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SESSÃO DE 5 DE MARÇO DE 1886

Presidencia do exmo. sr. Pedro Augusto de Carvalho (supplente)

Secretarios os exmos. srs.:
João José d'Antas Souto Rodrigues
Henrique da Cunha Matos de Mendia

SUMMARIO

Deu-se conta de um officio da camara dos dignos pares remettendo a proposição de lei interpretando a disposição do n.° 2.° do § unico do artigo 10.° do decreto eleitoral de 30 de setembro de 1852, e bem assim de outro do ministerio da fazenda, remettendo o processo do concurso a que ultimamente se procedeu, para provimento do emprego de contador geral da junta do credito publico, e copia do decreto pelo qual o dito emprego foi provido, documentos que tinham sido requeridos pelo sr. Sebastião Centeno. - Apresentaram representações: o sr. Azevedo Castello Branco, da camara municipal de Santa Martha de Penagião; o sr. Avelino Calixto, da associação commercial de Coimbra. - O mesmo sr. deputado, para reforçar o pedido da associação commercial de Coimbra, apresentou dois projectos de lei: 1.°, para que a fazenda nacional, em garantia das dividas por collectas da contribuição industrial, lançada aos caixeiros de qualquer estabelecimento commercial, possa promover execução, não só nos bens proprios dos mesmos caixeiros, mas tambem, e cumulativamente, nos seus ordenados vencidos ou vincendos, ainda em mão dos patrões; e para o governo ficar auctorisado a alterar, na parte respectiva, o regulamento da contribuição industrial de 28 de agosto de 1872; 2.º, para que as dividas dos mercadores a retalho, pelos objectos vendidos a pessoas que não forem mercadores, prescrevam pelo lapso de tres annos, sendo esta disposição opportunamente incorporada no artigo 541.° do codigo civil, sem prejuizo da sua immediata execução. - Tambem apresentaram projectos de lei, o sr. Moraes Sarmento, assignado tambem pelo sr. Eduardo Coelho, auctorisando o governo a tornar perpetua a cessão temporaria feita á camara municipal de Chaves, por carta de lei de 23 de junho de 1879, das muralhas e fortes que circumdam a mesma villa; e o sr. Cardoso Valente, assignado tambem pelo sr. Moraes Sarmento, isentando a camara municipal do concelho de Gaia do pagamento da contribuição de registo pela transmissão da quantia de 3:000$000 réis nominaes em inscripções da divida publica fundada, que o fallecido visconde das Devezas, Antonio Joaquim Borges de Castro, lhe legou com o encargo de distribuir annualmente pelos alumnos das escolas publicas de Mafamude e Santa Marinha de Villa Nova de Gaia os juros d'essas inscripções. - O sr. Carrilho mandou para a mesa um parecer da commissão de fazenda sobre as propostas de lei do governo nos. 17-B e 17-C, que a mesma commissão reunira num só projecto de lei. O projecto já estava impresso, e por isso mandou-se distribuir pela camara. - O sr. Lopes Navarro referiu se a um facto, na sua opinião, menos regular, do juiz de direito da comarca de Moncorvo, que lhe competia estar ausente emquanto durasse a syndicancia á administração da justiça na comarca, haver entrado na villa, acompanhado de um creado, deitando foguetes, facto que podia ser origem de sérios conflictos. - Responde-lhe o sr. ministro das obras publicas. - O sr. Alfredo Peixoto fez differentes considerações, já em relação á sua posição politica na camara, já alludindo ao conflicto entre o sr. bispo de Coimbra e a faculdade de theologia da universidade, já em relação ao observatorio astronomico da mesma universidade. - Responderam os srs. ministros das obras publicas e da fazenda. - Justificaram as suas faltas as sessões os srs. Sanches de Castro, Consiglieri Pedroso, Wenceslau de Lima, Alves Matheus, Goes Pinto e Luiz José Dias.
Na ordem do dia approvou-se o projecto n.° 15, approvando o encerramento das contas geraes das receitas e despezas do estado da metropole de 1877-1878 a 1882-1883. - Foi tambem approvado, depois de algumas considerações do sr. Consiglieri Pedroso, a que respondeu o sr. ministro da fazenda, o projecto n.° 20, que auctorisa o governo a admittir em Lisboa a cobrança domiciliaria da contribuição industrial em prestações mensaes. - Antes de se encerrar a sessão o sr. Pinheiro Chagas referiu-se a uma circular do sr. ministro da fazenda ao director da alfandega, e desejou saber o sentido com que se lhe dirigira. - Responde-lhe o sr. ministro da fazenda. - O sr. presidente declarou que a pri-meira sessão seria na sexta feira 12 do corrente.

Abertura - As tres horas e tres quartos da tarde.

Presentes á chamada - 65 srs. deputados.

São os seguintes: - Adriano Cavalheiro, Lopes Vieira, Agostinho Lucio, A. da Rocha Peixoto, Torres Carneiro, Silva Cardoso, Antonio Candido, Pereira Côrte Real, Garcia Lobo, A. J. da Fonseca, Lopes Navarro, Pereira Borges, Moraes Sarmento, Carrilho, A. M. Pedroso, Santos Viegas, Sousa Pavão, A. Hintze Ribeiro, Augusto Poppe, Pereira Leite, Neves Carneiro, Avelino Calixto, Barão do Ramalho, Bernardino Machado, Conde da Praia da Victoria, Conde de Thomar, Cypriano Jardim, Ribeiro Cabral, E. Coelho, Emygdio Navarro, Sousa Pinto Basto, Fernando Geraldes, Correia Barata, Barros Gomes, Matos de Mendia, Sant'Anna e Vasconcellos, Franco Frazão, Augusto Teixeira, J. C. Valente, Scarnichia, Franco Castello Branco, Souto Rodrigues, João Arroyo, Ponces de Carvalho, J. J. Alves, Simões Ferreira, Correia de Barros, Azevedo Castello Branco, Ferreira de Almeida, Figueiredo Mascarenhas, Simões Dias, Luciano Cordeiro, Luiz Dias, Luiz Osorio, Correia de Oliveira, M. J. Vieira, Mariano de Carvalho, Guimarães Camões, Pedro de Carvalho, Santos Diniz, Gonçalves de Freitas, Vicente Pinheiro, Visconde das Laranjeiras, Visconde de Reguengos e Consiglieri Pedroso.

Entraram durante a sessão os srs.: - Alfredo Barjona de Freitas, Sousa e Silva, Ganha Bellem, Jalles, Pinto de Magalhães, Lobo d'Avila, Estevão de Oliveira, Castro Matoso, Frederico Arouca, Avellar Machado, Lourenço Malheiro, Pinheiro Chagas, Marçal Pacheco, Martinho Montenegro, Miguel Dantas, Rodrigo Pequito, Tito de Carvalho e Visconde de Ariz.

Não compareceram á sessão os srs.: - Adolpho Phimentel, Moraes Carvalho, Garcia de Lima, Albino Montenegro, Antonio Centeno, Antonio Ennes, Fontes Ganhado, Moraes Machado, Almeida Pinheiro, Seguier, Urbano de Castro, Augusto Barjona de Freitas, Fuschini, Barão de Viamonte, Caetano de Carvalho, Sanches de Castro, Carlos Roma du Bocage, Conde de Villa Real, Elvino de Brito, Goes Pinto, Fernando Caldeira, Filippe da Carvalho, Firmino Lopes, Vieira das Neves, Francisco Beirão, Francisco de Campos, Mártens Ferrão, Wanzeller Guilherme de Abreu, Silveira da Mota, Costa Pinto, Baima de Bastos, J. A. Pinto, Melicio, Teixeira de Vasconcellos, Ferrão de Castello Branco, Sousa Machado, J. .Alves Matheus, J. A. Neves, Joaquim de Sequeira, Teixeira Sampaio, Amorim Novaes, Borges de Faria, Dias Ferreira, Elias Garcia, Laranjo, Lobo Lamare, Pereira dos Santos, José Luciano, Ferreira Freire, José Maria Borges, Oliveira Peixoto, Pinto de Mascarenhas, Luiz Ferreira, Reis Torgal, Luiz Jardim, D. Luiz da Camara, Manuel d'Assumpção, M. da Rocha Peixoto, Manuel de Medeiros Aralla e Costa, M. P. Guedes, Miguel Tudella, Pedro Correia, Barbosa Centeno, Dantas Baracho, Pereira Bastos, Visconde de Alentem, Visconde de Balsemão, Visconde do Rio Sado é Wenceslau de Lima.

Acta - Approvada.

EXPEDIENTE

Officios

1.° Da camara dos dignos pares, remettendo a proposição de lei interpretando a disposição do n.° 2.° do § unico do artigo 10.° do decreto eleitoral de 30 de setembro de 1852.
Á commissão de legislação civil.

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590 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

2.° Do ministerio da fazenda, remettendo o processo do concurso a que ultimamente se procedeu para provimento do emprego de contador geral da contadoria da junta do credito publico e copia do decreto pelo qual o dito emprego foi provido.
Á secretaria.

REPRESENTAÇÕES

1.ª Da camara municipal do concelho de Santa Martha de Penaguião, pedindo que se consigne em Villa Nova de Gaia uma zona de armazenagem, aonde exclusivamente sejam recebidos os vinhos do Douro, e só estes possam sair com a marca «Porto» ou sem marca alguma.
Apresentada pelo sr. deputado Azevedo Castello Branco, enviada ás commissões de agricultura e de commercio e artes e mandada publicar do Diario do governo.

2.ª Da associação commercial de Coimbra, pedindo para se eliminar da legislação fiscal o § 1.° do artigo 228.° do regulamento de 28 de agosto de 1872 e substituir no codigo civil o n.° 4.° do artigo 539.°
Apresentada pelo sr. deputado Avelino Callixto, enviada ás commissões de legislação civil e de fazenda e mandada publicar no Diario do governo.

JUSTIFICAÇÕES DE FALTAS

1.º Declaro que faltei na ultima sessão, 3 de março, por motivo justificado de serviço na camara municipal de Lisboa. = O deputado, Consiglieri Pedroso.

2.ª Participo a v. exa. e á camara que o sr. Wenceslau de Lima não tem comparecido ás sessões por motivo de doença. = José Azevedo Castello Branco.

3.ª O nosso distincto collega e meu particular amigo o sr. Alves Matheus incumbiu-me de participar á camara que tem faltado a algumas sessões e ainda continuará faltando por motivo de molestia. = Luiz José Dias.

4.ª O sr. deputado Goes Pinto, meu amigo, incumbiu-me de participar a v. exa. e á camara que teve de retirar-se da capital por ter recebido a triste noticia de ter fallecido uma pessoa de sua familia. = Luiz José Dias.

5.º Participo a v. exa. e á camara que não tenho podido comparecer ás tres sessões anteriores por falta de saude. = Luiz José Dias.

6.ª Participo a v. exa. que o sr. deputado Sanches de Castro tem faltado a algumas sessões por motivos urgentes de serviço publico. = Avellar Machado.
Para a acta.

REQUERIMENTOS DE INTERESSE PARTICULAR

1.° De Filippe Roberto da Silva Stockler, pedindo novamente á camara para ser indemnisado das perdas soffridas na sua casa queimada em 1833 por ordem do governo para sua defeza.
Apresentado pelo sr. presidente da camara e enviado á commissão de fazenda.

2.° Quatro requerimentos de aspirantes a officiaes alumnos da escola do exercito, pedindo que lhes sejam concedidas as vantagens do decreto de 24 de dezembro de 1863.
Apresentados pelo sr. deputado Simões Ferreira e enviados á commissão de guerra.

