667
DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS
negociantes; mas não posso determinar com facilidade onde ficam os dois pontos.
A minha infelicidade é esta, e lamento não poder esclarecer a camara.
Tenho consultado muitos documentos e muitas vezes e nenhum d'elles me determina esses pontos: o mesmo mappa do sr. marquez de Sá não nos dá conhecimento exacto, o que não admira porque foi feito em Lisboa, por informações.
Mas eu deixo este campo, lamentado não poder tratar d'este ponto com verdadeiro conhecimento de causa, porque não ha os mappas, nunca se fizeram por homens competentes sobre o terreno.
Nós não temos senão informações, e eu estou informando a camara do que sei.
O que eu quiz mostrar á camara e ao sr. deputado interpellante é que o provincia de Moçambique é muito maior do que a peninsula ibérica partindo de Tarragona no Mediterraneo, passando o estreito de Gibraltar ate Vigo.
Ora, dados estes esclarecimentos topographicos a respeito da provincia de Moçambique, e sem querer entrar no caminho das concessões, eu ainda vou tratar de outro ponto, que é a colonisação.
O estado, tendo prohibido a escravatura no ultramar, e sendo obrigado a occupar todos os pontos, todas as bahias e rios desoccupados, o que eram conhecidos dos navios negreiros, a fim de evitar o contrabando das fazendas que os negreiros costumavam levar para a compra dos negros, e trocal-as agora a troco de marfim, cera, ponta de abada, etc.. evitando o pagamento de direitos nas alfandegas legaes, mas para, isto era necessaria a colonisação como tem feito todas as potencias que tem colonias.
Em 1849, sendo ministro da marinha um homem distincto d'este paiz, o sr. conde de Castro, o nosso consul em Pernambuco officiou aquelle ministro, dizendo-lhe que n'aquella capitania brazileira existiam cento e tantos portuguezes que andavam esmolando, que não tinham que comer, e que desejavam ser transportados para qualquer parte das nossas colonias, porque antes queriam ser escravos do seu paiz, do que de um paiz estrangeiro.
O sr. colide de Castro, dominado de sentimentos nobres, que todos lhe conheciam, um portuguez de velha tempera, um homem que não podia deixar de ser sensivel a estes lamentos dos seus patricios, deu ordem ao nosso consul em Pernambuco para que fretasse um navio a fim de transportar áquelles portuguezes para Mossamedes, e deu ordem para Angola, para que fosse de ali um governador e entregasse áquelles portuguezes os terrenos que elles quizessem.
Entro áquelles colonos existia um homem enthusiasta pelos negocios do ultramar, Bernardim Abranches de Figueiredo, a quem o sr. conde de Castro estabeleceu como chefe da colonia.
Mandou-se para ali um governador, e este chefe de colonia de combinação com elles distribuiu lhes os terrenos, e em pouco tempo formou-se a grande colonia de Mossamedes, cuja alfandega rende actualmente 60:000$000 réis.
Quem ali vae acha está colonia mais bonita e mais agradavel do que Angola, e diz alguem que para o futuro será declarada capital da provincia, por ser um ponto salubre; o seu desenvolvimento de população branca tem dado os melhores resultados do que as tentivas que para esse fim se têem feito em Moçambique e mesmo em Angola.
Aqui tem a camara como um homem illustre, cheio de dedicação e boa vontade, e sensivel aos lamentos dos nossos irmãos que estavam no Brazil, sem fortuna e abandonados, por acto proprio, sem vir pedir auctorisação ao parlamento, e guiado pela nobreza dos seus sentimentos, acudiu áquelles desgraçados, distribuindo-lhe terras, e fazendo assim de Mossamedes uma grande colonia. (Apoiados.)
Ali se encontra o excellente palacio do governador, uma boa alfandega, hospital, ruas habitadas por brancos, e, finalmente, tudo arborisado, como se fosse uma povoação europêa.
E note-se que se fez tudo isto sem haver lei que permittisse concessões de terrenos, nem verba no orçamento, nem auctorisação parlamentar. (Apoiados.)
A vista d'isto, se fosse possivel apparecer hoje aqui o sr. Conde de Castro, que infelizmente já não pertence ao numero dos vivos, por desgraça nacional (Apoiados.), e que era um cavalheiro respeitavel (Apoiados.), haviamos de accusal-o por ter feito uma distribuição de terrenos que pertenciam ao estado sem auctorisação parlamentar? (Apoiados.)
Os grandes commettimentos com relação ao ultramar têem-se realisado assim, e por iniciativa de ministros dedicadíssimos á causa publica. (Apoiados.)
Foi este o primeiro ensaio que fizemos e produzimos excellente resultado.
0 segundo ensaio foi no Ambriz, na outra extremidade do provincia de Angola.
Em 1838, sendo ministro da marinha o sr. marquez de Sá, deu-se um conflicto no Ambriz. Estavam ali estabelecidos alguns negociantes inglezes, e os indignenas n'um certo dia sublevaram-se, lançando fóra d'ali esses negociantes. Este acontecimento produziu grande panico, e os navios inglezes que estavam n'essa occasião cruzando na costa de Angola, em consequencia dos queixumes d'esses negociantes, foram ao Ambriz, desembarcaram-se forças e foram perseguidos os indigenas, exigindo-se lhe que repozessem as feitorias ao estado em que se encontravam antes da invasão.
O governador de Angola queixou-se amargamente ao governo da, metropole em consequencia d'este desembarque que os inglezes ali tinham feito, o que podia ser prejudicial tanto ao nosso commercio como ao nosso dominio.
Trocaram-se notas diplomaticas a este respeito, e como v. ex.ª sabe o sr. marquez de Sá repentinamente e sem que ninguem o supposesse, mandou uma força de Lisboa e outra de Angola, para tomar posse do Ambriz, e feito isto, construiu-se ali uma alfandega, casa do governo, e muitas casas particulares, e hoje o Ambriz é um dos melhores districtos de Angola, e prospera, e terminou assim o conflicto com a Inglaterra.
O sr. Mendes official distincto, governador do Ambriz, fez enormes serviços para esta colonisação. (Apoiados.)
Aqui têem os meus illustres collegas como se estabeleceram na costa occidental de Africa esta duas colonias, sem haver verba orçamental, sem auctorisação das côrtes e só pela vontade de dois corações generosos e patrioticos que quizezeram consolidar o nosso poderio tanto em Mossamedes como no Ambriz. (Apoiados.)
Portanto áquelles que estão continuadamente a increpar o governo por saír da orbita constitucional e gastar os dinheiros publicos (não em seu proveito, mas em proveito do estado) devendo-se lembrar que outros governos de varias procedencias politicas, fizeram estes milagres saíndo da orbita constitucional, porque as circumstancias os obrigaram a não vir pedir o beneplacito parlamentar.
A terceira colonia que foi estabelecida, pelo sr. marquez de Sá, sem auctorisação parlamentar, foi a colonia de Pamba, na provincia de Moçambique.
Este cavalheiro, depois de ter mandado construir no arsenal de marinha uma embarcação, officiou para os governadores civis do Minho e da Beira, recommendando-lhes que engajassem colonos para irem tomar conta de terras que lhes fossem distribuidas na bahia de Pamba, em Moçambique.
Nomeou-se um chefe de colonos e estes embarcaram em Lisboa. Eu assisti ao embarque. Chegados lá, distribuiram-se-lhes as terras.
Infelizmente, porém, esta medida não deu bom resultado, por isso que os colonos não conheciam o genero de trabalhos que tinham que executar. Não lhes acontecia, como
Sessão de 4 de março de 1879