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SESSÃO DE 14 DE MARÇO DE 1885

Presidencia ao exmo. sr. Luiz Frederico de Bivar Gomes da Costa

Secretarios - os exmos. srs.:

Francisco Augusto Florido de Mouta e Vasconcellos
Augusto Cesar Ferreira de Mesquita

SUMMARIO

Dá-se conta de dois officios do ministerio da marinha, um devolvendo ma requerimento informado, outro enviando 150 exemplares da conta da gerencia deste ministerio relativa ao anuo economico de 1883-1884 e ao exercicio de 1882-1883, para serem distribuidos. - Tambem se dá conta de outro do ministerio da fazenda, remettendo informações pedidas pelo sr. Correra de Barros. - Têem segunda leitura : um projecto de lei da srs. Adriano Cavalheiro e Simões Ferreira; dois projectos do sr. Cunha Bellem e Estevão de Oliveira; uma renovação de iniciativa do sr. Adriano Cavalheiro.- Apresentam representações: o sr. presidente, da camara municipal de Villa Viçosa; o sr. Luiz Osorio, duas da camara municipal de Santarem; o sr. Guilherme de Abreu, dos officiaes do diligencias da camara de Cabeceiras de Basto, o sr. Pereira Borges, da camara municipal da Vidigueira. -Mandam requerimentos para a mesa, pedindo esclarecimentos, os srs. Luiz José Dias e Mariano de Carvalho; e de interesso particular, os srs. Joaquim José Alves e Antonio Centeno.- O sr. Costa Pinto apresenta um projecto de lei, que ficou para segunda leitura. - Antes da ordem do dia, chama p sr. conde de Thomar a attenção do governo e da camara para o facto annunciado pelos jornaes, com relação ao roubo no nosso consulado do Rio de Janeiro. - Na ausencia do sr. ministro da negecios estrangeiros, responde o sr. ministro da fazenda o pouco que officialmente sabia sobre este assumpto. - O sr. Luiz José Dias faz algumas considerações sobre um facto que lhe communicaram de Villa dos Arcos. - Por parte do sr. presidente do conselho e ministro das obras publicas, é apresentada uma proposta de lei para ser convertido em definitivo o contrato provisorio que tem por objecto a construcção de um molhe entre a Pontinha e o Ilheu, na ilha da Madeira.- A requerimento do sr. Santos Viegas é dispensado o regimento, entra em discussão e é approvado o projecto n.º 22, que diz respeito aos actuaes membros provisorios do corpo docente da escola medico-cirurgica do Funchal.
Na ordem do dia, continuando a discussão do projecto de lei n.º 19 (reforma das alfandegas), concluo o sr. Beirão o seu discurso, principiado na sessão antecedente, e lêem-se na mesa as suas propostas. - A requerimento do sr. Lopes Navarro é a sessão prorogada até se votar o projecto. - Fallam os srs. Alfredo Peixoto, que tambem apresenta propostas, e Consiglieri Pedroso, que apresenta uma moção de ordem. - Julga-se a materia discutida a requerimento do sr. Lopo Vaz. - O sr. Pinto de Magalhães, relator, que apresentara duas propostas, por parte commissão, em nome da mesma commissão declara que rejeitava todas as outras.- A moção de ordem do sr. Consiglieri Pedroso, que era um adiamento ao projecto, é votada em primeiro logar, e rejeitada.- Pede o sr. Eduardo José Coelho votação nominal sobre a primeira parte da proposta do sr. Beirão, e não houve vencimento; seguidamente é rejeitada a primeira parte da proposta do sr. Beirão.- As propostas da commissão, emendas ao projecto, são approvadas; é approvado ,o projecto na generalidade e na especialidade, salvas as emendas já approvadas é Os srs. Alfredo Peixoto e Lobo d'Avila retiram as suas propostas.- O additamento do sr. Beirão, segunda parte da sua proposta, foi rejeitado.- O sr. Carrilho apresenta o parecer sobre o projecto do governo, abrindo um credito supplementar para pagamento do subsidio é despezas de jornada dos srs. deputados.- Deu-se conta da ultima redacção do projecto n.º 22.

Abertura- Ás tres horas da tarde.

Presentes á chamada- 60 srs. Deputados.

São os seguintes: - Lopes Vieira, Agostinho Lucio, Albino Montenegro, A. da Rocha Peixoto, Torres Carneiro, Alfredo Barjona de Freitas, Sousa e Silva, Antonio Centeno, A. J. da Fonseca, A. J. D'Avila, Pereira Borges, Cunha Bellem, Santos Viegas, Almeida Pinheiro, A. Hintze Ribeiro, Augusto Poppe, Fuschini, Avelino Calixto, Bernardino Machado, Sanches de Castro, Conde de Thomar, E. Coelho, Elvino de Brito, Estevão de Oliveira, Correia Barata, Francisco de Campos, Mártens Ferrão, Guilherme de Abreu, Costa Pinto, Franco Frazão, Augusto Teixeira; João Antonio Teixeira, de Vasconcellos, Ferrão de Castello Branco, Sousa Machado, Ponces de Carvalho, Joaquim de Sequeira, J. J. Alves, Simões Ferreira, Amorim Novaes, Correia de Barros, Laranjo, José Frederico, Luciano Cordeiro, Luiz de Lencastre, Luiz Ferreira, Bivar, Reis Torgal, Luiz Dias, Luiz Osorio, Correia de Oliveira, Manuel de Medeiros, Mariano de Carvalho, Guimarães Camões, Gonçalves de Freitas, Sebastião Centeno, Visconde de Ariz, Visconde de Balsemão, Visconde das Laranjeiras e Consiglieri Pedroso.

Entravam durante a sessão os srs.: - Adolpho Pimentel, Adriano Cavalheiro, Moraes Carvalho, Garcia de Lima, Antonio Candido, Antonio Ennes, Lopes Navarro, Jalles, Carrilho, Sousa Pavão, Pinto de Magalhães, Seguier, Ferreira de Mesquita, Neves Carneiro, Barão de Ramalho, Lobo d'Avila, Carlos Roma du Bocage, Conde da Praia da Victoria, Cypriano Jardim, Ribeiro Cabral, Emygdio Navarro, Goes Pinto, E. Hintze Ribeiro, Fernando Geraldes, Francisco Beirão, Mouta e Vasconcellos, Castro Mattoso, Frederico Arouca, Barros Gomes, Matos de Mendia, San'Anna e Vasconcellos, Silveira da Motta, J. C. Valente, Scarnichia, Souto Rodrigues, J. Alves Matheus, Coelho de Carvalho, Avellar Machado, Ferreira de Almeida, Elias Garcia, Lobo Lamare, Figueiredo Mascarenhas, José Luciano, Oliveira Peixoto, J. M. dos Santos, Simões Dias, Lopo Vaz, Manuel d'Assumpção, M. J. Vieira, M. P. Guedes, Marçal Pacheco, Martinho Montenegro, Miguel Dantas, Miguel Tudella, Pedro Roberto, Rodrigo Pequito, Pereira Bastos, Tito de Carvalho, Vicente Pinheiro, Visconde de Reguengos e Visconde do Rio Sado.

Não compareceram á sessão os srs.: - Agostinho Fevereiro, Anselmo Braamcamp, Silva Cardoso, Pereira Corte Real, Garcia Lobo, Fontes Ganhado, Moraes Machado, A. M. Pedroso, Urbano de Castro, Augusto Barjona de Freitas, Pereira Leite, Caetano de Carvalho, Conde de Villa Real, Sousa Pinto Basto, Filippe de Carvalho, Firmino Lopes, Vieira das Neves, Wanzeller, Baima de Bastos, J. A. Pinto, Melicio, Franco Castello Branco, Ribeiro dos Santos, J. A. Neves, Teixeira Sampaio, Azevedo Castello Branco, José Borges, Dias Ferreira, Pereira dos Santos, Ferreira Freire, Pinto de Mascarenhas, Julio de Vilhena, Lourenço Malheiro, Luiz Jardim, M. da Rocha Peixoto, Aralla e Costa, Pinheiro Chagas, Pedro de Carvalho. Pedro Correia, Pedro Franco, Santos Diniz, Dantas Baracho, Visconde de Alentem a Wenceslau de Lima.

Acta. - Approvada,

EXPEDIENTE

Officios

1.º Do ministerio da fazenda, remettendo, em satisfação ao requerimento do sr. deputado José Augusto Correia de Barros, a nota da despeza ordenada até 7 de março pelo mesmo ministerio, era conformidade com o decreto de 3 de julho de 1884.
Para a acta.

2.º Do ministerio da marinha, remettendo 150 exemplares da conta da gerencia d'este ministerio, relativa ao anno economico de 1883-1884 e do exerc?cio de 1882-1883, a fim de serem distribuidos pelos srs. Deputados.
Á secretaria.

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3.º Do ministerio da marinha, informando de que o artigo 1G.ø da carta de lei de 10 de abril de 1874 não póde aproveitar ao sargento quartel mestre do corpo de policia da guarnição do estado da India, Napoleão Baptista Joaquim da Pureza e Couto.
Á secretaria.

4.º Da camara municipal do concelho de Villa Viçosa, enviando uma representação que a mesma municipalidade dirige é camara, pedindo providencias que obstem é crise agricola.
Enviado é commissão especial de inquerito, guando nomeada.

Segundas leituras

Projectos de lei

1.º Senhores.- A camara municipal do concelho de Pinhel, solicitando auctorisação para desviar do fundo de viação municipal a quantia necessaria para melhorar o abastecimento de aguas da cidade, propõe-se levar a effeito uma obra de innegavel urgencia, sem que por modo algum prejudique o desenvolvimento da viação concelhia.
Da posição da cidade em relação é rede das estradas reaes e districtaes, e da orographia accidentada do concelho, resulta que são inuteis umas o impraticaveis outras das que num plano de viação municipal se poderiam incluir.
Com effeito, da cidade de Pinhel sobem em differentes direcções as seguintes estradas reaes e districtaes:
Estrada real n.º 34, seguindo em direcção é Barca de Alva, atravessa a freguezia do Colmeal e liga Pinhel com a Figueira do Castello Rodrigo (quasi concluida);
Estrada districtal que, ligando a capital do concelho com a Guarda, atravessa a importante fregezia dos Freixedos de Alverca (concluida);
Com esta liga a estrada real que, atravessando as freguezias dos Soropires, Hervas, Tenros e Cerejo, deve ligar dentro em pouco Pinhel a Trancoso.
Está tambem já estudada, e creio que em construcção em alguns pontos, uma estrada districtal que deve ligar Pinhel a Almeida, por um lado, é Meda e Foscôa, por outro, atravessando um grande numero de freguezias do concelho.
Estrada municipal está construída uma, que serve duas freguezias, Soropires e Palia, não tendo o municipio necessidade de construir outras alem do pequenos ramaes pouco despendiosos, destinados a ligar algumas freguezias ás estradas reaes e districtaes mencionadas, e isso só mais tarde, quando estas estiverem concluidas.
É verdade que no mappa de viação municipal se encontram duas estradas não construidas ainda, uma em direcção ao Jermello e outra a Vascoveiro ; mas, a sua extensão, forçada pelo accidentado do terreno e difficuldades de construcção, tornam-as de tão pouca utilidade relativa e de tão pesados encargos para o municipio, que não poderão ser dotadas nem construidas senão em epocha muito e muito remota, quando o possam ou devam vir a ser.
Tendes, pois, por um lado, uma cidade populosa, sede de um municipio pobre, que nos annos de estiagem tem de abaster-se escassa e penosamente de aguas transportadas de grandes distancias, e que, mesmo em annos normaes, só dispõe de agua ruim e em pequena quantidade; e por outro, o cofre da viação do mesmo municipio deve quantias relativamente avultadas, que não podem ter por largo tempo uma applicação legal.
Para prover de remedio áquelle mal sem que se prejudique o fira que a lei teve- em vista, quando creou o fundo de viação municipal, submetto é vossa approvação o seguinte projecto de lei:
Artigo 1.º E auctorisada a camara municipal do concelho de Pinhel a desviar do fundo especial da dotação das estradas municipaes a quantia de 7:000$000 réis, a fim de ser applicada é eanalisa?ao e abastecimento de aguas
da cidade capital do mesmo concelho.
Art. 2.º Fica, revogada a legislação em contrario.
Sala das sessões, 12 de março de 1885. = Adriano Emilio de Sousa Cavalheiro, deputado pelo circulo de Pinhel.
Enviado ás commissões de administração e obras publicas.

2.º Senhores. - A classe dos pharmaceuticos militares, corporação scientifica, parte constituinte do serviço sanitario e parte integrante do exercito, sobre não ter ainda a organisação desenvolvida que lhe seria mister, encontra-se n'uma situação dubia, no seio de familia militar, por escassa e incompleta definição dos seus direitos em honras e recompensas; que estão plena e claramente definidas para os seus irmãos pharmaceuticos da armada, pela carta de lei de 28 de maio de 1883, que reformou o serviço de saude naval.
É de incontestavel justiça, senhores, que os beneficios concedidos por essa reforma a estes funccionarios sejam extensivos aos que professam igual ramo de sciencia e têem identica gerarchia no serviço do saude de terra.
Competem as duas corporações era illustração e em bom serviços; é iniquo para que onde tudo é igual é titulos de nobreza, scientificos, attribuições, graduações militares, encargos e responsabilidades é só fosse desigual a recompensa.
O artigo 31.º da citada lei, conferindo aos pharmaceuticos navaes todas as honras, privilegios e recompensas honorificas concedidas por lei aos officiaes combatentes da armada de igual graduação, veiu reparar uma injustiça para aquella briosa e esclarecida classe, mas veiu tornar mais flagrante a injustiça havida para com a distincta classe dos pharmaceuticos do exercito de terra, que não podem deixar de ser, em vantagens, postos ao mesmo nivel dos seus irmãos do exercito de mar.
É por este motivo, senhores, que tenho a honra de apresentar ao vosso esclarecido exame o seguinte projecto de lei:
Artigo 1.º Aos pharmaceuticos militares são extensivas as disposições do artigo 31.º da carta de lei de 28 de maio de 1883, no que dizem respeito ás honras, privilegios e recompensas honorificas concedidas aos pharmaceuticos navaes.
Art. 2.º Fica revogada toda a legislação em contrario.
Sala das sessões da camara dos deputados, 13 de março de 1885. = Antonio Manuel da Cunha Bellem.
Enviado é commissão do guerra, ouvida a de fazenda.

