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SESSÃO DE 11 DE MARÇO DE 1878

Presidencia do ex.mo sr. Joaquim Gonçalves Mamede

Secretarios - os srs.

Francisco Augusto Florido da Mouta e Vasconcellos

Alfredo Filgueiras da Rocha Peixoto

SUMMARIO

Apresentação de requerimentos e representações. — Na ordem do dia foram approvados os seguintes projectos de lei: n.º 75 de 1876, restabelecendo a prestação de 6:000$000 réis á sociedade do palacio de crystal portuense; n.º 74 de 1876, auctorisando as camaras municipaes a remir os fóros de que forem directas senhorias, independente de licença do governo; n.°98 de 1877, alterando a divisão judicial da comarca de Cabeceiras de Basto em relação ás duas freguezias de S. Nicolau e Santa Senhorinha; n.º 57 de 1877, auctorisando o governo a conceder á commissão administrativa do asylo montemorense da infancia desvalida o edificio do extincto convento das religiosas dominicanas da Saudação, a fim de n'elle continuar definitivamente estabelecido o mesmo asylo. — O sr. visconde de Moreira de Rey fez algumas considerações sobre não haver muitas vezes nos nossos consulados dos paizes estrangeiros quem saiba traduzir para portuguez os documentos ali recebidos em diversas linguas, para cumprir a disposição do codigo do processo civil a este respeito, a que respondeu o sr. ministro da justiça. — O mesmo sr. ministro da justiça apresentou uma proposta de lei para ser auctorisado a reformar a secretaria da justiça. — Foi apresentado o parecer da commissão sobre a reforma eleitoral.

Presentes á chamada 36 srs. deputados.

Presentes á abertura da sessão — Os srs.: Rocha Peixoto (Alfredo), Pereira de Miranda, Cardoso Avelino, A. J. d'Avila, Carrilho, Telles de Vasconcellos, Ferreira de Mesquita, Zeferino Rodrigues, Barão de Ferreira dos Santos, Carlos Testa, Vieira da Mota, Conde da Graciosa, Custodio José Vieira, Forjaz de Sampaio, Eduardo Tavares, Vieira das Neves, Cardoso de Albuquerque, Guilherme de

Abreu, Illidio do Valle, Ferreira Braga, Vasco Leão, Gonçalves Mamede, J. J. Alves, Matos Correia, Figueiredo de Faria, Ferreira Freire, Moraes Rego, Sampaio e Mello, Luiz de Campos, Camara Leme, Bivar, Faria e Mello, Pires de Lima, Mello e Simas, Cunha Monteiro, Pedro Correia, Pedro Jacome, Visconde da Arriaga, Visconde de Villa Nova da Rainha.

Entraram durante a sessão — Os srs.: Osorio de Vasconcellos, Braamcamp, Antunes Guerreiro, A. J. Boavida, A. J. de Seixas, Cunha Belem, Arrobas, Correia Godinho, Sousa Lobo, Mello Gouveia, Neves Carneiro, Conde de Bertiandos, Conde da Foz, Filippe de Carvalho, Pinheiro Osorio, Mouta e Vasconcellos, Francisco Costa, Van-Zeller, Paula Medeiros, J. M. de Magalhães, Correia de Oliveira,

Dias Ferreira, Pereira da Costa, Namorado, José Luciano, Pereira Rodrigues, Mexia Salema, Julio de Vilhena, Luiz de Lencastre, Freitas Branco, Pedro Franco, Pedro Roberto, Visconde da Azarujinha, Visconde de Guedes Teixeira, Visconde de Moreira de Rey, Visconde de Sieuve de Menezes.

Não compareceram á sessão — Os srs.: Adriano de Sampaio, Agostinho da Rocha, Alberto Garrido, Teixeira de Vasconcellos, A. J. Teixeira, Francisco Mendes, Pinto Bessa, Palma, J. Perdigão, Jayme Moniz, Jeronymo Pimentel, Barros e Cunha, Ribeiro dos Santos, Cardoso Klerck, Guilherme Pacheco, J. M. dos Santos, José de Mello Gouveia, Nogueira, Pinto Basto, Manuel d'Assumpção, Rocha Peixoto (Manuel), Alves Passos, Pinheiro Chagas, Marçal Pacheco, Mariano de Carvalho, Miguel Coutinho (D.), Placido de Abreu, Julio Ferraz, Ricardo de Mello, Visconde de Carregoso.

Abertura — ás duas horas e um quarto da tarde.

Acta — approvada.

EXPEDIENTE

Officio

Da santa casa da misericordia de Lisboa, acompanhando 120 exemplares do relatorio e contas da gerencia da mesa da santa casa no anno economico de 1876-1877.

Mandaram-se distribuir.

Representações

1.ª Do procurador á junta geral do districto, vereadores da camara e vogaes do conselho municipal de Alcoutim, districto de Faro, pedindo que seja approvado um projecto de lei que auctorise a camara municipal a distrahir do cofre do fundo de viação a quantia de 3:000$000 réis para ser applicado á edificação dos paços do concelho.

Apresentada pelo sr. deputado Carrilho e enviado á commissão de administração publica, ouvida a de obras publicas.

2.ª Da camara municipal e mais municipes do concelho de Mora, districto de Evora, pedindo que se ligue a linha do caminho de ferro do sul e sueste com a linha de leste.

Apresentada pelo sr. deputado Faria e Mello e enviada á commissão de obras publicas, ouvida a de fazenda.

3.ª Dos escripturarios do escrivão de fazenda no concelho de Setubal, pedindo augmento de ordenado.

Apresentada pelo sr. deputado Arrobas e enviada á commissão de fazenda.

Communicações

1.ª Declaro que por incommodo de saude faltei ás ultimas sessões. = Alberto Osorio de Vasconcellos.

