8 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS
escassos, com que se ha de sustentar o fardar. Se for casado e tiver dois filhos os 33$000 réis são o sufficiente para morrer de fome.
E assim successivamente.
Em todos os graus da hierarchia militar os vencimentos são insignificantes e estão em confronto frisante com os dos individuos da classe civil.
Estabelece-se o confronto com os individuos da classe civil, mas o exercito não se queixa do modo algum; magoa-se, porem, quando lhe dizem lá fora, impensadamente, que é elle o sorvedouro dos dinheiros publicos; não se queixa, porque está sempre prompto para todos os sacrificios que lhe exigem, mas magoa-se quando lhe dizem que o Sr. Ministro da Guerra é o perdulario dos dinheiros publicos, porque S. Exa. tem um pouco de boa vontade para levantar esta sympatica instituição.
Não façamos o confronto, porque são sempre cousas irritantes.
Digam-me, aqui á puridade, que paridade ha entre 400 réis diarios de subsidio de marcha, a um alferes ou tenente, 500 réis sendo capitão, para ir, destacado ou em diligencia, policiar feiras, policiar arraiaes, ao sol, á chuva, calcando a lama das estradas, ao passo que se dão 2$000 e 3$000 réis por dia como ajudas de custo a inspectores de varias cousas, que vão viajar, com toda a commodidade, de carruagem ou em coupé-leito...
Uma voz: - Como os fiscaes do sêllo.
O Orador: - Se tivessemos tempo haviamos de falar nos fiscaes do sêllo...
O exercito não se queixa nunca, porque é uma instituição fidalga, mas de uma fidalguia especial, toda baseada na noção do pundonor e de cumprimento do dever.
Sr. Presidente: se ha vida e instuição em que o brio e a honra sejam considerados como uma verdadeira religião, até com lithurgia propria, é a vida, ou instituição militar! (Apoiados).
Onde estão os desperdicios?
Ha aqui uma outra verba que é a destinada aos estabelecimentos de saude do exercito, dizendo o Sr. Oliveira Mattos que ahi é que estava a mais.
Sr. Presidente: se ha serviço mais miseravelmente dotado é o dos estabelecimentos de saude do exercito, e appello para a competencia profissional dos membros de um e de outro lado da Camara.
Haverá desperdicios na verba de instrucção? Não vamos para esse campo, porque vamos mal, ou por outra, eu para esse campo tambem vou bem.
Note V. Exa., Sr. Presidente, campos de instrucção, carreiras de tiro, polygonos, tudo isto se impele hoje mais do que nunca pelas modernas exigencias da sciencia da guerra, pela necessidade absoluta da instrucção dos quadros, e das tropas na pratica do tiro de guerra, e nas manobras das tres armas combinadas.
E tal a importancia que por toda a parte se dá á instrucção militar, que em todos os paises se consignam grandes verbas para este fim.
A França o anno passado consignou no orçamento da guerra um credito de 6 milhões de francos para campos de instrucção, que nunca devem ter menos de 6 ou 7 mil hectares de terreno.
É muito dinheiro, são 1:000 e tantos contos de réis. Em questões militares ha dois pontos primordiaes e principaes, sobre que estão de acordo todos os technicos militares de todos os paises. Esses dois pontos são exactamente a instrucção e o arsenal.
Eu sou de opinião que se possam eliminar ou adiar algumas pequenas verbas em differentes pontos, mas para a instrucção e para o arsenal não façamos questão do dinheiro, nem façamos questão politica, a não ser que queiramos pôr de parte o sentimento de patriotismo que a todos nós deve animar.
Não venho para aqui relatar as façanhas gloriosas do nosso soldado na Catalunha, Russilhão, na guerra da Peninsula, nem os valorosos esforços dos defensores da liberdade no Porto e Ilha Terceira, e outros muitos factos da nossa historia militar antiga e moderna.
Supponho que não é necessario isso, porque até fica mal, entre nós portugueses, e no Parlamento português, lembrar o que vale o nosso soldado, e o que se pode esperar do nosso exercito, quando elle for disciplinado como está, e armado e instruido como devia estar.
Quem for curioso o for ver o orçamento de 1885, da referenda do Sr. Fontes Pereira de Mello, conhecerá a verba das carreiras de tiro e da instrucção das tropas activas e de reserva.
Eram 25:000$000 réis. Na proposta ministerial actual estavam 15:000$000 réis, o a parte militar da commissão do orçamento pediu ao nobre Ministro da Guerra licença para augmentar esta verba, com o que S. Exa. concordou plenamente, e elevou-a a 25:000$000 réis, ainda inferior ao que era necessario, mesmo em 1880; e, portanto, ainda mais superior ao que é necessario hoje; e porque o Sr. Ministro da Guerra actual fez, no anno passado, as manobras de instrucção complementar, aqui d'el-rei que é mau, porque tem simplesmente uma boa orientação.
Eu em questões de instrucção militar quero o mais possivel, e neste ponto vou referir-me ao Sr. Oliveira Mattos, e fica assim respondido o que S. Exa. disse, a respeito de escolas regimentaes.
Eu desejo, e chamo a attenção do Sr. Ministro da Guerra para este ponto, ver acabada, resolvida de uma vez a questão do analphabetiamo no exercito.
As escolas regimentaes como foram e como são não podem produzir mais.
O padre capellão não é bastante para ensinar a ler o regimento.
O problema precisa de mais radical solução; assim como a instrucção militar está a cargo das companhias ou baterias, e da responsabilidade do capitão, assim devia ser a instrucção das primeiras letras.
Assim se faz na Allemanha e na Italia. E na Italia aonde se faz mais: depois da instrucção militar, dão-se aos soldados noções de agricultura pratica. Já não pretendo tanto, contentava-me com a instrucção das primeiras letras.
Este assumpto tem sido proficientemente tratado entre nós ainda ha pouco tempo, com artigos publicados no jornal As Novidades, devidos á penna dos Srs. Xavier Machado e Homem Christo, duas illustrações do exercito, dois officiaes distinctissimos. (Apoiados).
Não pareça a V. Exa., Sr. Presidente, que a questão é do pequena monta. Neste país, em que a percentagem dos analphabetos, entre varões e femeas, é de 85 por cento, não é para desprezar um desbaste annual de muitos milhares de leigos, saindo todos os annos das fileiras sabendo ler, escrever e contar, já não digo correctamente, mas pelo menos correntemente.
O Ministro da Guerra que resolvesse o problema do analphabetismo no exercito, enchia-se de gloria. V. Exa. não necessita, porque tem já o seu nome vinculado a muito altos serviços de toda a ordem, trazidos ao exercito pelo benefico influxo da sua rasgada iniciativa.
Mas peço-lhe muito, peço-lhe apaixonadamente, que resolva mais este problema; ponha mais esta perola na sua já bem guarnecida coroa de gloria, como Ministro. - (Vozes: - Muito bem).
Oh! Sr. Presidente: nunca tive tanta pena de ser pequeno e insignificante, como nesta occasião!... Eu desejava neste momento ser muito grande, ter muita auctoridade, não para me impor á Camara, que é muito illustrada e muito altiva e não recebia imposições de ninguem, mas para pedir á maioria, á minoria e á imprensa do meu pais, que me auxiliassem na resolução d'este problema,