3.º Senhores. - Em todos os tempos, gosaram os medicos do exercito particular consideração entre os belligerantes ; e, se no longo volver dos seculos, algumas vezes se encontraram, nas paginas da historia militar dos diversos paizes, vestigios de declinação ou desprestigio dessa estima, deriva tal phenomeno, sempre anormal e transitorio, menos dos sentimentos dos chefes, do que do proprio desconceito da corporação, que n'essas epochas, ou primava pela insciencia, ou se reduzia a turba de mercenarios.
No movimento evolutivo da educação scientifica, nem sempre a luz tem sido progressiva ou se quer de igual modo intensa; e não raro houve periodos de trevas, em que desvairamentos e absurdos escolares envenenaram os intellectos das gerações, formando como que verdadeiras e fundas depressões no nivel do saber humano.
Não podia a essas epochas de espessa escuridão intellectual corresponder o brilho da medicina castrense.
Tão pouco foi sempre cuidada de igual modo e apreciada no mesmo valor a vida dos soldados, da multidão anonyma, que se mandava vencer ou morrer pela ambição dos chefes, para gloria dos grandes capitães. Assim é que, muitas vezes, emquanto a soldadesca morria quasi ao desamparo, victimada pelo ferro do inimigo ou pelo flagelo

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das epidemias, os principes e os generaes que commandavam as forças tinham ao seu lado, ao seu serviço pessoal medicos eminentes, sabios notaveis para o seu tempo, luminares, cujo renome ainda brilha, ou na fama dos seus actos, ou no credito das suas obras, que atravez das idades e apesar das fecundas conquistas do progresso, ainda se impõem é nossa admiração.
Mas vae já decorrido largo estadio desde que tudo mudou, tomando a educação scientifica novos e mais seguros caminhos, e fixando-se é luz da humanidade e até é luz da economia os grandes principios do desvelo e solicitude pela saude e pela vida dos soldados. Concomitantemente as corporações medicas dos exercitos assumiram o levantado e erguido papel que lhes pertencia, e o seu recrutamento começou a ser feito entre a parte selecta dos medicos mais habilitados de cada paiz.
Soou por conseguinte, com o maximo prestigio e a maxima copia de serviços prestados aos belligerantes, a hora da maxima consideração para a medicina castrense.
Assim o comprehendem e assim o praticam todos os exercitos que se reorganisam em bases novas, scientificas, modernas.
Os medicos militares são com effeito uma corporação scientifica, que faz parte integrante dos exercitos e que é n'elles indispensavel, tanto como as outras corporações fardadas.
Nem hoje se coraprehende muito bem a obsoleta distincção entre os officiaes combatentes e não combatentes, que foi, por muito tempo e por motivos que seria longo enumerar aqui, o fulcro sobre que assentaram diversas organisações.
Na feição moderna da guerra, ou todos combatem, ou ninguem combate.
E depois, o que distingue os medicos militares dos officiaes das outras armas scientificas em que se distribue a força armada?
Será a importancia, extensão e dificuldades dos cursos escolares? Mas o dos medicos é tão longo, tão trabalhoso e tão arduo, se não mais, do que o dos officiaes mais largamente habilitados.
Será o exercicio effectivo do cominando? Mas corporações ha e muito distinctas e das mais illustradas, que tão pouco exercem o cominando, se por este exercicio se deve entender o acto de conduzir e guiar é linha de fogo os soldados empenhados na acção; e se o commando representa a superintendencia e direcção dos diversos actos necessarios na guerra, e para a guerra, então, assim como o official de engenheria commanda as companhias de sapadores, pontuneiros, artifices e outras, cuja collaboração é necessaria para o exito da lucta, assim tambem o medico militar exerce, em todos os paizes modernos, e é mister que exerça, o commando das tropas sanitarias, de enfermeiros, maqueiros, conductores de transportes de feridos e doentes e pessoal dos postos de soccorros, das hospitalisações ligeiras e das hospitalisações fixas.
Será a distincção baseada acaso na utilidade e alcance dos serviços prestados? Mas quem, mais que o medico militar, trabalha assidua e constantemente, na paz e na guerra, para a grande obra, em que se empenham as forcas vivas dos exercitos? Vejâmos! Robustece o engenheiro, pelos dictames da sciencia, as fortificações de toda a especie, augmentando as resistencias, abrigando os soldados contra o fogo do inimigo; e, depois de finda a acção, repara com presteza os estragos feitos nas obras materiaes. Pois bem! O medico, dia a dia, cuida em fortalecer, por todos os desvelos da hygiene, o organismo dos soldados, confiados é sua vigilancia, estudando a alimentação que mais lhes convém, o vestuario que lhes é mais apropriado, os aquartellamentos onde uns se não tornem nocivos aos outros, combatendo as mil causas deleterias da atmosphera deprimente das casernas, prevenindo ou contrariando a marcha das epidemias especiaes, alem da grande lucta contra as epidemias geraes; e se, na paz, ensina é poupar as vidas e as forças dos defensores da patria, por fim, terminada a batalha, repara, desvelado, os estragos feitos na muralha humana, n'essa muralha dos peitos dos valentes, que segundo o dizer dos estrategistas, é a mais solida defeza contra a aggressão dos inimigos 5 e se consegue salvar vidas preciosas, como são as de todos os que derramam o seu sangue pela patria, consegue tambem poupar avultados valores, pois que essas vidas, sob o ponto de vista material e economico, representam um avultadissimo capital, que os dietames da prudencia mandam poupar.
Porventura dos medicos militares se distinguirão os outros officiaes pelo privilegio de intervirem no plano da acção?
Diga-o o bom senso e diga-o a historia!
Mal irá aos generaes, se não consultarem os medicos superiores que junto d'elles servem, sobre os promenores desse plano, sobre os meios de evitar funestas influencias climatericas ou o desenvolvimento de mortiferas doenças.
Os annaes dos feitos militares estão cheios de dolorosas narrativas, em que se evidenceiam os deploraveis revezes, soffridos por brilhantes exercitos, só porque o voto dos medicos não foi escutado no delinear do plano de batalha, sendo sobretudo nos longos assedios que este facto se tornou vulgarissimo, por isso que os sitiantes, que por si teriam talvez a victoria, se viram, muitas vezes, forçados a levantar o cerco, cujo exito lhes não parecia militarmente duvidoso, só porque as enfermidades, não previstas, lhes fizeram maior damno do que o fogo dos sitiados, e lhes deixaram mortos no campo, sem gloria, a melhor parte das tropas.
Tambem o medico em chefe não póde ignorar o plano estrategico da acção, porque, a par do movimento das forças que se hão de empenhar n'ella, virá, de necessidade, outro movimento de feridos o doentes, embaraçando o primeiro que, sendo por elle embaraçado, com grave detrimento das operações em qualquer dos casos, se não forem os dois concertados e combinados de antemão entre o chefe de estado maior e o chefe do serviço medico.
Será acaso a bravura individual, emfim, que distinga dos medicos militares os outros officiaes do exercito?
Não! que esta virtude, a primeira das virtudes militares, não póde deixar de ser apanagio commum de todas as corporações fardadas!
E hoje, nas condições da guerra moderna, quando a lucta corpo a corpo, braço a braço é mais do que excepcional, quando os rasgos de valentia pessoal são raros e quasi estereis, quando a sciencia, de mil modos, suppre a força; hoje, que o artilheiro lucta com o adversario a distancias a que não alcança a vista desarmada, que o engenheiro fortifica os pontos inacessiveis é fusilaria inimiga, que o cavalleiro raro se empenha nas cargas, rompendo os quadrados por sobre bayonetas, e que o proprio infante mal distingue ao longe o alvo dos seus tiros e mal é distinguido a distancia pelas pontarias da linha contraria, o medico militar, se está tão arriscado como os seus camaradas no primeiro e ainda no segundo dos postos de soccorros, corre com elles perigos iguaes na linha de fogo, onde, ainda mais do que o exercicio da sua philantropica missão, o chama a necessidade, reconhecida desde os tempos de Napoleão I, do inspirar confiança e alentar a coragem aos soldados.
E se aos perigos da guerra se acrescentarem os da lucta com as epidemias, sempre suas companheiras, e sempre mais mortiferas do que o fogo dos inimigos, a bravura individual do medico, a abnegação com que sacrifica a vida pela causa commum do exercito, não se envergonham, nem empallidecom ao lado das dos seus bravos companheiros de trabalhos e riscos, dos seus gloriosos camaradas de todas as armas. Dil-o a estatistica, tambem gloriosa, do obituario dos medicos, militares em campanha.

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Senhores! A corporação fardada, que taes serviços presta, que com tão largo capital de sciencia o de dedicação contribue para o explendor dos exercitos, merece ser considerada e estimada.
É-o a classe medico-militar portugueza entre os valentes e illustrados offciaes do nosso exercito; mas força é confessar, sem resentimentos, nem invejas, que, se em nenhum paiz, e mais larga e avantajada essa consideração, em nenhum tambem é ella mais theorica e mais platonica, produzindo antes os effeitos individuaes do que os collectivos, antes a estima do cada medico do per si do que a da corporação que todos constituem.
Os postos superiores são-lhes regateados com uma mesquinhez avara e quasi cruel, como se homens de sciencia que seguem um ramo da carreira militar, fossem indigno; de gosar as honras e garantias, que a lei concede, na effectividade e na reforma a todos os officiaes, até aquelles a que mais se não exigo do que uma instrucção apenas rudimentar.
Senhores! A medicina militar portugueza está, para o accesso em peiores condições do que todas as armas e corporações fardadas, até do que o quadro das praças; quando ella respeitosamente notou a enorme desproporção de ter só um posto de coronel para cincoenta e dois de capitães, repondeu-lhe o decreto de 30 do outubro, elevando a sessenta o um o numero de capitães, para o mesmo unico posto de coronel que ficou existindo no seu quadro.
A promoção e as garantias da reforma, que são boa moeda de lei, em que se paga a todos os officiaes que sorvem bem a sua patria, são só escassas, mesquinhas, exiguas para a corporação medico-militar!
Esse decreto; que representa justo e justificado beneficie para todas as corporações fardadas, só para a classe medico-castrense teve desusada severidade, como se ella fosse a filha espuria do exercito, o zangão ocioso nesta colmeia de actividado productiva em que se distingue a briosa intelligente officialidade portuguesa.
Não se queixa o corpo de saude da injustiça relativa com que foi tratado; não pondera a desproporcionalidade entre o numero dos seus capitães para o dos seus officiaes superiores, quando comparados com os das diversas armas o corporações do exercito, não explana calculos, aliás faceis de fazer, e do uma incontestavel eloquencia, a favor da equidade que reclamava o alargamento do seu quadro superior! Não! bastas vezes tem elle advogado, e sempre em vão, a sua causa, que é a causa da justiça.
Mas a todo esto largo desamor com que foi tratado, acresce outra prova mais dolorosa, de desestima, consignada no artigo 179.º do decreto de 30 do outubro.
Tiveram antigamente os cirurgiões em chefe, quando completos os trinta e cinco annos de serviço, uma reforma privilegiada. Depois a ultima organisação do exercito, não reproduzindo disposição alguma n'este sentido, pareceu iincluil-os na lei cominam; e segundo esta interpretação, dada por diversos ministros da guerra, assim se liquidaram, no posto de generais de brigada, as reforma do tres medicos militares da mais alta patente.
Pois o citado decreto vem expressamente privar a classe medico-castrense d'essa prerogativa, que estava sendo de direito consuctudinario; e para que se accentuasse bem que é apenas uma questão de ciume de hierarchia, e não um desvelo pelos interesses da fazenda publica, dão-se aos medicos militares, que se reformaram com o posto de coronel, os vencimentos da patente immediata, e negam-se-lhes tão sómente as honras do generalato, até nos calçados annos de velhice, até na situação, sem brilho, da reforma!
E se é possivel, o que não cremos, que haja no brioso exercito portuguez um official, um só que seja, que envergonhe os galões de general; não se encontra esse de certo na corporação dos medicos militares, não se encontrou nunca nos cirurgiões em chefe, que se reformaram n'este elevado posto.
O primeiro foi um velho, com mais de cincoenta annos de serviço, uma veneranda reliquia das campanhas da peninsula, um prudente e discreto administrador, que, se peias condições de sua origem scientifica e pelas do tempo em que se alistou, não era um sabio, era um homem illustrado pela pratica, pelas provações da guerra, pela longa experiencia.
O segundo foi um dos medicos militares mais esclarecidos do seu tempo, um alumno da casa pia, que, pelo seu notavel engenho, aquella instituição de caridade destinou a estudar todos os novos cursos que se iam estabelecendo em Lisboa, e de que elle deu sempre satisfatoriamente conta. Reformou-se carregado de serviços, e venerado pelo seu caracter e pelo seu saber.
Do terceiro, que vive ainda, abstemo-nos, por este motivo, de fallar; mas ninguem lhe negar? o tributo de respeito e consideração, ou dirá que elle deslustra, no minimo que seja, o brilho das suas honras de general.
Senhores! A França, e falâmos d'ella especialmente, porque foi a ultima nação que reorganisou o seu serviço de saude militar, e porque foi tambem dos paizes mais refractarios a concessões do consideração é classe medico-castrense, a França não hesitou em elevar ao alto posto de general de divisão o seu presidente do conselho de saude do exercito, e ao posto de generaes de brigada os oito medicos seus immediatos na escala hierarchica.
É uma grande nação e um grande exercito, mas onde impera o preceito das idades fataes, succedendo-se, por isso, mais rapidamente o accesso áquelles elevados postos. Mas, se a França é grande, e grande proporcionalmente o seu exercito, póde fazer-se a comparação, reclamando para a classe medico-militar portugueza uma consideração proporcional; tanto mais que, sendo o cargo de cirurgião em chefe d'aquelles que, por sua natureza e attribuições, pouco convida é reforma, não haverá perigo de que os raros medicos que a elle ascendem, excepcionalmente e sempre com quarenta annos de serviço, vão engrossar as fileiras dos reformados, distribuindo assim successivamente por muitos o beneficio do primeiro posto.
E será injusto conceder a patente de general de brigada a um só, ao primeiro, ao mais graduado dos medicos militares, ao official com um longo curso scientifico, com as mais largas habilitações escolares que o paiz confere, com annos de serviço de sobra para a melhor reforma, companheiro nos primeiros postos dos mais graduados officiaes de todas as armas, hierarchicamente superiores a elles, muitas vezes; e vendo-os progredir em accesso, avançar em considerações, honrando e illustrando o exercito, de que os medicos militares tambem fazem parte integrante, activa, prestimosa e indispensavel?
Os dictames da justiça, da equidade, da justa consideração, devida por igual a todos os funccionarios, e até a justa proporção com as organisações de outros exercitos estão a affirmar que não !
É por este motivo, senhores, confiados em que a nossa iniciativa servirá apenas de ponto de partida para que o nosso elevado criterio elabore sobre o assumpto melhor e mais completo diploma legislativo que temos a honra de submetter é vossa esclarecida attenção o seguinte projecto de lei:
Artigo 1.º Ao cirurgião em chefe do exercito pertence, no serviço effectivo, o posto de general de brigada, e aos seus immediatos na escola hierarchica o posto de coroneis.
Art. 2.º Fica revogado, na parte que diz respeito aos medicos militares, o artigo 179.º do decreto de 30 de outubro de 1884 e toda a legislação em contrario.
Sala das sessões da camara dos deputados, 13 de março de 1885. = A. M. da Cunha Bellem.

Propostas para renovação de iniciativa

1.ª Renovamos a iniciativa do projecto de lei apresentado pelo deputado Estevão Antonio de Oliveira Junior,

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na sessão de 28 de abril de 1883, e que tem por fim ampliar a concessão fweita pela carta de lei de 17 de Maio de 1878 ao asylo de infância desvalida de Montemor o Novo.
Sala de sessões, 30 de janeiro de 1885. = António da Cunha Bellem = Estêvão António de Oliveira Júnior.
Lida na mesa, foi admittida e enviada á commissão de fazenda.