2.ª Declaro que faltei por motivo justificado ás sessões dos dias 7, 8 e 9 do corrente mez.

Sala das sessões, em 11 de março de 1878. = O deputado, Antonio José Boavida.

3.ª Declaro que o sr. deputado Manuel Bento da Rocha Peixoto tem deixado de assistir a algumas das ultimas sessões da camara e faltará a mais algumas por motivo justificado.

Sala da camara dos senhores deputados, em 11 de março de 1878. = Alfredo Filgueiras da Rocha Peixoto, deputado secretario.

4.ª Declaro que por motivo de doença não compareci a algumas sessões e que se estivesse presente teria votado contra o imposto de consumo. = Luiz de Campos.

Nota de interpellação

Desejo interpellar o sr. ministro das obras publicas sobre as providencias que tem adoptado ácerca da execução das portarias de 3 e 14 de julho, 16 e 21 de novembro e 7 de dezembro de 1877, que se referem aos contratos para fornecimento das obras da penitenciaria.

Sala das côrtes, 9 de março de 1878. = J. G. de Barros e Cunha.

O sr. Eduardo Tavares: — Mando para a mesa um requerimento de Antonio Ramos da Silveira Coutinho, residente em Angra do Heroismo, o qual se refere a uma pretensão que este individuo tem pendente da commissão de guerra.

Peço a v. ex.ª o obsequio de dar a este requerimento o devido destino.

O sr. Carlos Testa: — Mando para a mesa cincoenta requerimentos de outros tantos officiaes marinheiros da armada, os quaes, tendo obtido prévia licença das auctoridades superiores, pedem a esta camara augmento dos seus vencimentos.

Attendendo a que a profissão dos requerentes é muito laboriosa, como todos nós bem podemos conhecer, que as

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suas circumstancias são muito precarias e que as suas retribuições são muito diminutas, entendo que elles merecem a attenção dos poderes publicos, a fim de que os seus vencimentos sejam melhorados.

Recominendo a v. ex.ª que se digne remetter estes requerimentos á respectiva commissão, a fim de que ella possa dar o seu parecer, como é de justiça; e espero que v. ex.ª procederá do modo mais conducente ao bom despacho d´estas petições.

O sr. Visconde da Arriaga: — Mando para a mesa um requerimento de D. Maria Amalia da Cunha Maldonado Athaide Barahona, filha do capitão de mar e guerra Marçal Pedro da Cunha Maldonado Athaide Barahona.

Esta senhora, tendo-lhe sido concedida uma pensão por carta de lei de 22 de julho de 1863, em remuneração dos serviços prestados pelo seu fallecido pae, e não se designando n'esta carta de lei que a mesma pensão se torne extensiva a uma unica filha que tem, pede á camara dos senhores deputados que a sua pensão tenha sobrevivencia para a mesma sua filha.

A requerente allega que o mesmo se tem feito a outras senhoras; alem d'isso não ha augmento de despeza, e portanto parece-me que a commissão de fazenda não terá duvida em deferir a esta pretensão.

Acresce que a filha d'esta senhora é a unica irmã do fallecido governador de Tete, o sr. Barahona, que tão relevantes serviços prestou ao paiz, acabando com a guerra do Bonga. (Apoiados.)

Por consequencia, attendendo aos serviços prestados ao estado pelo pae da requerente, que era official de marinha distincto, e aos serviços prestados pelo filho, que era official do exercito de terra tambem distincto e que morreu em serviço da patria, espero que a commissão de fazenda não terá duvida em deferir esta pretensão, galardoando assim os serviços dos que morrem em serviço do estado.

O sr. Faria e Mello: — Mando para a mesa uma representação da camara municipal e mais municipes do concelho de Mora, em que pedem a construcção do caminho de ferro das Vendas Novas á Ponte de Sor.

Peço a v. ex.ª que mande esta representação á commissão respectiva.

O sr. Arrobas: — Mando para a mesa duas representações: uma do secretario e mais empregados da 1.ª divisão militar, pedindo augmento de vencimento; e a outra dos escripturarios da repartição de fazenda do concelho de Setubal, com a mesma pretensão.

Peço agora a v. ex.ª que me reserve a palavra, para quando estiver presente o sr. ministro da justiça.

O sr. Carrilho: — Mando para a mesa uma representação dos procuradores á junta geral do districto de Faro, e dos vereadores e vogaes do conselho municipal de Alcoutim, pedindo auctorisação para levantar dos cofres da viação municipal até á quantia de 3:000$000 réis, a fim de serem applicados á construcção dos novos paços do concelho.

O sr. A. J. de Seixas: — Mando para a mesa um requerimento do sr. Carlos Guilherme da Silva, escrivão da praça das arrematações da extincta junta do deposito publico, queixando-se de não ter sido collocado pelo ministerio da justiça em conformidade com o disposto na lei de 10 de abril de 1876, que fez passar aquella repartição para a caixa de depositos, e salvou os direitos adquiridos do dito escrivão.

Peço a v. ex.ª que este requerimento seja enviado á commissão competente, para o tomar na devida consideração.

ORDEM DO DIA

O sr. Presidente: — Vae entrar em discussão o projecto n.º 75, de 1876.

É o seguinte:

Projecto de lei n.º 75

Senhores: — Á vossa commissão de fazenda foi presente a representação da direcção da associação do palacio de crystal portuense, pedindo a revalidação da lei de 19 de junho de 1866, que concedeu a annuidade de 6:000$000 réis á mesma associação, para assegurar o juro e amortisação de um emprestimo de 75:000$000 réis.

