612 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS
N'esse caso haviamos de admittir que todas as povoações do reino, onde a differença entre a liquidação e a cobrança da contribuição é pequena, são realmente uns paraizos eleitoraes! (Riso.)
Com franqueza, digo ao illustre deputado que não creio que os meios sejam differentes em Lisboa e lá fóra. Pódem na pratica divergir um pouco, mas esteja certo o illustre deputado, que tudo quanto se podia inventar em materia eleitoral está inventado; nada se descobre de novo. A provincia ainda é a esse respeito mais sabedora e maliciosa que a capital.
Nos meios de se aliviarem do imposto modificam-se os processos, mas póde talvez dizer-se que as provincias ainda são mais habeis a este respeito, do que Lisboa.
Aqui a massa dos contribuintes é tamanha, as preocupações dos escrivães de fazenda são de tantas especies, que realmente, sem negar toda a influencia á consideração que o illustre deputado acaba de fazer, creio que ella contribue com muito pouco na differença entre a liquidação e a cobrança.
As causas são muitas e differentes. Ha defeitos na organisação das matrizes e não só os defeitos politico-eleitoraes, mas ainda outros. E não me atrevo a dizer a s. exa. o que em materia de malicia na organisação das matrizes da contribuição industrial se tem inventado, com o fim de certos contribuintes se isentarem do imposto, porque tenho medo de crear discipulos. (Riso.)
Os differentes processos de que se lança mão são infinitos; é extraordinaria a serie de artes com que cada um procura defender-se do onus tributario.
Em defeza do projecto, não se póde negar que deve influir essencialmente no mau resultado das cobranças o facto de se cobrarem em janeiro sete prestações da contribuição industrial, quando em 31 de dezembro se faz um grande numero de mudanças que são tanto mais repetidas, quanto mais pequeno é o contribuinte, mais modesta a casa que habita, mais resumido o seu estabelecimento industrial.
S. exa. ha de ter visto publicada no Diario do governo uma relação dos contribuintes que não foram encontrados, em que já figurou o nome de um illustre ministro da situação passada e em que tem figurado o nome de pessoas que todos conhecemos. (Apoiados.) Julgo que não é por fins politicos ou eleitoraes que tal succede. Sendo isto assim, imaginem o que succederá com a grande massa dos contribuintes.
(Interrupção.)
Acontece tudo isso e muito mais.
Ía eu dizendo que o facto de se cobrar em janeiro uma quota avultada da contribuição industrial, quando no mez de dezembro se faz um grande numero de mudanças por parte das classes menos favorecidas da fortuna, influe naturalmente na cobrança da contribuição, e como é fácil de ver, as cobranças que se seguem saem todas prejudicadas pela mesma causa.
No Porto a epocha das mudanças não é a mesma que em Lisboa, emquanto que a epocha do pagamento da contribuição é sensivelmente a mesma. Ali a quebra é muito menor, que na capital.
É licito suppor que, sendo a epocha das mudanças do Porto differente da epocha das mudanças de Lisboa, ao passo que é a mesma a epocha da cobrança da contribuição nas duas cidades, não é portanto a coincidencia da menor quebra na cobrança da contribuição do Porto e da maior quebra da contribuição de Lisboa. Isto não quer dizer que não seja necessario pensar muito no meio de aperfeiçoar as matrizes da contribuição industrial, e em geral de todos os processos de lançamento.
Não quero dizer tambem que seja este o unico meio de diminuir o desfalque consideravel que este imposto está soffrendo em Lisboa, mas parece-me que é um meio que deve contribuir efficazmente para diminuir este desfalque.
Isto quanto á primeira questão que s. exa. levantou.
Quanto á segunda questão, relativamente ao tempo que deva durar a auctorisação, devo dizer a s. exa. que o ser ou não a auctorisação provisoria, é uma questão de pequenissima monta; o que é muito difficil é marcar o tempo que deve durar a experiencia.
Ainda não ha muito tempo que se estabeleceu o systema da contribuição predial em prestações. Pois, como é sabido, a maior parte dos contribuintes de Lisboa não se aproveitaram d'este beneficio por ignorarem que existia similhante lei; agora é que já bastantes contribuintes se vão aproveitando d'essa vantagem.
Ora, se isto acontecia na contribuição predial, em que a maior parte dos contribuintes não conhecia as disposições da lei que os beneficiava, vejam s. exas. por aqui quanto é difficil fazer variar os habitos da população.
Ha de ser necessario um certo tempo para vencer resistencias. Mas quaes são os inconvenientes, que resultam de não ser temporaria a auctorisação? E, diz o illustre deputado, que se vae crear uma massa de empregados, que depois, a brandura dos nossos costumes, a tolerancia que temos com todos, o sermos um paiz pequeno, o conhecermos-nos uns aos outros, ha de tender e conservar ao serviço do estado. Ora, parece-me que n'este caso não ha que receiar esse perigo. Em primeiro logar são empregados pagos por uma simples percentagem; em segundo logar são tirados principalmente dos distribuidores telegrapho-postaes, que já têem outra collocação fixa.
O sr. Consiglieri Pedroso: - Tanto quanto possivel.
O Orador: - É claro que o illustre deputado não quer que eu vá privar a posta de Lisboa do pessoal necessario para a distribuição. O illustre deputado sabe que ha um numero consideravel de distribuidores telegrapho-postaes effectivos e outros supranumerarios; e se a direcção geral das contribuições directas se pozer de accordo com a direcção dos correios e telegraphos, como é natural que succeda, porque ambas estão animadas dos melhores desejos em bem do serviço publico, podem-se escolher, entre os effectivos e os supranumerarios, empregados que se encarreguem d'este serviço, sem prejuizo da distribuição postal.
Portanto, serão escolhidos, por via de regra, os empregados n'esta classe.
Supponhamos, porém, que ha um ou outro empregado novo; esses já sabem que serão pagos por uma percentagem: que não terão nenhuma especie de estabilidade; que são empregados dos recebedores e não do estado; que serão como os cobradores da companhia do gaz ou da companhia das aguas.
Pois já algum recebedor da companhia do gaz ou da companhia das aguas se persuadiu de que era empregado vitalicio e que havia de ficar ao serviço da companhia emquanto vivesse. Por certo que não. Estes individuos conhecem bem as condições com que são empregados.
Quanto a abusos possiveis, o illustre deputado sabe, tão bem como eu, que em geral os abusos não se manifestam em relação a pequenos empregados, que vencem apenas um pequeno estipendio proporcional á cobrança que fazem.
Infelizmente os abusos dão-se com empregados de categoria mais elevada, collocados em outras situações. E note s. exa. que esses empregados, de mais a mais nem são nomeados pelo governo, não são escolhidos pelo governo; são escolhidos e nomeados pelos recebedores dos bairros. E é certo, que se os factos estatisticos demonstrarem que a cobrança domiciliaria não dá resultado algum, o parlamento tem na sua mão o meio de acabar com esse serviço; é não votar no orçamento a verba para esses empregados, porque os recebedores tambem não os pagarão. Póde-se admittir o abuso de o parlamento reconhecer que o systema não dá vantagens, e comtudo continuar a pagar a cobradores