O projecto de lei a que se refere esta proposta é o seguinte:

Senhores. - Pela carta de lei de 17 de maio de 1878, promulgada em virtude de uma proposta, trazida ao parlamento pelo governo, foi cedido, para o estabelecimento definitivo do asylo de infancia desvalida de Moutemor o Novo o extincto convento de religiosas dominicanas da Saudação.
É, porém, certo que nessa lei se não traduzia expressamente a intenção do governo ao promover a concessão, por isso que, sendo, como não podia deixar de ser, idéa d'elle (e assim lhe fora solicitado em representações, que motivaram a apresentação da proposta de lei) o conceder aquelle estabelecimento todo o convento, isto é, a parte existente actualmente e os terrenos adjacentes resultantes das diversas demolições daquelle vasto ediffcio, d'aquella proposta de lei apenas se faz menção do convento, suscitando-se (e com todo o fundamento) duvidas sobre se com o convento foram ou não cedidos os terrenos que outrora foram occupados por edificação d'elle.
Estes terrenos, improprios hoje para a cultura por se acharem entulhados de pedra, telha e materiaes de construcção, nenhum rendimento produzem para a fazenda publica, e sómente pelo convento ou por quem o substitua podem ser com vantagem aproveitados; acrescendo para o asylo a que o convento for cedido, a necessidade de materiaes, que ali encontra, tendo assim esses terrenos numa dupla vantagem para elle: fornecer-lhe no estado actual materiaes de que carece para a sua construcção e desenvolvimento; e mais tarde, depois de limpos, o servirem-lhe para a cultura de legumes e hortaliças indispensaveis e taes estabelecimentos.
Para preencher uma lacuna evidente da lei de 17 de Maio de 1878, e completar a vonrade do governo e do parlamento na acção generosa e boa d'aquella concessão, tenho a honra de vos apresentar o seguinte projecto de lei:
Artigo 1.º É o governo auctorisado a ampliar a concessão feita pela carta de lei de 17 de Maio de 1878 ao asylo de infancia desvalida de Montemór o Novo, cedendo a este estabelecimento de caridade, alem do convento da Saudação, os terrenos annexos que antigamente eram occupados por aquelle edificio.
Art. 2.º Esta nova concessção é feita nos mesmos termos e com as mesmas condições da concessção primitiva.
Art. 3.º Fica assim ampliada a carta de lei de 17 de maio de 1878, e revogada a legislação em contrario.
Sala das sessões, 27 de abril de 1883. = Estevão Antonio de Oliveira Junior.

2.ª Renovo a iniciativa do projecto de lei n.º 126-A por mim apresentado na sessão de 12 de abril de 1882, com o parecer n.º 152 da respectiva commissão e approvado n'uma das ultimas sessões de 1884.
Sala das sessões, 12 de março de 1885.= O deputado pelo circulo de Pinhel, Adriano Cavalheiro.
Lida na mesa, foi admittida e enviada á commissão de legislação civil.

O projecto de lei a que se refere esta proposta é o seguinte:
Senhores. - A comarca de Villa Nova de Foscôa foi creada por decreto de 31 de dezembro de 1853 e foi constituida com os concelhos então existentes, de Foscôa,
Freixo de Numão, Almendre e Marialva. Por este mesmo decreto foram creados quatro districtos de juízes de paz, um em cada um d'aquelles concelhos, sendo o de Marialva formado pelas freguezias de Marialva, Rabaçal, Carvalhal, Valle de Ladrões, Pae Penella, Coriscada, Barreiro, Chãs e Santa Camba.
Mais tarde foram extinctos os concelhos de Freixo de Numão, Almendra e Marialva, sendo todos annexados ao Foscôa com excepção de duas freguezias do extincto concelho de Almendra.
Por decreto de 4 de dezembro de 1872 foram annexadas para todos os effeitos judiciaes, administrativos e de fazenda ao julgado e concelho de Meda, as de freguezias de Marialva, Valle de Ladrões, Pae Penella, Carvalhal, Rabaçal, Coriscada e Barreiro e por decreto de 12 de Novembro de 1875 foi creada a comarca de Meda, fazendo parte d'ella, alem de outras, estas mesmas freguezias.
Ficaram, todavia, no concelho e comarca de Foscôa as freguezias das Chãs e Santa Comba, fazendo, apesar d'isso, parte do districto do juízo de paz de Marialva.
São óbvios os inconvenientes que resultam d'este estado de cousas, a que é necessário pôr termo, e por isso tenho a honra de vos apresentar o seguinte projecto de lei:
Artigo 1.º Ficam fazendo parte do districto do juízo de paz de Villa Nova de Foscôa as freguezias das Chãs e Santa Comba, que actualmente pertencem ao juízo de paz do districto de Marialva.
Art. 2.º Fica revogada a legislação em contrario.
Sala das sessões, 12 de Abril de 1882. = O deputado pelo circulo de Pinhel, Adriano Emílio de Sousa Cavalheiro.

REPRESENTAÇÕES

1.ª Da camara municipal de Villa Viçosa, pedindo providencias que obstem á crise agrícola.
Apresentada pelo sr. presidente, enviada á commissão especial de inquérito, quando nomeada, e auctorisada a piblicação no Diário do governo.

2.ª Da camara municipal da Vidigueira, no mesmo sentido da antecedente.
Apresentada pelo sr. deputado Pereira Borges e enviada á commissão de agricultura, ouvida a de fazenda.

3.ª De officiaes de diligencias da comarca de Cabeceiras de Bastos, pedindo auctorisação para o pagamento de diligencias praticadas pelos officiaes nos processos de recrutamento.
Apresentada pelo sr. deputado Guilherme de Abreu e enviada á commissão de legislação civil.

4.º Da camara municipal do concelho de Santarem, pedindo providencias que obstem á crise agricola.
Apresentada pelo sr. deputado Luiz Ozorio e enviada á commissão especial de inquérito, sendo auctorisada a publicação no Diario do governo, estando em termos.

5.ª Da camara municipal do concelho de Santarém, pedindo a approvação da proposta de lei n.º 1-E, apresentada pelo sr. ministro das obras publicas, Aguiar e que tem por fim crear as escolas praticas de agricultura.
Apresentada pelo sr. deputado Luiz Osório, enviada ás commissões de commercio e artes, agricultura e fazenda, sendo auctorisada a publicação no Diário do governo, estando em termos.

REQUERIMENTOS DE INTERESSE PUBLICO

1.º Requeiro que sejam remettidos com urgencia á camara os seguintes esclarecimentos, pelo ministerio da guerra:
I. Nota dos presbyteros que no anno presente concorreram aos logares de capellães do exercito;

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II. Nota da classificação obtida por esses concorrentes;
III. Nota dos individuos que foram despachados em virtude do referido concurso. = O deputado, Luiz José Dias.

2.º Roqueiro que, pelo ministerio da justiça, me sejam remettidas as copias das informações officiaes, que o digno juiz do direito da comarca dos Arcos enviou á presidencia da relação do districto, ácerca do julgado de Soajo, da mesma comarca. = O deputado por Monçção e Melgaço, Luiz José Dias.

3.º Requeiro que, pelo ministerio dos negocios da marinha, seja enviado com urgencia a esta camara todo o processo relativo a uma petição ou protesto de Francisco de Paula Leite, ácerca do lançamento de armações para a pesca do atum na costa do Algarve. = Mariano de Carvalho.
Mandaram-se expedir.

JUSTIFICAÇÕES DE FALTAS

O nosso illustre collega, o sr. deputado José Borges de Faria tem continuado a faltar ás sessões por motivo justificado. = Mouta e Vasconcellos.

REQUERIMENTOS DE INTERESSE PARTICULAR

1.º De Gustavo Adolpho Mauperrin, thesoureiro da direcção geral dos correios, telegraphos e pharoes pedindo augmento de vencimento.
Apresentado pelo sr. Antonio Centeno e enviado á commissão de obras publicas, ouvida a de fazenda.

2.º De Francisco de Paula da Luz, major da guarnição da provincia de Macau e Timor, pedindo melhoramento de situação.
Apresentado pelo sr. J. J. Alves e enviado á commissão do ultramar, ouvida a de fazenda.

O sr. Presidente: - Pela camara municipal de Villa Viçosa foi enviada uma representação com respeito á questão cerealifera. Esta representação vae ser enviada á commissão de inquerito proposta para esse fim, logo que esteja nomeada.
Como a representação está em termos respeitosos e convenientes eu consulto a camara sobre se permitte que ella seja publicada no Diario do governo.
Foi concedida a publicação no Diario do governo.
O sr. Luiz Osorio: - Sr. presidente, visto v. exa. ter-me dado a palavra, cumpre-me em primeiro logar agradecer ao sr. ministro dos negocios estrangeiros a delicadeza e attenção que teve para commigo respondendo ás perguntas que outro dia lhe fiz.
Depois de ter cumprido este dever aproveito a occasião para mandar para a mesa duas representações da camara municipal de Santarem.
Uma adherindo ás representações que têem sido apresentadas n'esta casa com respeito á questão cerealifera.
Muito se tem dito a este respeito e ou não quero tomar o tempo á camara repetindo as considerações que ella já tantas vezes tem ouvido.
A outra pede á camara dos deputados que decida com a brevidade possivel a proposta apresentada ha tempo n'esta casa pelo exmo. sr. A. A. de Aguiar para a creação das escolas praticas de agricultura.
Tambem a este respeito se têem feito algumas considerações e em vista disso eu limito-me agora a apresental-a.
Peço a v. exa. consulte a camara sobre se permitte que estas representações sejam publicadas no Diario do governo, visto estarem em termos convenientes.
Consultada a camara, concedeu a publicação no Diario do governo.
O sr. Conde de Thomar: - Para tratar do assumpto, sobre o qual eu desejo chamar a attenção da camara, precisava da presença do sr. ministro dos negocios estrangeiros. Como s. exa. não está presente, e vejo o sr. ministro da fazenda, eu desejo saber se s. exa. se julga habilitado a dar-me os esclarecimentos de que necessito com respeito a um facto muito grave e importante, qual é o do roubo praticado no consulado portuguez do Rio de Janeiro.
Se s. exa. está habilitado a dar estes esclarecimentos á camara, eu formularei o meu pedido. Se s. exa. não está habilitado, eu peço a v. exa. me reserve a palavra para quando estiver presente o sr. ministro dos negocios estrangeiros.
O facto a que me refiro é grave e é preciso averiguar das accusações gravissimas que pesam sobre o nosso consul no Brazil, o sr. visconde de Wildick, que é um funccionario distincto e de elevadissimas qualidades.
O sr. Ministro da Fazenda (Hintze Ribeiro): - Sr. presidente, effectivamente como o illustre deputado muito bem conjecturou, o meu collega dos negocios estrangeiros poderá dar sobre este assumpto informações mais circumstanciadas do que eu ácerca do facto a que s. exa. se refere do roubo praticado no nosso consulado no Brazil.
Como esse negocio não corre pelo meu ministerio, mas sim pelo dos negocios estrangeiros, pois é para elle que têem vindo as participações a esse respeito, eu farei sciente o meu collega dos desejos do illustre deputado.
O que eu simplesmente posso dizer ao sr. conde de Thomar é que a ultima tabella que eu tenho é de dezembro, e n'essa tabella havia um saldo de duzentos e tantos contos.
Posteriormente não tenho elementos que me habilitem a dizer ao illustre deputado qual é d'esta somma a importancia que fosse envolvida no roubo. No entretanto, o meu collega dos estrangeiros quando vier á camara poderá dar ao illustre deputado as informações que s. exa. deseja.
Já que estou com a palavra aproveito a occasião para mandar para a mesa, por parte do meu collega o sr. presidente do conselho e ministro das obras publicas, um proposta do lei para ser convertido em definitivo, o contrato provisorio celebrado para a construcção de um molhe, entre a Pontinha e o Ilhéu na enseada do Funchal.
Esta proposta de lei vae no fim da sessão.
O sr. Guilherme de Abreu: - Sr. presidente, mando para a mesa uma representação dos officiaes de diligencias da comarca de Cabeceiras de Basto, pedindo uma providencia legislativa, que os auctorise a receber salarios pelas diligencias que fizerem no serviço de recrutamento.
Peço a v. exa. que se digne envial-a á commissão competente, e reservo os commentarios que sobre ella se me offerecem, para quando se discutir o parecer respectivo.
O sr. Luiz José Dias: - Mando para a mesa o seguinte requerimento:
(Leu.)
Como estou com a palavra, aproveito a occasião para me referir a um assumpto de grave importancia.
Recebi uma carta de um cavalheiro dos Arcos de Valle de Vez, em que se diz que a mesa da santa casa da misericordia daquelle concelho mandou proceder á construcção de um novo hospital, e apesar de estar tão sómente construída a terça parte do edificio, o provedor da santa casa resolveu fazer para ali a transferencia dos doentes, que se encontram no velho hospital. Essa terça parte do edificio está-se caiando e pintando a toda a pressa, tendo o mesmo provedor dado ordem para que esses trabalhos se concluam com a maxima brevidade, porque já designava o dia 19 do corrente mez para se fazer a mudança dos doentes e isso contra o parecer de quatro medicos, que fizeram uma exposição d'esse facto ás auctoridades superiores, e manda-

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ram uma copia do seu parecer ao delegado de saude, governador civil e ao sr. ministro do reino.
Como v. exa. e a camara vêem, este negocio é de summa gravidade, porque aquella parte do edificio não se acha em condições hygienicas proprias para se fazer já de prompto a transferencia de enfermos.
Portanto, entendo que é da maxima conveniencia, que o sr. ministro do reino dê promptas providencias para por cobro a factos que se me affiguram despoticos e até deshumanos! (Apoiados.) A simples exposição do facto, tal qual aquelle cavalheiro me faz na carta que acabo de receber, é sufficiente para se deprehender a gravidade do assumpto. Desejava communicar este facto aos meus illustres collegas representantes d'aquelle circulo, mas como os não vejo presentes, aproveitei a occasião de estar com a palavra para fazer esta exposição á camara e pedir ao sr. ministro da fazenda, que se digne communical-a ao seu collega do reino a fim de que s. exa. urgentemente, e pelo telegrapho, dá promptas providencias a este respeito.
Tenho dito.
O sr. Ministro da Fazenda (Hintze Ribeiro): - Digo ao illustre deputado, que communicarei ao meu collega as considerações, que s. exa. acaba de fazer.
O sr. Santos Viegas: - Pedia a v. exa. que se dignasse consultar a camara a fim de ver se permittia que entrasse desde já em discussão o projecto n.º 22, que está dado para ordem do dia e que se refere á organisação da escola medico-cirurgica do Funchal.
Consultada a camara, resolveu affirmativamente.
Leu-se na mesa o projecto.
É o seguinte:

PROJECTO DE LEI N.º 22

Senhores. - Não é justo que os professores, cathedraticos e ajudante, da escola medico-cirurgica do Funchal, sejam menos remunerados do que são os professores proprietarios e substitutos dos lyceus centraes. Tão pouco o é que professores seus com os titulos dos actuaes, todos tres filhos da universidade de Coimbra, e por ella condecorados com as mais elevadas honras academicas, estejam inhibidos de assegurar a sua posição, por muitos annos que sirvam provisoriamente o seu magisterio. Portanto, apesar de termos preferido dar o nosso parecer sobre um projecto de reforma completa da escola medico-cirurgica do Funchal, não hesitamos, de accordo com o governo, em recommendar á vossa attenção o seguinte projecto de lei

Artigo 1.º Os actuaes membros provisórios do corpo docente da escola medico-cirurgica do Funchal serão nomeados vitalicios, sem exame, logo que provem seis annos de effectivo serviço.
Art. 2.º É equiparado o ordenado de professor cathedratico d'esta escola ao de professor proprietario dos lyceus centraes; e o ordenado do professor ajudante d'ella ao de professor substituto dos mesmos lyceus.
Art. 3.º Fica revogada a legislação em contrario.
Sala da commissão de instrucção superior, 3 de março de 1885. = Mariano de Carvalho = Adriano Xavier Lopes Vieira = Avelino Cesar Augusto Calixto = Francisco A. Correia Barata = João J. d'Antas Souto Rodrigues = Ignacio Francisco Silveira da Mota = José Elias Garcia = Dr. Bernardino Machado, relator.

