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CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Sessão de 29 de maio de 1868

PRESIDENCIA DO SR. JOSÉ MARIA DA COSTA E SILVA

Secretarios — os srs.

José Tiberio de Roboredo Sampaio.

José Paria Pinho de Vasconcellos Soares de Albergaria.

Chamada—71 srs. deputados.

Presentes á abertura da sessão — os srs.: Rodrigues de Azevedo, Fevereiro, Alvaro Seabra, Alves Carneiro, Villaça, Antonio de Azevedo, Gomes Brandão, Silva e Cunha, Guerreiro, Seixas, A. Pinto de Magalhães, Seabra Junior, Falcão e Povoas, Magalhães e Aguiar, Costa e Almeida, Augusto de Faria, Montenegro, Cunha Vianna, B. F. Abranches, B. F. da Costa, Testa, Vieira da Mota, Conde de Thomar (Antonio), Pereira Brandão, Eduardo Tavares, F. F. de Mello, F. Coelho do Amaral, F. L. Gomes, Pinto Bessa, Silveira Vianna, Moraes Pinto, Rolla, Noronha e Menezes, Meirelles Guerra, Almeida Araujo, Judice, Santos e Silva, Assis Pereira de Mello, Ayres de Campos, João de Deus, Mendonça Cortez, J. M. da Cunha, J. M. de Magalhães, Pinto de Vasconcellos, Albuquerque Caldeira, Fradesso da Silveira, J. Pinto de Magalhães, Maia, Galvão, Bandeira Coelho de Mello, Klerk, Costa Lemos, Correia de Oliveira, J. I. Pereira de Carvalho, Costa e Silva, Achioli de Barros, Frazão, Ferraz de Albergaria, Rosa, José de Moraes, José Tiberio, Lourenço de Carvalho, Camara Leme, Penha Fortuna, Julio Guerra, Aralla e Costa, Mathias de Carvalho, Paulino Teixeira, R. Venancio Rodrigues, Galrão, Thomás Lobo, Visconde dos Olivaes.

Entraram durante a sessão — os srs.: Agostinho de Ornellas, Annibal, Rocha París, Costa Simões, Ferreira de Mello, Sá Nogueira, Falcão de Mendonça, Barros e Sá, Azevedo Lima, A. J. da Rocha, A. J. Teixeira, Arrobas, Lopes Branco, Torres e Silva, Falcão da Fonseca, Barão da Trovisqueira, Garcez, Carlos Bento, Custodio Freire, Eduardo Cabral, Fernando de Mello, Silva Mendes, Gavicho, F. M. da Rocha Peixoto, Van-Zeller, Guilhermino de Barros, Faria Blanc, Innocencio J. de Sousa, Freitas e Oliveira, Baima de Bastos, J. A. Vianna, Mártens Ferrão, Matos e Camara, Gaivão, Ribeiro da Silva, Faria Guimarães, Gusmão, Xavier Pinto, Mardel, Sette, Sousa Monteiro, Freire Falcão, Teixeira Marques, J. M. Lobo d'Avila, Rodrigues de Carvalho, Toste, Sá Carneiro, Batalhoz, J. F. Pinto Basto, Levy, Ferreira Junior, Leite de Vasconcellos, M. B. da Rocha Peixoto, Mota Veiga, Pereira Dias, Lavado de Brito, Limpo de Lacerda, Franco, P. M. Gonçalves de Freitas, R. de Mello Gouveia, Theotonio de Ornellas, Venancio Deslandes.

Não compareceram — os srs.: Braamcamp, A. Bernardino de Menezes, Correia Caldeira, Ferreira Pontes, Pequito, Faria Barbosa, Araujo Queiroz, Saraiva de Carvalho, Faustino da Gama, Albuquerque Couto, Dias Lima, Gaspar Pereira, Silveira da Mota, Aragão Mascarenhas, Calça e Pina, J. T. Lobo d'Avila, Dias Ferreira, Faria Pinho, Lemos e Napoles, J. M. de Magalhães, Silveira e Sousa, J. R. Coelho do Amaral, Sebastião do Canto.

Abertura — Ao meio dia e um quarto.

Acta — Approvada.

EXPEDIENTE

A QUE SE DEU DESTINO PELA MESA

Officios

1.° Do ministerio dos negocios do reino, declarando, em satisfação ao requerimento do sr. José Gregorio Teixeira Marques, que, nos annos de 1865-1866 e 1867-1868, nenhuma verba se despendeu com estudos em paizes estrangeiros.

A secretaria.

2.° Do ministerio dos negocios da justiça, fazendo declaração igual á do ministerio dos negocios do reino, em referencia ao requerimento do sr. José Gregorio Teixeira Marques.

A secretaria.

3.° Do ministerio dos negocios do reino, remettendo cento e oitenta exemplares das consultas das juntas geraes dos districtos do reino e ilhas adjacentes, relativas ao anno de 1867.

Mandaram-se distribuir.

4.° Do mesmo ministerio, remettendo um mappa das escolas de ensino primario de um e outro sexo, existentes no districto de Faro, em satisfação ao requerimento do sr. Manuel Quaresma Limpo Pereira de Lacerda.

A secretaria.

Participação

Declaro que não compareci ás sessões dos ultimos dias por motivo justificado. = Lopes Branco. Inteirada.

Requerimentos

1.° Requeiro que, pelo ministerio das obras publicas, sejam enviados a esta camara os seguintes documentos e esclarecimentos:

I Copia de toda a correspondencia entre o governo e a empreza do caminho de ferro de sueste, desde a publicação da lei que auctorisou o contrato de 14 de outubro de 1865 até 25 do corrente, em que foi apresentado pelo ex.mos ministros das obras publicas e da fazenda a proposta de lei para contratar o dito caminho, nos termos do officio de 24 de outubro ultimo, dirigido pelo governo transacto ao representante do mesmo caminho;

II Copia de todas as correspondencias entre o chefe fiscal do governo no caminho de ferro de sueste e o ministro das obras publicas em relação ao assumpto da promessa feita pelo governo transacto, no mencionado officio de 24 de outubro, á empreza do mesmo caminho;

III Se as subvenções de que falla a promessa de 24 de outubro no final do quarto periodo da segunda concessão é em referencia ao contrato de 14 de outubro de 1865, ou ao anterior de 23 de maio de 1864;

IV Qual o rendimento kilometrico e bruto do caminho de ferro de sueste em cada um dos annos decorridos de 1 de janeiro de 1864 a 31 de dezembro de 1867?

V Qual o numero de kilometros em exploração em cada um dos referidos annos?

Sala das sessões, em 29 de maio de 1868. = O deputado, Raymundo Venancio Rodrigues.

2.° Em additamento ao requerimento que aqui apresentei na sessão de 22 do corrente, requeiro que, pelo ministerio da fazenda, sejam enviados a esta camara com a maior urgencia a copia do officio e da conta da liquidação feita pela commissão creada por decreto de 20 de abril de 1859, relativamente ao que a camara municipal de Lisboa pagou por conta do governo de juros de padrões desde 1780 a 1848, cujo officio foi presente a Sua Magestade por via da secretaria da fazenda em 22 de novembro de 1859. = Pedro Augusto Franco, deputado por Belem e Oeiras = Antonio Augusto de Sousa Azevedo Villaça, deputado pelo circulo dos Olivaes.

Nota de interpellação

Desejo interpellar o sr. ministro do reino ácerca dos acontecimentos que tiveram logar ha poucos dias na freguezia de Ega do concelho de Condeixa, districto de Coimbra, os quaes obstaram á posse do parocho recentemente nomeado para aquella freguezia. = O deputado pelo circulo de Penacova, Fernando de Mello.

Mandou-se fazer a devida participação.

SEGUNDA LEITURA

Projecto de lei

Senhores. — Pelo n.° 2.° do artigo 880.° do codigo civil portuguez, gosa do privilegio mobiliario especial nos fructos dos predios rusticos respectivos o credito por divida de renda, relativo ao ultimo anno e ao corrente; mas, para que seja applicavel este privilegio, é necessario que o onus respectivo de arrendamento se ache registado, como determina o § 1.° ao mesmo artigo. E pelo artigo 978.° só são ad

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mittidos a registo os contratos de arrendamento por mais de quatro annos, ou por mais de um, se tiver havido adiantamento de renda.

Segue-se portanto da combinação d'estes artigos, que os arrendamentos por menos de quatro annos ou por um anno sómente sem antecipação de renda, não gosam de privilegio mobiliario especial nos fructos dos predios rusticos respectivos.

Esta distincção que o codigo faz entre arrendamentos por mais de quatro annos ou por mais de um com antecipação de renda, e arrendamentos por menos de seis annos ou por um sem antecipação de renda, é só emquanto ao registo, a que sujeita aquelles, mas de que dispensa estes arrendamentos. Sendo como é o arrendamento com o onus que acompanha a propriedade, porque o respectivo contrato não se rescinde por morte do senhorio nem do arrendamentario, nem por transmissão da propriedade, quer por titulo universal, quer por titulo singular, é muito conveniente e vantajoso, que a sua existencia conste por um modo authentico e com toda a publicidade.

Mas o legislador entendeu, e entendeu muito bem, que só os arrendamentos a longos prasos deviam ser sujeitos ao registo, porque emquanto aos arrendamentos por menos de quatro annos, ou por um sem antecipação de renda, os quaes nem como onus reaes, emquanto ao registo, são considerados pelo codigo (artigo 949.°), não se davam as mesmas rasões, e necessidade de publicidade.

O codigo civil concede aos arrendamentos não sujeitos a registo as mesmas garantias que aos registados, quando determina (artigo 1:621.°), que os arrendamentos não sujeitos a registo subsistirão, apesar da execução, por todo o tempo por que tiverem sido feitos, e que os arrendamentos sujeitos a registo subsistirão sómente, se estiverem registados anteriormente ao registo do acto ou facto de que a execução resultou.

'Não é porém o codigo coherente, quando deixa de conceder, nos arrendamentos não sujeitos a registo, o privilegio mobiliario especial constante do artigo 880.°, n.° 2.°, do qual só gosam os arrendamentos cujos contratos podem ser admittidos a registo.

N'estas circumstancias o senhorio de predios rusticos, para poder gosar de um privilegio que lhe pertence pelo mais sagrado direito, esta constituido na necessidade de as arrendar sempre por mais de quatro annos, ou de exigir do arrendatario a antecipação da renda respectiva.

Mas principalmente nas provincias do norte do reino, nem sempre é conveniente ao senhorio arrendar os predios rusticos por mais de quatro annos, e são poucos os arrendatarios para arrendamentos a longos prasos, e rarissimos os que podem adiantar as rendas respectivas.

Por estas considerações, e porque seria inconveniente e até injusto deixar de conceder privilegio mobiliario especial nos fructos dos predios rusticos respectivos ao credito por divida de renda, relativo ao ultimo anno e ao corrente, quando os contratos de arrendamento não estão registados, porque não são sujeitos a registo, nem a elle admittidos, tenho a honra de vos propor o seguinte projecto de lei.

