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Discurso do sr. deputado Pires de Lima, pronunciado na sessão de 8 de março, e que devia ler-se a pag. 577, col. 1.ª, d'este Diario

O sr. Pires de Lima: — Pedi a palavra sobre a ordem, e começo por ler a minha moção, a qual é formulada nos seguintes termos. (Leu.)

Serei brevíssimo na justificação da moção que acabo de mandar para a mesa.

A questão que ora se ventila é complexa e póde ser en-

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carada debaixo de differentes aspectos. Antes de tudo, porém, permitta-me V. ex.ª e permitta-me a camara que singela e resumidamente eu exponha o estado d'ella.

De 1 de julho de 1875 em diante a companhia dos caminhos de ferro do norte e lesto começou a exigir dos passageiros de grande velocidade mais 5 por cento do que estava marcado nas antigas tarifas.

Este facto causou estranheza, a qual era tanto mais justificada, quanto o publico não tinha sido prevenido com a devida antecipação' d'este augmento que a companhia havia proposto e o governo approvára.

Não tenho o mais pequeno intuito de discutir o procedimento da companhia. A companhia está para mim completamente fóra da discussão; se alludir a ella, será apenas constrangido e forçado pela necessidade de expor as minhas considerações, mas sem o fim de analysar os seus actos ou criticar o modo por que ella se houve.

A companhia, dirigindo ao governo uma proposta, uma supplica ou uma petição, usava do seu direito, pugnava pelos interesses dos seus accionistas e dos portadores das suas obrigações, o desempenhava-se d'esta fórma d'aquillo que ella julgava ser o seu dever e a sua missão.

Eu aqui discuto apenas os actos do governo, porque o governo é que é responsavel perante o parlamento e perante o paiz pela auctorisação que deu á companhia dos caminhos de ferro do norte o leste para augmentar as suas tarifas de grande velocidade.

Exposto o estado da questão, cumpre-me ver quaes os aspectos debaixo dos quaes ella póde ser considerada.

Como muito bem e com muita lucidez disse o illustre deputado interpellante, a questão póde ser encarada debaixo dos pontos de vista da legalidade, da conveniencia e da moralidade.

A primeira cousa que nos cumpre investigar é se o sr. ministro das obras publicas, auctorisando a elevação das tarifas, se manteve dentro dos limites que lhe marcavam as suas attribuições o faculdades, como membro do poder executivo, ou se foi mais alem do que a lei lhe permittia, ultrapassando essas faculdades e essas attribuições.

Esta é a primeira questão, a questão da legalidade.

Na segunda devem inquirir-se os motivos de interesse publico, que no animo do governo influiram para fazer esta concessão, visto como aos conselheiros responsaveis da corôa, simples administradores e meros gerentes do que é de todos e a todos pertence, cone indeclinavel a obrigação de attender sempre em todos os seus actos ás vantagens geraes da nação, ss quaes não lhes é licito esquecer, e muito menos preterir.

E n'isto se encerra a questão da conveniencia.

A terceira, enfim, que é a questão de moralidade, demanda trabalho mais improbo e ingrato, pois que n'ella cumpre descer ao estudo do modo por que a concessão foi feita, ao exame de todos os seus pormenores e á analyse das circumstancias que a precederam, acompanharam o seguiram, para investigar se o sr. ministro observou ou não os principios eternos, as regras imprescriptiveis da moral, que a todos obriga, os simples cidadãos como os mais altos funccionarios. (Apoiados.)

Isto posto, facil é conhecer que a minha moção de ordem se refere especialmente á segunda questão; mas, pois, que todas ellas se ligam e encadeiam entre si, prendendo-se por estreitos laços, mal poderei eu tratar de uma sem que insensivelmente me occupe das outras.

Hontem o sr. ministro das obra? publicas fez n'esta casa um longo discurso em defeza sua e resposta ao illustre deputado por Anadia. Deus me livre de que em meu animo entre a vaidosa pretensão de refutar ai considerações por s. ex.ª apresentadas. Não miram tão alto os meus humildes intuitos. Eu só pretendo expor o meu voto n'este assumpto, por muitas rasões momentoso, e os fundamentos que o explicam e justificam. Receio, porém, e se tal acontecer, desde já peço desculpa ao nobre ministro, que não possa forrar-me inteiramente á necessidade de alludir mais ou menos ás suas palavras.

Quando no 1.° de julho de 1875 o publico affluiu ás diversas estações do caminho de ferro do norte e leste, recebeu dos empregados da companhia a exigencia de um preço superior ao que estava acostumada a pagar. A surpreza foi grande, foi justa e foi fundada. Não houve só surpreza, houve tambem irritação, e essa manifestou-se na linguagem, que foi severa, na phrase, que foi desabrida; e porque não direi tudo? na increpação e na invectiva, que não se limitaram a ser violentas, chegando até a ser virulentas. Não admira. O momento dos grandes escandalos é sempre o momento das indignações profundas; e se as iras populares não se manifestarem e expandirem quando se commettem as grandes injustiças, não sei para quando se devam reservar. (Apoiados.) E a concessão do augmento das tarifas de grande velocidade, favor, e favor grande para a companhia, era flagrantissima injustiça para o publico, porque lhe augmentava, sem necessidade, nem rasão plausivel, encargos que sobre elle pesavam (apoiados), porque lhe aggravava impostos, e impostos tanto mais odiosos, quanto o seu producto não entrava nos cofres do estado, para se traduzir em melhoramentos que a todos pertencessem e a todos aproveitassem, mas nos cofres de uma companhia, cujos accionistas e portadores de obrigações, beneficiados ainda pouco antes pelo parlamento, e com largueza generosa, viam jubilosos augmentar-se-lhes agora mais ainda a fazenda e os haveres á custa de sacrificios de toda a nação, sacrificios que nenhuma rasão justificava e nenhuma necessidade exigia. (Apoiados.)

Eu na discussão d’este objecto não usarei da linguagem que o publico empregou. Depois do 1.° do julho de 1875 já decorreram muitos dias, já passaram oito compridos mezes, e o tempo, que tudo consome, diminuiu e attenuou consideravelmente a indignação que então era geral no paiz. Hoje ha mais placidez e serenidade de espirito; e eu, sem deixar de ser severo para com o sr. ministro das obras publicas, o para com o governo que é solidario com elle n'este malfadado negocio, empenhar-me-hei em usar da linguagem mais doce que o assumpto comportar.

O illustre ministro hontem começou o seu discurso fazendo a apologia da sua honradez e honestidade; apregoando a moralidade de que havia dado largo documento no desempenho de differentes cargos publicos, e apontando os seus precedentes como ajudante do procurador geral da corôa junto do ministerio das obras publicas, como outras tantas garantias do escrupulo com que tem gerido a pasta que actualmente lhe está confiada.

Afigurou-se-me que b. ex.ª, discorrendo por similhante modo, quiz apenas armar ao effeito, e que as palavras que pronunciou eram apenas uma precaução oratoria ou antes um ardil para nos desviar da questão. Acaso não foi o illustre ministro o primeiro a dizer: «tenho gosado de uma certa reputação de honesto, que o proprio sr. Luciano de Castro nunca me negou?»

Se, pois, ninguem punha em duvida a honestidade de s.. ex.ª, para que corria elle em sua defeza? (Apoiados.)

