16 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS
precisa; as legações criadas pelo Sr. Ministro são desnecessarias, escusadas, podem servir para collocar pessoal, mas para mais nada, porque, se me é permittido emittir com franqueza a minha opinião, direi que julgo que as relações diplomaticas do nosso país só teem importancia real pelo que respeita a certos paises; por isso eu preferiria que em materia de legações fosse reduzido consideravelmente o seu numero. (Apoiados).
Nós temos actualmente 14, somos um país abastado, rico de legações, e, ao contrario do que hoje succede, eu prefiriria que as verbas de dotação dessas legações fossem augmentadas e o seu numero diminuído. Menos legações e melhor retribuídas; pois é mesquinho que um representante do pais numa curte estrangeira tenha vencimentos, que não chegam muitas vezes para as despesas indispensaveis de uma modesta representação.
Achava preferível que p Sr. Ministro dos Negocios Estrangeires tivesse aproveitado a occasião da reforma dos serviços do seu Ministerio para reduzir o numero de legações e augmentar-lhes a dotação.
Com respeito aos consulados, algumas considerações da mesma natureza eu poderia fazer. Precisa revista a lista dos nossos consulados. Se se observar quaes são os consules que durante mais largo espaço de tempo estão ausentes dos seus consulados, ter-se-ha obtido uma indicação da pouca necessidade d'esses consulados. Se considerarmos a importancia do movimento commercial do nosso país com a sede de certos consulados ou a importancia da colónia portuguesa nessa região, reconheceremos que certos consulados são hoje susceptíveis de estarem a cargo apenas de cônsules de 3.ª classe ou vice-consules, pois é insignificante o valor dos serviços, que desempenham.
Podiam-se criar outros consulados em pontos onde o commercio português nos últimos annos tem augmentado. Realmente já existem consulados alem do quadro, cujos consules recebem remuneração especial, o que prova a necessidade d'esses consulados.
De forma que em ultima analyse no meu entender devem supprimir-se alguns consulados e crear outros. (Apoiados).
Sr. Presidente: a hora vae adeantada e eu não quero cansar a attenção da Camara.
Parece-me que nestas ligeiras o desataviadas considerações demonstrei que o orçamento do Ministerio dos Negocios Estrangeiros era defeituoso, porquanto nas despesas ordinarias havia verbas mal calculadas, insuficientes, e tinham-se augmentado sem necessidade, 6 funccionarios nas secretarias alem do augmento nas legações. Por ora, em virtude das hesitações do Sr. Ministro, as novas legações não são providas mas sê-lo-hão mais tarde como for conveniente !
Quanto ás despesas extraordinárias a incorrecção orçamental, é na verdade excessiva e mostra bem claramente que o nosso orçamento é um documento do qual se pode dizer o que Talleyrand dizia da palavra humana.
Por isso parece-me que nem pelo que respeito ás despesas ordinarias nem ás extraordinarias, o orçamento do Ministerio dos Estrangeiros merece confiança. E não é preciso ser grande propheta para assegurar, que este orçamento ha de ser completado com um numero rasoavel de creditou especiaes, que hão de contribuir para augmentar ainda mais o deficit que felizmente para nós ha de ser o ultimo, porque o Governo realizou o convenio e vae em breve apresenta-lo á consideração e voto da Camara, e convenio e deficit são ideas antagonicas.
Ninguem faz concordatas com os credores ao passo que continua fazendo bancarrotas annuaes!
Este será pois o ultimo deficit nos orçamentos do nosso país, e por isso não será nem dos menores nem dos menos assignalados. (Apoiados).
De resto o pais parece que pouco ou nada se interessa coza o orçamento, temos no sangue as taras de velhos fidalgos arruinados. Não vale a pena examinar a nota das despesas: a despreoccupação fidalga manda que se rasgue, atirando um punhado de ouro á cara dos exactores fiscaes. Por isso se diz que o trabalho das Camaras em materia orçamental é improfícuo e que se gasta aqui um tempo precioso em simples escaramuças de palavras, sem que isso beneficie o país. A verdade é que se não se tira resultado é por que se não quer (Apoiados), porque da discussão ficam precisamente indicados os pontos que necessitam reforma, as despesas inúteis, as verbas enganosas. (Apoiados).
Se houvesse alguém, e bem precisava de energia e de coragem - que quisesse cumprir um programma de nova administração economica e severa, introduzindo na nossa administração publica boas regras, de que tanto necessitamos, esse alguem podia esclarecer-se muito com as discussões, que tem merecido sempre o Orçamento do Estado durante annos seguidos.
O peor porém, Sr. Presidente, é que na conjuntura presente quem menos quis ser esclarecido foi justamente o Governo, que tem despendido á doida e compromettido gravemente a situação financeira do país, d'esse pobre país, Sr. Presidente, cuja situação no momento presente me traz á imaginação o quadro bem conhecido intitulado "O Pesadello", devido ao génio de um notavel artista flamengo.
Figura esse quadro um homem adormecido numa gruta, tendo no rosto e na contracção do corpo impressos o terror 'e a oppressão; próximo e ao de redor d'elle, aos lados e em varios pontos, rastejam monstros estranhos, reptis de formas bizarras e repugnantes; no ar esvoaçam morcegos e vampiros, e ao fundo da gruta faíscam os olhos de um monstro horrível, dragão phantastico, que rastejante e de garras abertas se avizinha do adormecido.
O orçamento português poderia fornecer a um pintor, se questões financeiras pudessem inspirar um artista, o symbolo do um quadro semelhante.
No primeiro plano, o povo português adormecido, em volta todos esses reptis, que na sombra devoram os dinheiros publicos, esses vampiros de formas e nomes bizarros, commissarios, inspectores, fiscaes, que sugam o sangue do pobre contribuinte. Ao fundo de olhos esbrazeados, garras aduncas, e avidas fauces escancaradas avança o monstro insaciavel, o déficit, que se prepara para devorar o adormecido!
Este quadro, Sr. Presidente, este quadro singular, poderia figurar como pagina illustrativa do relatorio do Sr. Ministro da Fazenda, e não se intitularia o pesadello, porque infelizmente elle é uma triste e perigosa realidade!
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem, muito bem.
O Sr. D. Luiz de Castro: - Sr. Presidente: o illustre Deputado, o Sr. Conde de Penha Garcia terminando ha dias um discurso nesta casa do Parlamento, recitou,- primorosamente,- versos do delicioso poeta das Doloras e das Humoradas. Pois a Campoamor seguiria Zorrilla, e, com elle, diria eu ao illustre Deputado:
"Hombre de hierro que velas..."
como D. João á estatua do Commendador, se o Sr. Penha Garcia fosse um politico - homem de ferro - que criticasse com argumentos bronzeos
Mas S. Exa. é um político faccioso, não é de ferro; os seus argumentos não são bronzeos, são de cera.
O illustre Deputado, o Sr. Penha Garcia, criticou porque é da opposição, mas a sua critica, exercendo-se sobre o orçamento do Ministerio dos Negocios Estrangeiros, encontrou tão fraca presa que, a mim, que não sou orador nem argumentador parlamentar, me parece que, seguindo o veio das suas considerações, irei desfazendo um a um os pontos de accusação deduzidos por S. Exa.