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FALTA TEXTO
Discurso do sr. deputado Frederico Laranjo, pronunciado nas sessões de 5 e 7 de março e que deve ler-se a pag. 698, col 2.º e pag. 713, col l.
O sr. Laranjo (Na sessão de 5. de março): — o Sr. presidente, o illustre deputado, que acaba de fallar, começou dizendo que era necessario levantar a questão que nos occupa de umas pequenezas em que tem andado envolvida, e que era necessario tratar por uma vez dos principios geraes, do methodo pelo qual se deve colonisar!
Parece me que as pequenezas em que a questão tem andado envolvida, ha opinião de s. ex.ª, têem sido as discussões ácerca da legalidade da concessão.!
Não concordo com, este modo do pensar do illustre deputado.
Parece-me que, a discussão sobre se nina concessão foi ou não legal não póde ser qualificada de pequena. (Apoiados.)
E, se não póde sei assim qualificada uma discussão d'esta natureza, quando a concessão a que ella se refere é pouco importante, com muito maior rasão não pôde ser qualificada d'esse modo a discussão quando a concessão é grande, é vastissima. (Apoiados.)..
Não póde considerar-se pequena á discussão da legalidade de um decreto, que faz concessões, por, mais pequenas que estas sejam, porque, não posso de maneira alguma conceder que se confunda a divisão dos poderes, que segundo a carta constitucional e segundo todos, os publicistas, é a garantia da liberdade do povo. (Apoiados.): com effeito, se nós consentirmos que o poder executivo seja alguma cousa mais do que o executor das leis, se nós consentirmos que elle as contrarie, onde estão então as raias entre o poder executivos o poder legislativo?
Não é isto porventura dar ao poder executivo o direito de legislar? (Apoiados.)
Com relação a essa legalidade do decreto, e para o defender, disse o illustre deputado que o governo, no decreto que fez a concessão, se referira a todas as leis que têem relação com concessões d'esta natureza, e pretendeu concluir d'isto que todas às leis tinham sido rigorosamente applicadas.
Parece-me que este modo de argumentar não e regular, nem legitimo.
Strauss affirmava que os factos narrados nos Evangelhos tinham sido formados por um processo, que, para se comprehender, exemplifico:
Havia na bíblia uma prophecia que, dizia que o Messias havia de nascer em Belem; os evangelistas, segundo Strauss, disseram: ora Jesus é o Messias, logo Jesus nasceu em Belem.
Os illustres deputados que têem defendidos legalidade fazem raciocinio identico; dizem: Ha leis que regulam as
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concessões de minas, terrenos e florestas no ultramar; este decreto é sobre taes concessões, logo este decreto applicou essas leis.
Mas não se póde argumentar assim; é preciso confrontar as disposições do decreto com as disposições das leis e. ver se estão ou não de accordo; o fazendo tal confronto vê-se que não foram cumpridas. As leis são pelo regimen da liberdade, o decreto é pelo regimen do monopolio. Não póde haver, não ha harmonia entre uma e outra cousa.
O illustre deputado que me precedeu fallou das boas intenções, dos srs. ministros; mas não se trata só d'isso; a questão é primeiramente objectiva, é primeiramente de confronto com as leis, e só depois de assim estudada é que se podem investigar e avaliar intenções.
Passando da, questão da legalidade a uma questão que s. ex.ª julgou de muito maior importancia, a questão do methodo de colonisação, o sr. Osorio de Vasconcellos censurou completamente o governo. O que disse s. ex.ª a este respeito?
Disse que durante muitos annos colonisamos por meio do monopolio, citou as capitanias do Brazil e affirmou que de tudo isso tinhamos tirado tristes resultados. Disse s. ex.ª que o melhor privilegio era a ausencia de privilegio.
Sob o ponto de vista economico, que, segundo s. ex.ª, é o mais importante, é pois s. ex.ª completamente contrario ao governo, (Apoiados.) e eu estou em absoluta conformidade com o modo de sentir e de pensar de s. ex.ª, e folgo que o illustre deputado ainda hoje hasteasse á bandeira da liberdade.
Apesar de julgar que a questão da legalidade não é pequena, eu vou principalmente tratar da questão sob o aspecto economico e politico, ainda que a opposiçâo não deva deixar escapar a questão do campo da legalidade, porque é necessario obrigar o ministerio a declarar que commetteu uma infracção a lei, da mesma maneira que o sr. ministro da fazenda se viu aqui obrigado a declarar outro dia que tinha infringido a lei. E s. ex.ª não corou fazendo esta declaração; taes declarações já não custam ao ministerio. (Apoiados.)