Considerando que, sem embargo de haver já sido paga a primeira annuidade, fôra, por decreto de 22 de abril de 1869, declarada cessante a mesma annuidade, sem embargo de ter sido, por portaria de 16 de novembro de 1867, approvado o contrato de emprestimo que a associação celebrára com fundamento e caução na dita lei;

Considerando que é justo e indispensavel ser parco no dispendio dos redditos da nação, mas que mais justo é ainda fazer todos os sacrificios para que a boa fé dos contratos e dos que confiam nos poderes publicos e nos seus actos legaes não seja illudida:

É de parecer, de accordo com o governo, que se deve approvar o seguinte:

PROJECTO DE LEI

Artigo 1.° É restabelecida, a datar do anno economico futuro, a annuidade de 6:000$000 réis a pagar á sociedade do palacio de crystal portuense, de que trata a carta de lei dei 9 de junho de 1866.

§ unico. A annuidade a satisfazer no proximo anno será considerada para todos os effeitos como a segunda a que o thesouro é obrigado.

Sala da commissão, aos 21 de março de 1876. = José Dias Ferreira = Visconde de Guedes Teixeira = Antonio José Teixeira = Manuel Maria de Mello e Simas = Visconde da Azarujinha = José Maria dos Santos = Antonio José de Seixas = Augusto Cesar Ferreira de Mesquita = Joaquim José Gonçalves de Matos Correia = Antonio Maria Pereira Carrilho, relator.

Foi approvado o artigo 1.º

O sr. Visconde de Sieuve de Menezes (Por parte da commissão): — Como ao projecto que se discute falta o artigo 2.°, que é: «Fica revogada a legislação em contrario,» mando o para a mesa, a fim de v. ex.ª o submetter á approvação da camara.

Foi approvado.

O sr. Lopo Vaz: — Mando para a mesa o parecer da commissão de fazenda sobre a proposta de lei do governo relativamente ao imposto do sêllo.

Entrou em discussão o projecto de lei n.º 74, de 1876.

É o seguinte:

Projecto de lei n.º 74

Senhores: — A vossa commissão de administração, tendo examinado o projecto de lei n.º 104-B da sessão de 1875, e julgando-o de reconhecida vantagem pelas rasões expostas no relatorio que o precede, é de parecer que deve merecer a sua approvação e ser convertido em lei.

Sala das sessões, 6 de fevereiro de 1876. = Julio de Vilhena = Jacinto A. Perdigão. — Augusto Godinho — Francisco Van-Zeller = M. d'Assumpção = Jeronymo da Cunha Pimentel = M. B. da Rocha Peixoto = Visconde de Moreira de Rey, relator.

N.° 104-B

Senhores: — A lei de 21 de abril de 1873 e seu regulamento de 26 de setembro do mesmo anno, modificando as leis de 4 de abril de 1861 e 22 de julho de 1866 para favorecer a desamortisação dos bens municipaes, não realisou o pensamento que a inspirou. O inventario com a descripção e louvação dos bens emphyteuticos, nas condições em que o exige o citado regulamento, demanda uma despeza tão avultada e um tempo tão demorado para alguns municipios, que torna difficil, se não impossivel para elles, o aproveitarem-se da faculdade que aquella lei lhes confere.

Desejam as camaras desamortisar os seus fóros e mais

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direitos dominicaes, querem os foreiros libertar as suas propriedades do onus que lhes pesa; mas as difficuldades para o conseguir em vista da legislação em vigor estorvam a realisação dos desejos de todos.

Encarecer hoje as vantagens da desamortisação era, alem de ocioso, duvidar da vossa illustração e offender os vossos sentimentos liberaes.

Aquelle minucioso inventario, que prescreve o regulamento de 25 de setembro de 1873, só póde servir para a avaliação do laudemio. Mas as camaras julgam-se bem compensadas com o augmento de dez vezes mais a importancia annual do fôro, e de bom grado prescindem da importancia do laudemio, para se furtarem ás excessivas despezas e delongas que importa aquelle inventario.

Se, porém, houver alguma camara que entenda lucrar mais com a percepção integral e exacta da importancia do laudemio, determinada pela avaliação rigorosa da propriedade emphyteutiea, não pretendo com este projecto prival-a de se aproveitar das disposições da citada lei e seu regulamento.

As camaras municipaes de Braga, Guimarães e outras reconhecem que lucram com a modificação d'aquella lei. É por isso que n´aquelle sentido vos dirigiram as suas representações.

Para satisfazer ás indicações d'aquellas camaras, e tendo em mira os interesses dos municipios e a liberdade da terra, principio proclamado pela escola liberal e progressista, tenho a honra de vos apresentar o seguinte

PROJECTO DE LEI

Artigo 1.º São auctorisadas as camaras municipaes a remir os fóros de que forem directas senhorias, independentemente de licença do governo.

§ 1.° O direito de remir pertencer ao subemphyteuta, e só não querendo este usar d'elle pertencerá ao emphyteuta.

§ 2.º O preço da remissão será a importancia do fôro em trinta annos sem laudemio algum, nos casos em que seja devido, e nos emprazamentos em que não haja laudemio o preço da remissão será a importancia do fôro em vinte annos.

Art. 2.° Perderão o direito á remissão os foreiros que a não requererem á camara dentro do praso de um anno a contar da publicação d'esta lei.

Art. 3.° Findo aquelle praso, as camaras não poderão mais remir fôro algum, e procederão á venda em hasta publica dos fóros que não estiverem remidos, tomando para base da arrematação o preço que se acha determinado para a remissão no § 2.° do artigo 1.° d´esta lei.

Art. 4.º Estas vendas em hasta publica devem previamente ser auctorisadas pelo conselho de districto, e a ellas deve assistir o agente do ministerio publico na localidade, para fiscalisar os actos da arrematação, fazer as convenientes reclamações e interpor os recursos competentes, nos termos do artigo 2.° da lei de 21 de abril de 1873.