Artigo 1.° Nos arrendamentos por menos de quatro annos, não tendo havido adiantamento de renda, gosa de privilegio mobiliario especial nos fructos dos predios rusticos respectivos, independentemente de registo, o credito por divida de renda, relativo ao ultimo anno e ao corrente.

Art. 2.º Fica revogada a legislação em contrario.

Sala das sessões da camara, 27 de maio de 1868. = O deputado por circulo de Felgueiras, Manuel Balthazar Leite de Vasconcellos.

Admittido e enviado á respectiva commissão.

O sr. Secretario (José Tiberio): — Participo a v. ex.ª e á camara que o sr. Caetano Vellosa não póde comparecer á sessão de hoje por incommodo de saude.

O sr. Faria Blanc: — Mando para a mesa uma nota de interpellação ao sr. ministro da justiça, sobre a execução que tem sido dada ao decreto de 2 de janeiro de 1862.

O sr. Costa de Lemos: — Mando para a mesa um projecto de lei que vao assignado por mim e pelo meu nobre e antigo amigo, o sr. deputado por Felgueiras.

Não o leio, porque não quero tirar tempo á camara, mas exporei breve e resumidamente o seu objecto.

E para ser escuso do recrutamento o filho ou creado do agricultor que fabricar predio seu ou arrendado com uma ou mais juntas de bois, uma vez que esse filho ou creado se occuppem exclusivamente na agricultura, e estejam n'este serviço um anno antes da idade em que podem ser recenseados para o serviço militar.

Peço pois menos e bem menos do que as antigas leis concediam á primeira das nossas industrias, a agricultura.

Sr. presidente, todas as rasões de conveniencia publica aconselham, e hoje mais do que nunca, que este projecto seja convertido em lei. Todos nós sabemos que na nossa agricultura ha uma grande falta de braços; ha poucos creados, quasi nenhuns jornaleiros, e talvez em breve haverá falta de cavadores, caseiros, o que será uma fatalidade para a provincia do Minho, onde os seus proprietarios não podem, ao menos sem grande despeza, fabricar todas as suas quintas como os das outras provincias, por estarem espalhados por differentes freguezias e até por differentes concelhos.

Emquanto se não publicou a lei de 27 de julho de 1855 nunca faltaram braços á agricultura; os paes logo que os filhos chegavam á idade de poderem trabalhar, destinavam-nos aos trabalhos agricolas, para um dia gosarem da isenção do recrutamento, que as leis sabiamente concediam aos que cultivavam a terra; e acostumados a estes trabalhos desde pequenos, e por não quererem passar na idade adulta pela aprendizagem que qualquer outra industria ou profissão demandava, ficavam passada a epocha do recrutamento, fazendo serviços á agricultura ou como lavradores caseiros, ou como creados, ou como jornaleiros.

Appareceu a lei de 27 de julho de 1855, que retirou o privilegio á agricultura, mas logo começou a sentir-se n'ella grande falta de braços. Os homens que até ahi se applicavam á agricultura, uns foram procurar as outras industrias, que acharam mais lucrativas e menos trabalhosas, e outros no intuito de escaparem ao recrutamento, emigraram para o Brazil.

É necessario occorrer de remedio a similhante mal, tomando providencias para chamar braços á agricultura; e eu entendo que isto se consegue em parte, adoptando o projecto que eu e o meu collega temos a honra de apresentar á camara.

Esta medida tem de mais a mais a vantagem de diminuir a emigração para o Brazil, onde os filhos de Portugal, principalmente aquelles que vão entregar-se a trabalhos pesados, definham a maior parte em pouco tempo, com grave prejuizo para a mãe patria, e sem proveito para aquelle paiz; e tem tambem a vantagem de desviar das outra industrias muitos braços com que ellas não podem, e cuja falta de trabalho esta hoje dando serios cuidados aos poderes publicos.

E, sr. presidente, ao passo que esta medida tem as vantagens que deixo dito, estou convencido que não ha de diminuir sensivelmente o numero dos recrutados. Muitos dos que até aqui escaparam ao recrutamento a titulo de amparo, hão de abrigar-se á agricultura para, quando chegarem a idade de serem recrutados, poderem aproveitar-se d'este privilegio. E aqui temos, aproveitando-se da isenção da agricultura mancebos, que na falta d'ella se aproveitariam da do amparo.

Emfim, nós antes da lei de 1855, tinhamos uma lei, que concedia immensas escusas de recrutamentos. Basta ler o decreto de 9 de julho de 1842, onde veem as escusas enunciadas em dezesete paragraphos. Com relação mesmo á agricultura, o privilegio era muito mais lato do que o que eu proponho, porque inclusivamente eram exceptuados os lavradores, os administradores de bens ruraes e um filho, ou creado, na rasão de um para cada junta de bois. Tinhamos então maior exercito, e nem por isso, apesar das muitas escusas que a lei concedia, faltavam os recrutas, quando eram necessarios.

Fico por aqui, reservando-me para fallar mais detidamente sobre este objecto, quando elle vier á discussão.

Peço á camara que o tome na devida consideração, e á commissão do recrutamento que dê sobre elle, quanto antes, o seu parecer. E fique certa a camara que a legislatura que conceder á agricultura a isenção proposta, bem merecerá do paiz.

O sr. B. F. de Abranches: — Mando para a mesa um requerimento pedindo esclarecimentos ao governo, tres propostas renovando a iniciativa de projectos de lei que apresentei nas differentes sessões em que fui deputado, e apresento tambem um novo projecto de lei.

O requerimento é o seguinte (leu).

Pelo artigo 4.° da proposta de lei n.° 13 apresentada pelo sr. ministro da fazenda e publicada no Diario de Lisboa n.° 117, de 25 do corrente mez, vejo eu, que os generos e mercadorias do producção propria das possessões nacionaes ultramarinas, transportados directamente em navios nacionaes, pagarão nas alfandegas do continente e ilhas, metade dos direitos de importação marcados na pauta gorai.

Ora, até hoje, os generos das nossas provincias ultramarinas, uns tinham um direito especial e outros pagavam apenas um quinto do direito que pagavam os generos estrangeiros. A differença era grande e isto era em beneficio da agricultura das nossas provincias ultramarinas, e havia necessidade de se dar essa protecção, para que os nossos productos podessem concorrer não só ao mercado de Lisboa, como depois aos mercados estrangeiros quando tivessem de concorrer com outros productos de igual natureza das possessões estrangeiras.

Pela proposta de lei augmenta-se o direito consideravelmente, e d'esse augmento ha de resultar necessariamente prejuizo á industria e agricultura das nossas possessões ultramarinas, por isso peço que o governo envie os esclarecimentos indicados, para em tempo competente mostrar que não posso approvar a proposta de lei, pela maneira por que foi apresentada.

Muito embora se augmente o direito que hoje pagam esses productos, comtudo o augmento não deve ser tal que vá prejudicar essa industria.

Não faço por agora mais considerações para não antecipar, nem o juizo da camara, nem a minha opinião a este respeito.

As propostas são as seguintes (leu a primeira).

O fim que tenho em vista, renovando esta primeira proposta que comprehende dois projectos de lei, é concorrer para que na provincia de S. Thomé, haja o numero sufficiente de braços para que aquella provincia possa ter o grau de desenvolvimento de que carece nos unicos ramos da sua exportação, o café e o cacau.

Pela maneira por que eu proponho, que effectue essa importação de braços e essa colonisação consegue-se esse resultado, e entendo tambem, a não querermos estar debaixo da tutela do governo inglez, que poderemos, nos termos da legislação vigente, dar braços sufficientes áquella provincia que é uma das que não carece que a mãe patria lhe dê subsidios, e sirva isto de resposta áquelle dos meus illustres collegas que n'esta casa têem dito que as provincias ultramarinas são onerosas á mãe patria. Nem todas o são, e uma dellas é a provincia de S. Thomé, que, tendo braços, não só poderá viver com os seus recursos, como tem vivido até agora, mas até póde concorrer de futuro com as suas sobras, como em outros tempos concorreu Macau, para as despezas de outras provincias, e entendo que assim devem concorrer reciprocamente, porque não faço distincção entre provincias do continente e ilhas, e provincias ultramarinas, porque todas ellas fazem parte da nação portugueza.

(Leu a segunda proposta.)

É fóra de duvida, como disse então, e repito hoje, que ha toda a conveniencia em que as cousas do ultramar sejam conhecidas por todos nós; mas não o podem ser emquanto não forem publicados na folha official, ou em documentos separados, todos os esclarecimentos que devem servir de base para o perfeito conhecimento do estado em que se acham as nossas possessões ultramarinas.

A terceira proposta de renovação de iniciativa é a que passo a ler (leu).

Entendo, pelas rasões que constam do relatorio d'este projecto de lei, que é de summa conveniencia que se acabe com a distincção entre a magistratura judicial do continente e a do ultramar; e que, regulando-se o serviço dos magistrados que são despachados para servirem nas nossas possessões, se lhes garantam as vantagens, a que tiverem direito, quando voltarem para o continente, e sobretudo que não seja illusorio o principio da antiguidade combinado com o merito consignado na lei de 21 de julho de 1855.

Eu podia apresentar este projecto com as modificações que entendo que hoje se podem fazer, porque são já decorridos alguns annos desde a data da sua primeira apresentação; mas não o faço, porque, se apresentasse um novo projecto, devia necessariamente ter a mesma base, e apenas modificaria a minha opinião no sentido de propor a extincção da relação de Loanda; relação que, a meu ver, não tem rasão de ser, já pelo diminuto numero de processos que ali se julgam, e já pela impossibilidade que tem havido daquelle tribunal funccionar com o numero de membros com que deve funccionar; no entanto, como me parece que os deputados de Angola, meus collegas, e mesmo o sr. ministro da marinha, não estão muito dispostos, por agora, a acabar com a relação de Loanda, apresento o projecto como se acha, e, se na commissão os meus collegas entenderem que a relação deve acabar, declaro desde já que não tenho duvida em modificar o projecto, aceitando a extincção da relação de Loanda.

(Interrupção do sr. José de Moraes, que se não ouviu.) Sim, senhor, e tambem a relação dos Açores; e já que se fallou n'ella, e o 'sr. José de Moraes diz que tambem deve ser extincta, assim como a relação commercial, direi que já n'esta casa manifestei a necessidade de se acabar com esses dois tribunaes; no entanto sei tambem que, por parte dos habitantes dos Açores, ha grande reluctancia em que se acabe com a relação que ali existe, e sei mesmo que os povos não duvidam cotisar-se para que se possa sustentar aquella relação; porém, sem querer agora discutir a conveniencia da extincção ou não extincção da relação dos Açores, sempre direi duas palavras para consignar as minhas opiniões sobre este assumpto.

Entendo que não ha necessidade de se conservar a relação dos Açores, porém, a conservar-se, é necessario que ali se regule o serviço de fórma tal, que aos juizes que para ali forem despachados se dê a garantia de poderem ser transferidos para o continente, na primeira vaga, tirando nós ao governo o arbitrio de os deixar lá estar indefinidamente, sendo outros despachados para o continente sem nunca terem servido nos Açores; ou então que, postos a concurso os logares da relação dos Açores, e concorrendo a elles os juizes de 1.ª classe, se lhes marque o tempo de serviço effectivo que ahi devem prestar, sendo depois aggregados ás relações do continente, até que n'ellas possam ser collocados definitivamente. Eu optaria pelo primeiro meio, isto é, por que o despacho fosse obrigatorio para os Açores, ficando ao juiz garantida a certeza de poder voltar para o continente na primeira vaga que houvesse em Lisboa ou no Porto.