Todas as vezes que a opposiçâo tem atacado o decreto pelo lado da legalidade, o governo e os seus adeptos pretendem demonstrar que o decreto, é uma providencia economica. Analysemos pois esta providencia economica.
Eu penso que se o decreto é illegal, é tambem inconvenientissimo economica e politicamente. Eu penso, e toda a opposiçâo seguindo o parecer da junta consultiva do ultramar, que o decreto das concessões, collocando uma provinda, quasi inteira nas. mãos, de um individuo, é impolitico e perigoso. (Apoiados.)
E cito a opinião da junta, porque apesar do discurso que hontem fez o sr. visconde da Arriaga, a quem eu prestei a attenção que merece quem esteve durante tantos annos nas regiões africanas, quem traz uma grande copia de factos e quem os expõe á camara, embora a sua palavra não seja academica, nem rhetorica, apesar d'isso, eu continuo a estar convencido de que a opinião da junta consultiva do ultramar é completamente contraria ás concessões feitas pelo governo. Com effeito vejamos a consulta.
Diz a consulta que se podiam conceder as minas pertencentes ao estado; mas não todas; qualquer dellas; e isto só no caso de se organisar uma companhia seria. E o que fez o governo?
O governo, antes de organisar a companhia seria, concedeu, não só qualquer d'estas minas, mas todas ellas; e não só todas as minas pertencentes ao estado, mas até as que não pertencem ao estado. (Apoiados.)
Em segundo logar...
(Interrupção do sr. visconde da Arriaga, que não se ouviu na mesa dos tachygraphos.)
1 (O orador entrega a constata da junta consultiva do ultramar ao sr. deputado que o interrompeu.)
O sr. Presidente: — Peço ao sr. visconde da Arriaga que não interrompa o orador.
O Orador: — Deixe v. ex.ª ler. Desde o momento em que se nega que eu leia como está na consulta, estimo que o sr. deputado verifique que li o que lá está.
O sr. Visconde da Arriaga (restituindo a consulta): — Leia tudo, não leia só o que lhe faz conta.
O Orador: — Se o sr. deputado pede que eu leia tudo, e não leia só as conclusões, é porque acontece na consulta o mesmo que aconteceu no seu discurso; estabeleceu umas premissas e tirou outras conclusões. (Riso.)
Se não é assim, para que quer que eu leia tudo?
Eu affirmava que a junta, consultiva do ultramar tinha dito, que se o sr. Paiva de Andrada organisasse uma companhia seria, poderia fazer-lhe a concessão das minas conhecidas e exploradas; e o decreto, ainda antes de organisada a companhia seria, concedeu lhe, não só qualquer das minas conhecidas e não exploradas, mas todas, e alem dessas, muitas ainda das que não eram conhecidas nem exploradas.
Em segundo logar, a consulta diz: Que o governo não deve conceder 100:000 hectares de terrenos»; o decreto concede 100:000 hectares de terrenos.
A consulta diz: «Que o governo não deve conceder o privilegio exclusivo por vinte annos para a exploração das minas», e o decreto concede-o por vinte annos para as minas que não são do estado, perpetuamente para as que lho pertencem.
A consulta diz: «Que toda e qualquer concessão será precedida de um deposito pecuniário»; e o decreto não exige deposito pecuniario.
Eu continuo portanto, sr. presidente, eu continuo portanto, srs. deputados, a considerar que a consulta da junta consultiva do ultramar e o decreto do governo estão em perfeita antinomia..
Como as varinhas das fadas, que faziam levantar palacios onde havia esterilidade, a omnipotencia do partido regenerador faz saír affirmativas d'onde só havia negações; diante d'essa omnipotencia parece que as palavras se assustam e deixam que se confundam as idéas que exprimiam; mas ha diccionarios a que não chegou ainda o susto.
Querer provar que ajunta consultiva do ultramar foi favoravel ao governo no seu parecer, não é, não póde reputar-se serio. (Apoiados.)
A respeito da consulta do sr. procurador geral da corôa, dá-se o mesmo que com a consulta da junta consultiva do ultramar.
Querem Moçambique, querem a Zambezia em completo estado de charneca?
