SESSÃO DE 12 DE MARÇO DE 1888 745
applicando um systema que, sendo repressivo, seja simultaneamente educativo.
O systema penitenciario é para este effeito o mais idoneo, porque á repressão alha o ensinamento religioso e moral e a benefica influencia do trato com pessoas que se dediquem á missão altissima de levantar do lodo do crime aquelles que, á mingoa de amparo e boas conselhos, podem afundir-se e perder se para sempre no paul masmatico da corrupção e do vicio (Muitos apoiados.)
Quando alludo á severidade ou austeridade no cumprimento das penas correccionaes, não pretendo que se applique o excessivo rigor com que nasceu o systema pheladelphiano, mas sim um regimen suavisado, como é o que se pratica na Belgica, onde os presos não estão n'um isolamento absoluto, sepultados em vida, como os emparedados da idade media, mas sim separados uns dos outros, para se evitar a mutua corrupção, vigiados e assistidos pelo pessoal das cadeiras e submettidos a uma disciplina que lhes insinue no animo elementos de moralisação o ao mesmo tempo lhes incuta o temor de novo castigo mais severo ainda, caso reincidam. (Apoiados)
Mas como quer a camara que a pena correccional realise este altissimo ideal, ou se enderece a esta suprema aspiração - estrella polar que orienta todos os modernos penalogistas?
Devendo cumprir se as penas correccionaes nas cadeias comarcas, como imagina a camara que se encontrem cento e sessenta e quatro funccionarios, que não poderão receber um elevado estipendio, com a illustração, o zêlo, a paciencia e o delicado criterio que se tomam indispensaveis para quem haja de dirigir o serviço das cadeias, convertendo-as em escolas de moralidade? (Apoiados)
Hão de ser os antigos carcereiros os que, pela mudança de regimen, se hão de metamorphosear em indefessos obreiros da regeneração moral dos delinquentes?
Não basta crear boas cadeias celulares. Se o pessoal carece das qualidades indispensaveis á sua direcção, a cella tornar-se-ha um logar doloroso para quem a habite, ou converter-se ha talvez n'um antro em que se desenvolvam os maus instinctos do delinquente, mas não será nunca uma escola de moralidade (Apoiados.}
Com um pessoal, que não provenha de uma selecção acurada, que succederá?
O que aconteceu na cadeia comarcã de Aldeia Gallega, onde um grande criminoso que estava em prisão preventiva, saíu da sua cella para maltratar uma capanga, que tinha sido victima já dos seus flagicios e a quem tentou assassinar, esfaqueando a, arremessando se em seguida de uma janella da cadeia para a rua no intuito de fugir ou de se suicidar
Mas não se carece unicamente de bons directores para as cadeias correccionaes, é mister que haja o pessoal que cumpra o artigo 25.° da lei de l de julho de 1867, que eduque e instrua os presos, ensinando lhes os deveres moraes e religiosos. E poderá realizar-se esta grande obra civilisadora, esperando que apareçam missionarios do bem, desinteressados, que lhe ponham hombros e que se consagrem a esta difficil tarefa só por caridade ou philanthropia? (Apoiados.)
Sem descrer completamente dos sentimentos altruistas da nossa especie, parece me que será uma illusão acreditar que, sem estipendio, appareçam homens dedicados que se encarreguem da educação moral dos delinquentes, (Apoiados.) e sendo isto verdade, calcula a camara quanto custará todo o pessoal das cadeias comarcas?
Não preferira, a nação pagar antes o tributo de guerra que diariamente lhe impõe o crime?
Antes de proseguir na minha ordem de considerações suggeridas pelo projecto, permitta-mo a camara que alluda a um ponto da nossa legislação criminal que me offerece alguns reparos.
O codigo penal, no artigo 64.° § unico, diz que a pena correccional não obriga a «trabalho, e a lei de l de julho de 1867 considerava o trabalho facultativo, todas as vezes que o probo tive-se meios para se sustentar e podesse pagar um tanto pela cella que habitasse.
Digo, de passagem, que esta disposição da lei de l de julho de 1807, a meu ver, contradizia o pensamento geral da lei, porque esta impõe o trabalho e mo formula de cumprir a pena e não como aggravamento d'ella, como dispunha o codigo de 1852, em que havia prisão simples e prisão com trabalho, degredo simples e degredo aggravado com trabalho.
Pela legislação anterior o trabalho era um aggravamento de pena; pela lei do l de julho de 1867 é, quanto ás penas maiores, não só o modo se cumprir a sentença, mas alem d'isso um elemento de corrigibilidade.
O nosso codigo penal, não estabelecendo como obrigatorio o trabalho para os delinquentes condem nados em penas correccionaes, desprezou um elemento que geralmente se considera como indispensavel para a moralisação dos condemnados o para a conservação da sua saude mental o physica no regimen cellular. (Apoiados.)
Eu sei que se me poderá observar que, sendo, em regra, de muito curta duração as penas correccionaes, não haveria possibilidade de ensinar em pouco tempo aos presos sem officio alguma profissão manual, quando fosse preciso este ensino, nem haveria facilidade de manter officinas em laboração constante, onde exercessem a sua actividade aquelles que já tivessem alguma profissão industrial. São ponderosas estas observações, bem o reconheço, até por experiencia do serviço a meu cargo.
Mas, se o argumento procede, quando as penas são curtas, já se não dá o mesmo, quando são mais longas. E por isso que o artigo 38.° da lei organica do nosso regimen penitenciario prescrevia que aos presos condemnados a mais de um anno de prisão correccional, quando ignorassem alguma arte ou officio, fosse ensinado um em harmonia com a sua posição social anterior, para se habilitaram a viver honradamente pelo seu trabalho
Em varios codigos penaes estrangeiros se estabelece a obrigação do trabalho para as penas de curta duração.
Na Inglaterra a pena do um dia a dois annos e na Irlanda do oito dias a tres annos cumpre-se em cadeias com o systema cellular, menos quanto ao passeio, escola e capella, com trabalho obrigatorio industrial ou penal.
Na França a pena de seis dias a cinco annos cumpre-se com trabalho obrigatorio, mas á escolha do condemnado. No império germanico a pena de um dia a cinco annos de prisão tambem obriga a trabalho. Disposição identica contém o codigo da Belgica com respeito ás penas de prisão de oito dias a cinco annos.
No codigo da Hollanda a pena de detenção de um dia a um anno cumpre-se com trabalho á escolha do preso, mas o trabalho é obrigatorio.
Disposições similhantes se encontram nos projectos de codigos da Austria, da Hungria, no novo codigo italiano com respeito á pena de prisão de um dia a dois annos, que só cumpre em casas de trabalho ou em obras publicas, e finalmente nos codigos de varios cantões da Suissa e de varios estados da America do norte.
A ociosidade é que não é preconisada como meio de morigeração dos delinquentes, e seria utopico julgar que a reclusão cellular sem o exercicio physico do trabalho obrigasse os condemnados a philosophar acercada pena o lhes levantasse o pensamento ás altas regiões da moral, onde a consciencia posta em face do delicto chamasse o delinquente ao cumprimento dos seus deveres.
A cella não tem o condão maravilhoso de transformar um delinquente n'um asceta, e portanto é mister alhar á repressão o processo educativo para se obter alguma percentagem, embora minima, a descontar nas reincidencias. (Apoiados.)
Os individuos que têem com mais frequencia de soffrer