Na parte em que é chamada a dar o seu parecer, a commissão de fazenda, de accordo com o governo, não tem que oppor ao projecto da illustre commissão de instrucção superior.
Sala da commissão, 9 de março de 1885. = Marçal Pacheco = A. C. Ferreira de Mesquita = Adolpho Pimentel = L. Cordeiro = Augusto Poppe = Lopes Navarro = José Maria dos Santos = Antonio Maria Pereira Carrilho = Pedro Roberto Dias da Silva = Antonio de Sousa Pinto de Magalhães = Francisco A. Correia Barata, relator.

N.º 6-P

Senhores. - Tendo a lei de 2 de setembro de 1869 suspendido a nomeação de professores effectivos, tanto para os lyceus como para a escola medico-cirurgica do Funchal; e tendo a lei da 14 de junho de 1880 occorrido tão sómente ao provimento definitivo dos professores de instrucção secundaria; e não sendo de equidade a desigualdade em que, desde então, se acham com os professores do lyceu os d'aquella escola; propomos o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.º Aos actuaes professores provisorios da escola medico-cirurgica do Funchal, nas condições do artigo 75.º da lei de 14 de junho de 1880, é extensiva a disposição d'esse artigo; e, para os effeitos da tabella n.º 1 da mesma lei, são equiparados os professores d'aquella escola aos dos lyceus centraes, e o ajudante demonstrador d'ella aos professores substitutos d'estes lyceus.
Art. 2.º Fica revogada toda a legislação em contrario.
Sala da camara dos deputados, 26 de janeiro de 1885. = Francisco Augusto Correia Barata = José de Azevedo Castello Branco = Luiz Ferreira de Figueiredo = Pedro Maria Gonçalves de Freitas = Henrique Sant'Anna Vasconcellos = Antonio Freire Garcia Lobo.
Foi approvado.

ORDEM DO DIA

Continua a discussão do projecto de lei n.º 19 que auctorisa a reorganisação dos serviços aduaneiros

O sr. Francisco Beirão: - Vou reatar o fio das considerações que hoje tenho a fazer, precisamente ao ponto, em que, hontem, deixei as que tive a honra de apresentar á camara.
Submetti algumas propostas á deliberação parlamentar, e tratei de fundamentar, as primeiras dellas, como soube e como poude. Resta-me, apenas, fundamentar as duas ultimas, o que passo a fazer.
Tratarei de ser o mais breve possivel, fazendo o menor numero de considerações, a respeito d'estas duas ultimas propostas.
A penultima, de que vou occupar-me em primeiro logar, é uma proposta de substituição ao n.º 4.º do artigo 1.º, que tem por fim, principalmente, fazer com que o governo, fitando auctorisado a rever a legislação especial sobre os crimes por contrabando e descaminho de direitos, não possa, de modo algum, aggravar as penas actualmente existentes.
Permitta-me a camara que, antes de tudo, comece por notar mais uma novidade n'este projecto.
Tem havido, e verdade, algumas leis autorisando o governo a rever a legislação especial com respeito ás penas que devem ser impostas aos crimes de contrabando e de descaminho de direitos.
Houve a auctorisação da lei de 1864. E, se bem que com respeito só ao tabaco, houve a auctorisação de 1879.
Percorrendo, porem, estes diplomas, apparece sempre uma restricção, e é a de que a respectiva penalidade não poderá ser aggravada.
Era, pois, aquella clausula essencial de todas as auctorisações.
Hoje temos esta novidade. O governo fica auctorisado a modificar o nosso systema penal, podendo aggravar as penalidades que hão de ser impostas ao descaminho de direitos e ao contrabando!
Não póde deixar de se reconhecer que esta novidade foi introduzida no projecto com perfeito conhecimento de que o era contra os precedentes, pois, se houvesse duvidas a este respeito, eu poderia invocar o testemunho do proprio sr. ministro da fazenda, que, como fez parte de uma commissão especial composta de tres membros, nomeada pelo sr. Antonio de Serpa, em 1879, em virtude da auctorisação concedida ao governo pela lei do mesmo anno, para

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modificar a penalidade relativa ao descaminho e occultação de tabacos, sabe bem que o seu mandato não lhe permittia ir alem da que estava em vigor.
Vamos, pois, modificar e aggravar a penalidade sobre os crimes de contrabando e descaminhos de direitos. Examinemos as rasões que se allegam para isso.
O sr. ministro da fazenda diz, no seu relatorio que, as bases d'esta reforma em muito se conformam com as ponderações de uma commissão especial nomeada por s. exa. para estudar os melhoramentos necessarios no serviço da alfandega de Lisboa, no intuito do remediar inconvenientes que haviam sido indicados pela associação commercial d'esta cidade.
Deve-se crer que s. exa. acceitou n'esta parte as ponderações d'aquella illustrada commissão, constantes do parecer especial que ella proferiu.
Não encontrando, portanto, no relatorio do sr. ministro da fazenda, rasões sufficientes para fundamentar o aggravamento da penalidade, vejo-me forçado a referir-me a esse documento, que é official e está publicado no relatorio do sr. ministro da fazenda, d'este anno e sob o n.º 26.
Diz-se ahi que a associação commercial solicitara a attenção dos poderes publicos para o contrabando que se estava introduzindo pela raia secca, especialmente em tabaco e tecidos, pois se affirmava, note a camara, que nas povoações proxima da raia se encontravam em grande quantidade artigos introduzidos por contrabando, offerecidos, sem rebuço, mesmo nas povoações mais importantes e afastadas da fronteira, sendo tal a importancia, dos artigos estrangeiros importados pela raia, que, em alguns casos, os similava nacionaes ou estrangeiros entrados pelas alfandegas maritimas não encontravam consumo algum em certas povoações.
Qual é, porem, o meio de precaver este mal prejudicial, não sé aos interesses fiscaes, mas aos particulares, aliás muito legitimos e que eu respeito?
Dizia a associação commercial que vogava entre a classe commercial a opinião de ser a pouca severidade das penas incentivo para tal abuso.
Assim pareceu tambem á commissão; e tanto que sendo esse o primeiro assumpto que mais seriamente occupou a sua attenção, votou unanimemente, em uma das primeiras sessões, as bases de um severo regimen penal para os delictos de contrabando e descaminho, e concordou a final em solicitar do governo uma proposta de lei aggravando, no descaminho de direitos, a penalidade.
O principal fim do projecto é a aplicação da pena de prisão ao crime de descaminho de direitos, ao qual não era, até hoje, salvo com respeito ao tabaco, applicavel.
Mas o governo e o partido regenerador têem as suas opiniões compromettidas no sentido de que os crimes de modo algum se cerrigem com a severidade das penas, mas pelo contrario com a sua reducção e a sua proporcionalidade.
Eu não sei o que sejam penas brandas e penas severas. As penas devem ser proporcionaes aos delictos: nada mais e nada menos.
Mas qual é o documento em que o governo tem a sua opinião compromettida n'este sentido?
Eu o vou mostrar á camara.
O governo e a maioria regeneradora do anno passado approvaram uma importantissima reforma que modificou completamente o nosso systema penal.
Eu não fazia parte da camara, mas declaro que, respeitando muito a illustração de quem propoz essa reforma, e reconhecendo que n'esse trabalho se revelam grandes conhecimentos juridicos, se eu estivesse na camara tel-a-ia combatido com a minha palavra e com o meu voto.
Mas porque é que se fez a reforma do codigo penal? Porque é que o governo entendeu - e por isso n'esta parte está completamente compromettida a responsabilidade do sr. ministro da fazenda - que se devia fazer esta larga reforma penal?
Está escripto. É o principio do relatorio do sr. ministro da justiça de então.
«As penalidades exageradas escandalisam, como o crime, a consciencia publica, que se revolta indignada contra iodas as injustiças, ou ellas provenham da violação da lei, ou do seu cumprimento e observancia, e influem, por consequencia, tanto mais na impunidade, quanto produzem no espirito do jurado a superior ingressão sempre resultante do facto actual (a imposição da pena excessiva} em relação á cansada por um facto passado, e não presenciado pelo jury (o crime). O jury quando profere o seu veredictum não ousa desaggravar em conformidade com a lei a socioedade affendidade, sem que a desaffronta se lhe afigure cruel e iniqua pela sua deshumanidade ou pela notavel desproporção com a gravidade da offensa...
«O nosso codigo penal é severo e por vezes draconiano...»
A illustrada commissão de legislação que deu parecer a respeito d'esse projecto acceitou perfeitamente estas reflexões, e declarou tambem no seu relatorio:
«Não póde ter contestada a asserção que se encontra no relatorio do governo, guando nos diz que o nosso codigo penal é severo e por vezes draconiano.
«Todos, que têem pratica dos tribunaes, conhecem por experiencia propria, que as penalidades exageradas, longe de constituirem um remedio, são sempre a rasão determinativa da impunidade dos crimes.
«Quem reflectir nas disposições que se encontram em muitos artigos do nosso codigo penal, conhece facilmente que não só as penas aplicaveis em muitos casos são desiguaes em relação ás applicaveis a crimes da mesma natureza, mas são tambem por tal férma severas, que os jurados hesitam naturalmente em proferir um veredictum condemnatorio, porque á sua consciencia repugna a applicação de uma pena extraordinariamente grave para um delicto muito pequeno...
«Era conhecida a causa do mal e urgia prover-lhe de remedio, tanto mais que a causa era justa, porque a penalidade em muitos casos era excessiva.»
Taes são os principios do actual governo e do partido regenerador.
Sendo assim não fallarei já no parecer dado pela commissão especial, a proposito d'aquella representação dirigida pela associação commercial de Lisboa; mas como é que hoje, o mesmo governo, o mesmo partido, vem sustentar que, para reprimir os crimes e por isso para tornar menos frequentes os descaminho de direitos o de contrabando, é preciso tornar as penas mais severas?
É isto uma contradicção, que só algum dos illustres membros do partido regenerador me póde explicar.
Mas devo dizer a v. exa. que tanto no parecer da commissão aduaneira como no da de fazenda, não vejo senão meios para reprimir o descaminho de direitos e não o contrabando, e a camara sabe muito bem, de certo, que o crime de contrabando é completamente differente do de descaminho de direitos.
(Interrupção do sr. Pinto de Magalhães.)
Ora o illustre deputado, de certo que me faz a minima justiça suppondo e acreditando, que eu sei perfeitamente distinguir o contrabando do descaminho de direitos!
Tendo-se, pois, reclamado providencias contra o contrabando, aconselharam-se só contra o descaminho de direitos.
Diz a commissão aduaneira:
«por ser esse crime um rigoroso furto.»
Ora realmente eu não comprehendo que se possa equiparar o crime de descaminho de direitos ao furto.
«com as circumstancias aggravantes de se riolarem preceitos economicos e fiscaes e de se produzirem graves prejuizos...?
Pois isto será proventura uma circumstancia aggravante