3.° De F. A. da Silva Botelho, sargento aspirante com o curso de infanteria, no mesmo sentido.
Apresentado pelo sr. deputado Eduardo Cabral e enviado á commissão de guerra.

4.° De R. de S. Pinheiro Chagas, primeiro sargento graduado aspirante a official, no mesmo sentido.
Apresentado pelo sr. deputado Santos Diniz e enviado á commissão de guerra.

O sr. Azevedo Castello Branco: - Mando para a mesa uma representação da camara municipal de Santa Martha de Penaguião, pedindo que se designe em Villa Nova de Gaia uma zona de armazenagem onde sejam recebidos os vinhos do Douro, e só estes possam sair com a marca «Porto», ou sem marca alguma.
Isto é uma velha questão, que interessa muito aos lavradores do Douro, e sobre a qual chamarei em tempo conveniente a attenção do sr. ministro das obras publicas.
Esta representação devia ser apresentada pelo sr. Wenceslau de Lima, que pelo seu estado de saude não tem podido comparecer ás sessões.
Peço a publicação no Diario do governo. (Apoiados.)
Foi auctorisada a publicação no Diario do governo.
O sr. Luciano Cordeiro: - Por parte da commissão de emigração, mando para a mesa mais alguns documentos para se juntarem ,aos que já mandei n'uma das sessões anteriores, e que v. exa. mandará remetter para a imprensa nacional.
Mandaram-se publicar.
O sr. Carrilho: - Por parte da commissão de fazenda, mando para a mesa um parecer sobre os projectos do governo nos. 17-B e 17-C, que a commissão fundiu n'um só projecto.
Como já está impresso, peço a v. exa. se digne mandal-o distribuir pela camara.
Mandou-se distribuir.
O sr. Moraes Sarmento: - Mando para a mesa um projecto de lei, tendente a tornar effectiva e perpetua a cessão temporaria feita á camara municipal de Chaves, das muralhas e fossos que circundam a villa, pela carta de lei de 23 de junho de 1879.
Esta cedência torna-se urgente e necessaria para que aquella villa se possa desenvolver e estender, attendendo ao augmento crescente de população e á salubridade publica.
O projecto ficou para segunda leitura.
O sr. Lopes Navarro: - Sr. presidente, pedi a palavra para chamar a attenção do governo para um acontecimento grave, que hontem se deu em Moncorvo, e que póde ser origem de outros não menos graves.
Como v. exa. e a camara sabem, tinha-se ordenado uma syndicancia aos actos do juiz de Moncorvo, estava-se procedendo a ella e ainda não tinha terminado. Ora v. exa. e a camara tambem não ignoram, que, não tendo ainda terminado a syndicancia e tendo sido o juiz intimado a estar ausente da comarca emquanto ella durasse, elle não podia nem devia ali entrar antes de findar o praso marcado.
Pois hontem, ás duas horas da tarde, entrou elle em Moncorvo com os filhos, genro e um creado e um burro carregado com foguetes, que lançaram ao ar durante o trajecto desde a entrada da villa até á casa onde mora, originando d'esta fórma, que immediatamente apparecessem dois bandos, um em favor e outro contra o referido juiz.
Este facto podia dar logar a serios conflictos, e talvez esses conflictos já se tenham dado.
Espero por isso que o sr. ministro do reino, que sinto não ver presente, tome as providencias necessarias para que a ordem não seja alterada, e que o sr. ministro da justiça, que tambem sinto não ver presente, olhe para esta irregularidade do juiz, que não devia entrar na comarca, antes de terminada a syndicancia aos seus actos, como lhe

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tinha sido ordenado e é determinado pela legislação vigente.
Como não vejo presente nenhum dos srs. ministros a quem me dirigi, pedia a qualquer dos membros do governo presente tomasse nota d'este facto, que acaba de me ser communicado em telegramma, pelo sr. presidente da camara municipal de Moncorvo, cavalheiro cuja respeitabilidade me merece toda a confiança, e dessem d'elle conhecimento aos seus alludidos collegas para os devidos effeitos.
O estado da administração da justiça em Moncorvo é grave e não póde continuar assim.
O delegado é um magistrado recto e digno, e á sua muita prudencia se deve unicamente o não terem as cousas chegado a mais, porque a paciencia tambem tem limites. Assim o affirmam as representações das camaras municipaes de Moncorvo e Freixo de Espada á Cinta e as representações collectivas dos quarenta maiores contribuintes e de toda a mais gente seria e digna dos dois concelhos, sem distincção de cor politica, e assim o affirmo eu, embora s. exa. seja meu adversario politico.
O juiz, pelo contrario, completamente obsecado por vis odios e ruins paixões para com as principaes pessoas da villa de Moncorvo, por quem só devia professar gratidão e respeito, é que tem dado logar ao estado anarchico em que se encontra a administração da justiça n'aquella mal fadada comarca!
Das suas prepotencias, arbitrariedades e até crimes darei conhecimento a v. exa. e á camara em tempo opportuno. Não o faço agora, porque o não devo fazer, e concluo, pedindo promptas e energicas providencias ao governo.
O sr. Ministro das Obras Publicas (Emygdio Navarro): - O estado da comarca de Moncorvo é realmente grave, mas póde o illustre deputado ficar certo de que o governo ha de tomar as providencias necessarias para que aquelle estado cesse o mais depressa possivel, tendo sempre em vista o respeito devido ao principio da independencia do poder judicial, e salvaguardando esse principio.
O sr. Lopes Navarro: - Estranho o facto, só por não ter ainda terminado a syndicancia, motivo por que, por fórma nenhuma podia o juiz ter entrado na camara.
O Orador: - Posso unicamente dizer que se deram instrucções ao magistrado encarregado d'essa syndicancia; e tambem que ainda não ha communicação official do acontecimento a que o illustre deputado se referiu.
O sr. Eduardo Cabral: - Mando para a mesa um requerimento do sargento aspirante da arma de infanteria, Francisco Augusto da Silva Botelho, em que pede a esta camara lhe seja regulado o seu accesso pelo decreto de 24 de outubro de 1863.
O sr. Avelino Calixto: - Sr. presidente, tenho a honra de mandar para a mesa uma representação da associação commercial de Coimbra, em que se pede a substituição do § 1.° do artigo 228.° do regulamento da contribuição industrial de 28 de agosto de 1872, e a do n.° 4.° do artigo 539.° do codigo civil.
(Leu.)
Provavelmente quem redigiu esta representação, não sendo homem de lei, entendeu que o parlamento era o competente para reformar um artigo de regulamento, o que pertence ás attribuições do poder executivo.
Mas como o artigo 228.° do regulamento de 28 de agosto de 1872 é atranscripção textual do artigo 12.° da lei de 30 de julho de 1860, entendi que me cumpria apresentar um projecto de lei, porque só o poder legislativo tem competencia para revogar disposições d'esta ordem.
Tem, pois, esta representação duas partes. Uma refere-se á reforma de legislação fiscal, e outra a um ponto de direito civil.
Vou ler á camara o projecto de lei sobre a primeira parte, para, em tempo, ser submettido á sua apreciação.
(Leu.)
Direi, em poucas palavras, quaes os motivos, que me evaram ao convencimento da justiça d'esta representação e a apresentar este primeiro projecto de lei.
A lei de 30 de julho de 1860, no artigo 12.°, diz assim.
(Leu.)
Por esta simples leitura se evidenceia, que o legislador estabeleceu uma innovação forçada, deslocando a responsabilidade legal dos caixeiros para os seus patrões, e tornando estes responsaveis pela falta de pagamento das colectas d'aquelles, quando não pagas nos prasos legaes.
Ora esta innovação, sr. presidente, considero-a eu iniqua, violenta e immoral!
Sr. presidente, na sciencia e arte de legislar é essencial não perder jamais de vista a indicação dos factos e as lei da vida real.
Este criterio é o meio mais seguro para aquilatar e modificar as theorias que tanto assoberbam o espirito dos nossos legisladores modernos.
A quasi totalidade dos commerciantes tem nos seus estabelecimentos caixeiros, a quem, alem do ordenado, dão habitação, sustento e até educação. Em Lisboa e Porto, na maior parte, dão-lhes só ordenado.
Os commerciantes, luctando com o estado de insubordinação, que se tem alastrado em todas as classes sociaes contra o principio auctoritario, vêem-se obrigados, para conservarem estes empregados em suas casas, a fazerem-lhes constantemente adiantamentos, ou a suas familias, sempre exigentes e intolerantes.
D'aqui resulta, que na maior parte dos casos, não ha, no final do anno, saldo algum a favor dos caixeiros; pelo contrario, estes quasi sempre ficam devedores a seus patrões.
Mas ha mais. Não poucas vezes ha prejuizos, causados por esses empregados, sem que o commerciante tenha garantia de reembolso, nem sequer os meios faceis de tornar effectiva a responsabilidade civil ou criminal dos seus caixeiros.
N'estas circumstancias, considero uma grave iniquidade, que o commerciante fique, por sobre tudo isto, sujeito ainda a pagar as collectas da contribuição industrial dos seus caixeiros, quando não forem pagas nos prasos legaes!
Quando o caixeiro perfaz a idade de quinze annos, fica, segundo a lei, sujeito á collecta da contribuição industrial. E então que elle começa também, em regra, a vencer o seu ordenado e como estes empregados e as familias, são intolerantes n'este ponto, o commerciante tem de ceder, sendo rara a vez que ha saldo a seu favor.
Por outro lado o caixeiro, acobertado com esta, disposição da lei, não paga ao estado, de proposito, receiando pouco da subrogação legal do seu patrão, porque é apenas nominal.
Parece-me que a fazenda tem outro meio de garantir os seus direitos.
A fazenda póde promover execução sobre os ordenados dos caixeiros, vencidos ou vincendos, que estiverem em poder dos seus patrões.
Suppunhamos que o caixeiro abandona o estabelecimento, sem pagar as contribuições, n'esse caso, a fazenda póde promover a penhora nos seus vencimentos em qualquer parte e estabelecimento aonde for encontrado. O commerciante, feita que seja a penhora, entra com os ordenados vencidos em deposito.
E, se apesar d'isso a fazenda não tiver meio de tornar effectivos os seus interesses, não vejo que tenha direito a exigir responsabilidades a quem as não contrahin.
A fazenda, em taes circumstancias, fica tambem sujeita, como qualquer credor, á força maior de uma insolvencia.
Por estes motivos entendo que é justa a representação, n'esta parte, e que o respectivo projecto merece ser attendido pela camara.
A representação tem outra parte, que diz respeito espe