A relação commercial tambem se póde extinguir, passando as suas funcções para as relações de Lisboa e do Porto.

Além da renovação d'estes tres projectos de lei, apresento outro que tem por fim melhorar o serviço das arcas dos orphãos nas comarcas do continente e ilhas.

Já em tempo apresentei n'esta casa um projecto quasi identico a este; entretanto, a experiencia que tive do serviço desde a epocha em que o apresentei até hoje, levou-me a modifica-lo alguma cousa. Estabeleço portanto n'este projecto menor numero de livros do que no outro, mas as bases são as mesmas; crio certo numero de livros para a escripturação das contas, e obrigo os juizes a que, regular e annualmente examinem as contas das arcas, tomando-as aos respectivos thesoureiros, sendo depois apresentadas aos presidentes das relações e ás procuradorias regias, pelos juizes e pelos delegados dos procuradores regios, e quero tambem que o resultado d'essas contas seja publicado no Diario de Lisboa, o que, a meu ver, é de bastante utilidade para os interessados e para o credito dos empregados de justiça.

Não faço mais considerações a este respeito, porque o projecto tem de ir á commissão, e ella o examinará como entender, trazendo á camara o seu parecer.

Por ultimo, e sem querer cansar a attenção da camara, peço ainda licença para dizer duas palavras e agradecer ao sr. visconde da Praia Grande, que foi ministro da marinha, e igualmente ao sr. ministro da marinha actual, o sr. Coelho do Amaral, a benevolencia com que sempre me attenderam com relação aos negocios da provincia que represento.

Os poucos collegas que tenho n'esta casa sabem que desde 1858, em que fui deputado até 1865, sempre pugnei por certas medidas para a provincia de S. Thomé e Principe;

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e entre ellas occupou sempre a minha attenção a da substituição da moeda fraca pela moeda do continente.

Por diligencias minhas e do meu amigo, e então collega n'esta casa, e hoje infelizmente fallecido, o sr. João de Roboredo, conseguimos que o sr. Ferreri, então ministro, publicasse em 1859 o decreto de 25 de outubro, pelo qual se ordenou a substituição da moeda fraca d'aquella provincia pela moeda corrente no reino. Constantemente, desde aquella epocha até setembro de 1865, que deixei de ser deputado, instei pela execução d'aquelle decreto, que por varias circumstancias não se póde cumprir.

Logo que em setembro de 1867 tive a noticia de ter sido novamente eleito, fallei com o sr. visconde da Praia Grande, apresentando-lhe uma nota das medidas que julgava que se deviam adoptar, e entre ellas ía esta; e s. ex.ª fez o favor de me dizer que estava já na casa da moeda o cobre para se cunhar o dinheiro que devia ser mandado para S. Thomé, para ahi ser cumprido o citado decreto de 25 de outubro de 1859; e em abono da verdade devo declarar, que o meu antecessor, o sr. Leandro José da Costa, que foi deputado por S. Thomé, desde dezembro de 1865 até setembro de 1867, não descurou d'este negocio. Fallou tambem com o sr. visconde da Praia Grande, e creio mesmo que por diligencias de s. ex.ª é que se effectuou a primeira remessa de 5:000$000 réis, que teve logar em 5 de novembro de 1865. Porém o facto é, que nem eu me descuidei d'este objecto, nem s. ex.ª, e que acredito que a primeira remessa dos 5:000$000 réis foi feita por diligencias de s. ex.ª, sem embargo de ter eu, desde 1867, tambem fallado novamente sobre este mesmo objecto. O facto é, que até hoje têem sido remettidos pelo governo para S. Thomé, com o fim de se cumprir este decreto, 20:000$000 réis.

A primeira remessa, como disse, foi em 5 de novembro de 1865, a segunda remessa teve logar em 5 de dezembro de 1867, a terceira teve logar em 5 de fevereiro d'este anno, e a quarta em 5 de maio tambem d'este anno; ao todo, 20:000$000 réis.

Em setembro fallei tambem ao sr. governador do banco ultramarino, o sr. Chamiço, para que se prestasse a emprestar ao governo o dinheiro que fosse necessario para que se cumprisse este decreto; e achei em s. ex.ª a melhor vontade em emprestar este dinheiro com um modico juro, e hoje tem o banco ultramarino 20:000$000 réis na provincia de S. Thomé á disposição do governo ou do governador para com os outros 20:000$000 réis que já foram mandados, se effectuar a troca da moeda provincial.

Eu sempre entendi que a troca da moeda se não devia fazer por pequenas porções, e com longos prasos, mas sim, que se devia fazer do uma só vez, o no mais curto espaço de tempo possivel, tendo o governador e a junta da fazenda á sua disposição, o dinheiro que para esse fim fosse preciso, evitando-se assim que, começada a troca, podesse haver por contrabando, a importação do dinheiro do cunho da moeda depreciada, como talvez em tempo se tivesse importado; queria que logo que se fizesse a primeira remessa, se lhe seguissem as outras para de prompto se fazer aquella troca, evitando-se assim o inconveniente por mim ponderado; ora, como desde que foi publicado o decreto de 1859, o governo se não póde habilitar a fazer as remessas que fez, e não póde obter o emprestimo que obteve do banco ultramarino depois de setembro de 1867, isto é depois que eu fui novamente eleito deputado, eis as rasões por que só agora é que se cumpriu o citado decreto de 25 de outubro de 1859. São estas as reflexões que entendi dever fazer para que os meus constituintes de S. Thomé possam saber que se o sr. Leandro José da Costa fez diligencias para se effectuar a primeira remessa do dinheiro, eu tambem as fiz, não só para que se publicasse o decreto de 25 de outubro de 1859, mas tambem instando como instei, para que continuasse a remessa do dinheiro para S. Thomé, para onde já foram como disse 20:000$000 réis, alem de outros 20:000$000 réis que o banco ultramarino poz em S. Thomé á disposição do governo e por modico juro; e estou convencido de que com os 40:000$000 réis, se poderá realisar a troca da moeda provincial, cumprindo-se assim o decreto de 25 de outubro de 1859, que como já disse foi promulgado por instancias minhas e do meu amigo e collega o sr. João do Roboredo. Tenho concluido, e eu vou mandar para a mesa o requerimento, as tres propostas de renovação da iniciath a dos projectos de lei por mim apresentados, e bem assim o projecto de lei que de novo apresento agora esperando que o sr. presidente lhes mande dar o destino conveniente.

O sr. José de Moraes: — Pedi a palavra, mas não pense V. ex.ª e a camara, que vou mandar alguma canastrada de projectos para a mesa (riso), ou mesmo elogiar os meus actos como deputado; não trato d'isto, é para muito modestamente pedir aos srs. tachygraphos que façam uma rectificação no meu discurso. Na parte do discurso aonde se diz =portaria de 14 de maio de 1865 = diga-se = portaria de 14 de maio de 1868 =.

E mui facil apparecer nas notas tachygraphicas um engano de data; mas peço que se faça esta rectificação, porque o engano mudava completamente o sentido.

Aproveito a occasião para continuar na minha tarefa de pedir a v. ex.ª que me inscreva para quando estiver presente o sr. ministro da fazenda. Desgraçadamente para mim, sempre que peço a palavra para interpellar ou fazer alguma pergunta a qualquer dos srs. ministros, não posso realisar o meu desejo, porque ss. ex.ªs ordinariamente não apparecem aqui na occasião propria. Este mal é antigo, e já me aconteceu inscrever-me vinte, trinta ou quarenta vezes, e só na ultima ter a felicidade de ver coroados os meus esforços. Parece-me que me ha de acontecer o mesmo com o actual sr. ministro da fazenda; entretanto peço a v. ex.ª que me inscreva e que me dê a palavra quando o illustre ministro estiver presente antes da ordem do dia; mas se acaso eu não podér obter que s. ex.ª compareça antes da ordem do dia, bem sei como hei de fazer as minhas perguntas, que é pedir a palavra quando se discutir qualquer projecto, não fallar sobre elle, e fazer as perguntas que pretendo e tenho direito de fazer, e a que o illustre ministro tem o dever de responder. Os deputados têem esse direito e os ministros o dever correspondente, e ss. ex.ªs devem cumpri-lo para que as questões não fiquem adiadas e sem andamento algum. O sr. ministro da fazenda desde que a camara se abriu ainda aqui não veiu antes do ordem do dia. Continuarei na minha tarefa de pedir a palavra até obter um resultado.

O sr. Magalhães e Aguiar: — Sr. presidente, vejo que não são muitos os trabalhos parlamentares de que nos temos de occupar na sessão de hoje, e então ha de v. ex.ª e a camara permittir que eu levante aqui a minha humilde voz com o fim unico de protestar com toda a força contra algumas asserções feitas na outra casa do parlamento relativamente ás eleições que em 22 de "março d'este anno tiveram logar.

Um digno par do reino que se acha á frente da administração de um dos districtos mais importantes do paiz, e a quem desde ha muito estou habituado a considerar e respeitar como homem de conhecimentos e de talento assás provado, fez entre os seus collegas asserções de todo inexactas e que eu, pela posição que occupo n'esta casa, entendo me incumbe o rigoroso dever de não deixar passar em julgado sem o competente reparo.

Refiro-me ao ex.mo conde de Samodães que foi nomeado governador civil do Porto alguns dias antes da eleição geral. S. ex.ª respondendo a um discurso de um seu collega, disse que = as eleições no districto do Porto, a seu cargo, haviam sido feitas sem a intervenção das auctoridades =. Eu vou ler á camara as suas proprias expressões. Ali (refere-se ao districto do Porto) quem fez a eleição foi o partido politico que apoiava o governo, e não as auctoridades. (Eu, sr. presidente, fazia parte de um centro politico que apoiava o governo, e desde o momento que aceitei o cargo de confiança que hoje tenho, entendi dever deixar de ir a esse' mesmo centro, para se não confundir a minha posição n'aquelle logar com a posição official e como auctoridade administrativa, e declaro ao digno par que pelo menos naquella parte do paiz, a intervenção da auctoridade foi nulla, e que a eleição foi feita só pelos amigos do governo.

Foi nulla a intervenção da auctoridade, diz s. ex.ª Admira-me que o governador civil do Porto que deve estar bem ao facto do modo como correu a eleição no districto a seu cargo, venha d'este modo fallar entre os seus collegas, e eu, sr. presidente, não posso deixar de protestar contra isto, e commigo, de certo, a maior parte dos habitantes do districto, na memoria dos quaes ainda devem estar todos os factos que se deram durante o periodo da eleição de que estou fallando.

Em muitos concelhos do districto foram demittidos administradores que eram bons empregados; que sempre haviam desempenhado as suas funcções administrativas com rectidão, zêlo, saber e imparcialidade, tornando-os estas qualidades credores da estima dos seus administrados, e foram substituidos por outros para o fim que todos sabemos o que não é licito ignorar visto fazerem-se estas mudanças administrativas pouco tempo antes da eleição de deputados.