Se não tinha havido accusação, para que havia apologia? Aqui não se discutem os predicados do homem, examinam-se os actos do funccionario.

Poucos homens publicos têem, como o sr. Cardoso Avelino, entrado nos conselhos da corôa sob tão bons auspícios. A sua ascensão ao poder foi saudada por todos, por amigos e por adversarios.

O sr. Barros e Cunha: — Apoiado.

O Orador: — Até aquelles a quem não inspirava confiança politica o gabinete de que s. ex.ª faz parte punham grandíssimas esperanças na competencia provada, na intelligencia e zêlo, largamente documentados e geralmente reconhecidos do sr. Antonio Cardoso Avelino. E de feito, o modo por que s. ex.ª se desempenhára até ali dos seus deveres no exercicio de differentes cargos publicos, parecia garan-

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tia mais que sufficiente para todos, para a maioria e para a opposição, de que s. ex.ª havia de bem merecer da patria como ministro das obras publicas. Mas a paixão partidaria, que quando chega a certo grau de intensidade tem o singular condão de perturbar ainda as intelligencias mais allumiadas e os espiritos mais cultos, não poupou o sr. Avelino, quando o seu merito e a sua fama o levantaram até ás eminências do poder; e é muito duvidoso que o illustre ministro da corôa tenha mantido nos conselhos do Rei a mesma nobre isenção e austera hombridade que lhe carearam é respeito e consideração de todos, quando era simples ajudante do procurador geral da corôa. (Apoiados.)

E se não, pergunto, era s. ex.ª capaz, como ajudante do procurador geral da corôa, de assignar uma consulta favoravel á concessão do ramal de Cacilhas? (Apoiados.)

Eu appello para a consciencia do nobre ministro.

O partido a que tenho a honra de pertencer foi hontem accusado n'esta casa pelo sr. Cardoso Avelino.

O sr. Ministro das Obras Publicas: — Accusado não senhor.

O Orador: — Em outros termos: o illustre ministro recordou differentes concessões e favores feitos por gabinetes historicos á companhia dos caminhos de ferro, e com essas concessões e favores quiz justificar o seu procedimento e defender-se da accusação formulada pelo sr. José Luciano.

Apontaram-se differentes ministros das obras publicas, uns já mortos, outros vivos ainda, mas todos pertencentes ao partido historico, e em especial citou-se um homem eminente que foi sempre respeitado durante a vida (apoiados), e cujo nome não póde ainda hoje ser pronunciado, sem que, em homenagem e preito á memoria de suas levantadas qualidades e relevantes serviços, se não curve a cabeça de todos, sim, de todos, dos que em vida lhe foram amigos, e dos que lhe foram adversarios tambem. (Apoiados.)

O sr. Ministro das Obras Publicas: — Apoiado.

O Orador: — Sempre foi respeitado o nome do Sr. duque de Loulé. (Apoiados.)

O sr. Ministro das Obras Publicas: — Apoiado.

O Orador: — Diz-se que o partido a que tenho a honra de pertencer quiz favorecer e favoreceu muito a companhia dos caminhos de ferro, lhe concedeu muito auxilio e lhe fez muitas e vantajosas concessões; e eu lendo a collecção da legislação, especialmente aquella que diz respeito aos annos de 1863 e 1864, vejo que os ministros do partido historico, repelliram sempre com energia e com uma hombriedade que os honra (apoiados) as pretensões desarrasoadas e menos justas das emprezas dos caminhos de ferro. O meu partido foi sempre tão parco, e escrupuloso em dispensar favores á companhia dos caminhos de ferro, como foi prompto e diligente em lhe corrigir abusos e prohibir demasias. (Apoiados.)

Não sou eu que o digo. Affirmam-no os documentos officiaes, documentos conhecidos de todos, publicados regular e opportunamente, documentos, emfim, que não ficaram sepultados nas gavetas das secretarias d'estado, nem foram sonegados ao publico e subtrahidos ao exame da nação. Tenho aqui dezenas d'esses documentos, e se não receiasse fatigar-me extraordinariamente e fatigar tambem a camara, não me furtaria ao desejo, que não devo, nem quero satisfazer agora, de os apresentar e commentar a todos.

Apesar porém do receio que tenho de cansar a attenção dos meus collegas, e da confiança que deposito na memoria de todos elles, permitta se-me ao menos ler uma portaria que está referendada pelo Sr. duque de Loulé, relativa á construcção da casa da estação de Lisboa.

E uma pequena amostra da molle condescendencia que o partido historico tinha e teve sempre com a empreza. E como esta, ha um sem numero d'ellas.

A portaria diz assim:

«Constando a Sua Magestade El-Rei, por officio do fiscal da construcção dos caminhos de ferro de norte e leste, de 28 do mez passado, que a respectiva empreza construiu voltas de tijolo sobre as hombreiras das portas e janellas do lado do desembarcadouro na estação de Lisboa, e está construindo janellas quadradas de cantaria na fachada para o Caes dos Soldados e de tijolo nas fachadas para o embarcadouro, não obstante ter-se-lhe ordenado pelas portarias de 16 do junho e 4 de julho ultimos que substituisse o tijolo por cantaria; e constando igualmente que alguns modilhões das janellas do primeiro andar em construcção têem apenas 45 centimetros de tardoz, quando deveriam ter 80, que é a espessura da parede, a fim de apresentarem a precisa estabilidade; e que já estão feitos alguns peitoris de alvenaria ordinaria, o que induz a crer que serão revestidos de gesso; e, finalmente, que o cordão que separa o rez do chão do primeiro andar está feito de tijolo para o lado do embarcadouro:

«Manda o mesmo augusto senhor, pela secretaria d'estado dos negocios das obras publicas, commercio e industria, declarar á companhia real de caminhos de ferro portuguezes que deve suspender immediatamente aquelles trabalhos e demolir a obra que não dá garantia irrecusavel de segurança, bem como toda a obra que pela sua pobreza é inferior á das mais pobres habitações de Lisboa; devendo ficar na intelligencia de que a estação de Lisboa lhe não será recebida se não for construida em conformidade com o contrato, segundo as ordens do governo, e em harmonia com as regras da arte.

«O que, pela secretaria d'estado dos negocios das obras publicas, commercio e industria, se communica á companhia real dos caminhos de ferro portuguezes, para sua intelligencia e devidos effeitos.

«Paço, em 6 de novembro de 1863. = Duque de Loulé.

«Para a companhia real dos caminhos de ferro portuguezes.»

Que energia viril se não revela n'este documento! Com que desasombro não falla o ministro da corôa á poderosa companhia dos caminhos de ferro! Com que nobre altivez não mantem o poder a sua dignidade! Com que firme linguagem se não reprehendem e castigam os abusos da empreza, á qual se apontam sem rodeios nem circumloquios os seus deveres e obrigações! Suspenda immediatamente os trabalhos; trate de demolir a obra que, sobre não dar garantia irrecusavel de segurança, é pela sua pobreza inferior á das mais pobres habitações de Lisboa; fique na intelligencia de que a estação de Lisboa lhe não será recebida se não for construida em conformidade com o contraio, segundo as ordens do governo, e em harmonia com as regras da arte; são phrases que se usavam em 1863, mas que passaram de moda, e que já hoje não apparecem nos documentos officiaes. (Apoiados.)

