolio. Todavia uma commissão de especialistas encarregada de estudar este assumpto, depois de proceder a um largo inquerito, deu um parecer inteiramente desfavoravel á opinião d'aquelle notavel estadista.
Essa commissão, composta do sabios e economistas, concilie o seu parecer por que se mantenha o systema, actual, augmentando-se os impostos sobre a importação e sobre a, cultura, cobrando-se estes em relação ao peso do tabaco.
Parece-me que o systema actualmente em pratica entre nós é o melhor; mas esse systema póde o deve ser aperfeiçoado.
Na lei de 3 de maio de 1864 ha disposições que poderiam ser alteradas.
Refiro-me principalmente á restricção do fabrico do tabaco ás cidades de Lisboa e, Porto.
Como v. ex.ª sabe, segundo essa lei não se póde fabricar tabaco senão em Lisboa e no Porto. Eu não vejo que haja motivo para se manter essa disposição e para que não se permitta a liberdade do fabrico nos outros pontos do paiz onde haja capitães bastantes para a fundação d'esses importantes estabelecimentos industriaes.
Que rasão obsta a que o sr. ministro da fazenda, visto que se está tratando de alterar uma parte da legislação do tabaco, introduza n'esta lei uma, disposição que amplie a liberdade do fabrico a todas as terras do reino?
É preciso que s. ex.ª declare se ha alguma rasão que eu porventura não conheça, que o determine a oppor-se a que se estabeleça o fabrico do tabaco em todo o reino, alem de Lisboa e Porto. (Apoiados.)
Ha outra alteração que eu desejo se faça na legislação do tabaco.
Não digo que seja esta a occasião para, afazer, mas lembro-a desde já ao sr. ministro da fazenda, e chamo para este ponto a attenção da camara.
Refiro-me á liberdade da cultura do tabaco.
O governo nomeou ha pouco uma commissão para estudar a, importantissima questão do phiylloxera. Essa, commissão propõe se tambem fazer ensaios ácerca da cultura do tabaco nas regiões devastadas por aquelle flagello, especialmente na região do Douro.
Parece-me conveniente experimentar se a cultura do tabaco dará no paiz os grandes resultados que a muitos se afiguram. Se os der, eu creio que facilmente a poderemos conciliar com o systema de fiscalisação do imposto do tabaco que actualmente vigora em Portugal, á vista do que se faz em outros paizes da Europa.
Em França, onde existe o monopolio, é permittida a cultura do tabaco, impondo-se umas certas restricções a essa cultura em beneficio do thesouro.
Em Italia, onde tambem existe o monopolio, é igualmente permittida a cultura do tabaco em condições similhantes.
Eu entendo, portanto, que em Portugal poderiamos chegar ao mesmo resultado, estabelecendo-se_ um imposto sobre a producção, o. impondo-se certas restricções á cultura.
Nós sabemos que uma parte do paiz tem soffrido grandes prejuizos com a devastação do phylloxera; e muitos homens competentes se têem lembrado de que seria este um meio de em grande parte compensar esses prejuizos.
Lembro, portanto, esta idéa, ao sr. ministro da fazenda.
Penso que seria conveniente esperarmos pelo resultado das experiencias a que vae proceder a commissão encarregada de estudar a questão do phylloxera, mas cuido tambem que não deviamos perder esta occasião de estudar este assumpto, porque d'ahi podem provir grandes resultados para o paiz.
Eis-aqui outro alvitre que eu apresento no sentido de aperfeiçoar a lei de 13 de maio de 186-1. E emquanto ás fianças.
Como v. ex.ª sabe, actualmente não é permittida fiança em caso algum nos crimes de descaminho e occultação de tabacos; ou antes a lei permitte-a de direito, mas não de facto.
A lei de 13 de maio de 1864 permitte a fiança em todos os casos em que a multa não exceder a 2$0OO réis; mas, percorrendo todos os artigos d'essa lei, não acho um só em que a multa seja menor de 2$000 réis.
Portanto, em caso algum ha, de facto, fiança. (Apoiados.)
Segundo a legislação actual, qualquer individuo que tenha em predio seu uma folha de herva santa vê-se arrastado aos tribunaes, sem poder dar fiança.
Aqui tem v. ex.ª como, pela mais leve infracção da legislação sobre, o tabaco, qualquer cidadão portuguez é arrastado á cadeia, sem poder afiançar-se, e ainda mesmo que se preste desde, logo a pagar o maximo da multa. (Apoiados.)
Na legislação franceza não acho estabelecida a pena de prisão senão para os casos em que os réus se não prestam a pagar logo o maximo da multa ou a, dar fiança.
Portanto não me parece indispensavel conservar este attentado contra os direitos individuaes, esta excepção á legislação geral do reino, quando por outro lado se não mostra a necessidade de tal excepção para manter uma fiscalisação efficaz que assegure aquella importante receita do estado.
Desejava ouvir a este respeito a opinião do nobre ministro da fazenda, e parece-me poder contar com o apoio do governo e da maioria para se expungir da nossa legislação fiscal uma verdadeira, nodoa, uma excepção odiosa que a civilisação d'este seculo não permitte, que é contraria aos nossos costumes e que offende a legislação commum. (Muitos apoiados.)
Que a legislação commum admitta fiança para todos os crimes cuja pena, não seja superior a tres annos de prisão, emquanto a, legislação do tabaco ordena a prisão sem fiança em todos os casos de contravenção ás suas disposições, quando aliás a maior pena, que estabeleceu, é a de prisão até um anno, é cousa que não posso comprehender. (Apoiados.)
Para manter a segurança publica, para sustentar a ordem, não é preciso fazer essa excepção aos. principios de processo penal, ao passo que para assegurar uma fonte de receita, para manter a fiscalisação do tabaco, ha de ser necessario fazei a, e, odiosa, aos principios em que se fundam o direito e a liberdade individual! (Apoiados.)
Peço portanto a v. ex.ª e á camara que aproveitem o ensejo para se revêr e alterar esta parte da, legislação fiscal? pois que não é justo que continue a existir por mais tempo uma tão injustificavel restricção á liberdade dos cidadãos. (Apoiados.)
Quando o legislador decretou que não houvesse fiança nos crimes por descaminho dos direitos do tabaco aos quaes não fosse applicavel a multa de 2$000 réis, suppoz irreflectidamente que haveria muitos casos em que a multa fosse apenas d'essa quantia; mas a verdade é que, percorrendo -se os diversos artigos da lei do 13 de maio de 1861, não se encontra um só em que a multa seja, inferior a 2$000 réis, e portanto não ha casos em que seja permittida, a fiança. (Apoiados.)
A este respeito tenho presenciado nas provincias casos dignos de. lastima, e que me têem produzido uma impressão dolorosa.
Acontece que ás vezes um pobre homem tem no seu quintal, sem o saber, um pé de herva santa. De repente apparece-lhe um guarda da fiscalisação que o autua, o prende, o leva para a cadeia entre lagrimas e maldições.
Debalde elle se promptifica a dar fiança, pede, supplica, exora, mas os tribunaes são inexoraveis, porque a lei não permitte a fiança!
E elle vê se obrigado a percorrer todos os tramites de