Houve até um concelho no districto onde se nomearam dois administradores durante o intervallo que medeou entre a dissolução da camara passada e a eleição d'esta.

Vêem já os meus collegas que estou fallando de Villa Nova de Gaia.

Os habitantes d'este concelho tiveram de conhecer por causa das eleições, dois administradores no curto intervallo de cerca de sessenta dias! Era forçoso que não desse entrada n'esta casa um cavalheiro assás digno a todos os respeitos e que se torna admirado pelo seu talento e reconhecidos merecimentos, o qual eu deveras sinto não ter como collega, e para isso se conseguir era mister que a administração estivesse nas mãos de quem se prestasse a fazer-lhe a mais crua guerra, e debaixo d'este ponto de vista posso asseverar á camara que nada houve a desejar. O derrotado não o seria, de certo, se a auctoridade administrativa não influisse na eleição muito energicamente, e se alem d'isso não houvesse outras causas que julgo não dever trazer para aqui agora.

O administrador do concelho que tenho a honra de representar n'esta casa, foi demittido tambem, e de um modo pouco digno. O secretario geral que n'aquella occasião estava servindo de governador civil, não teve a minima attenção com elle, desconsiderando-o completamente como se elle fosse um mau empregado, contra o que logo protestaram os seus antigos administrados, fazendo-o presidente, da commissão do recenseamento, mais tarde presidente da camara municipal, e escolhendo-o por fim para seu procurador á junta geral de districto. Entenderam os meus e seus conterraneos que deviam levantar assim o empregado que adrede era desconsiderado, e eu louvo-os por isso. Os empregados que servem bem o seu paiz, têem' direito á consideração do publico. Mau é que os empregados superiores não respeitem os seus inferiores, e só porque suspeitem que não estão estes resolvidos a acompanha-los nos saltos politicos que a cada passo estão dando.

Demittido que foi o administrador despachou-se um, sendo o seu principal fim guerrear a minha eleição. Eu era fusionista, e dos que tinha apoiado com toda a lealdade a situação passada até á sua queda; tinha commettido pois um peccado de que não podia ser absolvido, segundo o entendia a associação patriotica, creada na cidade invicta. Querendo esta associação ter a gloria de trazer ao parlamento dezesete deputados com que contasse em tudo e para tudo, não lhes convinha a minha humilde pessoa. Tratavam então de me fazer toda a guerra, e fizeram-na a todo o transe, e confesso a v. ex.ª que não podiam encontrar pessoa que mais vontade tivesse de me derrotar do que o actual administrador. Desde que foi despachado, não descansou um só instante. Deixava na casa da administração o sevr, substituto, e corria os eleitores de porta em porta, funccionando, d'este modo, n'aquelle concelho ao mesmo tempo administrador e substituto!! Algumas vezes o encontrei eu nessas corridas eleitoraes, quando tambem ía caminho de casa de alguns dos meus amigos. Elle por um lado, e por outro o commissario geral da policia do Porto que, com approvação do governo, deixou o seu logar para andar no concelho do Marco de Canavezes, cerca de sessenta dias a trabalhar em favor da candidatura de seu primo, não deixavam de empregar todos os meios conducentes á minha derrota. Apesar de toda a pressão da auctoridade poderam os eleitores independentes do circulo trazer-me aqui! Cabe-me n'esta occasião, e a camara não m'o levará a mal, endereçar d'aqui duas e só duas palavras de reconhecimento aos meus amigos, constituintes e conterraneos, que, escolhendo-me pela quarta vez para seu representante n'esta casa, me deram agora prova de uma grande estima e consideração, a que eu jamais poderei deixar de ser grato. As minhas forças são assás minguadas, bem o conheço, para cumprir a espinhosa missão de que me encarregaram; sobra-me porém vontade de não desmerecer da confiança que em mim depositaram. N'este intuito hei de empregar todos os esforços da minha parte para apreciar as medidas que se apresentarem ao exame do parlamento, venham ellas d'onde vierem, a fim de approvar aquellas, de cuja bondade me convencer, e rejeitar as que julgar não serem conducentes ao bem do meu paiz.

Regulando emfim pelo meu concelho, e por alguns outros do districto de que tenho completo conhecimento, o modo por que correram as eleições, posso asseverar á camara que as auctoridades administrativas intervieram, e com bastante energia, na ultima eleição a que se procedeu. Posso, a meu ver, n'esta minha asserção, completamente opposta á que foi feita na outra casa do parlamento pelo governador civil do Porto, appellar para o testemunho de todos os meus collegas do districto. Ss. ex.ªs não são capazes de asseverar que todos os deputados do districto que vieram a esta casa, aqui estariam, caso as auctoridades administrativas não interviessem energicamente nas eleições.

Pois demittem-se administradores e regedores substituindo-os por outros na proximidade das eleições, e vão estes fazer cabos de policia os seus adversarios politicos quasi exclusivamente, como aconteceu no concelho do Marco de Canavezes, para mais tarde se ter a coragem de dizer no parlamento que as auctoridades não intervieram na eleição! Parece impossivel, e eu declaro a v. ex.ª que o não acreditaria se o não visse escripto no Diario de Lisboa.

Lançado o meu protesto contra a asserção proferida na camara dos dignos pares, concluo pedindo desculpa á camara por lhe ter tirado alguns instantes, e agradecendo a attenção que se dignou dar-me.

O sr. Correia de Oliveira: — Mando para a mesa um requerimento pedindo alguns esclarecimentos pelo ministerio do reino e pelo das obras publicas.

O sr. Albergaria: — Mando para a mesa dois requerimentos pedindo esclarecimentos ao governo.

O sr. Cortez: — Mando para a mesa o seguinte requerimento (leu).

Peço a v. ex.ª que tenha a bondade de mandar expedi-lo com urgencia, porque julgo este documento, que eu peço, indispensavel para me habilitar a discutir com conhecimento de causa a proposta n.° 13, do sr. ministro da fazenda.

Aproveito a occasião para pedir a v. ex.ª que solicite a satisfação de outro requerimento, que eu mandei para a mesa n'uma das ultimas sessões/pedindo alguns esclarecimentos, que tambem reputo indispensaveis. Referem-se a alguns artigos, que não vejo mencionados na alteração da pauta apresentada pelo sr. ministro da fazenda, e preciso estar munido d'estes esclarecimentos, a fim de que, quando este negocio vier á discussão, esteja habilitado a approvar ou rejeitar a proposta do governo.

O sr. Galrão: — Mando para a mesa o seguinte requerimento (leu).

Aproveito esta occasião para lamentar que por parte das repartições do estado não haja toda a promptidão na remessa dos esclarecimentos pedidos por esta camara. Eu sou um dos queixosos. Ha doze ou quinze dias que mandei para a mesa dois requerimentos pedindo esclarecimentos, o ainda até hoje não vieram.

Demais, este negocio tem a meu ver importancia, porquanto parece-me que ha em todo o paiz uma certa apprehensão, não sei por emquanto se bem fundada, de que o asylo dos filhos dos soldados é um nicho em que se dispendem muitos contos de réis, sem verdadeira utilidade para o paiz. Preciso habilitar-me com estes esclarecimentos para entrar n'esta discussão, e por consequencia, sem aventar mais considerações a este respeito, mando para a mesa o meu requerimento, e peço a v. ex.ª que queira solicitar com toda a urgencia a remessa dos esclarecimentos que solicito.

O sr. Conde de Thomar (Antonio): — Mando para a mesa o seguinte requerimento (leu).

Não o fundamento, mas peço a urgencia da remessa destes documentos, para me habilitar a entrar na discussão do orçamento do ministerio dos negocios estrangeiros.

O sr. Santos e Silva: —Na quarta feira passada não pude assistir ao principio da sessão, mas quando entrava n'esta casa, fui prevenido por alguns amigos meus e collegas, de que um sr. deputado, a proposito de uma rectificação, se alongara em espirituosas considerações a meu respeito.

Tratei de colher informações, que me habilitassem a po-

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der n'esse dia responder ao sr. deputado, mas nem as explicações que os meus collegas me deram, nem as proprias que obtive de s. ex.ª, me pozeram em circumstancias de satisfazer aos meus desejos. Resignei-me pois a esperar no Diario a publicação do discurso do sr. deputado, que acabo de passar pela vista, e ao qual vou responder convenientemente. Supponho que o que apparece hoje no Diario será exactamente o que s. ex.ª aqui disse.

Não censuro que o illustre deputado por Fafe se tivesse aproveitado da minha ausencia, ou não quizesse esperar a minha presença n'esta casa, para disparar contra mim os seus finos epigrammas que aclimou, por dois dias, na estufa da sua memoria, com receio talvez que lhe murchassem, se a palavra lhe puxasse por elles, na occasião que teve logar o incidente.

Cada um tem o seu feitio. Eu estou habituado a não aggredir ninguem pelas costas, a atacar pela frente o meu adversario, e a carregar com a responsabilidade das, respostas, que as circumstancias do momento suggerem. E isto o que mandam as boas praticas parlamentares, que o illustre deputado por Fafe entendeu não dever respeitar. Em todo o caso eu não o censuro pelo seu proceder.

Queixa-se s. ex.ª de que eu me aproveitara de uma interrupção, que elle aqui não pronunciou, para modificar, alterar ou acrescentar o meu discurso. Afianço a v. ex.ª e á camara que a interrupção do illustre deputado, de que eu me aproveitei e a que respondi, esta textualmente nas notas tachygraphicas, como os srs. tachygraphos m'as entregaram. Diz s. ex.ª que fôra outra a sua interrupção, e eu afianço e posso provar, com documentos á vista, que não.toquei n'uma unica palavra das notas tachygraphicas, que dissesse respeito a s. ex.ª Não póde s. ex.ª achar modificação alguma, nem a mais ligeira alteração, nas minhas notas em relação ás interrupções de s. ex.ª, que foram escriptas pelos srs. tachygraphos. Não me faço cargo de afiançar ou de negar se s. ex.ª as pronunciou ou não; s. ex.ª diz que não, as notas tachygraphicas dizem que sim. Pela minha parte respondi ao que me pareceu ter ouvido, e estar em harmonia com o incidente que se tratava. A minha memoria não se fixou n'este objecto, e nenhum auxilio me póde, n'este momento, fornecer.

Apesar de não gostar o illustre deputado que lhe chamem deputado novo, sempre o irei prevenindo que, se continuar a recrear-nos com os seus discursos, ha de com certeza acontecer-lhe o que me acontece a mim, e acontece a todos, e é o ver-se na dura necessidade de mudar muitas vezes palavras, substituir phrases, e alterar ou modificar pensamentos, porque os srs. tachygraphos nem sempre e produzem tudo quanto aqui se diz. Ás notas são em regra defeituosas ou incompletas, sem que se possa attribuir isto á falta de intelligencia ou zêlo da parte d'elles. As causas são outras. É porque quando se falla de certos logares com certa rapidez e no meio do susurro ou conversa animada da camara, é muito facil que os srs. tachygraphos não possam apanhar todas as nossas palavras, nem mesmo comprehender todos os nossos pensamentos. Os srs. tachygraphos, sem que eu me queixe, ou os queira censurar, não só substituem palavras, mas até inventam pensamentos. E necessario pois muito cuidado, quando revemos as notas tachygraphicas, para que não appareçam publicadas cousas que aqui não dissemos, ou cuja responsabilidade de maneira alguma queremos tomar.