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592 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

cialmente a substituição do n.° 4.° do artigo 539.° do codigo civil, em materia de prescripção.
Este n.° 4.° dispõe, que as dividas de mercadores a retalho, por objectos vendidos a individuos, que não são mercadores, prescrevem por espaço de um anno.
Pede-se a substituição d'este artigo, com o fundamento de que é insufficiente este praso para que os commerciantes credores possam, n'esta qualidade, garantir os seus direitos e haveres.
A este respeito mando tambem para a mesa um outro projecto de lei, que submetto á apreciação da camara, o qual é concebido n'estes termos.
(Leu.)
Vou tambem expor succintamente os motivos, que para mim justificam a representação e o projecto.
Sr. presidente, a carta de lei de 1 de julho de 1867, que approvou o codigo civil, determinou, no artigo 7.°, que uma commissão de jurisconsultos seria encarregada de receber, colligir, e enviar ao seu destino todos os esclarecimentos e reclamações que dissessem respeito ao melhoramento da legislação civil, e que ao mesmo tempo servissem para resolver as difficuldades que elle tivesse apresentado na sua execução durante os primeiros cinco annos.
Os decretos de 13 de fevereiro de 1868 e de 27 de janeiro de 1870 constituiram e organisaram esta commissão, regulando tambem o respectivo serviço.
A maior parte dos membros d'esta commissão são hoje fallecidos.
Vão já decorridos dezesete annos, depois da vigencia do codigo civil, e não me consta que tenham dado entrada na secretaria da justiça quaesquer trabalhos, em ordem ao fim da lei de 1867.
É porém, fora de duvida, e a experiencia o tem mostrado, que muitas disposições do codigo civil estão reclamando reforma urgente: umas por incompletas e inefficazes, e outras por injustas e confusas.
Haja vista á deficiencia do codigo em materia de aguas e servidões.
O capitulo successões apresenta anomalias e confusões perigosas.
Á parte algumas providencias legaes e regulamentares, em materia de registo, tudo o mais se conserva no mesmo estado, apesar de os competentes reconhecerem a necessidade de aperfeiçoar a legislação civil, que, apesar de tudo, é uma das primeiras da Europa.
Está n'este caso o n.° 4.° do artigo 539.° do codigo civil.
Este artigo estabelece o praso de um anno para a prescripção das dividas dos commerciantes de retalho.
Sr. presidente, aproveitemos tambem n'esta questão as lições da experiencia, deduzida da observação das tradições, costumes e genio do povo para que se legisla.
Sem este criterio as reformas jamais serão efficazes e viaveis. As theorias sem possibilidade pratica já hoje não têem os foros e regalias scientificas. A sciencia é a expressão da verdade. E a verdade é o verificavel, o real, e não o abstracto, a não ser no mundo da subjectividade.
Quem tiver observado de perto, na vida do fôro, ou no movimento da vida commercial, as normas praticas que regulam, consuetudinaria e imperiosamente, os phenomenos tão complexos da vida commercial, não póde duvidar, um momento sequer, de que o praso de um anno para a prescripção das dividas de commercio a retalho é insuficiente para garantir os direitos dos commerciantes, e só dá logar a abusos e immoralidades.
A justiça e a moralidade completam-se. São dois modos de ser, solidarios do mesmo principio supremo, que regula a vontade humana na realisação do bem livre.
Entre o commerciante de retalho e os seus freguezes não póde deixar de haver da parte d'aquelle a maior tolerancia e condescendencia para com os seus devedores, não só pelo que respeita á extensão das vendas a credito, mas principalmente quanto aos prasos do pagamento.
Se obrigarmos os commerciantes, especialmente os de pequeno trato e os que principiam a sua carreira, a cumprirem o preceito do artigo 539.° do codigo civil, sob pena de perdimento dos seus direitos, será impossivel o commercio de retalho.
Será possivel intentar, dentro do anno e em todos os annos, um sem numero de acções, ou lançar mão dos meios caros e ruidosos que faculta o artigo 552.° do mesmo codigo para a interrupção da prescripção?!
O valor das dividas não daria; para a decima parte das despezas, afóra os lucros cessantes.
O consumidor, sendo coagido, póde pagar; mas não voltará ao estabelecimento.
Concorre logo ao que for mais tolerante, que os ha sempre, não por conveniencia do seu mister, mas porque muitos commerciantes não duvidam fazer concorrencia immoral aos commerciantes dignos, visto que nem sempre cogitam n'um futuro honrado e leal á sua classe!
Quantos commerceiam, sem capacidade pessoal e sem credito? Pois não são ás vezes os menos afreguezados!
Nas vendas por atacado ha garantias e elementos de prova mais efficazes; mas, no negocio a retalho, a venda a credito é a fórma commum d'estas transacções, especialmente pelo que respeita aos objectos de consumo.
Se o commerciante não tiver uma certa condescendencia com os seus devedores, em breve ficará abandonado o seu estabelecimento.
O devedor de consumo está sempre mal disposto, em regra, contra o commerciante credor.
Circumstancias alheias á sua vontade, ou habitos arreigados de má administração, perturbam-lhe o espirito, a ponto de descobrir sempre mais intenções no credor, que, no uso do seu direito, lhe pede a satisfação dos seus compromissos.
Se o pretexto da lei os poder salvar, não duvidam estes devedores trocar o valor moral do seu nome, por um acto de legalidade que, immoralmente, os desliga da responsabilidade material!
Infelizmente, é esta a realidade dos factos e a corrente dos costumes, contra os quaes o legislador não póde arcar de frente e de momento.
Ha poucos dias ainda, dizia o nobre ministro da fazenda, no relatorio de uma das suas propostas relativa ao pagamento domiciliário e mensal, que o meio mais pratico de augmentar a cobrança dos impostos era ampliar as facilidades de pagamento.
Pois eu, applicando este salutar principio á questão sujeita, direi que a ampliação do praso da prescripção para as dividas dos mercadores a retalho facilita o seu pagamento e garante melhor o direito dos credores.
Parece me, pois, que o praso de tres annos será sufficiente para este fim.
O devedor, que durante tres annos, e ácerca da mesma divida, tem recebido provas de tolerancia, por parte do seu credor, não póde já queixar-se com rasão plausivel; e só o fizer, a opinião sensata não o applaude, e nem o credor póde já ser taxado de exigente.
Tambem, durante este praso, o credor poderá, sem grave inconveniente, interromper a prescripção pelos meios que lhe faculta o artigo 552.° do codigo civil.
Por esta fórma garantem-se os direitos do credor, sem se aggravar a situação dos devedores. A equidade é a lei suprema do commercio, que não se sujeita, pela sua feição caracteristica, aos rigores e fatalidade das prescripções stricti juris.
São estas as considerações, que me parecem justificam a justiça d'esta representação e a dos projectos de lei que apresento, e cujo pensamento poderei explanar melhor, quando venham á tela da discussão,

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Mando, pois, para a mesa os dois projectos de lei e juntamente a representação, e, porque n'ella se trata de um assumpto de interesse geral, peço a v. exa. se digne consultar a camara sobre, se permitte que ella seja publicada no Diario do governo.
Foi approvada a publicação.
O sr. Cardoso Valente: - Mando para a mesa um projecto de lei.
(Leu.)
O pequeno relatorio que precede este projecto de lei contém as rasões justificativas da sua importancia, e, por isso me abstenho de fazer n'este momento quaesquer considerações em sua defeza.
O projecto ficou para segunda leitura.
O sr. Simões Ferreira: - Mando para a mesa quatorze requerimentos de differentes soldados e sargentos aspirantes a officiaes, pedindo que se lhes applique a lei de 13 de janeiro de 1860.
O sr. Miguel Dantas: - Pedi a palavra para perguntar a v, exa. se já foram remettidos a esta camara uns documentos que pedi em tempo, pelo ministerio da justiça.
O sr. Secretario (Souto Rodrigues): - Não, senhor; o requerimento foi expedido em 27 de fevereiro, mas ainda não foi satisfeito.
O Orador: - N'esse caso insisto pela remessa d'esses documentos, e peço que a requisição seja renovada.
O sr. Presidente: - Será renovada a requisição.
O sr. Alfredo Peixoto: - Declarou que, tendo entrado na camara pela primeira vez, ha quinze annos, e acompanhado sempre o partido regenerador, não tem necessidade de definir a sua situação diante do gabinete a quem estão confiados os negocios do governo; que será hostil em especial ao sr. ministro da fazenda, não por qualquer resentimento, mas por ser a mais importante, na actual conjun-ctura, a pasta de que s. exa. está encarregado; que não empregará contra este ministro, nem contra outro qualquer os meios de que o actual ministro tanto abusou; que não podia empregar esses meios, como contrarios á sua indole e á sua educação, e pela consideração que deve ao sr. presidente do conselho de ministros e ao sr. ministro das obras publicas. Alludiu então ás relações que com este tem desde o tempo em que ambos frequentaram a universidade, e a uma fineza que do mesmo recebeu n'esse tempo, declarando-se sempre muito reconhecido por ella.
Em seguida disse que insistia nas interpellações cujas notas haviam sido apresentadas pelo sr. deputado Sebastião Centeno. Uma d'ellas é dirigida ao sr. ministro dos negocios ecclesiasticos, ácerca do ensino da theologia nos seminarios; e a outra ao sr. ministro do reino, ácerca do estado actual do observatorio da universidade.
Alludiu ao conflicto entre o sr. bispo de Coimbra e a faculdade, de theologia na universidade, ácerca da superintendencia que ao estado e ao governo pertence no ensino de theologia.
Perguntou ao governo a sua opinião sobre este assumpto.
Protestou a sua consideração pelo sr. bispo conde, declarando que o considerava um dos mais dignos prelados do episcopado portuguez, um modelo em muitos negocios de administração ecclesiastica; mas não podia reputal-o incapaz de errar.
Entendia que este prelado tinha errado na doutrina que havia publicado sobre a acção que o estado e o governo devem ter no ensino de theologia em Portugal; e, portanto, que o governo devia declarar a sua opinião sobre a mesma doutrina. Ácerca do observatorio astronomico da universidade, declarou que havia abusos que reclamavam remedio prompto.
Em especial, mencionou, o facto de não ter sido aberto concurso para o provimento dos legares de ajudantes do mesmo observatorio, logares que n'estes ultimos annos têem sido servidos por individuos nomeados provisoriamente.
(O discurso será publicado na integra, quando s. exa. restituir as notas tachygraphicas.)
O sr. Ministro das Obras Publicas (Emygdio Navarro): - (O discurso será publicado quando s. exa. o restituir.)
O sr. Ministro da Fazenda (Mariano de Carvalho): - Sr. presidente, eu direi ao illustre deputado que não sei exactamente o estado em que se acha o observatorio da universidade de Coimbra, mas o governo não recusará, attendendo ás circumstancias do thesouro, todos os meios necessarios para que este estabelecimento se reorganise em harmonia com as necessidades d'este importante ramo de sciencias.
O sr. Presidente: - Vae passar-se á ordem do dia.