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no crime de descaminho de direitos? Pois não é esta condição essencial da existencia de tal crime? Pois podo haver crime de descaminho de direitos, som que haja violaclo de preceitos economicos e fiseaes, e sem haver prejuizos causados?
E querem n'este caso aggravar a pena com uma circumstancia aggravante?!
Antigamente havia circumstancias aggravantes indeterminadas, o jury tinha perfeita liberdade para considerar esta ou aquella circumstancia, como uma circumstancia aggravante, mas isso acabou, e o artigo n.º 24.º da reforma penal diz, e muito bem, que são só consideradas circumstancias aggravantes, taes e taes.
(Leu.)
Eu precorro todo aquelle artigo e não vejo lá, que violar os preceitos da legislação alfandegaria, causando prejuizos ao fisco e ao commercio, seja uma circumstancia aggravante.
Mas ha n'este assumpto um ponto que julgo de extrema importancia.
Note a camara que o parlamento vae delegar de si o direito de estabelecer um novo regimen penal.
Nós vamos fazer uma cousa de que creio que ha um só exemplo na antiga legislação portugueza. Vamos fazer uma lei mental; e sabe a camara porque? Porque pela proposta que estamos discutindo, o governo fica auctorisado a augmentar a gravidade das penas. Mas como e para que? Responde o parecer da commissão que o pensamento do governo e que a pena de prisão sé em certos casos terá applicação».
De maneira que vamos auctorisar o governo a applicar penas segundo um systema que ainda está no pensamento do ministro, o qual ninguem sabe quem será! Uma verdadeira lei mental, repito.
Mas esta questão da influencia da severidade das penas na criminalidade, está estudada ha muito tempo.
Hoje já não se sustenta que,, para diminuirem os crimes, seja necessario tornar mais severas as penas.
Desde que se publicou um pequeno livro que fez uma grande revolução - refiro-me ao tratado das penalidades e delictos de Becearia - é geral, senão unanime a opinião de que a multiplicidade dos crimes é devida, não á brandura das penas, mas á impunidade.
O que faz com que o contrabando se multiplique, não é a brandura das penas é a impunidade do contrabando e do descaminho. Mas esta é a opinião da propria associação commercial, da illustre commissão de fazenda e do ministro.
A associação diz que os artigos introduzidos por contrabando eram offerecidos sem rebuço, note a camara. Logo, onde estava a fiscalisação? E, como se procurava reprimir estes, crimes?
A commissão de fazenda queixa-se da falta de fiscalisação, e d'ella se queixa o sr. ministro da fazenda.
É elle mesmo que confessa, tambem no seu relatorio, o estado desgraçado em que está a fiscalisação.
O illustre relator da commissão sabe que a parte da fiscalisação que talvez seja mais repressiva é a que diz respeito ao tabaco.
Pergunto a s. exa. se não sabe que o rendimento do tabaco tem diminuido em Lisboa, se bem tenha augmentado no Porto? Mas mesmo não tanto que o saldo final contra o estado não seja negativo; 82:000$000 réis, creio.
Isto prova, e diz muito bem o sr. ministro da fazenda, contra a fiscalisação; mas não prova contra a actual penalidade.
As penas o que devem ser é proporcionaes e analogas, e a sua applicação prompta, efficaz, inevitavel. A tudo isso visa a minha proposta. E para isto a apresento depois de a haver, ao que me parece, suficientemente fundamentado.
Resta a minha ultima proposta.
(Leu.)
Sustentou o sr. Luciano do Castro que este decreto era dictatorial e considerou-o assim, por isso que o producto de certos bens pertencentes á fazenda deve ser applicado para as obras da alfandega, e o governo não podia dar destino ao producto dos bens nacionaes sem auctorisação legislativa. O sr. ministro da fazenda entendeu no anno findo que devia vir ao parlamento pedir auctorisação para fazer esta despeza; o projecto de lei foi apresentado o anno passado e approvado pela camara dos deputados, e assim confessou o sr. ministro que era necessaria auctorisação legislativa para applicar o producto d'estes bens á despeza da alfandega de Lisboa; e depois o er. ministro entendeu que podia fazer a despeza sem auctorisação! É por isso que o sr. Luciano de Castro disse que era um acto de dictadura, e tinha rasão, considerando o acto do sr. ministro inconstitucionial.
Defendeu-se o sr. ministro, e quanto a mim, salva a questão de principios, procedenmente, mostrando a necessidade de proceder a estas obras.
Eu dou-lhe tanta rasão, que lhe voto, não a sua absolvição, porque se o absolvesse é porque reconhecia que não tinha havido infracção, mas concedo-lhe amnistia e, concedendo-a, até tenho uma certa satisfação. Se o poder executivo, tem arrogado a si as attribuições de poder legislativo, tornando-se o governo dictador, eu quero tambem fazer a minha dictadura, convertendo-me em poder moderador, e amnistio.
Estão, pois, justificadas as minhas propostas. E creio que a primeira de todas ellas não tem caracter politico; e quando fallo em politica emprego-a no sentido elevado d'esta palavra e por isso a maioria a póde, em consciencia, votar.
Resta-me responder a algumas considerações apresentadas pelo sr. ministro da fazenda, e para não me alongar muito procurarei comprehender, o que tenho a dizer, na resposta que vou dar á invocação que s. exa. fez, ao projecto de 1880.
S. exa., invocando esse projecto, entendeu talvez acobertar com um precedente o seu pedido de auctorisação. Ora muito perfunctoriamente vou mostrar a differença que ha entre o projecto de 1880 e o projecto de 1885.
O projecto de 1880 creava logares, alterava vencimentos e dava auctorisações ao governo. É verdade: vejamos, porem, em que termos tudo isto se fazia.
E, em primeiro logar, o projecto de 1880 tinha sido inspirado pelos principios da mais rigorosa economia.
Não só ali se não propunha augmento de despeza, mas havia ainda uma economia, reconhecida pelos corpos colegisladores, confessada pela opposição de então, pelo menos de 20:000$000 réis.
Mas ha mais alguma cousa ainda.
Não se augmentava por esse projecto a proporção entre as despesas que se faziam com a cobrança dos impostos indirecto e as respectivas receitas.
Diz o sr. ministro da fazenda no relatorio, - e com isto nos pretende consolar, - que entre nós é de 7 por cento a proporção entre a receita e a despeza da impostos indirectos cobrados pelas alfandegas e pela fiscalisação externa; mas que não nos devemos surprehender com isso, porque em França, essa proporção é de 10 por cento...
Observarei as exa. que, segundo o seu projecto, e acceitando a sua comparação entre a França e Portugal, em logar de 3 por cento a nosso favor, temos 3 por cento contra, na comparação de receita e despeza das contribuições indirectas.
Se recorrermos aos documentos officiaes da França, encontramos que n'aquelle paiz o rendimento das alfandegas é de francos 319.949:000 e a importancia das despezas que lhe correspondem são respectivamente de 31.475:500.
A proporção é effectivamente de 10 por cento, e foi esta circumstancia que determinou provavelmente a affirmação do sr. ministro da fazenda.
Mas s. exa. esqueceu um pequeno elemento n'este cal-

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cuto; é que, quando fez a comparação, tomou, ao que me parece, a respeito de Portugal, a receita e a despeza, não só das alfandegas, mas de todas; as contribuições indirectas; e tomou a respeito da França, só a receita e a despeza das alfandegas.
Ora, se s. exa. quer comparar estes dois termos, deve tornal-os; homogeneos, e portanto, deve acrescentar; ao que em França rendem e custam as alfandegas a receita e despeza das outras contribuições indirectas.
Se fizer isso o resultado será que o rendimento de todas as contribuições indirectas em França é 1.521.869:000 francos, e a despeza é de 67.992:401 francos.
A proporção, pois, é de 4,4 por cento.
Ora, nós vamos gastar 7 por cento, logo mais 3 por cento.
Ora, dizia eu, o projecto do governo progressista fazia economias; e assim era.
Primeiro que tudo devo dizer que o projecto do governo progressista creava logares, é verdade, mas como? Á custa de outros que suprimia, de maneira que se vinham a equilibrar.
Eu tenho o parecer da commissão de fazenda d'esse tempo; não quero gastar tempo á camara lendo-lhe trechos d'este parecer, mas tenho aqui uma nota que diz o seguinte: crearam-se 12 logares de terceiros verificadores; nas alfandegas de Lisboa e Porto, mas reduziram-se, os logares de 30 terceiros officiaes a 24 e 62 aspirantes a 56; total 12 logares reduzidos iguaes aos creados.
Crearam-se, nas alfandegas de 2.ª classe maritimas e de 1.ª classe da raia 6 logares do verificadores, mas diminuiram-se os aspirantes de 55 a 49.
Note mais a camara, que estes quadros não foram feitos com auctorisações que se dessem ao governo, eram fixados e votados pelo parlamento.
Quanto aos vencimentos, elles eram augmentados, mas esse augmento constava da proposta de lei, era o parlamento que os votava.
Eu leio ao sr. ministro o que a commissão dizia:
«Tambem é elevado o vencimento da reverificadores a réis 50$000 annuaes.
Esse augmento, porem, tinha as compensações que, em seguida, se mencionavam.
Elevava-se de 120$000 réis a 150$000 réis, o vencimento de certos aspirantes, mas reduzia-se o numero dos officiaes proporcionalmente.
Aqui está quanto aos quadros e vencimentos.
Quanto ás aposentações era o mesmo systema.
O ministerio tinha proposto a aposentação com 50 por cento do ordenado.
A commissão de fazenda, porem, elevou a 75 por cento e mais 2 1/2 por cento por cada anno alem dos vinte.
Eu tomo a responsabilidade d'essa elevação, como todos os meus collegas da commissão.
Nós elevámos a aposentação de 50 a 75 por cento.
A camara comprehende, facilmente, as rasões de humanidade que inspiraram a commissão a elevar esta verba, proposta pelo governo em obediencia só aos principios da justa e severa economia que o projecto dava.
Com esquadrilha de fiscalisação, cujo serviço passava a cargo do pessoal do ministerio da marinha, a economia foi calculada pela commissão de fazenda d'esta casa e pela commissão de fazenda da camara dos pares em 14:000$000 réis.
Eu direi logo o que eram estas economias na opinião da propria opposição.
E aqui chegámos ás auctorisações com que se quer argumentar; e vamos a ver quem é que as queria conceder mais amplas ao governo, e quem é que as rejeitou.
O governo como o sr. ministro da fazenda de confessou não tinha introduzido na sua proposta artigo nenhum para a auctorisação: nós é que temos a responsabilidade; nós na commissão de fazenda é que demos ao governo esta auctorisação.
Ora, para que era esta auctorisação?
Vamos comparal-a á do actual projecto.
Esta auctorisação era:
(Leu)
Porque é que nós faziamos isso?
Porque eram assumptos que só o governo podia resolver com vantagem, pelas rasões que aqui se dão;
São estas as duas primeiras e grandes auctorisações que davamos ao governo. A ultima, a mais importante auctorisação, era para que o governo reorganizasse a esquadrilha da fiscalisação, sendo feito este serviço pelos officiaes da armada, o que pareceu que era um pensamento de boa administração e de regularidade no serviço, resultando alem d'isso uma economia de 14:000$000 réis.
Mas o que se passou na camara quando se discutiu esta terrivel, esta tremenda auctorisação? Levantou-se logo o sr. Hintze Ribeiro, que foi o primeiro que encetou o debate. Tremeu a camara, e sobretudo a commissão de fazenda, naturalmente pelo receio que viessem accusal-a de violação dos principios constitucionaes. Pois não aconteceu isso. S. exa. limitou-se apenas a pedir que se fixasse bem qual era a posição em que ficava o director geral das alfandegas. Aqui está como s. exa. combateu o projecto.
Mas, ha mais.
Discutiram-se as auctorisações. Por parte da opposição levantou-se um illustre deputado regenerador da memoria d'esse tempo, e o que disse s. exa.? Que esse pensamento era de tal modo importante que não dava só a economia de 14:000$000 réis, mas de 16:000$000 réis.
Dizia, isto um official da armada, o sr. Gomes Barbosa, cuja competencia se não póde pôr em duvida.
O mais curioso é que a commissão de fazenda e o governo tiveram de luctar com a opposição, que, representada por outro de seus membros, queria dar-lhe uma, auctorisação mais lata e que a commissão não quiz acceitar.
Sabe a camara o que a opposição queria? Que o governo, no uso da auctorisação, podesse deixar de fazer economia, e foi preciso que o sr. Pereira de Miranda, relator do projecto, dissesse que a commissão não queria tanto e que se contentava com a auctorisação que pedia.
Aqui tem o sr. ministro da fazenda um precedente referido a largos traços.
Como se crearam logares novos estabeleceram-se disposições transitorias nos artigos 30.º, 31.º e 32.º, em que se determinava que esses logares, á maneira que vagassem, fossem providos pelos empregados, de maneira que não houvesse augmento de despeza.
Aqui está o precedente invocado pelo sr. ministro da fazenda.
Eu tenho combatido este projecto, e continuarei a batel-o, porque vejo n'elle uma manifestação de politica regeneradora, que reputo obnoxia e prejudicial ao paiz. É n'este campo que o combato.
O sr. ministro da fazenda, porem, quer collocar a questão n'um terreno em que nós não podemos acceitar.
S. exa. allega que a sua personalidade não póde ser obico a que se conceda esta auctorisação por isso que não tem feito politica partidaria e mesquinha na administração das alfandegas e que não deu motivo a suppor-se que seja capaz de exercer esta auctorisação de modo inconveniente aos interesses publicos.
Mas será o sr. Hintze quem ha de executar esta auctorisação?
Tem s. exa., ou algum de nós, a certeza de quem será o dia de ámanhã?
Não póde, não podemos; e discutindo não; alludimos nem a este nem a qualquer ministro.

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S. exa. declarou aqui, que não pede aos adversarios favor d'elles, nem teme censura.
Não tenho duvida nenhuma em fazer justiça a s. exa.; faço-a a todos, e principalmente aos meus adversarios.
S. exa. sabe as antigas relações que nos ligam; sabe, como homem particular, o respeito, a consideração e até a amisade de longos annos que lhe tributo, e se precisa do meu testemunho para lhe dar uma prova de que tem administrado tão convenientemente, quanto possivel, o serviço das alfandegas, dou-lh'a; confesso que tem sido bom administrador n'esta repartição: não é favor, póde acceital-a como justiça. Mas sou deputado e não tenho a certeza de que é s. exa. quem executa esta auctorisação que estamos discutindo, e ainda, tendo-a, negal-a-ia por ser contra os principios, e porque o ministerio me não inspira confiança politica.
Combato este projecto porque envolve a abdicação dos direitos e das prerogativas parlamentares (Apoiados.)
Combato-o ainda, porque, se se pretende que seja um expediente financeiro, uma providencia para supprir mais que sufficientemente o deficit, não o posso apreciar debaixo este aspecto, porque nem sei o que elle é, nem o que representa.
Repito, não discuto a questão de fazenda. As circumstancias economicas do paiz são graves; não occultarei que ao as reputo desesperadas para que, n'estas palavras, se não queira ver uma reserva para defeza de futura situação politica.
Mas quando vejo um homem da elevação intellectual do sr. Mariano de Carvalho fazer o quadro da nossa situação economica e social, pelo modo porque aqui o fez e ao outro parecia sentir-se-lhe na voz o dobre funebre da actual situação, quando vejo que as sombras do desanimo e o desalento, que, como as da noite obscurecem primeiro os vales humildes, e só depois as montanhas alterosas, chegam até aquelles espiritos elevados, julgo-me obrigado a, salvo o devido respeito, dizer ao governo, e ao parlamento, o que entendo ser o dever de cada um.
Para a solução da questão de fazenda, ao governo cumpre fazer proposição de leis desenvolvidas, e administrar bem; este é o dever indeclinavel e imprescriptivel do governo.
Ao parlamento cumpre, o discutir, approvar e fazer leis, é o seu direito.
Este projecto, porem, é a inversão de todos os principios e a confusão de todos os poderes, por isso voto contra elle. (Muitos apoiados.)
Vozes: - ?Muito bem, muito bem.
Foram lidas na mesa as seguintes

Propostas

Proponho que, alem da discussão e votação na generalidade do presente projecto, haja discussão e votação na especialidade, com respeito a cada um dos numeros do artigo 1.º e a cada uma das bases que fazem parte integrante do mesmo projecto.
Proponho que o governo seja convidado a fixar uma quantia que represente o maximo da despeza a fazer com as aposentações auctorisadas pelo projecto.
Proponho a substituição do n.º 2.º do artigo 1.º do projecto da commissão pelo numero correspondente da proposta do governo.
Proponho que os logares de chefes das repartições da administração geral das alfandegas e contribuições indirectas, de directores das alfandegas e de vogaes do conselho geral das alfandegas, que nos termos do projecto têem de ser exercidos por commissão, sejam equiparados em categoria a determinados logares do serviço das alfandegas, organisando-se os respectivos quadros de fórma que abranjam uns e outros, não se verificando a substituição da funccionarios, servindo em commissão fóra das correspondentes categorias.
Proponho ao n.º 4.º do artigo 1.º a substituição seguinte:
A rever a legislação repressiva dos crimes de contrabando e descaminho de direitos, graduando as penas actualmente em vigor, segundo as diversas circumstancias que nos mesmos crimes concorrerem e tornando a sua punição prompta e efficaz.
Proponho o additamento seguinte:
Artigo... É o governo relevado da responsabilidade que incorreu pela publicação do decreto de 9 de outubro de 1884. = Francisco Beirão.
Foram admittidas.

O sr. Lopes Navarro: - Requeiro a v. exa. consulte a camara se permitte que se prorogue a sessão até se votar o projecto que se está discutindo.
Consultada a camara, decidiu affirmativamente.
O sr. Alfredo Peixoto: - Sustentou e enviou para a mesa as seguintes:

Propostas

1.ª A camara entende que é digna de especial apreço a conta geral da administração financeira do estado na metropole na gerencia do 1883-1884, ultimamente distribuida. = Alfredo da Rocha Peixoto.

2.ª Proponho que a vantagem concedida no terceiro numero do artigo 1.º do projecto em discussão seja concedida ás viuvas, ás filhas e netas orphãs de mãe e pae menores de dezoito annos, aos filhos o netos orphãos de mãe e pae, menores de quatorze annos; na falta d'estes parentes, ás mães e avós viuvas.
Proponho que a carta do curso geral dos lyceus seja declarada habilitação indispensavel para a admissão ao concurso para o ingresso nos logares de todas as alfandegas, quatro annos depois da publicação do decreto da reforma de que se trata.
Proponho que no quarto numero do mesmo artigo seja expressamente declarado que a pena de prisão nunca possa ser substituida ou remida por dinheiro. = Alfredo da
Rocha Peixoto.
Foram admittidas.
(O discurso do sr. deputado será publicado quando o restituir.)