Art. 5.º O producto da remissão ou da arrematação será immediatamente convertido em titulos de divida publica, nos termos da lei de 4 de abril de 1861.

Art. 6.º As camaras que não quizerem aproveitar-se da auctorisação que por esta lei lhes é concedida, deverão declaral-o dentro do praso de sessenta dias á direcção geral dos proprios nacionaes.

Art. 7.º Fica revogada a legislação em contrario.

Sala das sessões da camara, em 12 de março de 1875. = Jeronymo da Cunha Pimentel = João Vasco Ferreira Leão.

Approvado sem discussão o artigo 1.º

Entrou em discussão o

Artigo 2.°

O sr. Visconde de Sieuve de Menezes: — Não impugno a maioria do artigo que está em discussão, que julgo ser o artigo 2.°

Diz-se n'este artigo:

(Leu.)

V. ex.ª e igualmente a camara sabem que ha diversas providencias emanadas do ministerio do reino para que as camaras municipaes não possam vender os bens nem proceder á desamortisação dos fóros e baldios que não forem necessarios para logradouros communs, sem que tenham procedido a um arrolamento geral e inscripção de todas as propriedades que façam parte do seu concelho e que pertencem ao municipio. Parece-me que esta é a legislação actual. (Apoiados.)

N'este artigo impõe-se aos foreiros uma pena se não fizerem esta remissão em certo praso, contado desde a data da publicação da lei, que é um anno.

Por consequencia, estando as camaras municipaes sujeitas por outras leis a fazer um arrolamento de todos os seus bens para poder proceder á desamortisação, o beneficio que se quer dar aos foreiros e aos individuos que pagam differentes fóros ao municipio póde ficar sem effeito. Póde acontecer que os municipios, especialmente aquelles que têem muitas propriedades e fóros não façam esta inscripção ou arrolamento dentro de um anno, e por conseguinte a providencia que vamos conceder não aproveita áquelles que nós desejâmos que aproveite por já ter decorrido o anno de que trata este artigo.

Pedia pois aos illustres membros da commissão de administração publica e ao meu illustre amigo o sr. visconde de Moreira de Rey, que me dessem algumas informações sobre a materia d'este artigo, no sentido de ser mantido aos foreiros fazerem as suas remissões muito depois de passado um anno, se porventura o municipio n'esse anno não tiver completado o arrolamento ou inscripção de todos os seus bens.

O sr. Visconde de Moreira de Rey: — Vou dar as explicações pedidas pelo meu illustre amigo o sr. visconde de Sieuve de Menezes, e, alem d'isso, acrescentar outras que me parecem convenientes sobre o assumpto.

O fim que o projecto que se discute teve principalmente em vista, foi dispensar as camaras municipaes do encargo que pela legislação lhe é imposto, de não poder remir nem desamortisar os fóros que recebem, sem terem feito o tombo e a relação exactissima com as avaliações necessarias e estabelecidas nos diversos regulamentos.

Este fim é clarissimo, e é evidente que se tornára de primeira necessidade, por isso que a legislação actual exige das camaras municipaes, para poderem vender ou desamortisar, alem do incommodo que lhes causa este trabalho, uma despeza superior no valor da arrematação da maior parte dos seus bens.

Por esta occasião direi a v. ex.ª que este projecto, como se diz no relatorio, foi de iniciativa de alguns municipios do Minho. N'esta provincia, em geral, os fóros têem laudemio de quarentena, ou, em vez de fóros, ha simples pensões que não pagam laudemio de qualidade alguma; por consequencia para o Minho não ha inconveniente.

Póde ser que encontre alguma difficuldade n'outro qualquer districto, onde é possivel que o valor do fôro seja pequeno e que o laudemio seja da 5.ª, da 8.ª ou da 10.ª parte, como se dá em alguns aforamentos ecclesiasticos.

Já digo a v. ex.ª que não tenho conhecimento de districto nenhum em que as camaras municipaes possuam aforamentos d'esta ordem; no emtanto, fui prevenido particularmente de que talvez este caso se dê, e eu entendo que é conveniente definil-o na lei, para que se não deixe remir por trinta pensões insignificantes laudemios que podem ter importancia extraordinaria.

Pedirei a v. ex.ª que, depois de approvado o projecto, salvas as emendas, volte á commissão, para se evitarem quaesquer inconvenientes que se possam dar a este respeito.

Emquanto á pergunta especial que o meu illustre amigo me dirigiu, creio ter respondido com a declaração de que as camaras, logo que este projecto seja convertido em lei, podem proceder á remissão, embora não tenham promptos

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os tombos de todos os seus bens. O projecto é principalmente para as dispensar das avaliações, podendo por consequencia ellas proceder á remissão, e posteriormente á arrematação, apenas pelo rol de cobranças que todas ellas possuem.

O sr. Visconde de Sieuve de Menezes: — Estou satisfeito com as explicações dadas pelo illustre relator da commissão, na parte em que declarou que o fim principal d'este projecto é permittir a remissão de fóros e venda dos que pertencem ás camaras municipaes, independentemente dos arrolamentos.

Camaras municipaes conheço eu em que não tem sido possivel organisar definitivamente os tombos de todos os seus bens; e parecia-me que pondo-se no projecto o tempo fixo de um anno, em que se concede aos foreiros o direito de remir fóra d'este praso, ficaria sem effeito esta disposição.

Mas como o illustre deputado disse que as remissões e vendas se podem fazer independentemente do arrolamento de todas as propriedades do concelho, estou satisfeito com as explicações de s. ex.ª, e a lei poderá cumprir-se pela fórma por que está redigida.