ORDEM DO DIA

Projecto n.° 15, approvando o encerramento das contas geraes das receitas e despezas do estado da metropole de 1877-1878 a 1882-1883

Leu-se na mesa.
É o seguinte:

PROJECTO DE LEI N.° 13

Senhores. - A vossa commissão do orçamento foi presente, em tempo opportuno, a proposta de lei n.° 2-C do governo transacto, encerrando as contas geraes das receitas e despezas do estado nos exercicios de 1877-1878 a 1882-1883, proposta que o actual governo adopta.
E considerando que a apresentação d'esse documento torna evidente quanto o serviço da contabilidade publica tem melhorado nos ultimos tempos e quanto os poderes do estado se têem esforçado para que as disposições da lei de 31 de agosto de 1831 sejam religiosamente cumpridas;
Considerando que do exame da proposta e dos documentos em que ellas e firma, isto é, das declarações geraes do tribunal de contas e da conta geral do estado na gerencia de 1884-1885, se torna evidente que depois da execução da citada lei de 31 de agosto do 1881, a regra geral foi o respeito pelas prescripções das leis dos orçamentos, cujas auctorisações não foram excedidas na realisação das despezas, excepto n'uma pequena verba do ministerio das obras publicas, e n'outra ainda mais diminuta da junta do credito publico, excesso que aliás se póde justificar pela execução de leis promulgadas posteriormente ao decretamento das tabellas de despeza do exercicio de 1882-1883;
Considerando que na mencionada conta geral do estado e na sua nota preliminar estão ciadas todas as explicações e se encontram todos os documentos justificativos da mesma proposta;
Considerando que as declarações geraes do tribunal de contas de 10 de fevereiro e 4 de agosto de 1885 sobre as referidas contas dos exercicios de 1877-1878 a l882-1883, mostram a conformidade d'ellas com a proposta apresentada;
A vossa commissão, congratulando-se pela apresentação do primeiro documento parlamentar, encerrando as contas geraes de receita e despeza do estado, e fazendo votos pela continuação do aperfeiçoamento da contabilidade publica, de modo a tornar facil o exame de como são cobrados e applicados os dinheiros da nação, e a poder fazer-se esse exame, rapida e opportunamente, como é indispensavel para a boa fiscalisação dos serviços do estado:
Entende que a proposta de lei n.° 2-C, deve ser approvada tal como foi submettida ao exame das côrtes, pelo governo transacto e convertida no seguinte projecto do lei:

Artigo 1.° As receitas e despezas geraes do estado, na metropole, nos exercicios de 1877-1878 a 1882-1883, inclusive, em vista das declarações proferidas pelo tribunal

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de contas, e em harmonia com a conta geral do estado e documentos annexos, na gerencia de 1884-1885, são fixadas definitivamente, segundo os mappas nos. 1 a 12 juntos a esta lei, e que d'ella fazem parte, nos termos seguintes:

I

Exercicio de 1877-1878

1.° São legalisados os excessos de despeza liquidada, n'este exercicio, em relação ás auctorisações estabelecidas por lei, e, n'essa conformidade, são concedidos creditos complementares para as despezas, na somma de 737:032$578 réis, repartida pelos diversos capitulos das respectivas tabellas.
2.° É annullada definitivamente dos creditos fixados para despezas do dito exercicio pelas leis do orçamento e especiaes, a somma de 638:055$700 réis, em que importa, pelos capitulos das mesmas tabellas, a differença para menos das despezas liquidadas comparadas com os creditos concedidos.
3.° É transferido para o exercicio em que se realisar a despeza, o credito de 81:304$911 réis, destinado á compra de armamentos, equipamento e material de guerra, resto do credito extraordinario de 500:000$000 réis auctorisado por decreto de 1 de setembro de 1866 e confirmado por lei de 2 de julho de 1867.
4.° São transferidos para os exercicios subsequentes, nos termos expressos do regulamento geral de contabilidade, em vigor durante o dito exercicio de 1877-1878, os creditos, na importancia total de 311:896$484 réis, representando a differença entre as liquidações de despeza e os pagamentos effectuados durante esse exercicio de 1877-1878.
5.° É considerada como receita propria do referido exercicio, a somma de 4.931:849$828 réis, parte do producto liquido do emprestimo consolidado de 1877.
6.° Os restos dos rendimentos do estado, liquidados durante o dito exercicio e por cobrar na data do seu encerramento, na somma de 549:742$363 réis, serão subsequentemente escripturados como receita propria dos exercicios em que a arrecadação de todos ou de parte d'esses restos se effectuar.
7.° São, pois, fixadas definitivamente as receitas e as despezas do estado no exercicio de 1877-1878 nos termos seguintes:

[Ver tabela na imagem]

II

Exercicio de 1878-1879

1.° São legalisados os excessos de despeza liquidada, n'este exercicio, em relação ás auctorisações concedidas por lei, e, n'essa conformidade, são concedidos creditos complementares para as despezas na somma de 175:354$097 réis, repartida pelos diversos capitulos das respectivas tabellas.
2.° É annullada definitivamente dos creditos fixados para despezas do dito exercicio, pelas leis do orçamento e especiaes, a somma de 437:860$626 réis, em que importa pelos capitulos das mesmas tabellas a differença para menos das despezas liquidadas, comparadas com os creditos concedidos.
3.° São transferidos para os exercicios, em que se realisarem as despezas, os creditos de 81:304$911 réis, destinados á compra de armamento, equipamento e material de guerra, resto do credito extraordinario de 500:000$000 réis, auctorisado por decreto de 1 de setembro de 1866 e confirmado por lei de 2 de julho de 1867, e o credito de 200:000$000 réis, para acquisição de propriedades pertencentes á camara municipal de Lisboa, nos termos da lei de 10 de maio de 1878.
4.° São transferidos para os exercicios subsequentes, nos termos expressos do regulamento geral de contabilidade, em vigor durante o dito exercicio, os creditos na importancia total de 413:752$481 réis, correspondentes á differença entre as liquidações de despeza e os pagamentos effectuados durante o mesmo exercicio de 1878-1879.
5.° É considerada como receita propria do referido exercicio a somma de 1.801:398$499 réis, parte do producto liquido do emprestimo consolidado de 1877.
6.° Os restos dos rendimentos do estado, liquidados durante o exercicio, e por cobrar na data do seu encerramento, na somma de 571:671$128 réis, serão subsequentemente escripturados como receita propria dos exercicios em que a arrecadação de todos ou parte d'esses restos se effectuar.
7.° São, pois, fixadas definitivamente as receitas e as despezas do estado no exercicio de 1878-1879, nos termos seguintes:

[Ver tabela na imagem]

III

Exercicio de 1879-1880

1.° São legalisados os excessos de despeza liquidada, n'este exercicio, em relação ás auctorisações concedidas por lei, e, n'essa conformidade, concedidos creditos complementares para as despezas, na somma de 390:093$725 réis, repartida pelos diversos capitulos das respectivas tabellas.
2.° É annullada definitivamente dos creditos fixados para despezas do dito exercicio pelas leis do orçamento e especiaes, a somma de 898:725$734 réis, em que importa, pelos capitulos das mesmas tabellas, a differença para menos das despezas liquidadas, comparadas com os creditos concedidos.
3.° São transferidos para os exercicios em que se realisarem as despezas, os creditos de 81:304$911 réis, destinados á compra de armamento, equipamento e material de guerra, resto do credito extraordinario de 500:000$000 réis auctorisado por decreto de 1 de setembro de 1866 e confirmado por lei de 2 de julho de 1867, e o credito de réis 70:000$000 para acquisição de propriedades pertencentes á camara municipal de Lisboa, parte do credito concedido, nos termos da lei de 10 de maio de 1878.
4.° São transferidos para os exercicios subsequentes, nos termos expressos do regulamento geral de contabilidade, em vigor durante o dito exercicio, os creditos na importancia total de 218:984$691 réis, representando a differença entre as liquidações de despeza e os pagamentos effectuados durante o dito exercicio de 1879-1880.
5.° É considerada como receita propria do referido exercicio de 1879-1880, o producto liquido: do emprestimo consolidado de 1877 (parte), na somma de
1.848:491$262 réis;
do emprestimo consolidado de 1878, na somma de réis 5.318:264$175;
do emprestimo consolidado de 1880 (parte), na somma de 1.341:022$479 réis.
6.° Os restos dos rendimentos do estado, liquidados durante o exercicio e por cobrar na data do seu encerramento, na somma de 533:584$866 réis, serão, subsequentemente, escripturados como receita propria dos exercicios.

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em que a arrecadação de todos ou parte d'esses restos se effectuar.
7.° São, pois, fixadas definitivamente as receitas e as despezas do estado no exercicio de 1879-1880, nos termos seguintes:

[Ver tabela na imagem]

IV

Exercicio de 1880-1881

1.° São legalisados os excessos de despeza liquidada, n'este exercicio, em relação ás auctorisações marcadas por lei, e, n'essa conformidade, são concedidos creditos complementares para as despezas, na somma de 407:167$430 réis, repartida pelos diversos capitulos das respectivas tabellas.
2.° É annullada definitivamente dos creditos fixados para despezas do dito exercicio pelas leis do orçamento e especiaes, a somma de 1.218:486$163 réis, em que importa, pelos capitulos das mesmas tabellas, a differença para menos das despezas liquidadas comparadas com os creditos concedidos.
3.° É transferida para o exercicio seguinte de 1881-1882 a somma de 81:304$911 réis, destinada á compra de armamento, equipamento e material de guerra, resto do credito extraordinario de 500:000$000 réis, auctorisado por decreto de 1 de setembro de 1866 e confirmado por lei de 2 de julho de 1867.
4.° São transferidos para os exercicios subsequentes, nos termos expressos do regulamento geral de contabilidade em vigor, durante o mesmo exercicio, os creditos na importancia total de 272:524$932 réis, representando a differença entre as liquidações de despeza e os pagamentos effectuados durante o dito exercicio de 1880-1881.
5.° É considerada como receita propria do exercicio a somma de 8.359:628$729 réis, parte do producto liquido do emprestimo consolidado de 1880, em que se inclue réis 2.438:000$000 para subvenção da construcção do caminho de ferro da Beira Baixa, nos termos do artigo 9.° da lei de 22 de março de 1878.
6.° Os restos dos rendimentos do estado, liquidados durante o exercicio e por cobrar na data do seu encerramento, na somma de 649:361$849 réis, serão, subsequentemente, escripturados como receita propria dos exercicios em que a arrecadação de todos ou de parte d'esses restos se effectuar.
7.° São, pois, fixadas definitivamente as receitas e as despezas do estado no exercicio de 1880-1881, nos termos seguintes:

[Ver tabela na imagem]

V

Exercicio de 1881-1882

1.° São legalisados os excessos de despeza liquidada n'este exercicio em relação ás auctorisações estabelecidas por lei, e, n'essa conformidade, são concedidos creditos complementares para as despezas na somma de 359:972$984 réis, repartida pelos diversos capitulos das respectivas tabellas.
2.° É annullada definitivamente dos creditos fixados para despezas do dito exercicio, pelas leis do orçamento e especiaes, a somma de 589:619$024 réis, em que importa, pelos capitulos das mesmas tabellas, a differença para menos das despezas liquidadas, comparadas com os creditos concedidos.
3.° É transferida para o exercicio de 1882-1883 a somma de 81:304$911 réis, destinada á compra de armamento, equipamento e material de guerra, resto do credito extraordinario de 500:000$000 réis, auctorisado por decreto de 1 de setembro de 1866 e confirmado por lei de 2 de julho de 1867.
4.° São transferidos para os exercicios, subsequentes, nos termos expressos do regulamento geral de contabilidade publica, em vigor durante o mesmo exercicio de 1881-1882, os creditos na importancia total de 359:972$984 réis, representando a differença entre as liquidações de despeza e os pagamentos effectuados durante o dito exercicio.
5.° É considerado como receita propria do referido exercicio o producto de diversas operações realisadas pela divida fluctuante, na importancia de 5.652:428$765 réis, para satisfazer com regularidade as despezas do mesmo periodo.
6.° Os restos dos rendimentos do estado liquidados durante o exercicio, e por cobrar na data do seu encerramento, na somma de 568:450$904 réis, serão, subsequentemente, escripturados como receita propria dos exercicios em que a arrecadação de todos ou de parte d'esses restos se effectuar.
7.° São, pois, fixadas definitivamente assim as receitas e as despezas do estado no exercicio de 1881-1882:

[Ver tabela na imagem]

VI

Exercicio de 1882-1883

1.° São legalisados os excessos de despeza liquidada n'este exercicio, em relação ás auctorisações fixadas por lei; e, n'essa conformidade, são concedidos creditos complementares para as despezas effectuadas, na somma de 14:227$208 réis, repartida pelos diversos capitulos das respectivas tabellas.
2.° É annullada definitivamente dos creditos fixados para despezas do dito exercicio, pelas leis do orçamento e especiaes, a somma de 1.247:237$629 réis, em que importa pelos capitulos das mesmas tabellas, a differença, para menos, das despezas liquidadas, comparadas com os creditos concedidos.
3.° São transferidos para o exercicio de 1883-1884, ou para aquelles em que se realisar a despeza, os creditos de:

2:967$416 réis para acquisição de torpedos e material correlativo, saldo da auctorisação concedida pela lei de 21 de junho de 1880;
9:291$481 réis para compra de armamento e material de guerra, saldo da auctorisação concedida por lei de 3 de maio de 1878;
81:304$911 réis tambem para armamento, saldo do credito concedido por carta de lei de 2 de julho de 1867.