Aqui está como procedia o sr. duque do Loulé! Vejam como este precedente justifica largamente a benevolencia do governo actual! E se eu quizesse, podia multiplicar as citações extraordinariamente. (Apoiados.)

Era assim que o sr. duque de Loulé e os outros ministros das obras publicas,.pertencentes ao partido historico, tratavam a companhia dos caminhos de ferro, quando as suas pretensões eram desarrasoadas e injustas. (Apoiados.)

Ha dois systemas de governar. Um consiste em resistir, outro em ceder. Este é o mais commodo; mas não é o seguido pelo meu partido. E creio que nunca o será. (Apoiados.)

Mas, disso o illustre ministro, o sr. duque de Loulé fez grandes adiantamentos á empreza constructora, e isto foi favor, e ninguem o accusou então ou ousa accusa-lo hoje. Não quero pôr em duvida a verdade d'estas palavras, mas sinto apenas que a par da affirmativa e junto com ella não viesse tambem o documento, se não para verificar a exactidão d'ella, ao menos para apreciar os motivos que determinaram a providencia, e que de certo a justificaram ampla o cabalmente. (Apoiados.)

Mas nem isso é preciso. O proprio sr. ministro foi o pri-

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meiro que tratou do justificar o procedimento do sr. duque de Loulé.

Fizeram-se adiantamentos, mas porque? Porque a empreza se apressou em fazer as obras, apresentando-as promptas antes do praso marcado na lei. Com isso lucrava a companhia e tambem lucrava o publico. (Apoiados.) O sr. duque de Loulé, n'estas circumstancias, não tinha duvida em fazer os adiantamentos, quanto mais que elles já estavam solidamente garantidos nos trabalhos realisados.

O governo foi arguido por não ter publicado na folha official a portaria em que auctorisa o augmento das tarifas de grande velocidade, e o illustre ministro para rebater a accusação adduziu varias rasões, que na sua fraqueza estão denunciando a ruindade da causa que elle pretende defender.

A primeira d’ellas foi que o Diario do governo não é a folha official da companhia. Eu estava perto do sr. Antonio Cardoso Avelino quando hontem fallava, prezo-mo do ter o ouvido menos mal apurado, e comtudo, duvidei do testemunho do meu ouvido, porque julgava que esta rasão não era uma rasão séria para se apresentar n'este logar, e principalmente n'um assumpto de tal magnitude e importancia. (Apoiados.) Foi tal a minha surpreza ao ouvir cata phrase, que cheguei a pedir a alguns dos meus collegas me dissessem se realmente me enganara; mas o testemunho d’elles foi tão uniforme o positivo, que eu estou inclinado a crer que esta rasão foi realmente adduzida.

O Diario do governo não é folha official da companhia. Mas pergunto eu, a companhia podia só por seu arbitrio elevar as tarifas? Não; a lei prohibe-lho expressa e claramente. A elevação das tarifas não podia effectuar-se senão depois do governo a auctorisar.

A portaria não era, não é um acto da companhia; era o é um acto do ministerio; era e é um documento official, ordenando um augmento de imposto de que o publico devia ter conhecimento antes de ficar sujeito a elle. E não penso V. ex.ª, e não pense a camara, que chamando eu á elevação das tarifas um augmento do imposto, apresento uma doutrina exótica e peregrina; esta theoria é a mesma do governo e dos seus defensores.

Em 1873 e 1875 o nosso collega, o sr. Lourenço de Carvalho, que foi relator n'aquelle celebre accordo, do qual logo me hei de occupar, expoz estas mesmas idéas, idéas que mantem agora, segundo deprehendo do seu gesto affirmativo.

O sr. Lourenço de Carvalho: — Apoiado.

O Orador: — Mas onde se viu n'uma nação culta lançar-se ao povo um tributo sem primeiro lhe dar conhecimento d'isso, e sem dizer os motivos por que se lança? Isto nunca se fez era Portugal e não se faz em parte alguma onde ha indicios do que se chama civilisação.

Em tempos que não vão muito distantes de nós, mas nos quaes não vigorava ainda em Portugal o systema representativo, n'uma epocha em que o regimen absoluto havia chegado á sua maior perfeição, o marquez de Pombal, ministro omnipotente, publicava as leis tributarias, e em estirados, profundos e bem elaborados preâmbulos, expunha largamente os motivos que tinham influido no espirito do legislador, para exigir novos sacrificios aos vassalos fieis do" monarcha portuguez.

Isto fazia-se no tempo do systema absoluto, quando nem se convocavam nem se reuniam os procuradores do povo, quando a nação não intervinha em os negocies que mais de perto lhe tocavam, quando, emfim, o Rei decidia em primeira e ultima instancia dos destinos do povo.

Isto que se fazia no tempo do marquez de Pombal, não se faz no tempo do sr. Antonio Cardoso Avelino.

Na Russia o czar publica os seus ukases, em Portugal não se publica uma portaria que augmenta um tributo na importancia de 3.700:000$000 réis.

Eu comprehendo que o governo procedesse d'est'arte, se em vez de governar uma nação livre governasse uma roça de negros na America; mas em Portugal no anno da graça de 1875, este procedimento não se comprehende nem se justifica.

O evangelho recommenda que a mão esquerda nunca saiba do beneficio concedido pela mão direita, mas aconselhando este recato, este segredo, este mysterio que torna ainda mais poética e sublime a primeira das virtudes christãs, preceitua ao mesmo tempo que a esmola só se faça á custa da fazenda propria e nunca á custa dos haveres alheios. E o governo, no presente avultado, largo e generoso com que beneficiou a companhia, não recorreu á sua bolsa, mas ás algibeiras dos passageiros e da nação. (Apoiados. — Vozes: — Muito bem.)

Quando um particular dispõe do que é propriamente seu, do que adquiriu por doação, herança ou pela seu trabalho honrado, não tem, emquanto se contém dentro de certos limite?, de dar satisfação a pessoa alguma pelas liberalidades que dispensa. E digo, dentro de certos limites, porque quando dá signaes de prodigalidade, póde ser levado perante os tribunaes o privado da administração da sua casa. Mas esta independencia de que os particulares gosam na administração da sua propriedade, não a têem, nem a podem ter, os funccionarios na gerencia da cousa publica, porque a esses corre o dever rigoroso de dar ao publico estreitas contas do que fazem e dos motivos por que o fazem.

O Diario do governo não é folha official da companhia, disso o illustre ministro! Mas acaso será a portaria documento elaborado nos escriptorios da companhia, ou documento escripto, referendado e archivado no ministerio das obras publicas? (Apoiados.)

O sr. Cardoso Avelino soltou uma phrase que póde dar logar a conjecturas bem pouco agradaveis para o governo. (Apoiados.)

Se ámanhã o povo, induzido por essa phrase menos bem pensada, enunciar affirmativas, que aqui não repito, o sr. ministro das obras publicas não tem de que se queixar. (Apoiados.)

Mas porque não foi publicada a portaria no Diario do governo? Ha ainda outras rasões. O sr. ministro das obras publicas não despreza as lições da experiencia, e a experiencia condemnava o precedente da publicação das portarias!