O sr. Secretario (Mouta e Vasconcellos): - A commissão de redacção não fez alteração alguma ao projecto n.º 22, que foi votado na sessão de hoje.
O sr. Pinto de Magalhães (relator): - Sr. presidente, pedi a palavra com o unico fim de mandar para a mesa duas propostas que são as seguintes.
(Leu.)
Uma d'ellas tem por fim fazer com que o governo possa incluir n'essa lei tres empregados addidos do extincto contrato do tabaco, e que pelo seu estado de saude não podem prestar serviço.
A outra é uma substituição á base 6.ª do projecto.
São as seguintes:

Propostas

1.ª Proponho que no n.º 2.º do artigo 1.º se acrescente depois das palavras «aduaneiros e fiscaes» «addidos?. = Pinto de Magalhães.

2.ª Substituição á 6.ª base: - São garantidos aos actuaes empregados da direcção geral das alfandegas os seus direitos e vencimentos; e do futuro poderão os empregados que não pertencerem ás alfandegas ou á fiscalisação externa o ser oppositores em concurso, aos logares respectivamente superiores das outras direcções geraes, exceptuando a de contabilidade. = Pinto de Magalhães.
Foram admittidas.

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O sr. Consiglieri Peedroso: - Sustentou a seguinte moção:

«A camara, considerando que a maneira como está formulada a proposta de lei, auctorisando o governo a reorganisar differentes serviços das alfandegas, é offensiva das suas prerogativas, por tornar impossivel a discussão na especialidade das bases que acompanham a referida proposta, resolve que o projecto em discussão volte á commissão respectiva, a fim de ser redigido conforme as verdadeiras praxes parlamentares, e passa á ordem do dia. = Z. Consiglieri Pedroso.»

Explicou as rasões por que não podia approvar o projecto.
A parte grave do projecto estava nas bases, e desde e momento em que não podia haver discussão na especialidade, illudiram-se as garantias da camara, por isso que se podia haver a discussão na generalidade.
A questão de fazenda discutil-a-ia, quando vier á discussão o orçamento, associando-se ás considerações apresentadas pelos srs. deputados da opposição, quando combateram o projecto pelo augmento de despeza que trazia. Alem d'isso o projecto contem um voto de confiança, e elle, orador, não dava votos de auctorisação ao governo, nem os daria aos seus proprios amigos.
A proposta foi admittida.
(O discurso do sr. deputado será publicado quando o restituir.)

O sr. Elvino de Brito (para um requerimento): - Como o projecto tem mais de um artigo, requeiro a v. exa. que antes de abrir a discussão sobre a especialidade, nos termos do artigo 138.º do requerimento sujeito á votação da camara a primeira proposta do sr. Beirão.
O sr. Presidente: - Tomo nota do requerimento do sr. deputado, para na occasião opportuna o pôr á votação.
O sr. Lopo Vaz (para um requerimento): - Peço a v. exa. que consulte a camara sobre se julga esta materia sufficientemente discutida.
Julgou-se discutida.
O sr. Presidente: - Devo declarar á camara que este projecto, e bases que d'elle fazem parte integrante, como eu declarei no acto da abertura do debate, tem uma só discussão.
O sr. Elvino de Brito: - Peço a palavra sobre o modo de propor.
Vozes: - Está-se votando.
O sr. Presidente: - Agora vou indicar á camara o modo como tenciono propor á votação o projecto e as propostas a elle offerecidas. Depois darei a palavra aos srs. deputados que a pedirem sobre a modo de propor.
Ha uma proposta do sr. Consiglieri Pedroso que importa um adiamento, e por isso tem de ser votada antes do projecto. Se for approvado, fica prejudicada a primeira parte da moção do sr. Beirão.
A proposta do sr. Consiglieri Pedroso, é para que o projecto vá á commissão e a do sr. Beirão é para que, depois de votada a generalidade, se abra discussão sobre a especialidade; por consequencia, se aquella for approvada esta fica prejudicada.
Estão sobre a mesa diversas emendas, additamentos e substituições. Se o projecto for approvado, consideram-se prejudicadas as substituições.
As emendas hão de se votar antes, e os additamentos depois do projecto. Este é o modo como a mesa entende que deve ter logar a votação.
O sr. Pinto de Magalhães (relator): - Declaro: v. exa. e á camara, por parte da commissão, que não posso acceitar as propostas mandadas para a mesa durante a discussão do projecto, excepto as que eu mandei.
O sr. Elvino de Brito: - Diz o artigo 138.º do nosso regimento que os projectos que contiverem mais de um artigo terão duas discussões. Imaginava portanto que o que tinha estado em discussão era a generalidade do projecto, e foi n'esta conformidade que fiz o meu requerimento.
Ora, como v. exa. acaba de dizer que logo desde o principio pozera em discussão a generalidade e especialidade do projecto, eu desejo que me diga qual é o artigo do regimento em que se fundou para assim proceder. (Apoiados.)
O sr. Presidente: - Eu declarei quando se abriu o debate, sem impugnação nem reclamação e em harmonia com a praxe constantemente seguida e sempre observada, que o projecto só tinha uma discussão; porque sempre que um projecto tem, alem do 1.º artigo, outro que diz - fica revogada a legislação em contrario - nunca costuma haver sobre elle mais do que uma discussão. Sempre assim se tem entendido o artigo 138.º do regimento. (Apoiados.)
O sr. Eduardo Coelho: - É contra o regimento. (Apoiados.)
(Susurro.)
O sr. Presidente: - Peço ordem. A mesa indicou o modo como tencionava propor o projecto e as propostas á votação, mas, como alguns srs. deputados se inscreveram sobre o modo de propor, vou dar-lhes a palavra.
Tem a palavra sobre o modo de propor o sr. Veiga Beirão.
Peço ordem.
O sr. Veiga Beirão (sobre o modo de propor): - Pedi a palavra sobre o modo de propor quando me pareceu ouvir dizer a v. exa., sr. presidente, que a primeira parte da minha primeira proposta importava um adiamento e ficava prejudicada com a votação da proposta do sr. Consiglieri Pedroso.
Parece-me que v. exa. labora n'um equivoco.
A minha proposta não tem nada de adiamento; ? para que, depois de haver uma discussão, como houve, e uma votação, como vae haver, sobre a generalidade do projecto, haja uma discussão e uma votação sobre a especialidade d'elle.
Diz v. exa., e eu respeito muito as suas opiniões, que logo de principio tinha posto em discussão a generalidade e a especialidade do projecto.
E eu sei que assim foi.
Mas, por maior que seja a consideração que tenho para com v. exa., e v. exa. sabe qual ella é, appello de v. exa. para a camara.
Insisto, portanto, na minha proposta.
Póde a camara entender que, apesar da declaração de v. exa., haja uma segunda discussão e uma segunda votação, e portanto a minha proposta, nos termos do regimento, deve ser submettida á deliberação da assembléa.
O sr. Presidente: - Nós vamos procedendo em harmonia com o regimento.
A mesa indicou o modo como tencionava propor á votação o projecto e as propostas.
Depois alguns srs. deputados pediram a palavra sobre o modo de propor.
Estão no seu direito.
Tudo isto é regular. O regimento permitte que se abra discussão sobre a classificação das propostas.
Desde que se abriu esta discussão e se apresentam duvidas sobre o modo de propor, eu não posso deixar de consultar a camara. (Apoiados.}
Fique certo o sr. Veiga Beirão de que, depois de dar a palavra aos srs. deputados que se inscreveram, hei de consultar a camara, uma vez que s. exa. se não conforma com o modo de propor que indiquei. (Vozes: - Muito bem.)
Tem a palavra sobre o modo de propor o sr. Eduardo Coelho.
O sr. Eduardo Coelho (sobre o modo de propor): - Escuso repetir os protestos da minha consideração para

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com v. exa., tanto pessoalmente, como pela auctoridade de que está revestido.
Estarei em equivoco, mas parece-me que a confrontação do projecto em discussão com o artigo do regimento invocado não é uma questão de interpretação, mas sim uma questão de saber ler. (Apoiados.)
Eu vejo no projecto:
«Artigo 1.º Fica o governo auctorisado, etc.»
E depois d'este artigo e respectivos numeros, vejo:
«Art. 2.º Fica revogada toda a legislação em contrario.»
Ou eu não sei ler, ou aqui ha dois artigos. (Apoiados.)
E se aqui não ha dois artigos, temos então de recorrer aquellas celebres palavras tabellioas: aonde digo: digo, digo que não digo.» (Riso.)
Isto não póde ser. É possivel que esteja em equivoco, repito; ouço alguns ápartes dos meus collegas, mas eu respondo a essa objecção com o seguinte: diz o artigo 138.º:
(Leu.)
Ha, pois, uma discussão na generalidade e na especialidade ao mesmo tempo, todas as vezes que o projecto de lei tem um só artigo.
Ora, eu pergunto se o artigo 2.º não é artigo? (Apoiados.)
Se v. exa. me demonstrar que aonde se diz: «fica revogada toda a legislação em contrario», não é artigo, n'esse caso é bem applicado o artigo 138.º do regimento.
(Interrupção.)
Perdoe-me v. exa.
N'esse caso era inutil o artigo 138.º; o que agora não quero discutir.
Desde o momento em que o sr. ministro da fazenda descobriu a mirifica theoria de reduzir os artigos dos seus projectos a um só, em logar do projecto ter cinco numeros podia ter seis, ficando assim incluido o artigo que diz «fica revogada a legislação em contrario», em qualquer numero, ou mesmo fazer-se um § unico para a hypothese, porque tanto vigor tinha essa disposição exarada em artigo como se o fôra em numero; e d'esta maneira a letra da lei ficava em harmonia com o artigo 138.º do regimento. Desde o momento que assim não acontece, é necessario haver uma violação do regimento para chegar á conclusão a que v. exa. e a maioria querem chegar, e fazer manter (Apoiados.)
Emfim, faca v. exa. e a camara o que houverem por melhor.
Eu lembro apenas que n'uma discussão aliás muito importante no parlamento francez ácerca da validade ou não validade da eleição de Blanqui, que foi defendida por Clemenceau, um deputado da maioria, tratando de refutar as opiniões de tão eminente homem politico, contestou o seu argumento principal, ou antes resumiu toda a argumentação dizendo-lhe que o escudo das minorias era o respeito pela lei.
Queria assim significar o deputado da maioria a Clemenceau, deputado da opposição, que fazia mal em tomar a defeza de uma eleição, que a lei prohibia.
Eu venho invocar o respeito pela lei, que é garantia das minorias. (Apoiados.)
Não me parece que seja importuno, pedindo a v. exa. e é maioria, que reflictam um pouco para que a nós, que representamos a opposição, não nos seja cerceada a faculdade de discutirmos este projecto na generalidade e especialidade, tanto mais quanto elle está redigido em harmonia com as disposições do regimento.
Se a maioria, na suas omnipotencia quizer proceder de outro modo, julgando melhor as suas doutrinas, nós temos o direito de protestar contra essa violencia, e darmos os nossos trabalhos por concluidos, e antes que o povo se encarregue de vir pôr escriptos n'esta casa. (Riso.) Riem-se? Tambem ha pouco se riram os illustres deputados quando um deputado da extrema esquerda, fallava na miséria de uma classe, que esta camara tinha obrigação de respeitar, e de defender os seus interesses.
Vozes: - Não se riam.
O Orador: - Eu digo a v. exa. n'esse caso, que folgo ter-me illudido, e retiro quaesquer palavras que possam parecer censura, mas peço licença para dizer á camara que não serão quaesquer manifestações capazes de impedir, que eu exprima as minhas opiniões, consoante os dictames do minha convicção. E tanto mais, que não digo uma palavra com intuito de offender a camara, ou pessoa alguma, mas tambem estou resolvido, no uso do meu direito, a não deixar de dizer aquillo que entender, que é conveniente aos interesses publicos, e que está nos limites do mandato, que recebi dos meus eleitores. Respeito a todos, mas ha differentes modos de apreciar as questões, e todos julgam proceder bem, o at? melhor, do que os adversarios.
Em conclusão: este projecto tem dois artigos. O artigo respectivo do regimento diz que sobre os projectos que tiverem dois artigos haverá uma discussão na generalidade e outra na especialidade. Agora faça a camara o que quizer, e a consciencia lhe dictar. (Apoiados.}
O sr. Presidente: - Parece-me que tudo se concilia propondo á votação da camara, primeiro a proposta do sr. Consiglieri Pedroso, que é um adiamento, e, consultando depois a camara, se essa proposta não for approvada, sobre a primeira parte da moção do sr. Beirão, visto que esta não só trata da discussão, mas tambem da votação. D'este modo fica satisfeito o requerimento do sr. Beirão, embora eu entenda que ambas as moções estão já prejudicadas com a votação da camara, que julgou a materia do projecto sufficientemente discutida.
Leu-se a proposta do sr. Consiglieri Pedroso.
Foi rejeitada.
O sr. Presidente: - Vae ler-se agora, para se votar, a primeira parte da proposta do sr. Beirão.
(Leu-se.)
O sr. E. Coelho: - Peço a palavra.
O sr. Presidente: - Se o sr. deputado pede a palavra sobre o modo de propor, não lh'a posso conceder porque já se fechou o debate.
O sr. E. Coelho: - E sobre o modo de votar.
O sr. Presidente: - N'esse caso tem v. exa. a palavra.
O sr. E. Coelho: - Peço a v. exa. que consulte a camara sobre se consente que, sobre essa proposta, haja votação nominal.
Consultada a camara, sobre o requerimento, votaram a favor 24 srs. deputados e contra 73.
Não houve, pois, o numero necessario de votos para haver uma resolução.
Seguidamente foi rejeitada a primeira parte da proposta do sr. Beirão.
O sr. Presidente: - Vae votar-se sobre as emendas apresentadas pela commissão.
Foram approvadas.
O sr. Presidente: - Vae ler-se o projecto e as bases n'elle indicadas, e, no caso d'elle ser approvado, consideram-se prejudicadas as substituições.
Posto á votação o projecto e as respectivas bases, foi approvado.
O sr. Carlos Lobo d'Avila: - Em vista da declaração eloquente feita pelo sr. relator da commissão, peço a v. exa. licença para retirar o meu additamento.
Foi retirado.
O sr. Alfredo Peixoto: - Requeiro a v. exa. que consulte a camara sobre se consente que retire as minhas propostas, excepto a que se refere á conta geral da administração financeira do estado na metropole, gerencia de 1883.
Foram retiradas as propostas a que o sr. deputado se referiu.