93:563$808

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4.° São transferidos para os exercicios subsequentes, nos termos expressos do regulamento geral de contabilidade publica, em vigor durante o mesmo exercicio de 1882-1883, os creditos na importancia total de 685:622$829 réis, representando a differença entre as liquidações de despeza e os pagamentos effectuados durante o exercicio.
5.° É considerado como receita propria do referido exercido, o producto de diversas operações realisadas pela divida fluctuante, na importancia de 2.493:857$694 réis, para satisfazer com regularidade as despezas do dito periodo.
6.° Os restos dos rendimentos do estado, liquidados durante o exercicio e por cobrar na data do seu encerramento, na somma de 830:629$097 réis, serão subsequentemente escripturados como receita propria dos exercicios em que a arrecadação de todos ou de parte d'esses restos se effectuar.
7.º São, pois, fixadas definitivamente assim as receitas e as despezas do estado no exercicio de 1882-1883:

[Ver tabela na imagem]

Art. 2.° São consideradas como effectuadas nos referidos exercicios de 1877-1878 a 1882-1883 todas as transferencias de verbas, que para execução d'esta lei, das demais da contabilidade e das annuaes de receitas e despezas publicas, deviam ter sido decretadas de artigo para artigo dentro de cada um dos capitulos das diversas tabellas, e são igualmente approvadas as operações de contabilidade, effectuadas por encontro, para o encerramento das contas dos mencionados exercicios.

Art. 3.° Fica revogada toda a legislação contraria a esta

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Mappas definitivos das receitas e despezas geraes do estado na metropole, nos exercicios de 1877-1878 a 1882-1883, a que se refere a lei d'esta data, e que d'ella fazem parte

N.º 1 - Receitas geraes no exercicio de 1877-1878

[Ver tabela na imagem]

Ministerio dos negocios da fazenda, aos 7 de janeiro de 1886. = Ernesto Rodolpho Hintze Ribeiro.

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598 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

N.° 2 - Despezas geraes no exercicio de 1877-1878

[Ver tabela na imagem]

Ministerio dos negocios da fazenda, aos 7 de janeiro de 1886.= Ernesto Rodolpho Hintze Ribeiro.

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SESSÃO DE 5 DE MARÇO DE 1886 599

N.° 3 - Receitas geraes no exercicio de 1878-1879

[Ver tabela na imagem]

Ministerio dos negocios da fazenda, aos 7 de janeiro de 1886. = Ernesto Rodolpho Hintze Ribeiro.

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600 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

N.º 4 - Despezas geraes no exercicio de 1878-1879

[Ver tabela na imagem]

Ministerio dos negocios da fazenda, aos 7 de janeiro de 1886. = Ernesto Rodolpho Hintze Ribeiro.

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SESSÃO DE 5 DE MARÇO DE 1886 601

N.° 5 - Receitas geraes no exercicio de 1879-1880

[Ver tabela na imagem]

Ministerio dos negocios da fazenda, aos 7 de janeiro de 1886.= Ernesto Rodolpho Hintze Ribeiro.

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602 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

N.° 6 - Despezas geraes no exercicio de 1879-1880

[Ver tabela na imagem]

Ministerio dos negocios da fazenda, aos 7 de janeiro de 1886. = Ernesto Rodolpho Hintze Ribeiro.

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SESSÃO DE 5 DE MARÇO DE 1886 603

N.° 7 - Receitas geraes no exercicio de 1880-1881

[Ver tabela na imagem]

Ministerio dos negocios da fazenda, aos 7 do janeiro de 1886. = Ernesto Rodolpho Hintze Ribeiro.

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604 DIARIO DA CAMARA DOS DEPUTADOS

[Ver tabela na imagem]

N.° 8 - Despezas geraes no exercicio de 1880-1881

Ministerio dos negocios da fazenda, aos 7 de janeiro de 1886.= Ernesto Rodolpho Hintze Ribeiro.

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[Ver tabela na imagem]

N.° 9 - Receitas geraes no exercicio de 1881-1882

Ministerio dos negocios da fazenda, aos 7 de janeiro de 1886. = Ernesto Rodolpho Hintze Ribeiro.

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[Ver tabela na imagem]

N.° 10 - Despezas geraes no exercicio de 1881-1882
Ministerio dos negocios da fazenda, aos 7 de janeiro de 1886. = Ernesto Rodolpho Hintze Ribeiro.

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[Ver tabela na imagem]

N.° 11 - Receitas geraes no exercicio de 1882-1883

Ministerio dos negocios da fazenda, aos 7 de janeiro de 1886. = Ernesto Rodolpho Hintze Ribeiro.

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[Ver tabela na imagem]

N.° 12 - Despezas geraes no exercicio de 1882-1883

Sala da comissão do orçamento, aos 25 de fevereiro de 1886. = Caetano Pereira Sanches de Castro = Henrique da Cunha Matos de Mendia = Tito Augusto de Carvalho = Fernando Affonso Geraldes = Manuel Pinheiro Chagas = Manuel d'Assumpção = João Pereira Teixeira de Vasconcellos = Augusto Neves dos Santos Carneiro = Miguel D. G. Pereira = João J. d'Antas Souto Rodrigues = Antonio M. Pereira Carrilho, relator.

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Foi approvado na generalidade.
Artigo 1.°
O sr. Carrilho (relator): - Sr. presidente, pedi a palavra para fazer a declaração de que ha um erro nos mappas, devendo eliminar-se as palavras «Ministerio dos negocios da fazenda, assignado, Ernesto Rodolpho Hintze Ribeiro».
Posto a votos o artigo l.º, foi approvado com a rectificação.
Os artigos 2.° e 3.° foram approvados.
O sr. Presidente: - Vae ler-se, para entrar em discussão, o projecto n.º 20.
Leu-se na mesa.
É o seguinte:

PROJECTO DE LEI N.° 20

Senhores. - Foi presente á vossa commissão de fazenda a proposta do governo n.° 17-D, auctorisando a cobrança domiciliaria em Lisboa da contribuição industrial em prestações mensaes.
A vossa commissão:
Considerando que esta medida terá por effeito a apreciação de um systema de cobrança que se autolha como immensamente vantajoso para o thesouro e commodo para o contribuinte, systema já preconisado na proposta de fazenda n.° 1 do governo transacto;
Considerando que a maior producção do imposto a que se pretende applicar o systema de cobrança domiciliaria deve compensar largamente a despeza a fazer com os cobradores:
É de parecer que merece a vossa approvação o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° É o governo auctorisado a estabelecer em Lisboa a cobrança domiciliaria da contribuição industrial em prestações mensaes, introduzindo nos regulamentos as modificações indispensaveis para este fim.
§ 1.° Os cobradores domiciliarios era cada bairro serão nomeados pelos respectivos recebedores, de sua inteira responsabilidade e escolhidos quanto possivel entre os distribuidores telegrapho-postaes effectivos ou supranumerarios;
§ 2.° O governo, sob proposta dos recebedores e ouvido o delegado do thesouro, fixará o numero de cobradores para cada bairro e a sua remuneração por meio de percentagem sobre a cobrança effectuada.
Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.
Sala das sessões da commissão, 3 de março de 1886. = José Dias Ferreira = Antonio M. P. Carrilho = Adolpho Pimentel = Manuel Pinheiro Chagas = Filippe de Carvalho = Luciano Cordeiro = Correia Barata = Antonio de Sousa Pinto de Magalhães = Manuel Pacheco = Lopes Navarro = Frederico Arouca = Arthur Hintze Ribeiro = João Arroyo, relator.

N.º 17-D

Senhores. - Todas as administrações se têem esforçado por melhorar o lançamento, repartição e cobrança da contribuição industrial, aquella na verdade cujo systema mais obedece a um pensamento verdadeiramente democratico. As modificações sucessivas introduzidas n'esta imposição têem, certo é, aproveitado ao thesouro e em parte beneficiado os cidadãos; porém, força é reconhecer que muito existe ainda para aperfeiçoar, embora n'este proposito tenham desveladamente lidado as estações publicas desde bastantes annos.
Não é agora o ensejo opportuno para delinear a reforma completa da contribuição sobre o commercio, as industrias, e o exercicio das profissões, mas ao governo parece que ainda n'este momento alguma cousa se póde tentar em beneficio do thesouro e dos contribuintes.
Estabelecida a faculdade do pagamento da contribuição industrial em prestações mensaes, levantaram-se taes difficuldades relativas ao lançamento e repartição d'ella, que a despeito da melhor vontade dos governos ainda hoje se cobram sete prestações no mez de janeiro e as restantes nos ultimos cinco mezes do anno economico. O beneficio que a lei pretendeu proporcionar ao estado e ao contribuinte acha-se, portanto, reduzido a menos de metade.
Observa-se, por outro lado, que o thesouro soffre todos os annos avultados prejuizos na cobrança da contribuição industrial, mórmente em Lisboa. Com effeito a liquidação no continente feita na gerencia de 1883-1884 produziu 1.320:311$426 réis e a cobrança 1.074:083$337 réis, correspondendo a differença de 246:228$089 réis a 18,6 por cento de perda em relação á liquidação, o que já é excessivo.
Examinando, porém, os factos mais de perto chega-se aos seguintes resultados:

[Ver tabela na imagem]

Circumstancia similhante se encontra relativamente á gerencia de 1884-1885, na qual os resultados, embora algum tanto melhores, ainda foram:

[Ver tabala na imagem]

Em todos os annos se apresenta a perda na cobrança d'este imposto, muito mais em Lisboa, que no resto do reino.
Não deve o facto attribuir-se á condensação da população, que não é no Porto bastante differente de Lisboa para explical-o. Mas, alem de outras causas, póde em parte attribuir-se: á differença das collectas, porque aproveitando os ultimos resultados publicados, a collecta media é em Lisboa de 26$783 réis, no Porto de 19$949 réis, e no resto do reino de 3$258; aos habitos da população, posto que em Lisboa a cobrança de sete prestações é no mez seguinte ao das mudanças geraes de domicilio, e que os pequenos commerciantes e industriaes a miudo mudam de residencia.
N'esta situação os interesses do thesouro conciliam-se com os dos cidadãos, estabelecendo effectivamente na capital a cobrança por duodecimos, e tornando-a domiciliaria como era idéa do governo em 1881 e como o propoz o digno par Hintze Ribeiro nos seus projectos tributarios.
No futuro, melhorados os methodos de lançamento e repartição d'este imposto, será possivel e facil a cobrança em duodecimos, exigindo-se ao contribuinte em cada mez a quota exacta correspondente; por emquanto é indispensavel cobrar em cada mez do segundo semestre do anno civil alguma cousa mais ou menos do que lhe caberia em virtude da divisão exacta. Mas em regra geral as differenças não serão grandes para os contribuintes, que já estiverem na matriz e se conservarem n'ella, e terão compensações nas cobranças seguintes. Nenhum inconveniente haverá para os que, tendo sido collcctados n'um anno, deixarem de o ser no immediatamente seguinte. E para aquelles que de novo o forem, cobrar-se-hão em cada mez duas prestações duodecimaes. Pequenissimas modificações nas matrizes serão bastantes para se conseguir este resultado.
Os cobradores nos domicilios, escolhidos de preferencia entre os distribuidores telegrapho-postaes, serão nomeados pelos recebedores e da sua responsabilidade; o seu numero para toda a cidade será fixado pelo governo sob proposta dos recebedores, ouvido o delegado do thesouro, e a sua

