744 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS
tiça, em 7 de janeiro de 1S38. = Francisco Antonio da Veiga Beirão.
O sr. Antonio de Azevedo Castello Branco:- Sr. presidente, tendo deixado de vir á camara no sabbado, por doença, surprehendi me com a noticiado que íamos discutir o projecto n.° 12, que casualmente tinha levado para casa; não tive por consequencia tempo para fazer um estudo minucioso, principalmente sob o ponto do vista estatistico, para me convencer que devia approvar o projecto, ou para me, determinar a atacal-o e demonstrar, quanto em minhas forças coubesse, que não devia ser approvado pelo parlamento.
Entretanto, soccorrendo-me dos elementos que tenho á mão, uns existentes nos documentos officiaes do estabelecimento em cuja administração tomo parte, e outros constantes de documentos officiaes tambem, como e o Annuario estatistico, d'elles me servirei na ordem de considerações que vou fazer sem intuitos politicos, mas puramente doutrinarios. (Apoiados.)
Tenho a honra de fazer parte da administração do primeiro estabelecimento penitenciario do paia, e tendo me dedicado ao estudo dos systemas penaes e da criminalidade Consoante as minha faculdades m'o têem permittido, não posso discordar da necessidade do estabelecimento de novas penitenciarias, porque, ato hoje, ainda não se encontrou processo roais adequado para oppôr ao progressivo augmento da criminalidade, nem mais idoneo tambem para só conseguir a morigeração dos delinquentes, tanto quanto é possivel chegar a este desideratum, que eu considero, ato certo ponto, um ideal, raras vezes attingivel, mas não absolutamente irrealisavel. (Apoiados.)
O sr. ministro da justiça tinha aprosentado na sua proposta a idéa de se crear maior numero do penitenciarias do que aquellas que a lei de l de julho de 1867 tinha entendido que eram sufficientes, ou que estavam n'uma justa proporção com o numero provavel dos crimes que cumpria punir. Para o seu calculo serviu-se s. exa. do dados estatisticos, que se encontram no relatorio que precedia a proposta do lei do sr. conselheiro Lopo Vaz, convertida na lei de 16 de junho de 1884. Todavia esta base estatistica não é segura para n'ella se fundar o calculo do numero de penitenciarias sem receio de desproporção entre a criminalidade e a creação de taes estabelecimentos. (Apoiados)
Posteriores áquella epocha, não temos realmente elementos suficientemente seguros para determinar, no estado actual, qual deva ser o numero de penitenciarias centraes necessario e em proporção exacta, quanto possivel, com a criminalidade do paiz. (Apoiados.)
Se porventura fossemos a attender aos dados estatisticos fornecidos pelo numero de presos entrados na penitenciaria do Lisboa, não era preciso um tão grande numero, como o governo pedia na proposta, pois supponho que satisfaria completamente o numero das que estão designadas na lei de l de julho de 1867; porque tendo entrado para a penitenciaria, depois que ella está installada, 455 presos, e sendo a media das penas cinco annos, seis mezes e cinco dias, aproveitando 550 cellas da penitenciaria actual, apenas seria preciso crear mais uma penitenciaria com 456 cellulas, ao todo 1:006, para os presos do sexo masculino.
Estes dados estatisticos, porém, representarão a verdade? Devo presumir que nas cadeias das comarcas não estacionam léus que já devessem estar cumprindo a pena na penitenciaria central de Lisboa, e comquanto não tenhamos estatisticas criminaes de recente data para, em face d'ellas, só analysar qual foi a modificação que a reforma penal do 1884 operou na condemnação dos réus em penas maiores, presumo que a applicação d'estas deve ter decrescido, pois que muitos delictos passaram para a alçada correccional, e é de crer que a differença sensivel que se observa entre o numero dos condemnados a penas maiores recebidos na penitenciaria, e entre os que tiveram condemnação identica desde 1878 a 1880, constantes das estatisticas criminaes, provenha da alteração que no nosso regimen penal foi introduzida pela reforma de 188-1.
Vejamos, porém, outros elementos estatisticos.
No ultimo volume do Annuario, a pag. 79, vê-se que desde 1878 a 1880, isto é, no período de quatro annos, foram condemnados em penas maiores 1:199 individuos do sexo masculino e 100 do feminino, cujas sentenças deviam ser cumpridas nas cadeias centraes. A media é de 324 por anno, cifra redonda. Suppondo que a media das condemnações era por quatro annos, seriam precisas 1:206 cellas, numero superior ao que está auctorisado pela lei de l de julho de 1867; mas, se a media das condemnações fosso de cinco annos e meio, como é a media das condemnações dos réus entrados na penitenciaria de Lisboa, as cellas necessarias seriam 1:786, o que e muito superior ao numero fixado na referida lei. N'este caso o projecto, auctorisando a construcção de 1:700 cellas unicamente, não corresponde ás necessidades do regimen penitenciario.
O mesmo juizo não posso formar com respeito á proposta do sr. ministro da justiça, porque, fixando em cinco o numero das penitenciarias centraes, não designa o numero de cellas; admittindo, porém, que fossem quatro cadeias para o sexo masculino e uma para o feminino, aquellas com 500 cellas e esta com 200, somariam 2:200, numero que excede o que pelos elementos estatisticos do Annuario pareço ser preciso.
O que eu infiro d'isto é que tanto a proposta como o projecto se não firmam em bases seguras para a determinação do numero de penitenciai ias e do cellas em harmonia com o nosso regimen penal.
Os calculos são um pouco arbitrarios, (Apoiados ) e o que vejo só é que o sr. ministro da justiça tem um louvavel empenho de dar ao systema penitenciário todo o desenvolvimento possivel, e não serei eu que lhe regateie louvores pelo seu proposito. (Apoiados.}
Os elementos estatisticos fallecem, pois só os temos até 1880, e para que este projecto assentasse em terreno menos movediço, convinha que se apurasse se a criminalidade nos ultimos sete annos tem decrescido, ou se tem augmentado, como é provavel, e bem assim que influencia teve nas condemnações em penas maiores e nas correccionaes a lei de 1884.
A ausencia d'estes esclarecimentos sujeita o projecto a duvidas que a commissão mal poderá dissipar aos que o examinem cuidadosamente. (Apoiados.)
Sou partidario do augmento de penitenciarias, ou de estabelecimentos penaes, em harmonia com as exigencias da repressão do crime; mas, como logo indicarei, desejo que taes estabelecimentos não sejam construidos por um modelo uniforme, mas que se adaptem á varia indole do regimen penal a que os delinquentes hajam de ser submettidos em conformidade com a genese do delicto e com a sua natureza especial.
Entre outros pontos do projecto de que divirjo, ha um com que absolutamente discordo; é com a disposição que, dando como extinctas as cadeias districtaes, prescreve que as penas correccionaes sejam cumpridas nas cadeias comarcas, seja qual for o tempo do duração das mesmas penas. E uma modificação da lei de l de julho do 1867, que reputo inconveniente para os interesses sociaes. (Apoiados.)
A pena de prisão correccional só pôde ter os effeitos que o adjectivo correccional indica, quando seja cumprida com a severidade disciplinar de um austero regimen penitenciario. (Apoiados.)
N'isto são accordes todos os penitencialistas. Matar em principio o germen do crime, preparar por urna repressão viva, anno dos delinquentes noviços para fazer d'elles homens bons e encaminhal-os na senda da virtude e da probidade social, é resultado que não se póde conseguir senão