É este o brado constante do governo, brado que se solta n'esta camara, e que soltam na imprensa os adeptos do governo.
Esta defeza suppõe que as concessões do decreto vão colonisar a provincia, lucrando nós com a colonisação, continuando a colonia a ser nossa. E isto o que eu nego. Com as concessões que se fizeram póde ser que façamos politica, até certo ponto humanitária, mas o que não fazemos do certo é politica portugueza. (Apoiados.)
Sr. presidente, quando a opposiçâo começou a levantar a questão das concessões na Zambezia, o governo aconselhou-nos que não fizessemos politica com as colonias, que a questão das colonias era uma questão de politica nacional.
Sr. presidente, eu pertenço a um partido em que me filiei quando esse partido estava longe do poder, e não sei se o está ainda hoje, porque n'esta boa terra vae-se con-
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vertendo tudo em monopolio (Apoiados.); estou prompto a fazer por esse partido todos os sacrificios que eu possa, mas não lho faria de certo o do combater uma medida que eu reputasse util para as colonias, porque se me alistei n'um partido, foi para servir o meu paiz e não para lho contrariar os interesses. (Apoiados.)
Quando me levanto, pois, para combater as recentes concessões na Zambezia, levanto-me porque estou convencido que combatendo-as faço politica nacional; o se já se póde dizer para se demonstrar que a opposição não fazia politica partidaria com a questão da Zambezia, que a questão estava fóra da politica quando a junta consultiva do ultramar consultou contra, eu posso dizer, para demonstrar que não ataco o decreto só porque vem de um ministerio que eu guerreio, e que não guerreio mais, porque não posso mais (Riso.), que muito antes da existencia do decreto tinha eu exposto algures, por escripto, factos o principios, que, applicando-se ao decreto, o condemnam completamente. A camara não vão, pois, ouvir, sómente um partidario, bem ou mal fundada, vão ouvir uma convicção. (Apoiados.)
Façam politica nacional a opposição diz por seu turno ao governo:
Faça politica nacional e não politica que possa ser suspeita de favoritismo. (Apoiados.) A opposição diz por sou turno ao, governo:
Faça politica nacional e não politica que contraria as leis. A opposição diz por seu turno ao governo:
Faça politica nacional! e não politica precipitada, irreflectiva, desattendendo o conselho de uns, não pedindo o conselho de outros, não querendo sobre materia gravissima ouvir o parlamento que se abria dentro de poucos dias.
Diz-se que o governo não tinha obrigação de seguir o parecer da junta consultiva do ultramar.
Mas, sr. presidente, um governo, alem das obrigações legaes, tem obrigações moraes (Apoiados.) o obrigações de prudencia, que não póde esquecer e que não lhe é dado não cumprir. (Apoiados.)
Se a junta consultiva do ultramar linha dado um parecer contrario, esse parecer contrario devia levar o governo a fazer mais consultas, a ouvir mais auctoridades, e não a cerrar ouvidos, para seguir um caminho predeterminado. (Apoiados.)
É por este esquecimento de obrigações de prudencia, é por esta falta do cumprimento de obrigações moraes que se suspeita ás vezes das intenções e que ellas se discutem
Sejam os governos prudentes, se querem que as opposições sejam respeitosas. (Apoiados.)
Sr. presidente, a legislação sobre minas no ultramar distingue ás minas, em minas do estado e minas que não pertencem ao estado.
Só, são minas do estado as minas abandonadas o as minas já conhecidas, mas não exploradas, situadas em terrenos de estado ou sujeitas á soberania do estado..... Todas as minas que não estão n'estes casos não pertencem ao estado; a propriedade d'essas minas pertence a quem as descobriu ò praticou os actos necessarios para que lhe seja concedido aquillo que descobriu e pesquizou.
Pois apesar d'isto o governo concedeu, alem das minas do estado perpetuamente...
Vozes: — Deu a hora.
O Orador: — Não sei se deu a hora. V. ex.ª me informará.
O sr. Presidente: — A hora não deu. Faltam ainda doze minutos.
O Orador: — Alem das minas que pertencem ao estado, o governo concedeu, o seguinte:
1.° O exclusivo por vinte annos das minas do oiro não pertencentes ao estado n'uma area de mais de 8:000 leguas quadradas.
2.° O exclusivo por vinte annos das minas de carvão de pedra, na bacia hydrographica da Zambeze.