Eu creio que esta questão de nós alterarmos ou não os nossos discursos é das cousas mais pequenas que se podem tratar n'esta casa.

E facto porém que não alterei nenhuma das interrupções do illustre deputado.

Quanto ás reticencias, phrases alteradas ou incompletas que encontrei no meu pequenissimo discurso, apenas empreguei todos os esforços para que a publicação no Diario saísse em harmonia com as declarações que eu aqui tinha feito, e que a minha memoria, na occasião de revêr as notas, me suggeriu. Esta é a verdade, embora o illustre deputado se estirasse em longas considerações, d'onde se póde deprehender o contrario d'isto.

Vou concluir sobre este ponto com dizer ao illustre deputado que alguns collegas nossos me têem affirmado que foram menos benevolas ou mais fortes as palavras que eu aqui soltei, do que aquellas que apparecem no Diario. A minha memoria nada me diz a tal respeito; mas se assim é, seria mais um documento para provar que o illustre deputado por Fafe gosta de ter de conserva os desaggravos da sua susceptibilidade, que não deixa de ser original. O sr. deputado parece não ter feito caso, na occasião propria, de expressões mais fortes, para vir seis dias depois, e tão tardiamente, rebater o que apparece no Diario com feição menos violenta.

O illustre deputado illudiu-se ou não me quiz fazer justiça, quando suppoz que eu tivera ou tenho menos consideração pelas suas palavras, pelos seus dotes e por todas as suas qualidades intellectuaes e moraes.

Se no pequeno incidente que aqui se deu (e os pequenos incidentes ás vezes são acompanhados de circumstancias que collocam os deputados na situação de dizerem uma ou outra palavra mais forte ou menos calculada) houve alguma phrase menos agradavel para o illustre deputado, creio que não merecia se lhe desse tão largas proporções, como o illustre deputado lhe quiz dar.

Nunca eu aqui contestara nenhuma das qualidades que o illustre deputado attribue á sua pessoa no seu discurso que acabo de ler.

S. ex.ª houve por bem fazer-se o Xenophonte dos seus proprios feitos, e a mim só me cumpre declarar-lhe que não tenho repugnancias em o tomar por um rico proprietario, por um distincto advogado conhecido nos auditorios de Fafe ou em outros quaesquer, por um jurisconsulto de peso e cunho, por uma intelligencia acepilhada nas lutas da palavra, por um publicista, por um escriptor e por tudo o mais que s. ex.ª queira ser.

A nossa questão é outra, e reduz-se a poucas palavras. Deu-se n'esta casa, ha dias, um pequeno incidente, a proposito da eleição de Cabeceiras de Basto.

O illustre deputado suppoz que, com quatro punhadas sobre a sua carteira, ou, trazendo para a questão a logica dos seus pulmões, conseguia o fim a que se propunha. Eu observei ao illustre deputado, que me não parecia talhado para arrastar ninguem, por aquelle modo, a mudar de opinião. Referia-me ás suas pretensões de occasião. Nas minhas palavras nada ha que possa suspeitar-se ataque ou á sua riqueza, ou á sua intelligencia, ou aos seus creditos forenses, ou a qualquer outro attributo com que s. ex.ª se queira ataviar.

Não sei se o sr. deputado pretendeu devassar as minhas intenções, visto que as palavras se não prestam á sua errada apreciação. Se teve tal pretensão, ainda n'este caso foi infeliz, porque jamais me passou pela idéa contestar cousas em que eu nunca pensara.

Fique pois s. ex.ª descansado que eu não terei duvida em o proclamar o primeiro jurisconsulto do paiz, se isto lhe for agradavel, sob qualquer intuito.

Refere-se tambem s. ex.ª no seu discurso a retractações que eu aqui vim fazer no dia immediato áquelle em que teve logar a questão. É mais uma inexactidão do sr. Ferreira de Mello.

Não houve retractações nem eu sou facil em faze-las. A camara sabe como os factos se passaram, e eu vou, em poucas palavras, resumi-los'.

Travou-se uma pequena luta de palavras sobre se deviam ou não ser votadas as substituições ao parecer da commissão, relativo á eleição do circulo de Cabeceiras de Basto, caso o parecer não fosse approvado; e eu pronunciei-me contra taes substituições, porque podiam dar em resultado transferencias de diplomas, doutrina a que, em regra, sou adverso. No dia immediato, e pelos motivos que então expuz, vim declarar á camara que não tendo conhecimento do modo como a mesa tinha regulado na vespera a ordem dos trabalhos, formulara uma proposta verbal sobre as substituições, da qual desistia por considerações para com a camara e para com o sr. presidente.

Não quiz formular ou sustentar uma moção, desde o momento que me constava ter a mesa já na vespera decidido que se votassem essas substituições. Mas declarei bem alto qual era a minha opinião sobre a questão, e protestei formalmente contra taes substituições (apoiados).

Ainda hoje é a mesma a minha opinião. O sr. deputado, naturalmente pela sua muita bondade para commigo, não quiz qualificar estas minhas opiniões. Pois quaesquer que sejam as suas qualificações, benevolas ou desfavoraveis, continuarei a pensar do mesmo modo a respeito da transferencia de diplomas dos deputados da nação, e parece-me que o illustre deputado já na sua carreira parlamentar tem tido occasião para avaliar qual das duas jurisprudencias este parlamento aceita. E não faltam n'esta casa arestos para corroborar a minha opinião. Não duvido que o illustre 'deputado possa, pelo seu lado, apresentar tambem alguns. Segue-se d'aqui que ha precedentes para tudo, e o melhor é manter-se cada um firme no campo dos bons principios. Os meus são os que já expuz.

Dignou-se tambem o sr. deputado lançar um certo odioso sobre uma phrase minha, quando lhe chamei deputado novo; appellou para os sentimentos da gente nova d'esta camara, e como que quiz dividir em duas esta casa, indo buscar ás certidões de baptismo os fundamentos da sua pretensão.

Sr. presidente, esta camara não aceita de certo scisões que alguem, em nome das certidões de baptismo, queira decretar (apoiados). Aqui não ha nem deputados novos nem deputados velhos, ha representantes da nação com os mesmos direitos e obrigações (apoiados). Não tenho desconsideração nem pelos velhos, nem pelos novos, porque todos somos uns, e todos estamos dispostos a trabalhar, cada um segundo as suas forças, a sua intelligencia ou a sua aptidão.

Portanto se o sr. deputado por Fafe quiz fazer lançar sobre mim o desfavor dos deputados novos, parece-me que não será feliz, porque não foi justo. Respeito os velhos, porque vejo n'elles a experiencia das cousas publicas. Estimo os novos, aprecio aquelles que entram pela primeira vez na vida publica, porque sei que não vem aqui aprender a pensar, trabalhar e fallar, porque antes de para cá virem já lá fóra haviam naturalmente aprendido a meditar, trabalhar e fallar.

E pois claro e incontestavel que as minhas palavras se não podem prestar á infeliz interpretação que s. ex.ª se dignou dar-lhes, e se ainda d'esta vez lhe aprouve penetrar as minhas intenções, declaro solemnemente á camara que o sr. deputado se enganou.

Deu-nos o sr. deputado no seu discurso a noticia de que estava aqui violentado ou viera para aqui contrafeito. Se s. ex.ª esta incommodado, tem o remedio na sua mão. Mas eu não quero dar similhante conselho a um collega, de quem esta camara e o paiz têem tanto a esperar. E isto não é ironia, porque ha sempre a esperar muito de homens conhecedores das letras e das sciencias.

Não sei se s. ex.ª é ou não escriptor publico; se é auctor de obras primorosas, e quaes ellas são. Se tem produzido, tanto melhor. Mas quando assim não fôra, nem por isso eu, e naturalmente esta camara e todo o paiz, deixariamos de ter s. ex.ª na mais subida consideração. O sr. deputado sabe que n'este paiz, onde se lê pouco, nem sempre é um grande titulo de recommendação o ser productor de obras litterarias ou scientificas, que em geral têem fraco consumo,

servindo algumas dellas para embrulhar arrateis de assucar nas lojas de mercearia. Creia pois s. ex.ª, que ha muita gente entre nós apreciada favoravelmente, e bem considerada pelo seu paiz, sem ter sido precedida pela fama de ter produzido primorosas obras nas letras ou nas sciencias.

Diz-nos tambem o seu discurso, que tenho diante dos olhos, ter sido s. ex.ª como que impellido para aqui pelos seus eleitores, que o conhecem de pequeno, e supponho que o seu fim é dar-nos uma prova da liberdade, consciencia e independencia do seu circulo e da sua.

Não foi só o illustre deputado que veiu para aqui eleito por cidadãos, que o conhecem de pequeno Ha mais gente aqui conhecida desde pequeno pelos seus eleitores. Creio que um grande numero dos srs. deputados são conhecidos dos cidadãos que os elegeram. Quanto a mim, posso afiançar ao sr. deputado que os meus eleitores me conhecem desde pequeno.

Talvez que o illustre deputado pense que fui eleito pela India, não tendo saído do continente?

Não, senhor, sou deputado por Abrantes, onde recebi parte da minha educação, onde tenho amigos de infancia, e d'onde já recebi tres diplomas, sem que fosse necessario a recommendação de qualquer governo, ou sem que fossem precisos quaesquer esforços ou violencias por. parte da auctoridade. Nunca a minha eleição foi devida a violencias ou excessos da auctoridade, devo-a aos meus amigos, e á confiança que depositam em mim os meus eleitores. E até posso acrescentar, que a primeira vez que aqui vim não foi muito a contento de alguem, collocado em alta posição, que empregou esforços, ou mostrou desejos, de que o meu nome fosse substituido por outro. Não era de certo com o intuito de que se me fechassem as portas do parlamento, o que não tinha rasão de ser para com um homem, que era todo da situação que então governava o paiz. Era para conciliar certas pretensões, que o meu circulo não quiz aceitar.

Estamos pois a este respeito, pelo menos, em igualdade de circumstancias.

Nunca tive parente auctoridade no meu circulo, do qual se podesse suspeitar algum auxilio a favor da minha eleição.

Nunca tive parente administrador do concelho no meu circulo. Nada ha, absolutamente nada, que possa fornecer uma suspeita ao illustre deputado. Ainda assim, póde qualquer candidato ter por administrador seu proprio pae e ser livremente eleito. Eu dou estas explicações porque, fallando o illustre deputado tanto da sua independencia e da liberdade da sua eleição n'uma questão pessoal em que se occupa de mim, podia alguem ver no seu discurso allusões á minha eleição. Eu pois que não tenho no meu circulo parentes administradores de concelho, creio não ser muito exigente se, pelo menos, me colloco nas circumstancias da independencia e liberdade eleitoral do illustre deputado.