Houve já aqui um ministro, provavelmente immoral; era historico, não podia ser bom (riso); houve um ministro -immoral que teve o capricho e a extravagância de publicar na folha official uma portaria que auctorisava a elevação das tarifas, e depois aconteceu que os typographos da imprensa nacional foram pouco cuidadosos, e a portaria imprimiu-se com erros. Ora, d'estes erros nasceram conflictos serios e desagradaveis entre os passageiros e os empregados da companhia, porque a companhia fixava os seus annuncios marcando quaes eram as tarifas, e esses annuncios estavam certos; mas os passageiros iam munidos com um exemplar do Diario do governo, e queriam pagar menos, porque na folha official as tarifas appareceram com quantias inferiores. Ora, para evitar estes conflictos o sr. ministro das obras publicas resolveu não publicar a portaria. (Riso). Este creio eu que foi o argumento.

Oh! sr. presidente, eu peço que se amplie o principio. Na folha official do governo publicam-se portarias com erros sobre a elevação das tarifas, mas publicam-se muitas vezes tambem portarias de mais grave importancia o com iguaes incorrecções e defeitos. E o que acontece com as portarias, acontece tambem com os decretos e com as leis. A vista d'isto peço e proponho que não se torne a publicar no Diario mais documento algum official, nem leis, nem decretos, nem portarias! Acabe-se com a folha official e faça-se uma economia. (Apoiados. — Riso). No systema da publicidade haja o silencio e a mudez!

O sr. ministro das obras publicas receiava os conflictos que podiam resultar da publicação da portaria na folha of-

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ficial, mas não receiava os conflictos maia serios, mais justos o mais fundados que podiam nascer da sua não publicação, conflictos que de feito se deram em muitas estações, especialmente na Mealhada.

O povo portuguez, que é muito docil, muito condescendente, que grita e clama dois dias, quando contra elle commettem qualquer injustiça, mas que logo ce cala (apoiados), ainda não se póde habituar á idéa de considerar a companhia dos caminhos de ferro como um dos poderes do estado (apoiados), e quando via nas estações um annuncio, augmentando as tarifas, e não havia lido primeiro no Diario a portaria approvando esse augmento, entrava realmente em duvida se devia ou não devia pagar. Pois não era melhor que o governo tivesse declarado ao publico — esta elevação de tarifas foi auctorisada por mim? Não seria mais facil assim convencer o povo de que devia obedecer, e não levantar conflictos? De certo. As repugnancias n'este caso seriam menores, e os passageiros talvez se resignassem, dizendo de á para si manda quem póde.

Mas disse-se tambem, que não devera ser incriminado o actual governo pela não publicação da portaria, visto como falta, se não completamento identica ao menos analoga ou similhante, tinha commettido o partido historico, e apontou-se para 1860, para um decreto do sr. Thiago Horta, de 10 de novembro d'esse anno, que foi publicado no Diario do governo com apenas seis dias de antecipação do dia em que as novas tarifas começaram a vigorar.

O facto é verdadeiro, mas a arguição não é justa. E antes do tudo, advirta-se que o ministro historico não sonegou ao publico o conhecimento do decreto, e esta só circumstancia abre um abysmo entre o procedimento do sr. Thiago Horta e o acto do sr. Cardoso Avelino.

Depois, como foi que o illustre ministro, competentissimo n'estes assumptos, se esqueceu de que o decreto de 10 de novembro de 1860 fóra publicado em virtude da auctorisação dada ao governo pela lei de 5 de maio do mesmo anno, a qual permittia a revisão das tarifas desde já, dispensando assim para este caso especial as formalidades marcadas no contraio de 14 de setembro de 1859? O texto da lei é clarissimo, o diz assim no artigo 1.°, § 1.°:

«È o governo auctorisado a alterar, de accordo com a empreza, o artigo 44.° do mencionado contrato (14 de setembro de 1859):

«1.° Na parte em que determina que os preços hoje em vigor no caminho de ferro de leste fiquem estabelecidos como maximos até á conclusão do mesmo caminho, podendo estabelecer desde já o que dispõe o § 4.° do mesmo artigo, para o caso da conclusão da linha até á fronteira.»

O artigo 44.°, citado na lei (do contrato de 14 de setembro de 1859), diz assim:

«Para regular os preços da conducção dos passageiros, gado e mercadorias, adoptar-se-hão como base as tarifas actualmente em vigor no caminho de ferro de leste, ficando os seus preços estabelecidos como maximos até á conclusão do caminho de ferro á fronteira.

«§ 1.° Terminado o caminho de ferro á fronteira, serão as tarifas modificadas por accordo entre o governo e a empreza.

«§ 2.° Cinco annos depois de entregues á exploração as linhas de leste e norte, e consecutivamente de cinco em cinco annos, proceder-se-ha á revisão das tarifas.

«§ 4.° Na falta de accordo entre o governo e a empreza, ácerca das modificações a introduzir nas tarifas do caminho de ferro de leste, tanto depois de concluido o caminho, como nas epochas marcadas para a revisão, terá cada uma das partes o direito de estabelecer desde logo, como maximo, os preços das tarifas francezas, que n'esse tempo estiverem em vigor para os caminhos de ferro francezes, se não forem superiores ás que vigorarem anteriormente, no caso da revisão de que trata o artigo 1.°»

Por estas disposições, vê-se que no contrato estavam fixadas as seguintes epochas ou occasiões para a revisão das tarifas:

1.° Quando estivesse concluido o caminho de leste até á fronteira";,

2.° Cinco annos depois de entregues á exploração as linhas de norte e leste;

3.º Consecutivamente de cinco em cinco annos.

Portanto, a disposição do mesmo contrato, estatuindo o annuncio das alterações feitas nas tarifas com a antecipação de um mez, só póde referir-se aquelles casos, unicos previstos e auctorisados no contrato.

Mas a lei de 5 de maio de 1860, lei especial, permittindo a alteração das tarifas antes de concluido o caminho, veiu portanto auctorisar o que nem estava previsto, nem era ordenado no contrato, e bem longe de exigir o annuncio previo de um mez, como indispensavel para a alteração vigorar, declarou expressamente que desde logo, isto é, desde a data da lei, podia decretar se a alteração. E foi em harmonia com essa lei que se publicou o decreto de 10 de novembro do 1860, o qual diz assim:

«Sendo-me presentes as alterações que a empreza dos cadinhos de ferro de norte e leste propoz com fundamento no artigo 1.º § 1.º da carta de lei de 5 de maio do corrente anno, ás tarifas de que trata o artigo 44.° do contrato approvado pela referida carta de lei, para regular o transporte dos viajantes, mercadorias e maia objectos no caminho de ferro de leste: hei por bem, revogando o decreto de 23 de dezembro de 1858, auctorisar a mesma empreza a pôr em vigor, desde o dia 16 do corrente mez em diante, para o serviço do mencionado caminho de ferro, a tarifa que baixa com esta decreto, assignada pelo ministro e secretario distado dos negocios das obras publicas, commercio e industria.

«O mesmo ministro e secretario d'estado assim o tenha entendido e faça executar. Paço das Necessidades, em 10 de novembro de 1860. = REI. — Thiago Augusto Velloso de Horta.»

Vê-se portanto que o sr. Thiago Horta não commetteu falta ou irregularidade alguma. Não publicou o decreto um mez antes de vigorarem as novas tarifas, porque a lei não lhe impunha essa obrigação, da qual não estava comtudo dispensado o sr. Cardoso Avelino, visto como affirma ter permittido a alteração, fundado nas disposições do contrato de 14 de setembro de 1859, que exige clara e positivamente o annuncio previo de um mez. O segredo com que o illustre ministro se houve n'este objecto, nem tem precedentes que o justifiquem, nem lei que o auctorise.

