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674 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

O sr. Elmano da Cunha: - Pouco acrescentarei ao que na ultima sessão disse a proposito de dictadura e dictaduras, causas e remedios d'ellas.
Digo como os illustres ex-ministros srs. Navarro e Francisco Beirão.
«É tempo de pôr um ponto final n'esta fórma de governar. É preciso uma reforma profunda nos nossos costume politicos.»
Substituirei apenas os costumes politicos por costumes parlamentares.
Sr. presidente, entrando na especialidade do debate direi, que mal comprehendo os clamores n'esta casa levantados contra a nova lei de imprensa.
Eu sempre pensei, e melhor pensei desde 20 de março de 1868, que a lei de imprensa não passa de um simples regulamento sobre o exercicio de uma liberdade em relação com outras tão sagradas como ella.
Com effeito, sr. presidente, segundo os artigos 359.° 360.° do codigo civil, que todos os partidos votaram alegremente como obra prima, que é, são direitos originarios e fonte e origem de todos os outros - o direito de existencia e o direito de defeza, e o direito de liberdade.
O direito de existencia, diz o artigo 360.°, não só comprehende a vida e integridade pessoal do homem, mas tambem o seu bom nome e reputação, em que consiste a sua dignidade moral.
O direito de defeza, segundo o define o artigo 367.° consiste na faculdade de obstar a violação dos direitos naturaes e adquiridos.
O direito de liberdade deve ser tal qual o define o artigo 361.°, o livre exercicio das faculdades intellectuaes, comprehendendo pensamento, expressão e acção.
Finalmente, ao que vejo do artigo 363.°, o direito de expressão e livre, emquanto d'elle se não abusar em prejuizo da sociedade ou de outrem.
Do que tudo concluo, sr. presidente, que não pode ha ver liberdade alem do direito que a limita; que o direito envolve necessariamente duas idéas de relação, relação com todos os outros direitos, que com essa liberdade se exercem na mesma sociedade, e com a obrigação de se respeitarem.
Permitta-me v. exa., sr. presidente, que use de uma comparação que mais ao vivo exprima a idéa que faço d'estas cousas, que a paixão politica parece querer desvirtuar, a tanto leva e arrasta!
Suppondo que em um vasto oceano emerge uma pequena ilha, a que chamarei a liberdade de imprensa, está claro que ella pode estender-se a sua vontade emquanto não encontrar outras ilhas, quero dizer outros direitos, a um dos quaes chamarei - bom nome e reputação.
A ilha da liberdade de imprensa tem, pois, de parar na linha em que se encontrar com a honra particular, ou se assim não succeder ha de feril-a ou subvertel-a por força.
Este facto já não constituo direito nem liberdade; mas constituo sómente abuso de liberdade e abuso de direito.
De fórma que, sr. presidente, a peregrina theoria das liberdades, consideradas cada uma isoladamente, lembra-me o congresso dos deuses, que por terem todos iguaes e absolutos direitos, acabaram por dissolver o parlamento, dissolver a sociedade e passarem á historia.
Ora, quer v. exa. saber, o que era entre nos a liberdade de imprensa?
Genuina e correctamente um direito novo, o direito de diffamar quasi impunemente. (Apoiados.)
Durante vinte e quatro annos de fôro e de exercicio do meu emprego de contador na terceira vara civel de Lisboa, tem-me passado pelas mãos milhares de processos por abuso de manifestação de pensamento.
Posso affirmar a v. exa. e a camara, que raro será aquelle em que se não julgue provada a attenuante de provocação por injuria pela imprensa ou outro meio; raro
aquelle em que o offendido se não queixe amargamente da benevolencia do juiz para com o offensor.
D'aqui tenho concluido, sr. presidente, que não existe liberdade cujo uso seja mais difficil, nem mais facil o abuso; que similhante liberdade se exerce entre nós por uma fórma vergonhosa e indigna, e que os mesmos que d'ella usam por essa fórma, se consideram aggravados pela lenidade das penas applicadas aos que os insultaram, injuriaram, diffamaram ou calumniaram.
De modo que, ou se vae perdendo entre nós o sentimento de toda a dignidade, o que é grave, e deve intervir o legislador; ou vae chegando o momento em que e tal e tão geral o mal-estar, que approxima da revolta, quando não da revolução.
A lei de imprensa actual era, pois, absolutamente necessaria.
Para a imprensa digna e illustrada, a verdadeira evangelisadora dos tempos modernos, a que corrige nobremente, a que critica sensatamente, a que ensina e a que illustra, para essa qualquer lei será excellente, nenhuma seria ainda magnifica; para a outra, a que se deprime e avilta, deprimindo, aviltando o denegrindo a mesma virtude austera, a que viola a consciencia, o fôro intimo, as intenções, o santuario da familia, a vida particular do cidadão que trabalha, pondo-o ao raso do cidadão que delinque, para essa qualquer lei será pessima, e nenhuma seria ainda peior, porque ficaria então sujeita a todos os arbitrios do poder, e a todas as arbitrariedades da policia. (Muitos apoiados.)
O decreto dictactorial responde, pois, a uma verdadeira necessidade publica. (Apoiados.)
A instituição do jury e uma instituição desacreditada; não quero com isto dizer que não seja uma conquista, mas considero-a uma conquista para guardar, para casos excepcionaes e para melhor tempo, como o vinho generoso que só se depura e torna excellente depois de velho.
Tenho noticia de duas condemnações por cinco votos contra quatro.
O illustre advogado o sr. Holtreman, ha pouco fallecido, tinha noticia de dois réus absolvidos a sorte, que o mesmo é dizer ao acaso.
De ordinario e só um dos jurados quem absolve ou condemna, o mais illustrado ou o mais auctorisado. Servi em dois turnos de jurados, e posso affirmar a v. exa. que o jury absolveu uns e condemnou outros réus pela exposição que lhe fiz das provas escriptas e oraes.
Ha jurados que dormem e ha alguns que se alimentam decentemente, em pleno tribunal.
Se o julgamento por um juiz singular tem senões, os jurados são ainda mais impressionaveis.
Tenho visto condemnar e absolver por motivos e influencias singelamente politicas. A consciencia e uma grande luz, quando esclarecida: quando em trevas, limita-se a uma palavra.
Finalmente, os julgamentos que não deixam os fundamentos escriptos do seu voto, escapam a toda a responsabilidade, porque escapam a toda a critica.
Cada jurado descarrega metade da sua responsabilidade no seu vizinho da esquerda e a outra metade no da direita, o, em conclusão, nenhum jurado é responsavel.
Ha decisões absolutorias julgadas iniquas, e o que é mais grave ainda, ha decisões condemnatorias julgadas igualmente iniquas.
Conservem, pois, a famosa conquista como uma reliquia; como tal não lhe contesto o valor.
Eu por mim, grande innocente ou grande culpado, preferiria ser julgado por um juiz singular togado, com recurso para um tribunal collectivo.
Exponho uma opinião em presença dos factos; cada qual guarde a que tem.
Em materia de recursos sigo o meio termo. Acho inutil e perigoso o recurso do despacho que manda responder em