Vou concluir declarando ao illustre deputado que não me imponho á camara, nem nunca tive intenção de me impor a ninguem.

As allusões que s. ex.ª me dirigiu cáem por terra, não só em presença dos factos e dos registos parlamentares, mas tambem em presença dos sentimentos de dignidade que esta camara claramente manifesta quando alguem tenta fazer-lhe aceitar as suas intimações. O sr. deputado sabe perfeitamente isto.

V. ex.ª sabe perfeitamente, e sabe tambem o illustre deputado, como a camara costuma responder ás intimações daquelles que pretendem substituir á seriedade dos argumentos, á conveniencia da phrase e á compostura das maneiras a logica dos pulmões, a rethorica assanhada e os gestos embravecidos.

O sr. Ferreira de Mello: — S. ex.ª tem melhores rasões do que eu para saber isto.

O Orador: — Não quero dar conselhos a ninguem, e mesmo sou incompetente para os dar; mas se me fosse dado aconselhar alguem, diria ao illustre deputado que esta quadra não corre favoravel para os Ferrabrazes da palavra.

O illustre deputado ha de conhecer por experiencia propria que se quizer travar lutas d'esse genero ha de ter momentos de amargura e de grande desgosto.

A quadra não vae bem para isso; porque n'esta casa não ha onda, por mais encapellada, que não se quebre contra este dique, que offerece a seriedade e a dignidade da camara, e que não se desfaça em espuma.

Se eu fosse susceptivel ou capaz de dar conselhos ao illustre deputado, dar-lhe-ia este.

Concluo aqui, e peço a palavra para depois do illustre deputado.

O sr. Villaça: — Pedi a palavra para mandar para a mesa o seguinte requerimento (leu).

Peço a v. ex.ª que dê toda a urgencia a este requerimento, porque, desejando eu interpellar o sr. ministro do reino, não o posso fazer sem estarem cá estes documentos.

A interpellação é sobre um objecto importante, que muitas pessoas têem classificado até de arbitrario, e eu desejo estar a coberto com os documentos que vierem do ministerio do reino, para responder a qualquer asserção que s. ex.ª queira fazer quando o interpellar.

O sr. Ferreira de Mello (para um requerimento): — Requeiro a v. ex.ª que consulte a camara sobre se me concede a palavra para dar breves explicações sobre o que disse o sr. Santos e Silva.

O sr. Presidente: — Eu lembro ao sr. deputado que as questões pessoaes são prohibidas pelo regimento, e que podem trazer consequencias desagradaveis.

Por isso parecia-me melhor que passassemos á ordem do dia; no entanto vou pôr á votação o requerimento do sr. deputado.

Consultada a camara, resolveu que se desse apalavra ao sr. Ferreira de Mello.

O sr. Ferreira de Mello: — Felicito-me de que a maior

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parte dos membros d'esta camara, ou quasi todos elles, fôssem de opinião diversa da de v. ex.ª, a respeito dos receios de que eu encarasse esta questão como pessoal e fosse menos prudente, ou faltasse de alguma fórma á dignidade e respeito devido a todos os membros d'esta casa, e que devo tambem a mim mesmo e á propria dignidade.

Esteja V. ex.ª certo que a questão para mim não é questão de violencia nem de desforço pessoal. Nunca a encarei como tal.

Disse o meu illustre collega que eu demorei alguns dias a minha resposta. Observe s. ex.ª que eu, encontrando no Diario uma cousa que não ouvi aqui, não podia responder logo, porque não podia dar resposta antes de ter conhecimento d'aquillo a que desejava responder.

Tendo este incidente tido logar na sessão de sabbado, e partindo eu n'esse mesmo dia para o Porto, não tive o menor conhecimento d'elle se não na terça feira, quando cheguei a esta casa. N'esse dia eu tratei de ver o extracto da sessão, porque não queria vir aqui apresentar uma insinuação contra s. ex.ª sem ter toda a certeza, e sem, pelo menos, ter procurado todos os meios para justificar que a minha insinuação era mais ou menos fundada.

V. ex.ª e a camara comprehendem perfeitamente que eu não podia vir apenas apresentar a auctoridade da minha opinião, a auctoridade da minha memoria. Eu tinha procurado as notas tachygraphicas ou os originaes que deram origem ao que se acha impresso no Diario, e só depois de ver e examinar cuidadosamente essas circumstancias é que podia vir aqui affirmar uma cousa de que eu me queixava, ou ficar silencioso e convencer-me á vista d'esses documentos que a minha memoria me era infiel, e que não tinha direito a queixar-me do illustre deputado e meu collega, que eu muito respeito, o sr. Santos e Silva.

Chegando eu a esta casa na terça feira de manhã, e tendo vindo na segunda á noite do Porto, procurei n'essa mesma terça feira ter conhecimento d'estes esclarecimentos, o que pude obter muito tarde, isto é, fóra da hora em que n'esta casa se falla em assumptos da natureza d'este, que e antes da ordem do dia.

Por consequencia, desde o momento em que eu tive conhecimento d'este incidente na terça feira e tratei d'elle na quarta pela manhã, parece-me que, a não ser por um calculo maravilhoso, para que eu não tenho competencia, mas sou o primeiro a reconhece-la em s. ex.ª, porque o illustre deputado é versado nas sciencias exactas, não se póde dizer que eu demorasse seis dias de infusão a minha resposta, quando a dei em menos de doze horas, depois de ter conhecimento do facto.

Ora, eu não aproveitei a ausencia do illustre deputado; não tive a minha palavra de estufa por longo espaço; não usei d'ella na propria occasião, porque a sessão levantou-se, como todos nós sabemos, em consequencia do tumulto que todos lamentámos, e não nos deixou a nós darmos explicações nem pedir rectificações.

Eu não pude fallar mais cedo do que fallei; e se fallei mesmo antes da ordem do dia, logo que cheguei, foi exactamente com o pensamento de evitar a censura do illustre deputado, que apesar d'isso me veiu fazer, de ter demorado o meu pedido de rectificações.

Não estou ao facto das praticas parlamentares, nem n'esse ponto tenho a menor pretensão de competir com os muitos conhecimentos do illustre deputado o sr. Santos e Silva; no entanto pela pequena pratica que tenho d'esta casa concluo que todos nós temos obrigação de assistir ao principio da sessão. Quando qualquer deputado se refere a outro que se não acha presente, este não tem de que se queixar senão de si mesmo. V. ex.ª sabe que a culpa é de nós todos; a resposta é muito simples; é em latim: sibi imputet.

Modifiquei as minhas queixas em attenção á ausencia de s. ex.ª; eu tinha tenção de ser um pouco mais longo, e talvez mesmo mais desagradavel ao meu collega, se elle estivesse presente; como não estava, limitei as minhas observações ao que vem publicado no Diario sem alteração alguma; e não esperei por s. ex.ª, porque não podia dar estas explicações senão antes da ordem do dia.

Mas a circumstancia de s. ex.ª não estar presente, não, era motivo para eu deixar de dar as minhas explicações. Apesar do pequeno conhecimento que tenho das praticas parlamentares, parece-me que só esta em uso esperar-se para - fallar, quando o deputado precisa dirigir-se a algum sr. ministro: e nas sessões passadas ha já precedentes, póde mesmo dizer-se que esta em pratica, posto que não de todo seguida, que não estando presente o ministro a quem o deputado se quizer dirigir, mas estando outro qualquer membro do gabinete, o deputado, em vez de esperar pelo, competente, expõe o que quer, encarregando-se o ministro presente de avisar o collega do que se passou.

Eu fallei aqui da proxima ascensão do meu collega ao ministerio, é verdade, no entretanto como era ainda deputado como eu, e estando presentes outros tantos nossos collegas, que o podiam informar do que eu dissesse, entendi que não tinha necessidade de estar esperando até que s. ex.ª quizesse apparecer.

E por esta occasião, permitta-me o meu collega que eu levante apenas uma expressão de s. ex.ª; d'estas expressões habituaes no meu collega, e que eu não levo a mal, porque é proprio das intelligencias elevadas carregar as expressões quando se dirigem a intelligencias acanhadas, como a minha, com receio muito natural, de que, não exprimindo a phrase bem clara, não possa ser comprehendida. Mas permitta-me que levante a expressão ferir pelas costas. Deixo ao meu collega decidir se esta phrase é parlamentar, e se é mesmo rigorosamente delicada, porque, na minha qualidade de deputado novo, não o sei fazer.

S. ex.ª contentou-se, para demonstrar que não tinha feito alteração alguma na interrupção que eu lhe fiz, com a circumstancia de que a tinha encontrado nas notas tachygraphicas.

E exactamente o que eu disse; não me queixei. Disse que a interrupção não vinha como eu a tinha feito, mas que não era culpa dos srs. tachygraphos, nem de s. ex.ª De que eu me queixei foi da alteração da resposta dada por s. ex.ª á pergunta que eu tinha feito; resposta que o meu collega' diz que, se estivesse exactamente fiel com o que tinha dito, me seria muito mais desagradavel. Pois eu declaro ao meu collega que o que não quero é aceitar a sua generosidade; eu quereria antes que o illustre deputado dissesse com toda a exactidão os termos de que se serviu, embora fortes, que ferissem profundamente, e repassados mesmo d'aquelle ridiculo que s. ex.ª podesse empregar contra um homem, que mal se póde defender aqui pela circumstancia de contar apenas vinte e tantos dias de parlamento. Preferia tudo isso á sua generosidade; quereria antes isso, do que ver que o meu collega modificava ou alterava no Diario aquillo que tinha dito aqui.

S. ex.ª diz que o fez por generosidade, e eu entendo que o fez para produzir o effeito contrario; mas não quero escolher. Quero ver antes a reproducção fiel da verdade do que aqui se passou, mas a haver mudança, parece-me, como a resposta me dizia respeito, que devia ser eu o unico juiz que julgasse peior a resposta que tinha obtido, ou a substituição que tinha apparecido no Diario. Por todas as rasões declaro a v. ex.ª que preferia a verdade do que se passou aqui, ainda que fosse muito mais forte, porque quero antes a ferida terrivel e profunda, mesmo o ridiculo atroz, do que a generosidade do illustre deputado, que francamente me offenderia muito mais do que um dito passageiro e violento em uma occasião de discussão agitada. Se essa generosidade existisse, era pelo menos uma declaração tacita, que eu sem a generosidade de s. ex.ª não podia ter vida parlamentar. N'estas circumstancias é que eu me não deixo collocar.

Creia s. ex.ª que eu continuarei a apresentar as minhas opiniões todas as vezes que o julgar necessario para cumprir os deveres que me impoz o mandato que recebi para entrar n'esta casa. E mesmo para me reservar o direito de repudiar as de s. ex.ª é que dei as pequenas explicações que tiveram logar na sessão da quarta feira. Declaro a v. ex.ª e á camara que estou completamente satisfeito com as explicações que me deu o meu illustre collega, o sr. Santos e Silva; mas a camara decidirá se essas explicações, se esse reconhecimento dos meus dotes intellectuaes, se esta consideração, se esta predilecção pela minha pessoa, podem de alguma fórma combinar com a declaração terminante e absoluta que s. ex.ª apresentou aqui por occasião d’aquella excitação, declarando-me «o illustre deputado não' me parece talhado para levar ninguem a modificar as suas opiniões». Contra esta sentença absoluta é que me quiz revoltar. Mostrei ao illustre deputado que, apesar de todas as suas sentenças, apesar de todas as suas opiniões, apesar de todos estes julgamentos de infallibilidade, e n'isto não offendo a s. ex.ª, não aceitava o seu julgamento, nem as suas probabilidades de infallibilidade. Contra isto é que eu quiz protestar, para mostrar que apesar do tudo isto eu havia de fallar aqui quando o julgasse necessario.