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retribuição far-se-ha por meio de percentagens proporcionaes á cobrança effectuada por cada um.
Os estudos feitos permittem calcular que a despeza com este serviço não excederá a 8:000$000 réis por anno, e encontrará ampla compensação no beneficio prestado aos contribuintes e nos redditos do thesouro. Pouco basta que se melhore na cobrança realisada para haver lucro effectivo.
Por estes motivos tenho a honra de submetter á vossa esclarecida apreciação a seguinte proposta de lei:
Artigo 1.° É o governo auctorisado a estabelecer em Lisboa a cobrança domiciliaria da contribuição industrial em prestações mensaes, introduzindo nos regulamentos as modificações indispensaveis para este fim.
§ 1.° Os cobradores domiciliarios em cada bairro serão nomeados pelos respectivos recebedores, de sua inteira responsabilidade, e escolhidos, quanto possivel, entre os distribuidores telegrapho-postaes effectivos ou supranumerarios.
§ 2.° O governo, sob proposta dos recebedores e ouvido o delegado do thesouro, fixará o numero de cobradores para cada bairro e a sua remuneração por meio de percentagem sobre a cobrança effectuada.
Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.
Ministerio dos negocios da fazenda, gabinete do ministro, em 1 de março de 1886. = Maroiano Cyrillo de Carvalho.

O sr. Consiglieri Pedroso: - Sr. presidente, pedi a palavra sobre este projecto, não tanto para o discutir, como para sobre elle apresentar algumas duvidas, que me parece talvez possam ser esclarecidas, ou pelo sr. ministro da fazenda, ou pelo sr. relator da commissão.
E digo que não discutirei o projecto, porque n'elle se não altera nenhuma das nossas leis tributarias, mas só se pede auctoriaação para ensaiar um novo methodo de cobrança com relação a uma das contribuições directas.
O governo pede, com effeito, n'este projecto, para, como experiencia, ser auctorisado a estabelecer em Lisboa a cobrança domiciliaria e por duodecimos da contribuição industrial, e pede mais á camara o consentimento indispensavel para poder organisar o serviço d'essa cobrança.
O relatorio do sr. ministro da fazenda, que precede o projecto em discussão, indica com a eloquencia dos algarismos a differença, por vezes extraordinaria, entre as verbas da contribuição industrial liquidada e as verbas da contribuição industrial arrecadada, especialmente na capital.
O sr. ministro da fazenda, talvez com demasiado optimismo, suppõe que, applicando este novo methodo de cobrança ao referido imposto, as differenças hão de desapparecer, e a percentagem tão exagerada da perda da contribuição arrecadada, ha de ir-se successivamente reduzindo.
Eu não quero combater o principio em que se funda o processo de cobrança que se pretende ensaiar entre nós.
Este processo, alem d'isso, vae ser applicado ao imposto que entre nós está estabelecido em bases mais democraticas, e logo que possa traduzir-se n'uma realidade, mais democratica tornará ainda a respectiva contribuição.
Poupar tempo e trabalho aos contribuintes de uma cidade de tão vasta area, como a que Lisboa, depois da lei de 18 de junho ultimo, vae ter, é incontestavelmente um beneficio, e porventura um certo ganho para o thesouro, ainda que sobre este ultimo ponto eu tenha as mais justificadas duvidas.
Porque, não obstante o processo que se quer ensaiar agora pela primeira vez merecer a minha sympathia, eu sou um pouco incredulo com relação ás suas vantagens praticas, especialmente se o governo ficar com a auctorisação, tal qual se contém no artigo 1.°
A cobrança domiciliaria por duodecimos, sendo em these muito equitativa e muito justa, destinando-se a facilitar o mais possivel ao pagamento da contribuição industrial, e portanto a fazer entrar no thesouro a maior parte d'ella, na pratica virá a produzir, segundo o meu presentimento, uma serie de dificuldades e embaraços que dentro em pouco hão de tornar completamente inexequivel esta lei. Oxalá que eu me engane, e se não cumpra similhante vaticinio!
No entretanto, a duvida é permittida; pois creio que n'este caso nenhum de nós póde ter, a priori, uma opinião certa e segura sobre o assumpto.
O proprio parecer da commissão, que approva a proposta do governo, assim o confirma.
Ora, se da parte da commissão, onde aliás não faltam competencias especiaes em relação ao assumpto, se confessa que o systema da cobrança domiciliaria é meramente uma experiencia a tentar; que prova isto senão que estamos num campo hypothetico, sem base segura em que nos possamos apoiar, e apenas com um certo numero de probabilidades a favor da innovação proposta? A experiencia, no emtanto, vae-se fazer, e eu não a condemno. Mas se é a uma experiencia que se vae proceder; se é uma tentativa de exito, ainda não certo, que se vae pôr em pratica, applicando-a á cobrança de um imposto, que até hoje pelo methodo da cobrança ordinaria tem deixado um deficit tão grande, não parece natural que o governo peça, e a commissão conceda uma auctorisação permanente para tal fim.
Se o ensaio é puramente provisorio, provisoria seja tambem a auctorisação que esta camara vae dar ao sr. ministro da fazenda.
É esta a boa doutrina, e é isto o que aconselha a prudencia.
Por isso mal comprehendo os termos em que está redigido o artigo 1.° d'este projecto, sobretudo se os comparo com o que se diz no relatorio da illustre commissão de fazenda. Parece-me francamente que o governo foi alem do que podia pedir, e a commissão do que podia conceder.
Se se trata de uma experiencia, repito, cujos resultados, por provaveis que sejam, não são comtudo certos, não era mais proprio que o governo pedisse uma auctorisação provisoria, por um ou dois annos, por exemplo?
Seria não só o mais proprio, mas até o mais natural.
(Interrupção do sr. ministro da fazenda.)
Bem sei que daqui a dois annos se póde revogar esta disposição, se se entender que não convém que a auctorisação continue, e que o permanente que se estabelece na lei não tem por consequencia rasão de ser.
Mas v. exa., sr. presidente, sabe que pelos §§ 1.° e 2.° é creado um serviço de empregados, cuja despeza se calcula no relatorio do sr. ministro da fazenda em 8:000$000 réis.
Ora, se este serviço for organisado, mencionando-se na lei a circumstancia de que o trabalho que estes empregados vão desempenhar é meramente provisorio, não ha direitos adquiridos; e, quando amanhã se conheça que a experiencia não deu resultado, é claro que esses empregados voltam á situação em que se encontravam anteriormente, não tendo que exigir cousa alguma do estado, que nem sequer os illudiu ao tomal-os ao seu serviço.
Se pelo contrario o artigo 1.° der ao serviço da cobrança domiciliaria um caracter permanente, ainda que aos empregados, que vão admittir-se se não concedam expressamente garantias algumas, eu, que conheço bem n'este ponto as tradições da minha terra, prevejo já que não haverá governo que, se amanhã esta experiencia acabar, tenha a coragem de mandar para suas casas os funccionarios do serviço extincto.
Ha de inventar-se, esteja v. exa. certo d'isso, um meio de transição e de transacção; ha de organisar-se um serviço qualquer para occupar os desempregados; em summa ha de procurar-se por todas as fórmas escapar ao odioso que mais ou menos traz sempre comsigo o facto de ter de

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despedir em massa individuos que se suppunham já permanentemente ao serviço do estado.
Se não houver que se lhes dar, ficarão addidos...
(Áparte.)
Pois, se se admittem com o caracter provisorio, era melhor que desde logo se désse bons resultados, então viria á camara uma medida definitiva, que n'esta casa ninguem deixaria de votar.
Tanto mais que o sr. ministro da fazenda, tendo de apresentar no anno proximo ao parlamento uma reorganisação da fazenda publica, conforme prometteu, facilmente n'essa occasião encontraria meio de apresentar a este respeito uma proposta definitiva.
Aqui está o motivo por que eu não posso conceder ao governo a auctorisação contida n'este projecto de lei.
Eu, sr. presidente, disse ha pouco que era incredulo a respeito dps effeitos
Da proposta de lei patrocinada pelo sr. Mariano de Carvalho, que a salvou do naufragio da herança do sr. Hintze Ribeiro.
Parece-me effectivamente que este projecto, correspondendo aliás a uma aspiração que eu applaudo, não ha de produzir os resultados praticos que d'elle se esperam. E isto por uma rasão, que vou apontar á camara, e que com certeza o sr. ministro da fazenda não desconhece.
Facilitando-se a cobrança do imposto industrial, por meio de recebimento domiciliario, estou persuadido de que mais algumas sommas entrarão nos cofres publicos; mas creio ainda assim, que a divergencia entre a verba da contribuição liquidada e a verba da contribuição cobrada ha de manter-se sempre em Lisboa de um modo muito acentuado
É que esta divergencia não se suprime apenas com o aperfeiçoamento nos methodos de cobrança.
E quer v. exa. saber porque?
Quanto a mim, e póde ser que me engane, mas a experiencia o demonstrará, o defeito principal não está nos methodos da cobrança; está mais no lançamento, ou para melhor dizer, na materia collectavel.
O defeito principal, e o futuro o demonstrará, está nas matrizes. Mais do que ninguem, o sr. ministro da fazenda, que conhece maravilhosamente o mechanimo administrativo eleitoral em Lisboa, está no caso de comprehender a rasão por que nas matrizes ha sujeitos ao imposto muitas centenas e talvez milhares de individuos meramente ficticios, ahi introduzidos apenas com fins eleitoraes, para contrabalançar o suffragio independente da capital.
Todos os dias se accusam gravissimas fraudes nos nossos recenseamentos, que necessariamente trazem comsigo fraudes identicas na confecção das matrizes.
Qual é o principal motivo determinante d'estas fraudes?
É, torno a repetil-o, o de organisar um corpo eleitoral ficticio, que está sempre á disposição d'aquelles que conhecem os segredos e os escaninhos d'estes documentos officiaes.
Não será esta uma das causas, se não a principal, por que tão grandes differenças se encontram entre a contribuição liquidada e a arrecadada?
A contribuição liquidada é calculada pelas matrizes, ou directamente, ou, como na contribuição industrial, por intermedio dos gremios. É a que devia ser, se as matrizes fossem verdadeiras.
A contribuição arrecadada, pelo contrario, é em grande parte a real, isto é, a contribuição paga pelos individuos authenticos. A differença principal entre as duas contribuições, desnecessario é dizel-o, significa o que não foi pago pelos contribuintes ficticios, incluindos na matriz pela corrupção eleitoral.
De modo que, por mais que se faça, por mais que se procure ir ao encontro do contribuinte, para que elle de ao estado aquillo que elle deve, o mais que se póde conseguir é reduzir a percentagem da divida, com relação aos contribuintes existentes; com relação porém, aos que meramente figuram, como fraude, na matriz e nos recenseamentos, claro está que nada se conseguirá!
Deixo estas considerações á camara, e ao sr. ministro da fazenda, para que pesem bem e investiguem até que ponto o factor que acabo de mencionar, e que considero de maior importancia, explica as enormes differenças que todos nós podemos ler no orçamento geral do estado e no relatorio que precede o projecto de lei que se discute.
Eu não ignoro que ha sempre uma certa quebra dos impostos liquidados para os arrecadados, em todos os paizes, e quaequer que os impostos sejam. Mas, quando as differenças chegam a attingir 33,25 por cento, como aconteceu com a contribuição industrial em Lisboa no anno de 1883 a 1884, é necessario que
admittamos a intervenção de causas estranhas ás que de ordinario fazem abater o rendimento de todos os impostos.
Este projecto não é, pois o remedio para os factos anormaes que no relatorio se apontam. O principal remedio está n'uma refundição completa dos methodos por que se elaboram os decumentos officiaes que servem de base para o lançamento dos impostos.
Não é a primeira vez que n'esta casa se fazem referencias aos factos que eu agora apontei; o que é novo, me parece, é a approximação entre esses factos e a anormal cobrança de uma das nossas contribuições directas.
No entretanto, esta approximação era natural, por ser a unica que satisfactoriamente explica o que de outro modo se nos afigura enygmatico. E senão, um proximo futuro dirá quem se engana.
Termino, portanto, declarando que não me parece que a cobrança domiciliaria seja o sufficiente remedio para evitar os males do que soffre entre nós a contribuição industrial.
Por outro lado, não me parece tambem que se possa dar ao governo auctorisação para organisar permanentemente um serviço, que até a propria commissão confessa que vae ser meramente uma experiencia.
Se o governo acceitasse, eu não teria duvida em mandar para a mesa um additamento, limitanto o praso da auctorisação a dois annos.
Tenho dito.