O illustre auctor da interpellação no seu lúcido, erudito o brilhantissimo discurso demonstrou hontem á camara evidentemente que o procedimento do governo para com a companhia dos caminhos de ferro do norte e leste, desde 1871 até hoje, tem sido uma serie não interrompida de favores immerecidos, os. quaes por si só estão denunciando uma benevolencia exagerada e uma protecção decidida do gabinete para com a empreza. A elevação das tarifas é mais um documento d'essa protecção, da qual são testemunhos eloquentes e provas irrecusáveis os dois' accordos, tanto o de 1873 como o de 1875, mas especialmente o primeiro.

De ambos preciso eu fallar tambem n'esta occasião, não com a largueza e desenvolvimento que a assumpto está naturalmente aconselhando, mas tanto quanto for necessario para ser entendido nas considerações que a proposito da materia especial da interpellação tenho a adduzir.

No primeiro accordo dispensava-se a companhia de construir o ramal de Valladares o as obras de arte para a segunda via, e substituia-se o traçado primitivo, que era de 10 kilometros por outro maia curto, o qual se não me engana a memoria, não excedia 4 kilometros. Além d'isso, a empreza ficava alliviada do encargo, que sobre ella pesava, de pagar o imposto de transito pelas mercadorias de pequena velocidade, o isto durante todo o tempo que ti-

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vesse de existencia, isto é, durante oitenta e seis annos. Eram estas as vantagens enormes, colossaes e giganteas, que ce pretendia conceder á companhia. (Apoiados.) O publico lucrava apenas o ter um menor percurso desde as Devezas até á estação terminus, e o estado realisava a economia de 400:000$000 eu 500:000$000 réis pouco mais ou menos, porque deixava de pagar o subsidio kilometrico e para espropriações, ao qual estava obrigado pelos contratos anteriores, para se concluir a 5.ª secção pelo traçado antigo.

O accordo de 1875, identico em todas as suas disposições ao de 1873, se differia d'elle no que respeitava á isenção do imposto de transito, a qual agora apparecia reduzida de oitenta e seis a trinta e seis annos. A differença era pequena e insignificante. Cincoenta annos de mais ou de menos de imposto de transito é bagatella, que não merece importancia! (Riso. — Apoiados.) -

O illustre ministro affirma que submettendo estes accordos á discussão e voto das camaras, dera documento do seu muito respeito ao parlamento. Vejamos em que consistiu esse respeito.

Quando n'esta casa appareceu o primeiro accordo, a opposição, então mais numerosa e valente do que hoje, deu-se pressa em o examinar cuidadosamente. Calculou maduramente o valor da concessão que se pretendia fazer á companhia; amontoou algarismos sobre algarismos; cotejou as vantagens que se pediam para a empreza com os lucros que advinham pára o publico e para o estado; e mostrando a toda a luz da evidencia que estes eram microscópicos e insignificantes, comparados com a enormidade dos beneficios que se intentava prodigalisar á companhia, taes difficuldades e tão serias objecções oppoz ao projecto, que este, apenas approvado na generalidade, voltou para a commissão, onde morreu, onde ficou sepultado, e d'onde nunca mais surgiu.

Emquanto porém corria a discussão, que foi longa e curiosa, que dizia o governo e os seus defensores? «Atacae, diziam elles á opposição, atacae, como quizerdes, o projecto; nós podemos transigir comvosco em muitas das suas disposições, mas não no que respeita á parte financeira; n'esta não é permittido tocar.»

«Nós pedimos que a companhia do caminho de ferro de norte e leste seja isenta do imposto de transito durante oitenta e seis annos, e d'estes oitenta e seis annos não diminuimos nem um anno, nem um mez, nem uma semana, nem um dia, nem um minuto. Ou tudo ou nada». Era esta a linguagem que se usava em 1873. (Apoiados.)

Passou tempo, decorreram dois annos, e o sr. ministro das obras publicas reconsiderando, ou fingindo reconsiderar, veiu dizer á camara «eu tinha pedido para a companhia do caminho de ferro do norte e leste oitenta e seis annos de isenção do imposto de transito, affirmando que n'esses oitenta e seis annos não podia haver diminuição de qualidade alguma, nem grande nem pequena; mas hoje venho condescender com os desejos da opposição, abato cincoenta nos oitenta e seis annos, e d'este modo só durante trinta e seis será a companhia isenta do imposto do transito».

Como explicar reconsideração tão rapida e tão completa em assumpto tão momentoso? Se foi sincera, o sr. Avelino não havia estudado profundamente o primeiro accordo, não lhe tinha calculado bem o alcance, e semelhante e tão reprehensivel falta de circumspecção, nem revela grande zêlo do bem publico, nem demonstra grande respeito ao parlamento. (Apoiados.) Se não foi sincera, a camara, tratada como se fóra creança ingénua, pouca estima e gratidão deve ao illustre ministro pelo respeito que lhe tributou. (Apoiados.)

Quando veiu o segundo accordo, a opposição folgou por haver tomado em 1873 uma altitude energica, e por ter conseguido com a sua resistencia teimosa grandes beneficios para o thesouro. Lidara e lidara muito, mas os seus esforços não haviam sido inefficazes. O primeiro accordo, evidentemente ruinoso para o estado, fóra abandonado, e em legar d'elle apparecia outro, não bom, mas emfim menos damnoso para a nação. Em todo o caso esta lucrava o lucrava muito com a troca.

Eu disse que a opposição folgou, e a justiça pede que não se lhe attribua a victoria exclusivamente. O primeiro accordo era tão mau, que a'.é muitos ministeriaes, silenciosos na camara, oppunham fóra d'ella serias repugnancias á sua approvação, e protestando sempre a sua fidelidade ao governo, não se mostravam comtudo muito dispostos a dar-lhe o voto n'esta questão. (Apoiados.) A verdade é que para o triumpho obtido contribuiu principalmente a opposição, e contribuiram tambem em parte alguns amigos do governo.

O segundo accordo não se podia dizer bom. A concessão que o governo pretendia fazer á companhia era ainda exagerada. (Apoiados.) Apesar d'isso foi approvada sem grande hostilidade, e foi approvada porque a camara ardia em desejo de ver concluir quanto antes o caminho de ferro do norte, sentia a impaciencia, aliás louvavel, de conseguir a ligação d'esta linha ferrea com a do Minho e Douro.

E tambem por parte do governo e dos seus defensores era este o principal argumento adduzido a favor do accordo. «Urge completar, diziam elles, o caminho de ferro, fazendo as obras da 5.* secção desde as Devezas até á estação terminus dentro da cidade do Porto, mas a companhia não esta era circumstancias de emprehender e realisar estes trabalhos tão dispendiosos, e faltará aos seus compromissos se não lhe melhorarmos as condições financeiras, augmentando-lhe os recursos».

A camara, examinando maduramente o estado da empreza e calculando as despezas que ella ía fazer, approvou o accordo, e approvando-o ficou convencida que havia dado á companhia, não só o strictamente necessario e indispensavel, mas ainda mais alguma cousa.