Deixe-me ainda a camara protestar contra uma asserção do illustre deputado, que se referia ás minhas punhadas sobre as banquetas aos susurros e gritos. Achava-me n'essa occasião, e parece-me que a memoria do illustre deputado não precisa ser extremamente milagrosa para se recordar que me achava diante d'elle, em sitio aonde não havia banquetas em que podesse bater, e onde só podia bater no ar, o que não podia produzir sem que incommodasse os sensiveis ouvidos de s. ex.ª

Disse o meu illustre collega que =eu tinha devassado as suas intenções, e que não era sua a asserção absoluta que lhe attribuia =. Não quiz devassar as intenções do illustre deputado; não fiz mais do que referir me á asserção do illustre deputado nas palavras de que = não estou talhado para levar ninguem a modificar as suas opiniões =. Nem ha necessidade de devassar as intenções de uma pessoa quando se explica tão franca e claramente. A asserção do illustre deputado é muito clara; ella importa uma declaração de incapacidade de que ninguem póde duvidar. Agora com as explicações que s. ex.ª deu, e que me satisfizeram completamente, declaro que, se as tivesse dado na propria occasião, eu não tinha trazido a questão a esta casa.

Agora ha aqui apenas uma asserção que v. ex.ª permittirá que eu a levante com toda a serenidade de animo. O digno collega, o sr. Santos e Silva, fez aqui uma insinuação relativamente á questão de que tem sido eleito livremente pelo seu circulo, porque nunca tinha sido recommendado por governo algum. Não affirmo nem nego, porque ignoro. O que eu sabia é que s. ex.ª nunca tinha sido guerreado por governo nenhum. Creio que é mesmo da historia parlamentar que s. ex.ª tem merecido a todos os governos a consideração precisa para nunca ser guerreado por nenhum; as. auctoridades administrativas da localidade conformam-se sempre com a vontade dos eleitores quando tratam de eleger o illustre deputado, o que realmente é uma cousa muito honrosa, muito gloriosa para s. ex.ª, e que eu lhe não quero disputar. É certo que s. ex.ª mereceu sempre a maior aceitação aos governos, ás auctoridades locaes, e aos eleitores do circulo que tem a honra de representar!

Eu não tive n'este ponto tanta felicidade, mas se saí eleito não foi porque meu pae era o administrador d'aquelle circulo. O illustre deputado, occupado só com a historia parlamentar d'esta casa, parece desconhecer a historia politica do paiz; talvez uma cousa lhe não deixe tempo para conhecer da outra. Entretanto, s. ex.ª que proclamou a inutilidade de ser escriptor n'um paiz como este, o que, tomado a serio e admittido, reduziria tudo a um estado de torpor e de indolencia, que sem duvida havia de ser de grande vantagem para a sciencia e illustração d'esta terra. S. ex.ª, que disse isto, desde o momento em que fez uma tal declaração não admira que ignore a historia politica d'este paiz.

Pois fique o illustre deputado sabendo que ha mais de trinta annos que meu pae tem conquistado pelos seus actos e procedimento a sympathia e amisade de todos os seus vizinhos, e ha mais de trinta annos que elle faz na sua localidade de accordo com os seus amigos as eleições, sem nunca perder uma só. O illustre deputado póde muito bem ser que nunca lhe aconteça, mas ha de ter visto que outros por muito segura que tenham a eleição, lá soffrem de quando em quando uma derrota; porém meu pae ha mais de trinta annos ainda ali não soffreu nenhuma, os seus amigos sempre combinaram com elle, sempre aceitaram qualquer indicação que elle quizesse fazer, ou elle a aceitava dos seus amigos, porque tem esse costume, não quer votos á força, sempre combinaram elle e os seus amigos em quem haviam de eleger; e estando oito annos successivos na opposição, venceram a eleição no oitavo anno como no primeiro e nos demais, com a auctoridade Contra, e com toda a guerra possivel, que lhe faziam os governos, que não tinham por meu pae e pelos seus amigos d'aquelle circulo a mesma consideração que têem tido, e de certo continuarão a ter pelo illustre deputado.

Portanto meu pae sempre ali venceu as eleições, sempre, sem uma unica excepção.

Não houve por consequencia nenhuma asserção que eu precise levantar, porque esta claro que, se um proprietario de uma localidade faz ali com os seus amigos ás eleições ha mais de trinta annos sem haver experimentado ainda o que é ter uma eleição duvidosa, esse individuo não precisa ser auctoridade administrativa para continuar a faze-las, principalmente quando as fez por oito annos successivos sendo opposição.

Agora declaro a v. ex.ª que não entro em mais largas considerações. As explicações que deu o sr. Santos e Silva, relativamente á sua posição n'esta casa, satisfizeram-me completamente, e áparte apenas estas pequenas differenças, eu estou satisfeito, e a questão para mim não é pessoal.

Peço desculpa á camara e aos meus collegas, se por acaso proferi alguma palavra que não merecesse a sua aceitação e fosse menos propria da dignidade d'esta casa. Eu farei quanto podér, sempre que fallar perante esta assembléa, para me conter dentro dos limites da dignidade do parlamento e da minha propria dignidade (apoiados).

Tenho concluido.

Vozes: — Muito bem.

O sr. Costa e Almeida (para um requerimento): — Ha pouco tinha eu pedido a palavra para responder a algumas considerações politicas feitas pelo meu illustre collega e amigo o sr. Magalhães e Aguiar, mas tendo V. ex.ª declarado que se ía passar á ordem do dia, impossivel me era hoje responder a essas considerações; porém como o illustre deputado o sr. Ferreira de Mello requereu se consultasse a camara sobre se ella permittia que elle usasse da palavra para responder ás observações feitas na sessão de hoje pelo sr. Santos e Silva, e a camara lh'o permittiu, por isso requeiro que v. ex.ª consulte a camara sobre se ella consente que eu responda desde já ás considerações politicas que foram hoje apresentadas pelo sr. Magalhães e Aguiar.

Vozes: — Falle, falle.

O sr. Presidente: — Eu consulto a camara.

Consultada a camara, decidiu que se desse a palavra ao sr. Costa e Almeida.

O sr. Costa e Almeida: — Eu serei muito breve, porque não quero tirar tempo á camara com questões de pouca significação; tenho apenas que levantar algumas phrases e asserções proferidas n'esta casa pelo meu illustre collega e amigo o sr. Magalhães e Aguiar; o illustre deputado começou mesmo por declarar que, não havendo objectos importantes de que tratar, aproveitava a occasião para protestar contra uma asserção feita na outra casa do parlamento pelo meu prezado amigo e digno par do reino, o sr. conde de Samodães. Esta asserção era de que =as eleições de deputados que tinham tido logar ultimamente no districto do Porto tinham sido feitas com completa abstenção da auctoridade. O meu amigo, o sr. Magalhães e Aguiar, contestou a exactidão d'esta asserção, e, referindo-se ás eleições do districto do Porto, tomou para typo e para exemplo da sua contestação a eleição no 2.° circulo eleitoral de Villa Nova de Graya, e a eleição do circulo de Marco de Canavezes, que elle tão dignamente representa n'esta casa. Pois são exactamente estas mesmas duas eleições que eu tomo para typo e para modelo, a fim de mostrar ao illustre deputado que a sua contestação e asserção não é inteiramente exacta, salvo o respeito que tributo ao meu illustre collega e amigo.

O sr. conde de Samodães, digno governador civil, que foi, do districto do Porto, disse na outra casa do parlamento, e disse muito bem, que = as eleições no districto do Porto tinham sido feitas por um grupo politico que representava a situação actual, sem que interviesse directamente a auctoridade administrativa =. Disse a verdade. Por os dois exemplos que o illustre deputado citou, provou exactamente a verdade d'esta these, e a inexactidão da asserção do illustre deputado.

Eu conheço sufficientemente o districto do Porto, porque resido ha muitos annos na sua capital. Tenho relações com muitos dos cavalheiros dos diversos circulos eleitoraes do districto do Porto, faço, mesmo frequentes digressões a alguns dos concelhos d'aquelle districto, onde tenho relações, e até familia e bens; estou portanto no caso de dar testemunho insuspeito da exactidão da asserção pronunciada pelo sr. conde de Samodães.

A eleição do 2.° circulo eleitoral de Villa Nova de Gaia

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fez-se, dirigida por um centro politico de que tive a honra de fazer parte, e do qual era o mais humilde membro; fez-se em dez dias, sem nenhuma intervenção da auctoridade administrativa; esta apenas se limitou a dispor dos meios precisos de modo que o socego publico fosse mantido, e esses meios limitaram-se a mandar uma insignificante força para um dos pontos do concelho, ponto d'onde nunca essa força saíu, e onde esteve sempre aquartelada. 1 Todos os actos eleitoraes n'aquelle circulo foram dirigidos por pessoas do Porto, por pessoas daquelle mesmo concelho e circulo, e sem nenhuma ingerencia da auctoridade administrativa. Outro tanto direi relativamente ao circulo que o illustre deputado representa.

O illustre deputado queixa-se de que fôra mudada a auctoridade administrativa.

O sr. Magalhães e Aguiar: — No me queixo.

O Orador: — Não se queixa, mas accusa o governador civil.

O sr. Magalhães e Aguiar: — Nem accuso.

O Orador: — Nem accusa, mas disse que o facto da nomeação da auctoridade administrativa prova a interferencia directa do governador civil.

O sr. Magalhães e Aguiar: — Não prova, deduz-se alguma cousa; deduz-se o que queria fazer.

O Orador: — Eu vou descendo á medida que o illustre deputado desce! Deduz-se que houve uma tal ou qual interferencia da parte do governador civil na eleição.

O sr. Magalhães e Aguiar: — Logo não foi nulla.

O Orador: — Ora, eu provoco o illustre deputado a que me diga se a escolha da auctoridade administrativa que foi presidir aos negocios administrativos do seu concelho partiu da iniciativa do governador civil ou do quantos são amigos seus?

O sr. Magalhães e Aguiar: — Não me importa isso.

O Orador: — Portanto já vê o illustre deputado que a auctoridade administrativa era a mais digna que se podia escolher para a substituição do digno administrador, que não inspirava confiança politica, satisfazendo-se assim a todas as exigencias da legalidade e da tranquillidade publica, pois que é certo, nem o illustre deputado o póde contestar, que n'aquelle concelho se debatiam dois partidos, um pelas idéas que o illustre deputado hoje apresenta o outro pelas do seu adversario (apoiados).