sr. Ministro da Fazenda (Mariano de Carvalho: O illustre deputado concorda com o pensamento do governo e com a opinião da commissão, de que o pensamento da lei é bom, santo e justo, considerado debaixo do ponto de vista dos principies liberaes.
Effectivamente, trata-se de facilitar, sob este aspecto, ao contribuinte, e sobretudo ao contribuinte pobre, o pagamento das suas contribuições por um modo suave, em pequenas prestações, sem perda de horas de trabalho, andando nas repartições de fazenda a solicitar o favor de lhe receberem o dinheiro.
S. exa. sabe, que em Lisboa ás vezes, em certas, epochas do anno, quasi que é preciso metter empenhos para se pagar uma contribuição que se deve ao estado. (Apoiados.)
Debaixo do ponto de vista dos principios liberaes, dos bons principios liberaes e democraticos, de que s. exa. é tão apostolo como eu, o projecto que se discute não póde deixar de ser approvado; (Apoiados.) debaixo do ponto de vista fiscal, é que s. exa. não acredita na effficacia do projecto, e não acredita, porque entende que a differença consideravel que existe entre a liquidação e a cobrança da contribuição, provém mais de motivos politico-eleitoraes do que de motivos fiscaes.
Ora, devo dizer ao illustre deputado, que se a sua apreciação fosse completamente exacta, nós deviamos dar graças aos deuses, por serem tão perfeitos os costumes na naxima parte do reino, aonde essa differença entre a liquidação e a cobrança é pequena comparativamente com Lisboa.

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N'esse caso haviamos de admittir que todas as povoações do reino, onde a differença entre a liquidação e a cobrança da contribuição é pequena, são realmente uns paraizos eleitoraes! (Riso.)
Com franqueza, digo ao illustre deputado que não creio que os meios sejam differentes em Lisboa e lá fóra. Pódem na pratica divergir um pouco, mas esteja certo o illustre deputado, que tudo quanto se podia inventar em materia eleitoral está inventado; nada se descobre de novo. A provincia ainda é a esse respeito mais sabedora e maliciosa que a capital.
Nos meios de se aliviarem do imposto modificam-se os processos, mas póde talvez dizer-se que as provincias ainda são mais habeis a este respeito, do que Lisboa.
Aqui a massa dos contribuintes é tamanha, as preocupações dos escrivães de fazenda são de tantas especies, que realmente, sem negar toda a influencia á consideração que o illustre deputado acaba de fazer, creio que ella contribue com muito pouco na differença entre a liquidação e a cobrança.
As causas são muitas e differentes. Ha defeitos na organisação das matrizes e não só os defeitos politico-eleitoraes, mas ainda outros. E não me atrevo a dizer a s. exa. o que em materia de malicia na organisação das matrizes da contribuição industrial se tem inventado, com o fim de certos contribuintes se isentarem do imposto, porque tenho medo de crear discipulos. (Riso.)
Os differentes processos de que se lança mão são infinitos; é extraordinaria a serie de artes com que cada um procura defender-se do onus tributario.
Em defeza do projecto, não se póde negar que deve influir essencialmente no mau resultado das cobranças o facto de se cobrarem em janeiro sete prestações da contribuição industrial, quando em 31 de dezembro se faz um grande numero de mudanças que são tanto mais repetidas, quanto mais pequeno é o contribuinte, mais modesta a casa que habita, mais resumido o seu estabelecimento industrial.
S. exa. ha de ter visto publicada no Diario do governo uma relação dos contribuintes que não foram encontrados, em que já figurou o nome de um illustre ministro da situação passada e em que tem figurado o nome de pessoas que todos conhecemos. (Apoiados.) Julgo que não é por fins politicos ou eleitoraes que tal succede. Sendo isto assim, imaginem o que succederá com a grande massa dos contribuintes.
(Interrupção.)
Acontece tudo isso e muito mais.
Ía eu dizendo que o facto de se cobrar em janeiro uma quota avultada da contribuição industrial, quando no mez de dezembro se faz um grande numero de mudanças por parte das classes menos favorecidas da fortuna, influe naturalmente na cobrança da contribuição, e como é fácil de ver, as cobranças que se seguem saem todas prejudicadas pela mesma causa.
No Porto a epocha das mudanças não é a mesma que em Lisboa, emquanto que a epocha do pagamento da contribuição é sensivelmente a mesma. Ali a quebra é muito menor, que na capital.
É licito suppor que, sendo a epocha das mudanças do Porto differente da epocha das mudanças de Lisboa, ao passo que é a mesma a epocha da cobrança da contribuição nas duas cidades, não é portanto a coincidencia da menor quebra na cobrança da contribuição do Porto e da maior quebra da contribuição de Lisboa. Isto não quer dizer que não seja necessario pensar muito no meio de aperfeiçoar as matrizes da contribuição industrial, e em geral de todos os processos de lançamento.
Não quero dizer tambem que seja este o unico meio de diminuir o desfalque consideravel que este imposto está soffrendo em Lisboa, mas parece-me que é um meio que deve contribuir efficazmente para diminuir este desfalque.
Isto quanto á primeira questão que s. exa. levantou.
Quanto á segunda questão, relativamente ao tempo que deva durar a auctorisação, devo dizer a s. exa. que o ser ou não a auctorisação provisoria, é uma questão de pequenissima monta; o que é muito difficil é marcar o tempo que deve durar a experiencia.
Ainda não ha muito tempo que se estabeleceu o systema da contribuição predial em prestações. Pois, como é sabido, a maior parte dos contribuintes de Lisboa não se aproveitaram d'este beneficio por ignorarem que existia similhante lei; agora é que já bastantes contribuintes se vão aproveitando d'essa vantagem.
Ora, se isto acontecia na contribuição predial, em que a maior parte dos contribuintes não conhecia as disposições da lei que os beneficiava, vejam s. exas. por aqui quanto é difficil fazer variar os habitos da população.
Ha de ser necessario um certo tempo para vencer resistencias. Mas quaes são os inconvenientes, que resultam de não ser temporaria a auctorisação? E, diz o illustre deputado, que se vae crear uma massa de empregados, que depois, a brandura dos nossos costumes, a tolerancia que temos com todos, o sermos um paiz pequeno, o conhecermos-nos uns aos outros, ha de tender e conservar ao serviço do estado. Ora, parece-me que n'este caso não ha que receiar esse perigo. Em primeiro logar são empregados pagos por uma simples percentagem; em segundo logar são tirados principalmente dos distribuidores telegrapho-postaes, que já têem outra collocação fixa.
O sr. Consiglieri Pedroso: - Tanto quanto possivel.
O Orador: - É claro que o illustre deputado não quer que eu vá privar a posta de Lisboa do pessoal necessario para a distribuição. O illustre deputado sabe que ha um numero consideravel de distribuidores telegrapho-postaes effectivos e outros supranumerarios; e se a direcção geral das contribuições directas se pozer de accordo com a direcção dos correios e telegraphos, como é natural que succeda, porque ambas estão animadas dos melhores desejos em bem do serviço publico, podem-se escolher, entre os effectivos e os supranumerarios, empregados que se encarreguem d'este serviço, sem prejuizo da distribuição postal.
Portanto, serão escolhidos, por via de regra, os empregados n'esta classe.
Supponhamos, porém, que ha um ou outro empregado novo; esses já sabem que serão pagos por uma percentagem: que não terão nenhuma especie de estabilidade; que são empregados dos recebedores e não do estado; que serão como os cobradores da companhia do gaz ou da companhia das aguas.
Pois já algum recebedor da companhia do gaz ou da companhia das aguas se persuadiu de que era empregado vitalicio e que havia de ficar ao serviço da companhia emquanto vivesse. Por certo que não. Estes individuos conhecem bem as condições com que são empregados.
Quanto a abusos possiveis, o illustre deputado sabe, tão bem como eu, que em geral os abusos não se manifestam em relação a pequenos empregados, que vencem apenas um pequeno estipendio proporcional á cobrança que fazem.
Infelizmente os abusos dão-se com empregados de categoria mais elevada, collocados em outras situações. E note s. exa. que esses empregados, de mais a mais nem são nomeados pelo governo, não são escolhidos pelo governo; são escolhidos e nomeados pelos recebedores dos bairros. E é certo, que se os factos estatisticos demonstrarem que a cobrança domiciliaria não dá resultado algum, o parlamento tem na sua mão o meio de acabar com esse serviço; é não votar no orçamento a verba para esses empregados, porque os recebedores tambem não os pagarão. Póde-se admittir o abuso de o parlamento reconhecer que o systema não dá vantagens, e comtudo continuar a pagar a cobradores