Não sei se o illustre ministro quando n'esta e na outra casa do parlamento defendia o projecto de accordo, celebrado depois com a companhia, pensava já em auctorisar a elevação das tarifas. Se pensava, declaro com a franqueza que me é propria, que o modo por que o sr. ministro se houve, se póde abonar a sua astúcia diplomatica, não é forte documento da sua sinceridade e franqueza para com 03 procuradores do povo, nem do seu respeito para com o parlamento. (Apoiados.)

Mas se o sr. ministro das obras publicas não pensava em similhante cousa antes da approvação do accordo, se não pensava em permittir a elevação das tarifas de grande velocidade, então tambem o não devia pensar depois. (Apoiados.)

É fóra de duvida que o parlamento não approvaria o accordo, se conhecesse antes o pensamento reservado do sr. Avelino de elevar as tarifas. (Apoiados.) Deu com difficuldade os trinta e seis annos do imposto de transito, e nem esses daria. (Apoiados.) E dando-os, entendia que dava o sufficiente, ou mais do que o sufficiente. O sr. Avelino é que não quiz conformar-se com a decisão da camara, e com a elevação das tarifas tratou de corrigir, emendar ou antes aniquilar a obra do parlamento. (Apoiados.)

Entendeu que este havia procedido com avareza mesquinha, e a essa pretensa avareza oppoz elle bizarra generosidade ou antes prodigalidade reprehensivel.

A camara arrancou á companhia cincoenta annos de imposto de transito, isto é, 2.000:000$000 réis approximadamente; o illustre ministro indemnizou a companhia, dando-lhe a elevação das tarifas, isto é, 3.700:000$000 réis pouco maia ou menos. (Apoiados.)

O illustre ministro não podia, nem devia, ir alem do parlamento, e indo, faltou ao respeito que lhe é devido. Pois é na occasião em que este acabava de fazer uma larga concessão á companhia, pois é quando a affluencia de passageiros e mercadorias crescia extraordinariamente pelo

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desenvolvimento de viação ordinaria e pela abertura dos Caminhos de ferro de Minho e Douro, que o sr. Avelino se lembra de elevar as tarifas de grande velocidade?

Porque não as elevou em 1873?

O accordo não estava ainda approvado!

Porque não as elevou em 1874?

O accordo não estava ainda approvado!

Porque não as elevou no principio do anno de 1875?

O accordo não estava ainda approvado!

Esta é a verdade.

Mas ha mais.

Em 1873, como em 1875, no primeiro como no segundo accordo, o governo e os illustres relatores, tanto n'esta casa como na camara dos dignos pareci, defendiam a proposta com as vantagens que da sua approvação tiraria o publico.

«Approvae o accordo, diziam elles, dae á companhia a isenção do imposto, porque a companhia ficará habilitada a reduzir muito as suas tarifa?. Alliviada do encargo do imposto, poderá dar mais elasticidade ás tarifas, e d'ahi resulta, não só beneficio para ella, pelo augmento da circulação, que provoca a reducção dos preços de transporte, mas tambem beneficio para o publico, que lucra muito com essa reducção.

«Ha portanto aqui uma vantagem reciproca para o publico e para a companhia.»

Para arrancar votos ao parlamento e conseguir que o accordo passasse, promettia-se a reducção das tarifas; approvado o accordo e fechado o parlamento, tratou-se logo de elevar as tarifai. Que admiravel coherencia! Que profundo respeito aos corpos legislativos! (Apoiados.) Vede e pasmae.

Hontem ouvi n'esta casa, expostas pelo governo, doutrinas que me causaram verdadeiro assombro.

Perguntava o sr. Luciano de Castro ao sr. ministro das obras publicas, quaes eram as rasões de conveniencia, mas de conveniencia publica, que o tinham levado a consentir na elevação das tarifas, e o illustre ministro respondeu de um modo que eu hesito em repetir:

«O governo, disse o sr. Avelino, não ha da consultar para a elevação das tarifas os interesses publicos, mas sim os interesses da companhia!» (Apoiados.)

(Interrupção do sr. ministro das obras publicas,)

Mas te e. ex.ª não disse isso o quer rectificar...

O Sr. Ministro das Obras Publicas: — Não, senhor: o illustre deputado póde continuar, e quando eu fallar, responderei.

O Orador: — Pareceu-me ouvir isto; e não só me pareceu a mim, mas a mais alguem. (Apoiados.) Entretanto, não tenho interesse em combater argumentos que a. ex.ª não apresentasse.

Mas ha mais ainda.

Eis-aqui as palavras que s. ex.ª pronunciou: «A acção do governo ha de ser limitada pelos interesses legitimos da companhia; e o governo não se póde oppor, só em nome do interesse publico, á elevação das tarifas!» Parece-me que estas foram as palavras pronunciadas pelo sr. ministro (apoiados); mas se s. ex.ª protesta, dou como não dito o que acabo de ler.

Oh! sr. presidente, não preciso commentar largamente estas palavras, ellas têem em si mesmo o commentario. (Apoiados.) Se as ouvisse a um advogado da companhia, não as estranhava; mas declaro a V. ex.ª que me surprehenderam desagradavelmente quando as ouvi pronunciar a um membro do governo.

«O governo tem de attender aos interesses legitimos da companhia!» Mas quaes são esses interesses legitimos? Sobre isso não disse nada o sr. ministro das obras publicas. Sobre esse ponto convido-o a dar explicações, claras, francas e explicitas.

Estou certo de que o sr. Avelino não fará agora o que já fez a respeito do ramal de Cacilhas; pois que interrogado uma e muitas vezes sobre os motivos por que tinha feito a concessão, respondeu sempre com o silencio e com a mudez. (Apoiados)

O illustre ministro, respondendo hontem sobre os motivos de conveniencia que o tinham decidido a elevar as tarifas, limitou-se a confessar que o publico não lucrara nada com esta medida do governo. Antes do sr. ministro ter declarado isto, já o tinha affirmado claramente o engenheiro respectivo que foi consultado sobre o assumpto; e quando este o não dissesse, tambem não eram necessarias grandes lucubrações para o conhecer. A cousa é simples e clara. O publico paga mais; lego não lucrou, ficou prejudicado.

Mas porque se consentiu e auctorisou esse prejuizo? Se havia conflicto entre os interesses publicos e as conveniencias da companhia, porque haviam estas de prevalecer sobre aquelles? (Apoiados.) O accordo era mau, mas com a approvação do accordo tambem lucrava a nação; lucrava pouco, mas lucrava. Promettia-se lhe concluir a 5.ª secção e reduzir as tarifas de pequena velocidade. Mas com essa concessão só folga a companhia, e os passageiros soffrem e nada aproveitam. Que rasões justificam similhante iniquidade? (Apoiados.) Falle o illustre ministro e dissipe as trevas que envolvem este escuro e mysterioso negocio. (Apoiados.)

Mas disse ainda o governo: «permitti o augmento das tarifas de grande velocidade, porque se o não permittisse, a companhia ficava com o direito de estabelecer os preços das tarifas francezas, os quaes são ainda um pouco superiores aos que foram ultimamente adoptados». Não sou jurisconsulto, mas a lei é tão clara, que eu não hesito em dizer que é errada a interpretação que lhe deu o sr. Cardoso Avelino.

Diz a lei: Na falta de accordo entra o governo e a empreza, ácerca das modificações a introduzir nas tarifas do caminho de ferro de lente, tanto depois de concluido o caminho até á fronteira, como nas epochas marcadas para a revisão, terá cada uma das partes o direito de estabelecer desde logo, como maximos, os preços das tarifas francezas, que n'esse tempo estiverem em vigor para os caminhos de ferro francezes...