Foi approvado o artigo 2.º

Approvados sem discussão os artigos 3.º e 4.°

Entrou em discussão o

Artigo 5.º

O sr. Visconde de Sieuve de Menezes: — Está em discussão o artigo 5.°, que diz o seguinte:

(Leu.)

Da disposição d'este artigo vê-se claramente que a importancia de todos os fóros e remissões deve ser convertida em titulos de divida publica; mas v. ex.ª sabe, e toda a camara, que muitas vezes as camaras municipaes têem certas urgencias, e por motivos menos justos e menos convenientes podem lançar mão d'este capital, empregal-o nas despezas correntes, e d´esta maneira o fundo e a importancia d'essas remissões, em vez de trazer vantagem, traz inconvenientes, porque deixa de ser invertido em fundos publicos, que augmentem a receita e fazenda municipal.

Desejava, pois, que o artigo ficasse redigido de maneira que as camaras municipaes não podessem distrahir nas despezas correntes a importancia de todas as remissões e vendas que fizessem.

Chamava, pois, a attenção do illustre membro da commissão, o sr. visconde de Moreira de Rey, para dar algumas informações que esclareçam a materia que se discute; porque o meu fim é que as camaras municipaes, vendendo os seus bens, empreguem o capital em inscripções, sem poderem dar-lhe destino differente d'aquelle que a lei auctorisa.

O sr. Visconde de Moreira de Rey: — A commissão julgava que com a declaração, de que a inversão do producto das remissões, em titulos de divida publica, seria feita nos termos da lei de 4 de abril de 1861, se prevenia a maior parte das difficuldades; no entretanto estou de accordo com o illustre deputado, em que melhor é acautelar mais minuciosamente os abusos, que são possiveis, e de que por muitas vezes se tem dado exemplo.

V. ex.ª e a camara sabem que nos meus principios está libertar os municipios da tutela administrativa, e que desejo reformar as leis, de modo que, cada municipio tenha ampla e perfeita liberdade para se arruinar, conforme entender, mas debaixo da sua responsabilidade; o que desejo é impedir a ruina dos municipios pelo arbitrio da auctoridade administrativa ou do governo, systema em que temos vivido até hoje, e que realmente não tem produzido beneficios que nos levem a pedir a sua continuação. (Apoiados.)

Sou no entretanto o primeiro a reconhecer que com a actual organisação municipal e com as nossas actuaes leis ds administração, é indispensavel e conveniente adoptarem-se as providencias possiveis, para evitar estes inconvenientes.

Aproveito a occasião para mandar para a mesa a proposta, a fim de que o projecto, depois de approvado, salva a redacção, volte á commissão para se redigir novamente, não só o artigo 1.°, como os outros artigos que têem sido objecto de discussão, e estou convencido que a redacção definitiva ha de satisfazer, não só o meu illustre amigo e collega, mas toda a camara. (Apoiados.)

Leu-se na mesa e foi approvada a seguinte

Proposta

Proponho que depois de approvado o projecto, volte á commissão para a redacção definitiva. = Visconde de Moreira de Rey.

Approvado o artigo 5.º

Approvados sem discussão os artigos 6.° e 7.°

Entrou em discussão o projecto n.º 98, de 1877.

É o seguinte:

N.° 98

Senhores: — Á vossa commissão de legislação civil foi presente a representação da camara municipal do concelho de Cabeceiras de Basto, apresentada na camara pelo sr. deputado Guilherme de Abreu, pedindo que a freguezia de S. Nicolau de Cabeceiras de Basto passe a pertencer á circumscripção do julgado ordinario de S. Miguel de Refojos, e que a freguezia de Santa Senhorinha de Basto passe a pertencer á circumscripção do julgado ordinario de S. Martinho do Arco de Baulhe, da comarca de Cabeceiras de Basto; desfazendo-se assim o equivoco que houve no mappa da divisão judicial, que faz parte do decreto de 12 de novembro de 1875, e de cujo equivoco provém inconvenientes de incommodo e prejuizo aos povos d'aquellas duas freguezias.

A commissão, senhores, acha procedentes o pedido e representação da camara, e por lhe parecer que assim fica melhor feita, e com maior conveniencia dos povos a divisão judicial da comarca de Cabeceiras de Basto, é de opinião que se deve approvar o seguinte

PROJECTO DE LEI

Artigo 1.° A freguezia de S. Nicolau de Cabeceiras de Basto passa a pertencer á circumscripção do julgado ordinario de S. Miguel de Refojos, e a freguezia de Santa Senhorinha de Basto passa a pertencer ao julgado ordinario de S. Martinho de Arco de Baulhe, da comarca de Cabeceiras de Basto.

Art. 2.° Fica assim alterada a divisão judicial da comarca de Cabeceiras de Basto, e revogada a legislação em contrario.

Sala da commissão, 25 de março de 1877. = Luiz da Bivar = Antonio Cardoso Avelino = João Vasco Ferreira Leão = Lopo Vaz de Sampaio e Mello = Jeronymo Pimentel = Manuel d'Assiimpção = Luiz de Lencastre, relator.

O sr. Visconde de Sieuve de Menezes: — Não combato a materia do projecto em discussão, pedi a palavra unicamente para fazer muito simples considerações sobre um objecto igual ao de que se trata n'este projecto.

V. ex.ª sabe e sabe a camara que foi feita a nova divisão das comarcas, creando se trinta comarcas.

Sabe v. ex.ª e tambem a camara as graves difficuldades que uma divisão judicial traz, porque altera costumes e habitos inveterados e que vae offender interesses creados em muitas localidades.