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754 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPURADOS

A proposta com referencia á conta geral da administração financeira ficou para segunda leitura.
Os additamentos do sr. Beirão foram rejeitados.
O sr. J. J. Alves: - Requeiro a v. exa. que mande ler os nomes dos cavalheiros que estavam ainda inscriptos para fallar sobre o projecto.
O sr. Presidente: - Vae ler-se a inscripção.
Estavam inscriptos sobre a ordem : contra, os srs. Simões Dias, Eduardo Coelho, Correia de Barres e Elvino de Brito; e a favor, os srs. Bernardino Machado e Joaquim José Alves. Sobre a materia: contra, o sr. Barros Gomes; e a favor, os srs. Seguier e Costa Pinto.
O sr. Presidente: - A ordem do dia para segunda feira é a continuação da que estava dada. e mais o projecto n.º 20.

Está levantada a sessão.

Eram seis horas e meia da tarde.

Proposta apresentada polo sr. ministro das obras publicas n'esta sessão

Proposta de lei n.º 23-A

Senhores. - Na sessão da camara dos senhores deputados de 17 de maio de 1884 foi approvada uma proposta de lei, pela qual ficava o governo auctorisado a adjudicar, precedendo concurso publico, as obras do porto do Funchal, segundo o projecto datado de 22 de fevereiro d'aquelle mesmo anno, apoiado pelo parecer da junta consultiva de obras publicas e minas, dado em consulta de 31 de março.
Esse projecto consistia na construcção de um molhe entre a Pontinha e o Ilhéu na enseada do Funchal, formando uma pequena doca de abrigo ou porto artificial de arca restricta.
A proposição de lei, que passára para a camara dos dignos pares, não chegou, por falta de tempo, a ser ali discutida.
Ficou, pois, o governo privado de auctorisação legal para levar a effeito tal melhoramento, no passo que os interesses da navegação e do commercio da ilha da Madeira, ameaçados por temida concorrencia, reclamavam instantemente a realisação d'aquellas obras.
N'estas circumstuncias, a providencia que mais efficaz se antolhava, dentro das faculdades constitucionaes do poder executivo, era a de aproveitar para o praso do concurso, que não devia ser inferior a noventa dias, o tempo que tinha de decorrer até que o assumpto podesse ser novamente tratado em côrtes; celebrando-se, quando o resultado do concurso o permittisse, um contrato provisorio, que seria logo submettido á approvação do parlamento.
Tal foi a medida adoptada pelo governo, em conformidade com o artigo 64.º do regulamento geral de contabilidade publica, no decreto de 20 de novembro ultimo, que poz em hasta publica a empreitada d'aquellas obras, com as condições que fazem parte do mesmo decreto, entre as quaes se lê a de ficar o contrato que se fizesse dependente da confirmação legislativa.
O concurso deu unia proposta que o governo julgou acceitavel, celebrando com os proponentes o contrato provisorio de 9 do corrente mez, para o qual tem a honra de pedir a vossa approvação na seguinte proposta de lei.
Artigo 1.º É approvado, para ser convertido em definitivo, o contrato provisorio celebrado em 9 de março de 1885, entre o governo e Frederic Combemale, Jules Michelou e Arthur Maury, para a construcção de um molhe entre a Pontinha e o Ilhéu na enseada do Funchal, formando uma pequena doca de abrigo ou porto artificial de area restricta, o qual contrato faz parte da presente lei.
Art. 2.º Fica revogada a legislação em contrario.
Ministerio das obras publicas, commercio e industria, em 14 de março de 1885. Antonio Maria de Fontes Pereira de Mello.

Termo de contrato provisorio para a construcção de uma doca de abrigo na enseada do Funchal

No dia 9 de março de 1885, no ministerio das obras publicas, commercio e industria, e gabinete do ministro, aonde vim eu Viriato Luiz Nogueira, secretario do mesmo ministerio, ahi se adiavam presentes: de uma parte o illmo. e exmo. sr. conselheiro d'estado Antonio Maria de Fontes Pereira de Mello, presidente do conselho de ministros, ministro e secretario d'estado dos negocios da guerra, interinamente encarregado dos negocios das obras publicas, commercio e industria, primeiro outorgante em nome do governo; e da outra parte, como segundos outorgantes, os srs. Frederic Combemale, Jules Michelon e Arthur Maury, assistindo tambem a este acto o exmo. sr. conselheiro distado João Baptista da Silva Ferrão de Carvalho Mártens, procurador geral da corôa e fazenda; e por elle exmo. ministro foi dito, na minha presença e na das testemunhas ao diante nomeadas, que, tendo o governo de Sua Magestade resolvido que fosse adjudicada a elles segundos outorgantes a empreitada geral da construcção de um molhe entre a Pontinha e o Ilhéu na enseada do Funchal, formando uma pequena doca de abrigo ou porto artificial de area restricta, pela somma total de 449:550$000 réis por elles offerecida no concurso que se effectuára n'este ministerio no dia 20 de fevereiro ultimo, nos termos do decreto de 20 de novembro de 1884 e das condições que o acompanham; tinha por isso elle exmo. ministro resolvido celebrar com os segundos outorgantes, nos termos do citado decreto e condições, o presente contrato, o qual na conformidade do artigo 15.º d'esse decreto, é considerado provisorio e dependente da approvação do poder legislativo. E por elles segundos outorgantes foi dito que acceitavam este contrato com aquella natureza de provisorio e nos termos que ficam indicados; declarando todos que se obrigavam a cumprir fielmente todas as condições d'este contrato, que são as seguintes:

CONDIÇÕES PARA A CONSTRUCÇÃO DE UM MOLDE ENTRE A PONTINHA E O ILHÉU NA ENSEADA DO FUNCHAL

FORMANDO UMA PEQUENA DOCA DE ABRIGO OU PORTO ARTIFICIAL DE AREA RESTRICTA

CAPITULO I

Indicações geraes - Systema de construcção

ARTIGO 1.º

Obras a construir

As obras a construir são um molhe ou quebramar entre a Pontinha e o Ilhéu com um caes do lado interior.

ARTIGO 2.º

Traçado em planta do molhe

O molhe será tratado segundo os desenhos do projecto definitivo, que os empreiteiros devem apresentar depois de approvados pelas estações competentes.

ARTIGO 3.º

Systema de construcção

O systema que deverá ser adoptado na construcção do molhe será o do chamado typo francez, de que, entre outros, são exemplares os molhes de Marselha, e consiste no emprego de enrocamentos de pedras naturaes de differentes categorias, defendidas da acção das vagas por blocos artificiaes de grande volume, que occuparão a zona de maior agitação das aguas, comprehendida entre o nivel de baixamar de aguas vivas e o plano que está de 8 a 10 metros abaixo.
A face interna do molhe será constituida por uma mu-

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ralha vertical construída com blocos artificiaes e coroada por um muro de caes que sustentará um pavimento de 5m,20 de largura proximamente, que assim ficará abordavel aos navios de maior lotação.
O pavimento d'este caes será protegido do lado exterior do porto por um muro de abrigo de 5m,6 de altura sobre o mesmo pavimento, proximamente, tendo na parte superior um outro pavimento guarnecido de um parapeito tambem do lado exterior, tendo-se em vista o typo geral do perfil transversal do molhe representado pela figura 2 do projecto datado do 22 de fevereiro de 1884.
As disposições e volume dos enrocamentos, fórma dos taludes, perfis dos muros de abrigo e de caes serão conforme os desenhos do projecto definitivo dos empreiteiros depois de approvado ou modificado pelas estações competentes.

CAPITULO II

Proveniencia e qualidade dos materiaes

ARTIGO 4.º

As terras que os empreiteiros precisarem para estabelecer os caminhos de serviço, estaleiros e officinas de construcção poderão ser extrahidas na localidade que os mesmos empreiteiros julgarem, mais conveniente, indemnisando, em conformidade das leis em vigor, os proprietarios dos terrenos.

ARTIGO 5.º

Madeiras

As madeiras de que os empreiteiros carecerem para a ponte de serviço ou para outras obras provisorias poderão vir da localidade que mais lhes convenha, comtanto que satisfaçam as precisas condições de segurança, segundo os diversos fins a que se destinam com approvação do fiscal do governo.

ARTIGO 6.º

Enrocamento, pedra de alvenaria e cantaria

A pedra natural para os enrocamentos da infrastructura poderá ser explorada nas pedreiras que os empreiteiros escolherem e indicarem no projecto definitivo que são obrigados a apresentar, ou em outras de não inferior qualidade, ficando em todo o caso a seu cargo o pagamento das expropriações e indemnisações aos proprietarios dos terrenos conforme as leis em vigor.
§ 1.º Todas as pedras serão duras e isentas de fendas ou lezins que possam fazer receiar a fractura e divisão das pedras na occasião da descarga ou depois d'ella.
§ 2.º Os empreiteiros poderão empregar nos differentes trabalhos do molhe o systema de construcção que mais conveniente julgarem, se previamente tiver sido approvado pelo governo, conservando, porem, toda a responsabilidade pela boa execução dos mesmos trabalhos.

ARTIGO 7.º

Pedra britada para beton

A pedra para britar será extrahida pelos empreiteiros do local que melhor lhes convier, com previa approvação do engenheiro fiscal, devendo ser dura, aspera e limpa de materias terrosas.
§ unico. O britamento deverá ser feito de modo que cada pedra possa passar em todos os sentidos em um annel de Om,06 de diametro e não passe em um annel de Om,02.

ARTIGO 8.º

Areia

A areia, para argamassa será explorada nas praias do litoral do sul da ilha da Madeira. Deverá ser pura e limpa de materias terrosas, de grão duro, devendo ter a grossura propria ao fim a que for destinada.
§ unico. Acontecendo haver difficuldade em obter a quantidade de areia necessaria das praias da ilha da Madeira, poderão os emprezarios empregar areia da ilha do Porto Santo, se esta areia for approvada pelo engenheiro fiscal.

ARTIGO 9.º

Cimento do Portland

O cimento de Portland poderá ser da melhor qualidade e o seu peso por metro cubico estar comprehendido entre os limites de 1:350 a 1:400 kilogrammas. Não deve ter granulações que se elevem a mais de 20 por cento do seu peso total quando passado por peneiro ou crivo de 961 malhas por centimetro quadrado. Se os residuos excederem este limite, juntar-se-ha uma quantidade de cimento proporcional á differença verificada.
§ 1.º O cimento será guardado na localidade dos trabalhos, em armazens bem seccos, construidos pelos empreiteiros para esse fim, com todas as divisões e accommodações necessarias para se extrahirem facilmente amostras para as experiencias que se julgarem convenientes para verificar a qualidade dos differentes lotes.
§ 2.º Não se applicará cimento algum no fabrico das argamassas sem ser previamente experimentado e o seu uso auctorisado pelos agentes do governo.
§ 3.º O cimento geralmente empregado será o de presa lenta, considerando-se o de presa rapida aquelle que, amassado com agua do mar e exposto a uma temperatura não superior a 15º, supportar sem depressão no fim de meia hora de immersão uma agulha de cabeça quadrada de 1 millimetro de lado e de um peso total de 300 grammas.
O cimento de presa rapida só será admittido para proteger provisoriamente as obras construidas com o cimento de presa lenta.
§ 4.º O cimento será experimentado puro ou misturado com areia:
1.º A areia empregada nas experiencias deve ser quanto possivel quartzosa, tendo passado por um crivo de 81 malhas e não podendo passar por outro de 199 malhas por centimetro quadrado;
2.º O cimento será bem misturado a secco com a areia, juntando-se lhe depois 10 por cento do seu peso de agua do mar, e fazendo-se os tijolos a experimentar em moldes, devendo apresentar na secção mais fraca 6,45 centimetros quadrados de superficie.
3.º Os tijolos serão, conservados em uma, atmosphera humida durante vinte e quatro horas e depois mergulhados em agua até ao momento em que for experimentada a sua resistencia á ruptura por tracção. As experiencias serão feitas pelos agentes do governo e por meio de apparelhos que lhes pertençam, prestando os empreiteiros gratuitamente todo o auxilio que lhes for requisitado.
4.º No estado de puro, o cimento que, immerso em agua salgada, fizer presa em menos de duas horas deve resistir sem se romper a um peso de 10 kilogrammas, por centimetro quadrado, e se não fizer presa senão de duas a cinco horas, a um peso de 12 kilogrammas por centimetro quadrado.
Depois de sete dias de fabrico e seis de immersão o cimento puro deve supportar 39 kilogrammas por centimetro quadrado.
Misturado com areia, na proporção de um de cimento por tres de areia, deve supportar, depois de vinte e oito dias de fabrico e vinte e sete de immersão, 10 kilogrammas por centimetro quadrado.
5.º O cimento que não satisfizer ás condições acima referidas será rejeitado, e os empreiteiros obrigados a removel-o dos armazens proximos das localidades das obras, nas quaes sómente se deve conservar os que estiverem nas condições estabelecidas, e se os empreiteiros não fizerem opportunamente a remoção, o engenheiro fiscal a mandará effectuar á custa dos empreiteiros.
§ 5.º As experiencias poderão ser repetidas tantas vezes quantas o engenheiro fiscal julgar conveniente, sendo todas as despezas por conta dos empreiteiros, com excepção dos apparelhos de verificação, que são fornecidos pelo

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ARTIGO 10.º

Cal

A cal empregada deverá ser pura e homogenea, podendo ser fabricada com a pedra calcarca da ilha do Porto Santo.
O modo de extincção será o conhecido pelo nome de extincção por immersão, que se deverá praticar regando a cal viva disposta em camadas de 0m,15 de espessura. Logo depois de regada será arrumada em pilhas, a fim de se facilitar a sua reducção a pó, estado no qual não deverá reter mais de 20 por 100 de seu peso de agua.
Os empreiteiros deverão conservar a cal em pó convenientemente abrigada em telheiros. Quando o emprego da cal tiver de ser demorado deverá ser coberta com lonas ou esteiras. Poderá tambem praticar-se o processo de immersão mergulhando em agua, durante alguns segundos, a cal viva encerrada em cestos de arame de ferro, lançando a depois em barricas ou paioes para ali se reduzir a pó.

CAPITULO III

Modo de execução das obras

ARTIGO 11.º

Terraplenagens, caminhos de serviço das pedreiras, officinas o estaleiros

As terraplenagens que os empreiteiros executarem para organisar os seus estaleiros e officinas de construcção e para estabelecer os caminhos de serviço das pedreiras, serão feitas com regularidade e solidez, especialmente quando possam ser utilmente aproveitados para a ulterior conservação e exploração das obras do porto.
§ 1.º O governo entregará aos empreiteiros para o estabelecimento dos estaleiros e officiaas, emquanto durarem as obras do porto, os terrenos occupados pela praça da Rainha, bateria das Fontes e forte da Pontinha.
§ 2.º Os estaleiros, pedreiras, officinas de construcção e caminhos de serviço, e o respectivo material fixo e circulante, ficarão sendo propriedade do estado.
§ 3.º Fica a cargo dos empreiteiros o pagamento das expropriações e indemnisações, em harmonia com as leis em vigor, relativas á construcção das vias de communicação com as pedreiras, cujo traçado e escolha fica ao arbitrio dos empreiteiros, devendo fazer parte do projecto definitivo que têem de apresentar.