Até aqui leu o illustre ministro, mas não quiz concluir, porque o que se segue é a refutação do seu pobre argumento. A ninguem é licito mutilar um artigo da lei, e este artigo acrescenta as seguintes palavras:

«Se não forem superiores aos que vigorarem anteriormente, no caso da revisão de que trata o § 1.°»

Ora o caso a que se refere o § 1.° estava já verificado em virtude da lei de 5 de maio e decreto do 10 de novembro de 1860; logo a companhia só podia estabelecer os preços francezes, se não fossem superiores aos que vigoravam antes, o portanto a companhia não podia elevar só por si as tarifas, e os receios do illustre ministro eram tão infundados, como illusorio o perigo que s. ex.ª nos descrevera. Se elle não quizesse approvar a elevação das tarifas, a companhia não as podia elevar. Esta é que é a verdade. (Apoiados.)

Mas supponhamos que a companhia do caminho de ferro podia fazer essa elevação só por si, dispensando a cooperação do sr. ministro das obras publicas; admittamos ainda que era licito á empreza estabelecer os maximos francezes: acaso não havia na lei meio de conjurar esse mal? (Apoiados)

A companhia elevava as tarifas, estabelecendo os preços das linhas ferreas francezas, e o governo trazia aqui uma proposta de lei, marcando os preços e garantindo á companhia o producto bruto das tarifas, que ella houvesse recebido no ultimo anno, feita a deducção dos gastos materiaes da exploração e o augmento progressivo que, em termo medio, Unha lido no ultimo quinquennio. É esta a disposição clara e expressa do artigo 3.° do contrato addicional de 20 de dezembro de 1860. Aqui está o remedio dado e o problema resolvido. (Apoiados.)

Se o governo se oppozesse em julho á elevação das ta-

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rifas, se a companhia tivesse direito para estabelecer os preços francezes e de feito os estabelecesse, o publico soffria apenas alguns mezes até á abertura do parlamento, mas o mal seria passageiro e dentro em breve ficaria radicalmente extirpado. Mas agora que fazer?

Agora, sr. presidente, ha de ser difficil levar a companhia a reduzir as tarifas. (Apoiados.)

E quando se intentar diminuir o preço dos transportes, a companhia ha de oppor-se tenazmente. E se o governo mais tarde quizer aqui trazer uma proposta no sentido que eu indiquei e o contrato addicional permitte, claro é que se ha de dar á empreza uma somma maior, porque com a elevação das tarifas terá crescido o producto bruto. (Apoiados.)

O mal é pois irremediavel. E que rasões de conveniencia publica (seja-me licito repetir a pergunta), influiram no espirito do sr. ministro para o permittir e auctorisar? O sr. Cardoso Avelino, alem da generalidade muito vaga e muito nebulosa dos interesses legitimos da companhia, nada disse. Perdão, disse mais alguma cousa: disse que tanto não tinha sido lesiva a elevação das tarifas, que o movimento dos passageiros havia crescido desde julho em diante!

Este argumento colheria, se ao lado da linha ferrea do norte e leste houvesse outra linha que lhe fizesse concorrencia.

O sr. ministro das obras publicas elevou as tarifas apenas 5 por cento, e se as elevasse 10, 15 ou 20, o movimento havia do mesmo modo crescer sempre, porque a linha ferrea satisfaz uma grande necessidade, e porque os antigos meios de locomoção, mais caros, mais incommodos e mais morosos, desappareceram depois que ella se abriu á circulação.

O movimento tem augmentado desde julho! Quem sabe se o illustre ministro, fascinado por esta idéa, não se lembrará ainda, se se demorar muito tempo no poder, de convidar a companhia a elevar mais as suas tarifas?

Tenho sido mais extenso do que quizera, e vou concluir já, mas não sem dizer alguma cousa tambem sobre a questão da legalidade,

A lei que regula sobre este assumpto é o contrato ceie brado entre o governo e a companhia em 1859, e approvado pela lei de 1860. É este o pacto fundamental para as duas partes contratantes; é por este codigo que ellas se têem de regular n'esta materia. Ora no artigo 44.° §§ 1.º e 2.° d'esse contrato está estatuido o modo por que se deve proceder á reforma as tarifas, e ahi as regras estabelecidas são tão claras e explicitas, que mal posso eu comprehender como possa haver logar para duvidas ou fundamento para interpretações encontradas.

Diz este artigo assim:

§ 1.° Terminado o caminho de ferro á fronteira, serão as tarifas modificadas por accordo entre o governo e a em preza;

§ 2.° Cinco annos depois de entregues á exploração ás linhas de leste e norte, e consecutivamente de cinco em cinco annos, proceder-se-ha á revisão das tarifas.

Que quer isto dizer? Acaso poderá alguem concluir da leitura d'estes paragraphos que em qualquer occasião se possam revêr as tarifas? Não. O texto é clarissimo. As tarifas serão modificadas e revistas: 1.°, quando estiver terminado o caminho de ferro á fronteira; 2.°, cinco annos depois de entregue á exploração o caminho de norte e leste; 3.°, consecutivamente de cinco em cinco annos.

A primeira revisão, isto é, aquella a que se devia proceder quando estivesse concluido o caminho até á fronteira, já está feita. Foi antecipada pela lei de 5 de maio de 1860, artigo 1.° § 1.°, e auctorisada pelo decreto de 10 de novembro do mesmo anno. Esta está portanto fóra da questão.

E a segunda revisão poder se-ia fazer em 1875?

Duvido que o governo tivesse direito para fazer accordos com a companhia a tal respeito.

Pois não estatuo muito expressamente o § 2.° que cinco annos depois de aberto á exploração o caminho de ferro do norte e leste se proceda a esta revisão?

E, pergunto eu, o caminho de ferro do norte e leste está todo entregue á exploração? Creio que não. (Apoiados.)

O § 2.º diz: quando for entregue á exploração o caminho de ferro do norte e leste. Não é uma parte, é todo o caminho de ferro do norte e leste. Não é só o caminho de ferro até á margem esquerda do rio Douro; é o caminho de ferro até á margem direita d'esse rio, até á estação terminus. (Apoiados.)

Ora, o caminho de ferro de norte e leste não está todo feito, porque está feito só até á estação das Devezas, e a prova de que não está todo feito é que a companhia ainda o anno passado fez um accordo com o governo para a conclusão d'elle. (Apoiados.) Logo, se o caminho de ferro do norte e leste não está concluido, como é que o governo podia auctorisar legalmente a revisão das tarifas, quando a lei só lhe dá esse direito cinco annos depois d'esse caminho de ferro estar prompto e aberto á exploração. (Apoiados.)

Quanto a mim, se a lei for rigorosamente interpretada, o sr. ministro das obras publicas procedeu illegalissimamente (apoiados), porque o caminho de ferro do norte e leste não póde considerar-se aberto á exploração nem ainda prompto e concluido. (Apoiados.)

Mas supponhamos que não se trata de uma exploração definitiva, normal e ordinaria; supponhamos que se trata de uma exploração provisoria, de uma exploração interina, como a permittiu o' sr. João Chrysostomo de Abreu o Sousa em 1864; supponhamos mesmo, por uma interpretação benevola, que o caminho de ferro do norte e leste já está todo concluido e aberto á exploração; supponhamos tudo isto; supponhamos o que quizerem.