Depois que sr. ministro da justiça Barjona de Freitas creou as trinta comarcas, levantaram-se n'esta casa e na imprensa muitas reclamações sobre este assumpto, pedindo-se a creação de mais comarcas, e alterações nos limites das então creadas, e o illustre ministro que então geria a pasta da justiça, o sr. conselheiro Mexia Salema, respondeu a differentes observações, que se fizeram n'essa epocha, sobre a alteração das comarcas isto é, sobre a necessidade de crear mais algumas, que na proxima sessão

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legislativa traria ao parlamento uma proposta de lei alterando ainda a divisão judicial, para satisfazer assim a certos interesses e a muitas representações que vinham das provincias, especialmente dos concelhos e dos julgados que foram prejudicados com a ultima divisão comarcã subindo a esta comarca então muitas representações, que dizem estão na commissão.

Alem d'isso consta-me que foi nomeada uma commissão para estudar este assumpto, pelo ministro da justiça o mesmo sr. Mexia, excluindo-se d'ella muitos juizes, que eram de certo os mais competentes.

No entretanto, aquelle cavalheiro não trouxe ao parlamento a proposta de lei relativa a esta alteração, e não me consta tambem que os trabalhos d'essa commissão tenham progredido, nem vejo parecer da commissão de legislação civil a tal respeito.

Peço, portanto, ao illustre membro da commissão, relator d'este projecto, que é o sr. Lencastre, que me dê algumas explicações a respeito d'este assumpto, se acaso s. ex.ª está hapilitado para responder a estas minhas observações; e digo se está habilitado, porque não me referi exclusivamente á doutrina do projecto, mas ao importante assumpto da divisão comarcã.

A camara sabe que com a ultima divisão das comarcas levantaram-se certos attrictos, certas difficuldades que convem respeitar, especialmente quando os povos trazem ao parlamento representações muito respeitosas, ás quaes nos cumpre responder e que devemos acatar.

O sr. Lencastre — Quasi que nem precisava pedir a palavra a v. ex.ª e usar d'ella, se não fosse chamada pelo meu illustre amigo, o sr. visconde de Sieuve de Menezes; mas tendo s. ex.ª feito referencia ao meu nome e chamado o relator para lhe dar explicações, tenho a dizer a s. ex.ª e á camara, que a commissão de legislação civil teve em seu poder, e tem ainda, muitas representações pedindo alterações na circumscripção judicial d'este paiz.

A commissão estudou essas representações, meditou muito ácerca do assumpto d'ellas, e resolveu não lhes dar andamento, porque entendeu que só passado tempo é que se podia ver se a ultima circumscripção tinha sido bem ou mal feita, tinha ou não inconvenientes.

É sabido que quando se fazem alterações nas circumscripções do paiz, alterações que contrariam os costumes e os habitos dos povos, apparecem sempre muitas reclamações, e nem sempre essas reclamações são justificadas.

Appareceram, porém, no fim da sessão passada duas representações, uma da comarca de Moura e outra da de Cabeceiras de Basto, as quaes pareceram á commissão de tal modo justificadas, que esta resolveu attendel-as, e assim deu um parecer que já foi discutido n'esta casa e approvado, e este que se discute agora.

Na parte do assumpto relativa a este projecto, que não foi combatido pelo sr. visconde de Sieuve de Menezes, nada tenho a dizer, porque, não tendo sido combatido o projecto, não é preciso defendel-o.

Referiu-se porém s. ex.ª a outros pontos, e um d'aquelles que s. ex.ª tocou foi a nomeação pelo ministerio passado de uma commissão para estudar este assumpto.

Eu combati n'esta camara a nomeação d'essa commissão, porque entendo que qualquer circumscripção, quer judicial quer administrativa, feita para ir alterar radicalmente a circumscripção existente, que é a que me parece que tendia aquella nomeação, não se deve realisar sem passar o lapso de tempo necessario para se conhecerem as vantagens e os inconvenientes d'essa circumscripção que se pretende modificar.

Não quer isto dizer que este principio absoluto não tenha limitações, e a apresentação d'este projecto e do outro que já foi votado, representam uma modificação n'estas idéas.

Direi ainda que a circumscripção judicial não está perfeita. Mesmo o seu auctor, tendo nomeado uma commissão de homens muito competentes e tendo seguido em grande parte o parecer d'essa commissão, não está convencido de que essa circumscripção seja no todo perfeita e completa. É opinião minha que qualquer alteração que se faça n'essa circumscripção póde trazer muitos mais inconvenientes que aquelles que se encontram actualmente. E, repito, qualquer circumscripção que se faça, quer na ordem administrativa, quer na ordem judicial, deve ser muito meditada e resolvida com todo o cuidado; mas desde o momento em que esteja resolvida, deve haver todo o cuidado em não a estar a alterar todos os dias; (Apoiados.) não quero dizer com isto que a circumscripção ultimamente feita não tenha defeitos; reconheço que effectivamente tem alguns, e se não fossem as considerações que actuaram no animo da commissão de legislação civil, e que a dominaram, eu teria já vindo apresentar a esta camara um projecto de lei para que fosse alterada a circumscripção respectiva á antiga comarca da Chamusca, que effectivamente foi aquella que mais soffreu com a ultima circumscripção judicial.

Emquanto aos outros pontos a que o illustre deputado se referiu, não lhe posso responder, porque nem pertenci á commissão, nem sei nada do que se passou n'esse tempo. Tenho dito.

O sr. Presidente: — Tem a palavra o sr. Guilherme de Abreu.

O sr. Guilherme de Abreu: — Visto que o projecto não foi combatido, cedo a palavra.

Foi approvado o projecto n.º 98.

O sr. Ministro da Justiça (Barjona de Freitas): — Remetto para a mesa uma proposta de lei, que tem por fim auctorisar o governo a reorganisar o ministerio da justiça.

Esta proposta vae desacompanhada de relatorio, porque as rasões que a justificam são obvias.