ARTIGO 12.º

Transporte e descarga dos enrocamentos

Os enrocamentos de diversas categorias e os blocos artificiaes serão transportados em caminhos e pontes de serviço ou embarcações, e descarregados por meio de apparelhos fixos ou fluctuantes, comtanto que se realise a collocação dos enrocamentos e blocos conforme os perfis do projecto definitivo e approvado pelas estações competentes.
§ 1.º Se os empreiteiros o julgarem conveniente ou se o engenheiro fiscal o exigir, proteger-se-hão os enrocamentos em construcção, cobrindo-os temporariamente com enrocamentos de maior dimensão ou com blocos que depois serão removidos.
§ 2.º Os empreiteiros farão collocar todas as balizas e boias que os agentes do governo julgarem precisas para indicar as posições e limites dos enrocamentos de diversas categorias e dos blocos artificiaes, tomando as precauções necessarias para que estas marcas se não desloquem.
§ 3.º Os materiaes que por qualquer causa ficarem fóra das posições indicadas nos perfis approvados ou d'ellas forem deslocados, serão removidos por conta dos empreiteiros conforme as indicações do engenheiro fiscal.
§ 4.º As pedras naturaes ou os blocos que se fraccionarem, alterando assim as condições adoptadas, serão igualmente removidos pelos empreiteiros, segundo as indicações do engenheiro fiscal.
§ 5.º As pontes de serviço, barcaças e em geral todo o material fixo e circulante para a exploração das pedreiras, conducção e descarga dos enrocamentos, será fornecido pelos empreiteiros, devendo satisfazer convenientemente e com segurança ao fim a que é destinado, devendo os respectivos projectos ser previamente submettidos á approvação do governo.
§ 6.º Os empreiteiros são obrigados a prestar com a maior promptidão todos os esclarecimentos que ácerca da natureza dos materiaes e do seu emprego forem exigidos pelo engenheiro fiscal, devendo igualmente os mesmos empreiteiros acceitar e cumprir exactamente todas as indicações que em harmonia com estas prescripções lhes forem feitas pelo fiscal do governo.

ARTIGO 13.º

Fabrico das argamassas

As argamassas tanto ordinarias como de cimento de Portland terão as dozagens indicadas no projecto definitivo, devendo ser fabricadas pelos processos mais perfeitos nos apparelhos mais aperfeiçoados.
§ 1.º O engenheiro fiscal poderá exigir a substituição dos processos de fabrico se assim o entender conveniente, e no caso em que as experiencias locaes mostrem que os processos e apparelhos usados pelos empreiteiros não dão resultado satisfactorio, ou em harmonia com os outros processos conhecidos.
§ 2.º Todas as argamassas serão empregadas antes de terem feito presa.
As que endurecerem antes, serão rejeitadas e sem demora removidas da localidade do fabrico á custa dos empreiteiros.

ARTIGO 14.º

Fabrico de beton

A mistura da brita e da argamassa de cimento de Portland far-se-ha nos apparelhos modernamente usados e approvados pelo engenheiro fiscal, e segundo as dozagens indicadas no projecto definitivo.
§ unico. São applicaveis ao fabrico do beton as disposições dos §§ 1.º e 2.º do artigo antecedente.

ARTIGO 15.º

Construcção de blocos artificiaes

Os blocos serão fabricados com beton em moldes, de modo que fiquem com as dimensões adoptadas no projecto definitivo, devendo ter as ranhuras e cavidades precisas para alojar os ferros e cavilhas de suspensão, segundo o systema que tenha sido indicado no projecto definitivo.
§ 1.º Os blocos só serão separados das caixas moldes quando tiverem a consistencia necessaria que impeça a sua deformação.
§ 2.º Os blocos deverão permanecer, por via de regra, sessenta dias no estaleiro, e não poderão ser empregados sem que o engenheiro fiscal tenha reconhecido que elles adquiriram a dureza precisa para serem transportados e descarregados.

ARTIGO 16.º

Construcção do muro de abrigo

A construcção do muro de abrigo só será começada quando os enrocamentos de infrastructura tenham adquirido pelo recalque o sufficiente grau de estabilidade.
§ unico. O muro de abrigo será construido com as dimensões e fórmas indicadas nos perfis do projecto definitivo dos empreiteiros, depois de approvado.

ARTIGO 17.º

Construcção do muro vertical de blocos artificiaes e do muro do caes que o sobrepuja na parte interior do molhe

A construcção do muro vertical de blocos artificiaes que limita o molhe do lado interior deve acompanhar a descarga dos enrocamentos, de modo que a construcção geral do molhe se execute por camadas horisontaes em toda a sua extensão.
§ 1.º Este processo de construcção deve requerer tanto maior cautela quanto seriam para temer os effeitos da es-

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trangulação da vaga durante a construcção do molhe entre a extremidade da parte construida e qualquer dos flancos occupados pelas rochas da Pontinha ou do Ilhéu.
§ 2.º O muro do caes será construido conforme o perfil que for approvado no projecto definitivo, sendo a parte vista de cantaria apparelhada.

ARTIGO 18.º

Disposições geraes applicaveis a todas as obras

Os empreiteiros serão obrigados a fazer o fornecimento de materiaes em tempo opportuno para que os agentes do governo possam fazer os exames e experiencias necessarias sem que o andamento dos trabalhos fique prejudicado.
§ 1.º Os materiaes refugados serão removidos para longe do local da obra por conta dos empreiteiros dentro do praso fixado pelo engenheiro fiscal, e que em geral não deverá exceder de vinte e quatro horas.
§ 2.º Se os empreiteiros não effectuarem esta remoção apportunamente, o engenheiro fiscal mandará effectual-a pelo modo que lhe parecer mais conveniente, á custa dos empreiteiros.
§ 3.º Os empreiteiros serão multados na quantia de réis 10$000 por cada vez que deixem de cumprir as indicações do engenheiro fiscal nos prasos que lhes forem indicados, salvo no caso de força maior.

ARTIGO 19.º

Avarias

Os empreiteiros tomarão todas as precauções necessarias para evitar avarias de qualquer especie nas obras, não tendo aliás direito a indemnisação alguma, nem se admittindo casos do força maior, salvo o caso previsto no § unico do artigo 26.º

CAPITULO IV

Modo de avaliar as obras e pagamentos

ARTIGO 20.º

Plano de comparação

As cotas serão calculadas em relação a um plano de comparação, passando pelo zero hydrographico.
§ unico. O nivel medio das aguas do Oceano suppõe-se estar 1m,48 acima do zero hydrographico e será marcado em differentes pontos na localidade das obras.

ARTIGO 21.º

Avaliação dos enrocamentos de differentes categorias durante a execução das obras

Os enrocamentos de diversas categorias ser?o avaliados no decurso do trabalho ao metro cubico compacto, tomando-se conta dos pesos das pedras de cada categoria expressas em kilogrammas, dividindo-os pelo peso do metro cubico determinado de antemão por experiencias rigorosas.
§ 1.º As balanças para as pesagens serão fornecidas pelos empreiteiros, e verificadas pelo fiscal do governo, que poderá exigir a sua substituição se o entender conveniente.
§ 2.º As pesagens serão feitas tantas vezes quantas for, pelo engenheiro fiscal, julgado conveniente, procedendo se em caso de duvida as medições de volume que se julgarem necessarias, de modo que se realisem as condições do peso minimo e medio adoptadas no projecto definitivo para as pedras de cada categoria.
§ 3.º O peso medio dos enrocamentos transportados em barcaças será sempre avaliado por meio de tubos com escalas collocadas em cada embarcação, indicando o peso das cargas segundo o grau do calado de cada embarcação.
§ 4.º As pesadas das balanças ou as cargas das embarcações em que, por negligencia dos empreiteiros, forem misturadas pedras de diversas categorias, considerar-se-hão como pertencendo á categoria das pedras de menor peso.
§ 5.º Logo que os enrocamentos tiverem adquirido perfis regulares, far-se-hão medições rigorosas, deduzindo-se nos volumes calculados as fracções que representam os vasios, e que devem ser indicadas no projecto definitivo.
§ 6.º Os empreiteiros cumprirão todas as indicações do engenheiro fiscal, prestando todo o auxilio de que este carecer, quer para fazer as pesadas, quer para se executarem as medições, sondagens e nivelamentos, etc., devendo assistir a estas operações ou fazer-se representar por delegado seu.
§ 7.º Os blocos artificiaes serão veerificados um por um, devendo ter as dimensões marcadas no projecto definitivo.
§ 8.º Não serão avaliados os enrocamentos ou os blocos que estiverem fóra das posições indicadas nos perfis, nem os blocos que se tiverem fracturado, sendo os empreiteiros obrigados a removel-os se o engenheiro fiscal o julgar conveniente.

ARTIGO 22.º

Avaliação do paramento interior do molhe, muro de caes e muro da abrigo

Estas obras serão avaliadas pelos processos ordinarios, devendo realisar exactamente as dimensões e disposições dos perfis do projecto definitivo.
§ unico. Os empreiteiros serão obrigados a reparar qualquer avaria que occorra durante a construcção, seja qual for a sua causa, sem que tenham direito a indemnisação alguma, salvo o caso previsto no § unico do artigo 26.º

ARTIGO 23.º

Avaliação das obras auxiliares de construcção dos molhes expropriações, indemnisações, etc.

Os caminhos, pontes de serviço e em geral as obras auxiliares da construcção dos molhes serão avaliadas pelo engenheiro fiscal e seus delegados, procedendo ás medições necessarias e examinando os documentos de despeza que os empreiteiros deverão apresentar, fornecendo igualmente todos os esclarecimentos que lhes forem exigidos.
§ unico. As expropriações e indemnisações serão avaliadas em vista dos respectivos documentos de despezas e processos respectivos segundo as leis em vigor.

ARTIGO 24.º

Avaliação definitiva para ajuste de contas da empreitada

A avaliação definitiva para o ajuste de contas da empreitada depois da conclusão da obra, far-se-ha por meio de medições referidas ao plano de comparação indicado no artigo 20.º
§ unico. Verificando-se que as obras estão executadas segundo as condições do projecto, os empreiteiros terão direito a receber o valor contratado com a deducção indicada no artigo 25.º, a qual ficará retida até ao fim do praso de garantia.

ARTIGO 25.º

Pagamentos

Os pagamentos serão regulados pelas disposições dos artigos 21.º a 24.º d'este capitulo, e pelas clausulas e condições geraes para arrematações de empreitadas de 8 de março de 1861, que assim ficam fazendo parte integrante d'estas condições.

ARTIGO 26.º

Praso de garantia

É fixado em tres annos o praso de garantia contado depois do dia da recepção provisoria. Se antes de terminado este praso se manifestar ruina em qualquer parte da construcção, terá o governo direito de mandar proceder ás necessarias reparações por conta do deposito definitivo e do valor dos decimos retidos.
§ unico. Exceptua-se o caso de ruina causada em qualquer parte da obra por effeito de operação de guerra.

ARTIGO 27.º

As expropriações indicadas no artigo 23.º d'estas condições serão feitas e pagas pelos empreiteiros, ficando os respectivos predios propriedade do estado.
As indemnisações, devidas pela, occupação provisoria de

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quaesquer terrenos ficam tambem a cargo dos empreiteiros.

ARTIGO 28.º

Os empreiteiros obrigam-se a tomar sob sua responsabilidade todas as medidas de precaução, de ordem e de segurança proprias para evitar accidentes, tanto com relação aos seus operarios como ao publico, e conformar-se-hão com as disposições das leis e regulamentos em vigor, e com as instrucções que o engenheiro do governo lhes der a este respeito.
§ unico. Todas as despezas de guardas, illuminação e quaesquer outras precisas para a completa execução do disposto n'este artigo ficarão a cargo dos empreiteiros.

ARTIGO 29.º

Os trabalhos preliminares para construcção do molhe entre a Pontinha e o Ilhéu (estabelecimento de officinas, construcção de vias de communicação com as pedreiras, transporte e installação do apparelhos diversos) deverão começar dentro do praso de tres mezes, a contar da data da assignatura do contrato da empreitada. Os trabalhos de construcção propriamente dita deverão começar dentro do praso de um anno a contar da data da assignatura do contrato de empreitada, e deverão estar concluidos no praso de quatro annos a contar da mesma data.
§ 1.º Se os trabalhos preliminares ou de construcção não começarem nos prasos acima indicados perderão os empreiteiros o deposito que tiverem effectuado e será rescindido o contrato.
§ 2.º O praso de execução das obras poderá ser prorogado a requerimento dos empreiteiros ou por indicação de engenheiro fiscal se for reconhecida a necessidade de esperar que os enrocamentos tenham adquirido maior grau de estabilidade para se ultimar a obra.
§ 3.º Não se dando o caso previsto no § 2.º d'este artigo e não estando os trabalhos concluidos no praso marcado, pagarão os empreiteiros pela móra de cada mez a multa de 1:000$000 réis.

ARTIGO 30.º

O deposito provisorio de 9:000$000 réis effectuado pelos empreiteiros, á ordem do governo, na caixa geral de depositos, servirá de caução a este contrato provisorio, o qual fica dependente da approvação do poder legislativo.

ARTIGO 31.º

Obtida a approvação do poder legislativo e dentro de quinze dias; contados da publicação da respectiva lei no Diario ao governo, se apresentarão os empreiteiros n'este ministerio das obras publicas, commercio e industria, a fim de assignarem o contrato definitivo; devendo previamente elevar o deposito a 5 por cento do preço total indicado na sua proposta, a que este contrato se refere; preço que é de 449:550$000 réis, como acima fica dito. Este deposito poderá ser feito em dinheiro ou em titulos de divida publica portngueza, segundo o seu valor no mercado, e ficará, á ordem do governo, servindo de caução ao contrato definitivo.

ARTIGO 32.º

Se os empreiteiros não satisfizerem ao disposto no artigo antecedente, perderão para o estado o deposito effectuado.
E com as condições acima exaradas deram os outorgantes por feito e concluido o presente termo de contrato, ao qual assistiram como testemunhas presentes o segundo official da repartição central d'este ministerio Francisco José Guedes Vilhegas de Quinhones e o amanuense da mesma repartição Luiz Antonio Namorado. - E eu, Viriato Luiz Nogueira, secretario do ministerio das obras publicas, commercio e industria, em firmeza de tudo e para constar aonde convier, fiz escrever, rubriquei e vou subscrever o presente termo de contrato, que vão assignar commigo os outorgantes e mais pessoas já nomeadas, depois de lhes ter sido por mim lido. = Antonio Maria de Fontes Pereira de Mello = F. Combemale = J. Michelon = A. Maury. = Fui presente, João Baptista da Silva Ferrão de Carvalho Mártens = Francisco José Guedes Vilhegas de Quinhones = Luiz Antonio Namorado = Viriato Luiz Nogueira.
Acham-se devidamente inutilisadas neste logar duas estampilhas do imposto do sêllo no valor total de 2$400 réis.

Rectificação

Na sessão de 10 do corrente, logo depois do expediente, na segunda columna de pagina 686 d'este Diario, faltou mencionar que teve segunda leitura uma proposta do sr. Guilherme do Abreu, apresentada na sessão anterior.

Esta proposta é a seguinte:
Proponho que o inquerito votado pela camara na sessão de 6 do corrente, se amplie a todos os ramos da industria agricola. = Guilherme Augusto Pereira de Carvalho e Abreu.
Foi admittida e approvada.
Ha de ser remettida á commissão especial de inquerito, quando for nomeada.

Redactor = Rodrigues Cordeiro.

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