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que para nada servem? Não quero fazer essa injuria ao parlamento; e d'este logar menos ainda o devo fazer.
Estou convencido de que as maiorias procuram sempre acertar. Sei por experiencia propria que muitas vezes a lealdade politica obriga a votar em certo e determinado sentido, mas não chego a comprehender que especie de considerações politicas e graves hão de pesar no animo das maiorias para conservarem verbas para pagar a cobradores que para nada sirvam.
Não supponho que os cobradores sejam influencias politicas tão altas que só imponham, não só aos recebedores, mas aos governos e aos parlamentos.
São estas as considerações que tenho a fazer em resposta a s. exa.
Parece-me que a lei é por si propria transitoria, e não póde marcar a priori o praso da experiencia. A experiencia ha de durar o tempo indispensavel, conforme se forem vencendo mais ou menos as reluctancias e os habitos da população. Se der bons resultados o governo e o parlamento hão de manter o systema, e se não der bom resultado, esteja s. exa. tranquillo, como eu estou, confiando em que ninguem mais terá os cobradores da contribuição industrial pela sua alta influencia politica ou eleitoral.
Alem d'isso, se o illustre deputado não confia nos governos nem ao menos nas camaras, só lhe restaria proclamar a anarchia, se a sua indole e os seus principios lh'o consentisssem.
O sr. Consiglieri Pedroso: - Sr. presidente, não desejo prolongar um debate que versa apenas sobre muito pouco. Em todo o caso, cumpre-me dizer alguma cousa em resposta ás considerações feitas pelo sr. ministro da fazenda.
Em primeiro logar permitta-me a camara e o proprio sr. ministro que eu tome boa nota de uma declaração que s. exa. acaba de fazer, e da qual a seu tempo eu pedirei os necessarios effeitos.
O sr. Mariano de Carvalho, com uma auctoridade bem superior á que eu tenho n'esta camara para accusar as fraudes nas matrizes, acaba, não só de confirmar os factos gravissimos a que eu me referi, mas ainda de os acrescentar com revelações, que teem um peso enorme por partirem d'esse logar.
Espero, e a camara esperará tambem comigo, depois de ter ouvido declarar por parte de um ministro que o governo bem sabia das fraudes que se commettem nas matrizes e nos recenceamentos eleitoraes, que esse ministro tomará, quanto antes, as providencias urgentes, que o caso reclama, e que o decoro do proprio gabinete não póde demorar!
Pela minha parte, repito, tomo nota da declaração do sr. ministro da fazenda, e peço á camara que attente na gravidade que essa declaração encerra.
Se eu aqui estiver na proxima sessão parlamentar, hei de pedir a s. exa. a responsabilidade da sua confissão, com a circumstancia, alem d'isso, de ter sido feita com tanta espontaneidade.
Com relação ao que ironicamente disse o sr. Mariano de Carvalho, a respeito da moralidade eleitoral do resto do paiz comparado com Lisboa, se fosse exacta a minha supposição, tenho a ponderar a s. exa. que, eleitoralmente, o resto do paiz está em circumstancias muito diversas, para que o systema de corrupção a empregar seja o de incluir nos recenseamentos e nas matrizes individuos ficticios.
Não me parece, infelizmente, que a independencia das provincias seja tão grande que se torne necessario ir buscar, como em Lisboa, mortos aos cemiterios para contrapôr á hombridade dos vivos.
Lá o systema é mais franco, vergam-se os individuos, trazem-se acorrentados ao poder d'esses caciques que aqui têem sido mais de uma vez descriptos, dos bancos da opposição por quem os conhecia de perto.
O sr. ministro da fazenda não aceeita o meu additamento porque ainda insiste na redacção do artigo tal como está; mas se a rasão é a que s. exa. deu, que não póde acceitar um praso determinado para que esta experiencia possa dar todos os resultados que se desejam, eu peço então a s. exa. que acceite ao menos o adverbio «provisoriamente», que me parece conciliará tudo.
Diga-se «fica auctorisado o governo provisoriamente, etc.»
(Interrupção.)
Está enganado o illustre deputado! Os adverbios valem de muito, e n'este caso o adverbio que o meu collega diz que pouco quer dizer, vem alliviar a responsabilidade do estado para com os funccionarios que provisoriamente vão ser encarregados do serviço da cobrança domiciliaria.
Não quero, conforme já disse, prolongar este debate. O tempo mostrará, embora com mágua minha, se se realisaram as minhas previsões, ou se se realisou o optimismo do sr. ministro da fazenda!
O sr. Ministro da Fazenda (Mariano de Carvalho): - Depois das palavras amaveis que o illustre deputado me dirigiu, tinha um grande desejo de concordar com s. exa. em que a experiencia fosse declarada provisoria. Mas a fallar a verdade é principio estabelecido em Portugal que tudo quanto é provisorio dura eternamente.
Provisorio era o regulamento da cadeia do Limoeiro e todavia teve cerca de um seculo de existencia. O provisorio é o que dura o passa.
O provisoriamente, proposto pelo illustre deputado, sob o ponto de vista dos abusos que se podem commetter, nomeando-se cobradores que não sirvam para nada, quando se provasse ser mau systema da lei, não acautelava cousa alguma, porque duraria por toda a eternidade. Sob o ponto de vista do serviço, desde o momento em que os encarregados de executarem a lei virem o adverbio fatidico, cuidam pouco de cumprir o seu dever.

clausula do provisorio n'esta terra não acautela cousa alguma.
Já lembrei o regulamento da cadeia do Limoeiro, e agora lembro o monumento aos restauradores, que chegou a ter tido vontade de se inaugurar a si proprio, porque um dia appareceram as estatuas sem a serapilheira que as cobria havia muito tempo, tambem provisoriamente. (Riso.) Sob o ponto de vista de serviço é prejudicial.
Pelo que respeita ás garantias que os cobradores hão de dar ao estado, direi que o estado nada tem com isso. Succede em relação a elles o mesmo que se dá com os propostos dos recebedores das comarcas. Os recebedores afiançam-se para com o estado, e todos os empregados da sua confiança são por elles nomeados e com elles tambem se afiançam. E também, o que se faz nas grandes companhias e nos bancos, em que os cobradores se afiançam com os cobradores geraes d'esses estabelecimentos, e por isso não se julgam empregados perpetuos d'esses mesmos estabelecimentos.
São estas as observações que tinha a fazer em, poucas palavras para responder ao illustre deputado.
Foi approvado o projecto n.° 20.
O sr. Presidente: - Vae dar-se conta de uma mensagem vinda da camara dos dignos pares.
Leu-se na mesa um officio da camara dos dignos pares, remettendo a proposição interpretando a disposição do n.° 2.° do § unico do artigo 10.° do decreto eleitoral de 30 de setembro de 1852, a fim de que os pares electivos possam ser eleitos deputados.
Foi enviada á commissão de legislação civil.
O sr. Presidente: - Tem a palavra o sr. Pinheiro Chagas, que a tinha pedido para antes de se encerrar a sessão.
O sr. Pinheiro Chagas: - Eu quando pedi a palavra tinha acabado de entrar na sala, e suppondo que já se tinha passado á ordem do dia, pedi por isso a v. exa. que

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me inscrevesse para antes de se encerrar a sessão; aliás teria pedido a palavra immediatamente.
Desejo apenas fazer uma pergunta muito breve ao sr. ministro da fazenda, esperando assim não abusar da benevolencia da camara.
Chegou-me ás mãos este documento, e eu pedia ao sr. ministro que me dissesse se é authentico. Eu supponho que é. É uma circular que diz o seguinte.
(Leu.)
Pergunto ao illustre ministro como entende esta circular, porque da redacção d'ella parece derivar-se que s. exa. entende que os seus subordinados não podem envolver-se em negocios politicos, e eleitoraes, não podem apresentar-se candidatos á deputação, nem podem sustentar as suas candidaturas, nem as dos seus amigos com a plena liberdade que hoje têem os outros cidadãos.
Das palavras que li, póde se deduzir que o sr. ministro da fazenda tentou cercear os direitos politicos e eleitoraes aos seus subordinados, e quiz proceder contra todos aquelles que se envolvessem em questões politicas como qualquer outro cidadão, usando da influencia que o exercicio das suas funcções lhes possa dar.
Em summa, n'esta circular póde estar uma ameaça de perseguição aos empregados publicos; por isso faço esta pergunta ao sr. ministro da fazenda unicamente para registar a sua resposta e tirar as deducções que entender convenientes.
O sr. Ministro da Fazenda (Marianno de Carvalho): - Não respondi logo se a circular era authentica ou não, porque não conhecia o papel que o illustre deputado leu.
O que posso e vou dizer a s. exa. é quaes foram as ordens que dei e a interpretação que ellas têem.
As ordens que dei não se referem aos empregados publicos todos, referem-se simplesmente aos empregados fiscaes, o que faz muita differença, e não as dei para exercer pressão, porque não permitto aos empregados fiscaes que trabalhem nem a favor do governo nem de qualquer parcialidade.
Não posso transigir com as correrias politico-eleitoraes dos empregados, do fisco, e não posso transigir nunca, porque é muito difficil saber quando o empregado fiscal está ou não no exercicio das suas funcções.
Quando é que um inspector da fiscalisação está ou não exercendo as funcções do seu cargo?
Não póde dizel-o o illustre deputado, e eu ainda menos.
Portanto entendo que os empregados fiscaes, emquanto estiverem ao serviço da nação, não podem servir este ou aquelle partido, seja elle qual for, e entendo que não póde haver boa administração de fazenda emquanto se tolerarem os abusos de que ha numerosos exemplos.
É claro que não posso tolher nem cercear os actos licitos, o que posso e quero é evitar as correrias eleitoraes e castigar os abusos.
Do papel lido pelo illustre deputado, no qual ouvi referencias a empregados quaesquer, não tinha conhecimento.
Sei apenas quaes foram as ordens que dei e qual é a sua interpretação racional.
Não se trata de inquerir as opiniões politicas, nem de tolher a ninguem a liberdade do suffragio; trata-se de cohibir a propaganda politica e eleitoral feita por empregados do fisco.
Sei que houve já um equivoco; entendeu-se que um membro do conselho das alfandegas era um empregado fiscal, e que outro em iguaes circumstancias era tambem empregado fiscal, e não o são no sentido da ordem que dei. Mas o equivoco não admira, sendo difficil a definição dos empregados fiscaes.
Para mim es empregados fiscaes, aquelles a quem se referem as minhas ordens, são aquelles que estão em contacto com o publico, que têem subalternos e subordinados, e que pelo effeito das suas funcções podem exercer pressão sobre os eleitores. Não me podia passar pela idéa que o sr. José Luciano de Castro, director geral dos proprios nacionaes, ou que o sr. deputado Franco Castello Branco, empregado distincto da administração geral das alfandegas, não podessem manifestar livremente a sua opinião, serem candidatos a deputados, ou membros de quaesquer partidos.
Uma voz: - E os que escreverem na imprensa?
O Orador: - A liberdade de imprensa está segura nas leis do reino, e cada um póde escrever o que quizer, porque, se abusar, lá está a lei para o castigar.
Repito, a ordem que dei refere-se unicamente aos empregados fiscaes que estão em relações com o publico e que podem exercer pressão eleitoral sobre este ou sobre outros empregados. O que posso affirmar ao illustre deputado e á camara é que foi a intenção da ordem que dei que deixo explicada, e que hei de fazel-a respeitar emquanto a confiança da corôa e a vontade do parlamento me conservarem n'este logar; de outro modo não sei, nem posso administrar.
O sr. Pinheiro Chagas: - Pedi a palavra simplesmente para agradecer ao sr. ministro da fazenda a explicação que deu, e que no meu entender já restringiu bastante o sentido da circular que eu tinha lido; reservando para outro ensejo a resposta que tinha a dar. Folgo com a declaração do illustre ministro, porque restringe o sentido que se dera á circular, e que parecia pouco liberal.
Também devo dizer que me pareceu intempestiva uma circular eleitoral no momento era que se não falla em eleições.
Agradecendo as explicações que s. exa. deu, e a respeito das quaes reservo a minha opinião, agradeço a v. exa. a sua benevolencia em me ter concedido a palavra.
Leu-se a ultima redacção dos projectos n.° 15 e 20, que foi approvada.
O sr. Presidente: - A primeira sessão é sexta feira, e ficam dados para ordem do dia os projectos nos. 18 e 21 e está levantada a sessão.

Eram seis horas da tarde.

Redactor = Rodrigues Cordeiro.

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