Queixou-se tambem o illustre deputado de que o commissario geral de policia do Porto fosse áquelle circulo tratar da eleição do seu primo. Não sei que por isso aquelle funccionario possa ser censurado. Pediu licença por algum tempo para tratar de negocios seus; concedeu-se-lho essa licença e elle foi tratar dos seus negocios, todos pessoaes, e tratou da eleição de seu primo. Está visto que não exercia nenhuma auctoridade como commissario de policia, cujas attribuições expiravam dentro das barreiras do Porto.

O illustre deputado disso que = tinha sido fusionista leal e convicto e n'essas circumstancias acompanhou-a situação passada até ao seu ultimo suspiro, e que por esse motivo um centro eleitoral existente no Porto entendêra que elle não devia fazer parto dos dezesete deputados que o districto do Porto devia eleger. E verdade isso. Posto que eu não estivesse inteiramente de accordo com a exclusão do illustre deputado, o que me parece que não ignora, todavia entendi que a nova situação devia conduzir ao parlamento pelos seus meios e pela sua influencia, os homens que fossem representantes d'ella (apoiados), e portanto que se devia fazer guerra, mas uma guerra franca e leal, ao illustre deputado. Mas se eu podesse relatar aqui, e a camara estivesse disposta a ouvir a historia d'esta eleição, havia de mostrar que se n'ella houve pressão e oppressão, partiu dos amigos do illustre deputado (apoiados).

Vozes: — E verdade.

Basta enunciar um facto. O illustre deputado não póde negar que uns tantos eleitores estiveram em carcere privado em uma casa particular para não poderem votar...

O sr. Magalhães e Aguiar: — Nego, porque é falso.

O Orador: — Tanto é verdade que foi por essa estrategia que nós ficámos vencidos, derrota com que não contávamos...

(Interrupção do sr. Magalhães e Aguiar que se não percebeu.)

E admiremos a audacia, o arrojo com que se metteram em carcere privado n'umas lojas do Marco de Canavezes uns eleitores para não votarem. Visto que não podiam votar a favor do illustre deputado, ou que estavam compromettidos a votar no seu adversario, ao menos ficassem excluidos de votar no candidato opposto! ou fossem guardados e escoltados até á uma para não serem seduzidos!...

O sr. Magalhães e Aguiar: — Mas isso não é exacto.

O Orador: — É perfeitamente exacto. Queixou-se tambem o illustre deputado de que o administrador, que era, de Marco -de Canavezes, fôra demittido pelo secretario geral de um modo pouco digno.

Eu posso afiançar que o cavalheiro que servia de secretario geral naquelle districto, n'essa occasião, representando o governador civil, é tal modo respeitavel que basta lembrai-o seu nome para se mostrar que era incapaz de demittir um seu subordinado de um modo pouco digno (apoiados).

Eu podia citar muitos factos para mostrar que nenhuma interferencia houve nem podia haver da parte da auctoridade nas eleições, a que ultimamente se procedeu n'aquelle districto; citarei apenas uma.

No concelho de Villa Cova, e seu circulo, os cavalheiros que approvavam as idéas da situação actual vieram muitas vezes ter comnosco e com a auctoridade, queixando-se de que ella deixava estar á frente do seu concelho um administrador, que seguia uma politica contraria á d'elles e mostrando os desejos de ao menos terem liberdade para poderem trabalhar no sentido da situação actual; e o digno secretario geral lhes disse que = não removia o administrador emquanto não podessem mostrar-lhe, pela eleição da camara a que se ía proceder, que elle tinha força real, apesar da influencia administrativa, para fazer a eleição =. E um facto que o illustre deputado não póde contestar.

Estes homens foram para o circulo, trabalharam contra a auctoridade e não venceram a eleição da camara: perderam-n'a por 20 votos, o que é o mesmo que dizer que a venceram moralmente.

N'esse caso a auctoridade administrativa não teve remedio senão remover o administrador do concelho, e substitui-lo por um outro cavalheiro digno, e das idéas politicas da situação.

Isto não é desairoso para o cavalheiro que representava aquelle circulo, cavalheiro que muito prezo, e que conheço desde os bancos da universidade.

Estes factos são naturaes. Quando se ergue uma situação, derribando outra, é natural que os derribados soffram as consequencias da sua derrota politica.

Não preciso dizer mais nada.

Quiz reivindicar a veracidade da asserção do digno par o sr. conde de Samodães.

Não houve intervenção das auctoridades no districto do Porto na eleição passada.

Não era necessaria, e era muito impolitico have-la.

Digo mais. Se em toda a parte se tivesse procedido com o mesma rigoroso escrupulo, o resultado seria o mesmo, senão melhor ainda.

O sr. Presidente: — Passa-se á ordem do dia. Os srs. deputados que tiverem que mandar para a mesa alguns requerimentos, representações, propostas ou projectos dejei, podem faze-lo.

O sr. Gonçalves de Freitas: — Mando para a mesa um projecto de lei e uma nota de interpellação.

O sr. Pedro Franco: — Mando para a mesa dois requerimentos, pedindo esclarecimentos ao governo pelo ministerio da fazenda.

O sr. Agres de Campos: — Mando para a mesa tres requerimentos, pedindo esclarecimentos ao governo, e uma declaração de que, por incommodo de saude, deixei de comparecer a algumas sessões.

O sr. Bernardo F. 'da Costa: — Mando para a mesa uma nota de interpellação. Peço que seja communicada com urgencia ao sr. ministro da marinha, porque são de importancia os objectos sobre que ella versa.

O sr. Carlos Mardel: — Mando para a mesa um requerimento, pedindo esclarecimentos ao governo.

O sr. Carlos Testa: — Mando para a mesa uma nota de interpellação.

ORDEM DO DIA

CONTINUA A DISCUSSÃO DO PROJECTO N.° 3

O sr. Camara Leme (para um requerimento): — -Não me achava presente á sessão de quarta feira, quando se discutiu o projecto n.° 3. Sei que se levantou alguma questão sobre a interpretação que se dava ao artigo 2.°, e como este projecto foi feito de accordo com o sr. ministro da guerra, e s. ex.ª não esta presente, parece-me conveniente que se ouvisse a opinião do governo sobre este importante assumpto. Portanto o meu requerimento é para que se adie esta discussão até que esteja presente o sr. ministro da guerra; e n'essa occasião tomarei parte na discussão do projecto, e explicarei qual foi a rasão por que se trouxe ao parlamento a disposição d'este artigo.

Leu-se na mesa a seguinte

Proposta

Proponho que seja adiado o parecer n.° 4 até estar presente o sr. ministro da guerra. = Camara Leme.

Considerada como proposta de adiamento, foi apoiada e logo approvada.

O sr. Mathias de Carvalho (para um requerimento): — Mando para a mesa o seguinte requerimento:

«Requeiro que com toda a urgencia seja remettida a esta camara a correspondencia havida entre o actual governo e o nosso ministro em Londres e o encarregado da agencia financial ácerca do negocio do caminho de ferro de sueste.»

Não tive o prazer de ouvir a resposta dada pelo sr. ministro das obras publicas na ultima sessão a uma pergunta que lhe foi feita por um illustre deputado; mas vendo no Diario essa resposta, desejo saber se existem os documentos a que me refiro no meu requerimento, e por isso o mando para a mesa, a fim de que v. ex.ª se digne dar-lhe o destino competente. E declaro que annuncio uma interpellação aos srs. ministros, logo que venham estes esclarecimentos.

E um negocio urgente e que demanda explicitas declarações por parte do governo. Admiro-me mesmo que o governo, tendo a imprensa da capital, publicado documentos tão importantes, se não apressasse a apparecer n'esta casa para dar as devidas explicações.

O sr. Santos e Silva: — Pedi a palavra para fazer uma ligeira rectificação ao que acabou de dizer o illustre deputado o sr. Ferreira de Mello. Desejo ser muito curto.

Eu não sou atreito a questões pessoaes, e mesmo o modo por que o illustre deputado se houve, não me fornece materia para alimentar uma questão pessoal; porquanto s. ex.ª foi urbano, cortez, commedido, e não pronunciou d'esta vez palavras que eu tenha grande necessidade de rebater.

Folgo que s. ex.ª ficasse satisfeito com as minhas explicações. Tambem eu fico satisfeito com a sua satisfação. Estamos ambos satisfeitos.

Só tenho a declarar-lhe e á camara, que não quiz referir-me, de uma maneira menos benevola ou menos justa, a respeito de qualquer membro de sua familia. Se s. ex.ª entendeu que devia trazer para esta casa o nome respeitavel de seu pae, estava no direito de o fazer. Eu é que não lhe quiz fazer a menor censura nem tratar por modo menos agradavel a s. ex.ª, ou qualquer pessoa da sua familia.

Não aceito tambem a interpretação que s. ex.ª quiz dar ás minhas palavras, quando se persuadiu de que eu tinha, por alguma fórma, o proposito de lançar desfavor sobre os homens que escrevem ou produzem quaesquer obras. Se não fui bem entendido por s. ex.ª, talvez fosse minha a culpa. Talvez fosse isso filho da maneira pouco clara por que eu me exprimi. O meu pensamento não foi pois censurar ou injuriar os escriptores do meu paiz que, em geral, estimo e respeito. Foram estas as minhas intenções. E se os srs. tachygraphos não reproduzirem nas suas notas as minhas palavras, e o meu pensamento tal qual aqui o estou apresentando, desde já declaro que hei de fazer as convenientes alterações para rectificar o que eu não disse, ou não quiz dizer.

Nada mais tenho a dizer.

O sr. Barros e Sá: — Eu tinha pedido a v. ex.ª que me inscrevesse antes da ordem do dia, e a minha intenção era aguardar a presença do sr. ministro dos negocios estrangeiros, para o interrogar ácerca de uns documentos que foram "publicados no Jornal do commercio de hontem. S. ex.ª não esta presente, e os boatos que correm, de crise ministerial, impedem-me de dar a este negocio o seguimento que as praxes parlamentares aconselham aos deputados que não partilham a politica do governo. Entretanto o extracto da sessão ha de publicar o que eu vou dizer, e s. ex.ª me responderá quando julgar mais conveniente.

A minha pergunta versa sobre se os documentos publicados no Jornal do commercio de hontem têem ou não têem authenticidade.

N'estas circumstancias vou mandar para a mesa um additamento ao requerimento do sr. Mathias de Carvalho. Consta que depois da rescisão do contrato de 14 de outubro, o governo inglez, officiosa ou officialmente, interviera junto do nosso governo para se não dar seguimento a esta rescisão, e que o ministro, que então estava gerindo a pasta respectiva, dera a esta intervenção a conveniente resposta. Desejava pois que esta correspondencia viesse toda á camara, porque ella póde esclarecer-nos para entrarmos na apreciação dos actos ministeriaes n'esta materia.

O meu requerimento é pois o seguinte (leu).

Escuso de o classificar como urgente, porque o é de sua natureza.

Nada mais.

O sr. Presidente: — Em consequencia do adiamento votado pela camara, não ha mais nada que discutir; convido portanto os srs. deputados a irem trabalhar em commissões.

A ordem do dia para ámanhã é a continuação da que está dada.

Está levantada a sessão.

Eram ditas horas e meia da tarde.

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