SESSÃO DE 5 DE MARÇO DE 1886 591
tinha sido ordenado e é determinado pela legislação vigente.
Como não vejo presente nenhum dos srs. ministros a quem me dirigi, pedia a qualquer dos membros do governo presente tomasse nota d'este facto, que acaba de me ser communicado em telegramma, pelo sr. presidente da camara municipal de Moncorvo, cavalheiro cuja respeitabilidade me merece toda a confiança, e dessem d'elle conhecimento aos seus alludidos collegas para os devidos effeitos.
O estado da administração da justiça em Moncorvo é grave e não póde continuar assim.
O delegado é um magistrado recto e digno, e á sua muita prudencia se deve unicamente o não terem as cousas chegado a mais, porque a paciencia tambem tem limites. Assim o affirmam as representações das camaras municipaes de Moncorvo e Freixo de Espada á Cinta e as representações collectivas dos quarenta maiores contribuintes e de toda a mais gente seria e digna dos dois concelhos, sem distincção de cor politica, e assim o affirmo eu, embora s. exa. seja meu adversario politico.
O juiz, pelo contrario, completamente obsecado por vis odios e ruins paixões para com as principaes pessoas da villa de Moncorvo, por quem só devia professar gratidão e respeito, é que tem dado logar ao estado anarchico em que se encontra a administração da justiça n'aquella mal fadada comarca!
Das suas prepotencias, arbitrariedades e até crimes darei conhecimento a v. exa. e á camara em tempo opportuno. Não o faço agora, porque o não devo fazer, e concluo, pedindo promptas e energicas providencias ao governo.
O sr. Ministro das Obras Publicas (Emygdio Navarro): - O estado da comarca de Moncorvo é realmente grave, mas póde o illustre deputado ficar certo de que o governo ha de tomar as providencias necessarias para que aquelle estado cesse o mais depressa possivel, tendo sempre em vista o respeito devido ao principio da independencia do poder judicial, e salvaguardando esse principio.
O sr. Lopes Navarro: - Estranho o facto, só por não ter ainda terminado a syndicancia, motivo por que, por fórma nenhuma podia o juiz ter entrado na camara.
O Orador: - Posso unicamente dizer que se deram instrucções ao magistrado encarregado d'essa syndicancia; e tambem que ainda não ha communicação official do acontecimento a que o illustre deputado se referiu.
O sr. Eduardo Cabral: - Mando para a mesa um requerimento do sargento aspirante da arma de infanteria, Francisco Augusto da Silva Botelho, em que pede a esta camara lhe seja regulado o seu accesso pelo decreto de 24 de outubro de 1863.
O sr. Avelino Calixto: - Sr. presidente, tenho a honra de mandar para a mesa uma representação da associação commercial de Coimbra, em que se pede a substituição do § 1.° do artigo 228.° do regulamento da contribuição industrial de 28 de agosto de 1872, e a do n.° 4.° do artigo 539.° do codigo civil.
(Leu.)
Provavelmente quem redigiu esta representação, não sendo homem de lei, entendeu que o parlamento era o competente para reformar um artigo de regulamento, o que pertence ás attribuições do poder executivo.
Mas como o artigo 228.° do regulamento de 28 de agosto de 1872 é atranscripção textual do artigo 12.° da lei de 30 de julho de 1860, entendi que me cumpria apresentar um projecto de lei, porque só o poder legislativo tem competencia para revogar disposições d'esta ordem.
Tem, pois, esta representação duas partes. Uma refere-se á reforma de legislação fiscal, e outra a um ponto de direito civil.
Vou ler á camara o projecto de lei sobre a primeira parte, para, em tempo, ser submettido á sua apreciação.
(Leu.)
Direi, em poucas palavras, quaes os motivos, que me evaram ao convencimento da justiça d'esta representação e a apresentar este primeiro projecto de lei.
A lei de 30 de julho de 1860, no artigo 12.°, diz assim.
(Leu.)
Por esta simples leitura se evidenceia, que o legislador estabeleceu uma innovação forçada, deslocando a responsabilidade legal dos caixeiros para os seus patrões, e tornando estes responsaveis pela falta de pagamento das colectas d'aquelles, quando não pagas nos prasos legaes.
Ora esta innovação, sr. presidente, considero-a eu iniqua, violenta e immoral!
Sr. presidente, na sciencia e arte de legislar é essencial não perder jamais de vista a indicação dos factos e as lei da vida real.
Este criterio é o meio mais seguro para aquilatar e modificar as theorias que tanto assoberbam o espirito dos nossos legisladores modernos.
A quasi totalidade dos commerciantes tem nos seus estabelecimentos caixeiros, a quem, alem do ordenado, dão habitação, sustento e até educação. Em Lisboa e Porto, na maior parte, dão-lhes só ordenado.
Os commerciantes, luctando com o estado de insubordinação, que se tem alastrado em todas as classes sociaes contra o principio auctoritario, vêem-se obrigados, para conservarem estes empregados em suas casas, a fazerem-lhes constantemente adiantamentos, ou a suas familias, sempre exigentes e intolerantes.
D'aqui resulta, que na maior parte dos casos, não ha, no final do anno, saldo algum a favor dos caixeiros; pelo contrario, estes quasi sempre ficam devedores a seus patrões.
Mas ha mais. Não poucas vezes ha prejuizos, causados por esses empregados, sem que o commerciante tenha garantia de reembolso, nem sequer os meios faceis de tornar effectiva a responsabilidade civil ou criminal dos seus caixeiros.
N'estas circumstancias, considero uma grave iniquidade, que o commerciante fique, por sobre tudo isto, sujeito ainda a pagar as collectas da contribuição industrial dos seus caixeiros, quando não forem pagas nos prasos legaes!
Quando o caixeiro perfaz a idade de quinze annos, fica, segundo a lei, sujeito á collecta da contribuição industrial. E então que elle começa também, em regra, a vencer o seu ordenado e como estes empregados e as familias, são intolerantes n'este ponto, o commerciante tem de ceder, sendo rara a vez que ha saldo a seu favor.
Por outro lado o caixeiro, acobertado com esta, disposição da lei, não paga ao estado, de proposito, receiando pouco da subrogação legal do seu patrão, porque é apenas nominal.
Parece-me que a fazenda tem outro meio de garantir os seus direitos.
A fazenda póde promover execução sobre os ordenados dos caixeiros, vencidos ou vincendos, que estiverem em poder dos seus patrões.
Suppunhamos que o caixeiro abandona o estabelecimento, sem pagar as contribuições, n'esse caso, a fazenda póde promover a penhora nos seus vencimentos em qualquer parte e estabelecimento aonde for encontrado. O commerciante, feita que seja a penhora, entra com os ordenados vencidos em deposito.
E, se apesar d'isso a fazenda não tiver meio de tornar effectivos os seus interesses, não vejo que tenha direito a exigir responsabilidades a quem as não contrahin.
A fazenda, em taes circumstancias, fica tambem sujeita, como qualquer credor, á força maior de uma insolvencia.
Por estes motivos entendo que é justa a representação, n'esta parte, e que o respectivo projecto merece ser attendido pela camara.
A representação tem outra parte, que diz respeito espe