V. ex.ª sabe muito bem, assim como a camara, que o decreto de 1869, obedecendo ao louvavel intuito de reduzir a despeza, diminuiu consideravelmente os quadros da secretaria da justiça. Ainda quando n’quelle tempo fosse compativel com o serviço aquella reducção, não podia adoptar-se hoje em que se crearam novos serviços, que exigem augmento de pessoal.

A camara sabe tambem que depois da ultima reforma organisou-se o registo criminal e crearam-se trinta comarcas e centenas de julgados. Sabe ainda que o governo está compromettido a organisar o registo civil; e todos estes serviços, que duplicaram extraordinariamente o trabalho, exigem infalivelmente o augmento de pessoal, que não é compativel com a organisação de 1869.

Em 1869 fez-se a reforma diminuindo os quadros, mas no decreto d'essa reforma havia uma disposição transitoria pela qual ficaram em exercicio, por um principio de equidade bem entendido, os funccionarios a mais dos quadros fixados; mas esses funccionarios vão faltando, e por isso se vae tornando cada vez mais sensivel a falta. Escuso de expor outras rasões para justificar esta medida.

A proposta é a seguinte:

Proposta de lei

Artigo 1.° É o governo auctorisado a reformar a actual organisação da secretaria d'estado dos negocios ecclesiasticos e de justiça, não podendo exceder a despeza que actualmente se faz com a secretaria em mais de 3:500$000 réis.

Art. 2.° O governo dará conta ás côrtes, na proxima sessão legislativa, do uso que fizer d'esta auctorisação.

Art. 3.° Fica revogada a legislação em contrario.

Secretaria d'estado dos negocios ecclesiasticos e de justiça, em 11 de março de 1878. = Augusto Cesar Barjona de Freitas.

O sr. Lopo Vaz: — Mando para mesa o parecer da commissão sobre o projecto da lei eleitoral.

O sr. Visconde de Moreira de Rey: — Desejo cha-

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mar a attenção do sr. ministro da justiça sobre um objecto que julgo importante, mas não quero prejudicar a discussão de qualquer projecto de que se esteja tratando; por isso pergunto a v. ex.ª se será agora occasião opportuna para expor as observações que desejo dirigir ao sr. ministro da justiça.

O sr. Presidente: — Agora é opportuna a occasião, visto que acabou de ser votado o projecto que esteve em dsicussão; portanto tem a palavra.

O sr. Visconde de Moreira de Rey: — O codigo do processo civil determina que os documentos expedidos por auctoridades estrangeiras e escriptos em lingua estrangeira, só podem ter validade em Portugal quando se apresentem acompanhados de traducção authenticada pelo consulado da nação respectiva, e se no nosso paiz não existir agente consular da respectiva nação, póde então o documento ser traduzido por peritos.

Á vista d'esta disposição, todas as vezes que qualquer paiz tem em Portugal agentes consulares, o tabellião não póde celebrar os diversos contratos, sem que os documentos originaes estrangeiros se apresentem traduzidos e authenticados pelo consul respectivo.

Nós, por habito ou por descuido, costumâmos em Portugal legislar não só para os subditos da nação portugueza e para os estrangeiros aqui residentes, mas até para os agentes consulares dos paizes estrangeiros, que não obdecem ás nossas leis nem as reconhecem, e entendo que elles fazem muito bem.

Acontece que os diversos consulados estrangeiros, mesmo os das nações mais importantes, não têem traductor official para traduzirem os documentos, cuja traducção a lei lhes incumbe, sem ter competencia para tanto. Portanto os consules não traduzem, nem têem por quem mandar traduzir, e não estão habilitados para authenticar as traducções que se lhes apresentem, porque esses agentes geralmente desconhecem a lingua portugueza, ou não a conhecem bastante para poderem ter a certeza de que qualquer traducção está rigorosa e fiel.

Eu acabo de experimentar pessoal e praticamente as bellezas d'este artigo.

Parece-me, portanto, indispensavel e da maior urgencia substituir a disposição do codigo do processo civil.

Se não podemos nem devemos dispensar a obrigação de se exhibir uma traducção authentica, é indispensavel providenciar para que essa traducção possa ser feita perante os juizes, ou por peritos ajuramentados ou por outro meio, mas dispensando sempre a intervenção do consul em tudo que não seja reconhecer a validade das assignaturas das auctoridades do seu respectivo paiz.

A intervenção do consul, indispensavel no documento original estrangeiro, é inconveniente e absurda na traducção, a qual deve tornar-se um acto unico e exclusivamente portuguez, ou seja perante o juiz ou por outra fórma qualquer que faça prova em juizo.

Diz o artigo do codigo civil, e mais do que elle dizem os tabelliães, que são a lei viva e pratica, quando qualquer individuo precisa de reduzir a escriptura qualquer contrato. Dizem elles que a lei, quando houver agente consular da respectiva nação, não admitte outro meio de traduzir, e que a unica traducção authentica que reconhece é a que for feita ou authenticada pelo consul estrangeiro.

Esta disposição não é justa nem racional, porque não temos direito de impor obrigações aos agentes consulares estrangeiros, e tornar os interesses do paiz dependentes de funccionarios estrangeiros, sobre os quaes não temos nem podemos ter meios de acção; não é só absurda, é cousa muito peior.

Julgo que é indispensavel e urgente evitar os grandes inconvenientes que a legislação actual produz.

O sr. Ministro da Justiça: — Pedi a palavra para dizer ao illustre deputado que qualquer inconveniente que encontre n'esta disposição do codigo do processo civil poderá ser remediado por um projecto de lei.

Não sei se o illustre deputado se quer dar ao trabalho de apresentar esse projecto, ou se deixa ao governo providenciar a tal respeito.

No segundo caso não tenho duvida em tomar sobre mim essa responsabilidade, e de examinar o assumpto.