Quando começou essa exploração? Dos documentos officiaes consta que ella começou em julho de 1864, logo, só podiam ser revistas as tarifas em 1869 e depois em 1874, Em 1875 de certo não. (Apoiados.)

O illustre ministro, respondendo ao sr. José Luciano, quiz inculcar que, a lei quando diz cinco annos depois de aberto á exploração o caminho de ferro do norte e leste, e consecutivamente de cinco em cinco annos, não marca epochas determinadas, marca apenas o minimo do tempo que deve decorrer para a revisão da tarifas.

Ora, sr. presidente, esta interpretação, salvo o respeito devido á sciencia juridica do sr. Cardoso Avelino, é evidentemente erronea. Se os cinco annos são apenas o minimo, então a revisão poderá fazer-se no 5.°, 6.°, 7.°, 8.º ou 9.º anno. Dizer portanto de cinco em cinco annos, equivaleria a dizer: quando o governo quizer entrar em accordo com a companhia. A letra do paragrapho desapparece com tal interpretação. Aquelle consecutivamente de cinco em cinco annos, não tem rasão de ser. A idéa que o illustre ministro quiz ver no texto, evidentemente não se encontra n'elle. Poder-se-ia admittir, mas com difficuldade, em relação aos cinco primeiros annos, e nunca em relação aos cinco consecutivos. E sendo assim, a interpretação para explicar uma parte do paragrapho destruiria a outra parte.

A lei condemna abertamente o acto do governo, que auctorisou a companhia do caminho de ferro do norte e leste a elevar as tarifas de grande velocidade.

A condescendencia do illustre ministro para com a empreza tem tanto de illegal como de damnosa para os interesses publicos, e nas circumstancias que a revestem só oferece motivos para increpações serias e censuras ásperas.

Nada justifica o sr. Cardoso Avelino. Se houve interesses da companhia, aos quaes era forçoso attender, interesses tão respeitaveis, que fizeram esquecer as disposições da lei, as conveniencias do publico, e até os bons principios

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da governação do estado, é indispensavel que o illustre ministro declare quaes elles foram.

Acabem as trevas e appareça a luz. (Apoiados.)

Eu poderia acrescentar ás reflexões já expostas muitas outras que o assumpto me estava naturalmente suggerindo, mas estou fatigado, e por isso termino aqui já, agradecendo a benevolencia com que fui escutado e a attenção que os meus collegas se dignaram dispensar-me.

Vozes: — Muito bem.

(O orador foi comprimentado.)

PARECERES N.° 82-B

Senhores. — A vossa commissão do ultramar examinou com a precisa attenção o requerimento, em que o capitão de engenheiros do extincto exercito da India, director das obras publicas da provincia de Angola, Claudino Augusto Carneiro de Sousa e Faro, pede a transferencia para o exercito da Africa occidental no seu actual posto, e contando a antiguidade do mesmo, desde a data em que a elle foi promovido por decreto de 3 de julho de 1873; e viu tambem o parecer da vossa illustre commissão de guerra, favoravel á pedida transferencia, ainda que indicando que deverá o requerente ficar o mais moderno da sua respectiva classe; mas

Considerando que o requerente tem habilitações superiores ás de todos os officiaes do exercito da Africa, como official de engenheiros do exercito da India, tendo completado o respectivo curso com honrosas distincções, como se vê dos documentos, e sendo mesmo lente da escola militar de Goa, logar em que foi provido por concurso especial;

Considerando que a sua antiguidade de praça é maior do que a dos capitães despachados para Africa occidental depois de 3 de julho de 1873;

Considerando que o decreto de 3 de julho de 1873, promovendo o requerente a capitão para ir servir na Africa occidental como engenheiro, é fundado na lei de 3 de dezembro de 1869, que no seu artigo 12.º considera engenheiros para Angola aquelles habilitados pela escola da India como o requerente;

Considerando que, ainda quando não houvesse tal lei, não podia nem devia esse decreto de promoção ser menos considerado que outros taes, que promovem officiaes sem habilitações algumas para o exercito de Africa occidental;

Considerando que pretendendo a lei de 24 de abril de 1873 beneficiar os officiaes e aspirantes do exercito extincto da India, equiparou os cursos superiores da escola de Goa aos de infanteria e cavallaria do exercito do reino, mandando que n'este ultimo entrem esses officiaes ou aspirantes como os mais modernos das suas classes, mas não determina o mesmo emquanto aos exercitos da Africa;

Considerando que não deve o requerente ser prejudicado nos seus direitos adquiridos, em relação a seus camaradas; e

Considerando, finalmente, que é vantajoso para o serviço que no exercito da Africa occidental haja officiaes habilitados como o requerente:

É a vossa commissão do ultramar de opinião que parece justa e equitativa, e de vantagem para o serviço, a pretensão do requerente Claudino Augusto Carneiro de Sousa e Faro, capitão de engenheiros do extincto exercito da India, de passar ao exercito da Africa occidental no seu actuai posto e com a antiguidade da data em que a elle foi promovido; pelo que deve esta pretensão ser remettida ao governo, para que a tome na consideração que lhe merecer.

Sala das sessões da camara dos senhores deputados, 20 de março de 1816. = Joaquim José Gonçalves de Matos Correia = Augusto Cesar Ferreira de Mesquita — Alberto Garrido = Antonio Augusto Teixeira de Vasconcellos = Antonio José de Seixas = Luiz Adriano Magalhães Menezes e Lencastre = Henrique Ferreira de Paula Medeiros = Visconde da Arriaga = Julio Ferreira Pinto Bastos = Filippe Augusto de Sousa Carvalho — José Maria Pereira Rodrigues = Carlos Eugenio Correia da Silva, relator.

A commissão de guerra, acceitando o convite da illustre commissão do ultramar para dar a sua opinião a respeito do requerimento junto de Claudino Augusto de Sousa Faro, e enviando os documentos que acompanham um outro antigo requerimento do mesmo supplicante, tem a declarar:

Que, em vista das habilitações do supplicante, seria de equidade conceder-se lhe a transferencia para o exercito de Africa occidental, devendo porém ficar o mais moderno da sua classe, porque é esse o espirito das leis, as quaes têem por fim evitar toda a especulação em prejuizo dos officiaes dos differentes quadros;

Que não colhe a circumstancia, que o supplicante qualifica de anomala; de ter como engenheiro director de obras publicas uma graduação inferior á de alguns seus subordinados na repartição que dirige; porquanto mesmo no continente do reino acontece muitas vezes terem os engenheiros, commissionados no ministerio das obras publicas, sob a sua direcção alguns officiaes mais graduados em outras armas;

Que, emfim, a pretensão de ser o supplicante considerado como engenheiro para todos os effeitos é desmesurada, porquanto a carta de lei de 24 de abril de 1873 equipara os cursos de artilheria o de engenheria de Goa aos de infanteria e cavallaria no reino.

A commissão de guerra é, pois, de parecer que o capitão Claudino Augusto de Sousa Faro está no caso de ser transferido para o exercito da Africa, ficando o mais moderno da sua classe.

Sala das sessões da commissão, 15 de março de 1876. = José Maria de Moraes Rego = José Frederico Pereira da Costa = Antonio José d'Avila = Antonio Manuel da Cunha Belem = José Joaquim Namorado, relator.

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