Eu creio que pelo codigo do processo civil o agente consular deve ser substituido, ou por peritos ou por um interprete.

Estou de accordo com o illustre deputado em que as partes não fiquem privadas de authenticar os seus documentos por qualquer falta que se dê do agente consular ou do modo que acaba de dizer. Não tenho duvida alguma, repito, em estudar o assumpto e providenciar como for de rasão; porém, independentemente d'isto, o illustre deputado póde apresentar um projecto de lei, se julgar preciso.

O sr. Visconde de Moreira de Rey: — Agradeço ao nobre ministro não só as explicações categoricas que acaba de dar, mas a affirmativa da sua boa disposição em remediar os inconvenientes que apontei. Sei perfeitamente que, como deputado, tenho nominalmente o direito de apresentar qualquer projecto de lei. Desse direito usei eu com alguma largueza no tempo das minhas illusões, nos primeiros annos em que vim a esta camara.

Eu tambem me dei ao incommodo de redigir projectos de lei, mas depressa vi que quanto mais importante era o assumpto, a que se referiam os projectos, maior difficuldade tinham em obter a attenção dos meus collegas ou mesmo das commissões de que eu fazia parte.

Por exemplo, um projecto de lei que apresentei e cuja iniciativa renovei varias vezes sobre registo predial, que ainda só nominalmente existe no paiz, nunca foi possivel encontrar na commissão de legislação, aliás composta das primeiras illustrações e dos primeiros talentos d'esta terra, um unico dos meus collegas que se prestasse a ser relator d'esse projecto. Portanto, não é n'esta idade e com estes desenganos que se póde pretender de mim que eu escreva duas palavras que pareçam projecto de lei! Reconheço a existencia nominal da iniciativa parlamentar. Emquanto a camara quizer que ella assim esteja, prometto que não apresento projecto de lei algum para cousa alguma d'este mundo. Para mim não ha iniciativa senão do governo.

Expuz as minhas idéas, reconheço, e o illustre ministro tambem reconhece, quanto é necessario e urgente attender ás difficuldades que actualmente se dão.

Reconheço a competencia de qualquer agente consular estrangeiro para affirmar a authenticidade do titulo original estrangeiro, para a traducção se ha alguem absolutamente incompetente, e absolutamente impossivel é o agente consular estrangeiro, que sabe a sua lingua, mas que ignora a lingua portugueza.

Só em Portugal se apresentava uma disposição na lei que obriga um consul estrangeiro a declarar boa a traducção em lingua portugueza, que elle ignora absolutamente.

Portanto o nobre ministro da justiça considerará o caso, e para mim é garantia solemne a boa disposição em que s. ex.ª está a este respeito.

O sr. Vasco Leão: — Mando para a mesa um parecer da commissão de legislação civil, ácerca das duvidas que apresentou a esta camara a commissão de inquerito á penitenciaria.

Foi approvada a ultima redacção do projecto n.° 75.

Foi approvado sem discussão o projecto n.º 57, de 1877.

É o seguinte:

N.º 57

Senhores: — Á vossa commissão de fazenda foi presente o requerimento apresentado pelo sr. deputado Faria e Mello, no qual a commissão administrativa do asylo montemorense de infancia desvalida pede, pelos fundamentos que expõe, que lhe seja definitivamente concedido o edificio do extincto convento das religiosas dominicanas da Saudação, sito

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DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

na villa de Montemór o Novo, onde o mesmo asylo se acha interinamente estabelecido.

A vossa commissão, considerando ser de justiça e de incontestavel utilidade que os poderes publicos auxiliem estas philantropicas instituições, que tão importante serviço prestam, e de tão grande alcance são para a moralidade publica, e provam os sentimentos caritativos que felizmente distinguem a nossa patria, pelo que se tornam dignas de louvor e auxilio;

Considerando que as auctoridades a quem competia, tanto assim o reconheceram, que concederam licença para provisoriamente se estabelecer n'aquelle edificio o alludido asylo;

Considerando que nenhuma applicação mais util se podia dar ao referido edificio, cuja conservação na posse da fazenda só traria encargos, e a venda pouco valor, muito mais comparando-se com a utilidade e vantagens da instituição ali estabelecida:

Por todas estas considerações, a vossa commissão, de accordo com o governo, tem a honra de vos propor o seguinte

PROJECTO DE LEI

Artigo 1.° É o governo auctorisado a conceder á commissão administrativa do asylo montemorense da infancia desvalida, o edificio do extincto convento das religiosas dominicanas da Saudação, a fim de n'elle continuar definitivamente estabelecido o mesmo asylo.

Art. 2.° Ficam a cargo da referida commissão administrativa os reparos de conservação do dito edificio, a fim de poder servir para o fim para que e cedido.

Art. 3.° No caso de, por qualquer eventualidade, fechar o dito asylo e cessar portanto o fim utilitario que preside a esta concessão, reverterá novamente para a posso da fazenda o edificio cedido, bem como quaesquer bemfeitorias feitas sem direito a indemnisação alguma.

Art. 4.° Fica revogada toda a legislação em contrario.

Sala da commissão de fazenda, em 28 de fevereiro de 1877. = Joaquim de Matos Correia = A. R. Sampaio = Antonio José de Seixas = Antonio Maria Barreiros Arrobas = Mello e Simas = Antonio José Teixeira = Antonio A. P. Carrilho = A. C. Ferreira de Mesquita Visconde da Azarujinha, relator.

O sr. Presidente: — A ordem do dia para ámanhã é a continuação da que estava dada para hoje, e mais os projectos n.º 156, de 1875, e 12 e 14 do corrente anno.

Está levantada a sessão.

Eram quatro e meia horas da tarde.

Sessão de 11 de março de 1878

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