A liberalidade do governo, não podendo caber nos limites da monarchia, saíu fóra d'ella o deu aquillo que não tinha, julgando o governo que bastava um decreto com á sua referenda, para se fazer nosso aquillo que nosso não era.
3.° O exclusivo da exploração o lavra de minas do ferro, cobre e outros quaesquer metaes, comprehendidas na dita area do mais de 8:000 leguas quadradas.
E engenhoso o modo por que o governo interpreta a legislação sobre minas no ultramar, para demonstrar que o decreto é legal.
Disse o sr. ministro da marinha: «O decreto sobre minas no ultramar quiz facilitar a todos, o por todos os modos, a exploração de minas; o para facilitar a todos, e por todos os modos, á exploração de minas, permittiu que se desse a um só uma certa zona!» (Apoiados.)
Applicando esta boa interpretação da lei, s. ex.ª diz que', para facilitar a todos e por todos os modos a exploração das minas da Zambezia, as concedeu só ao sr. Paiva de Andrada.
Dentro da area da concessão, area que o governo terá de mandar demarcar, o que será despendioso, porque para demarcar um terreno com precisão, não basta ter no máppá meridianos e parallelos, fica facilitado a todos, e por todos os modos, explorar minas. Rasão porque só o sr. Paiva do Andrada as póde explorar!
Todos! Esta palavra, que era antigamente um signal de universalidade, ou, pelo menos, de grande generalidade, no anno da graça do 1878, e sob o governo regenerador passou a ser um nome proprio de pessoa o significa o sr. Paiva de Andrada!
Mas, diz o governo: «Fomos pouco liberaes; nós podiamos fazer essas concessões perpetuamente, e fizemol-as só por vinte annos!»
Pergunto: porque foi que o governo em todas as minas que pertenciam ao estado não marcou limites do tempo á concessão, e o marcou nas não pertencentes ao estado? E que a lei estava a clamar ao governo — isso não é permittido.
Com effeito, se a concessão era conveniente, para que dar-lhe um limite por vinte annos? Se era o limite conveniente, porque não o applicar tambem ás concessões dás minas do estado? Trahe-se a infracção 'da lei e a consciencia d'essa infracção na distincção do tempo por que foram concedidas as minas que são e as que não são do estado.
Foi só por vinte annos! Mas, se nem um minuto era permittido conceder taes exclusivos, como é que os Vindes dar por vinte annos? São vinte annos, durante os quaes é tirado a todos, em proveito do um só, o direito que elles tinham de pesquizar, de explorar e do lavrar as minas hão pertencentes ao estado; são vinte annos durante os quaes o direito está invertido o convertido ha sua antithese, ò privilegio. (Apoiados.)
Mas, sr. presidente, se o governo tem uma maneira engenhosa do justificar os exclusivos sob o ponto do vista legal, tom tambem uma economia politica só do governo para os justificar sob o ponto de vista economico.
O sr. ministro da marinha considera estes exclusivos como uma providencia de ordem publica; vamos ouvir a rasão que s. ex.ª dá para esta afirmativa.
Disse o sr. ministro: Quando na Austrália se descobriram as minas, os emprezarios alliciavam operarios na Europa. Esses operarios chegavam á Austrália, os emprezarios disputavam-os, o elles fugiam de umas para outras emprezas, e iam até muitas vezes cultivar o explorar por sua conta. Para impedir isto é que s. ex.ª concedeu taes ex-
Sessão de 11 de março de 1879
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clusivos, e considera-os uma providencia do ordem publica!
Mas isto, srs. ministros, não é uma providencia do ordem publica, isto é uma providencia a favor do concessionario e contra os trabalhadores! (Muitos apoiados)
Elimina-se a concorrencia na procura do trabalho, o que fará, com que os trabalhadores tenham de trabalhar por preço mais baixo do que aquelle por que trabalhariam se essa concorrencia se não eliminasse, o que fará com que os trabalhadores não possam passar do assalariados a cultivadores, e que o resultado das concessões não seja o que deve ser, a colonisação.
Não foi assim que os Estados Unidos se tornaram florescentes; ahi, como disse o sr. Osorio e Vasconcellos, as emprezas levantavam-se umas defronte das outras; essas emprezas disputavam os trabalhadores, que adquiriam assim grandes salarios, que lhes permittiam, depois de certo tempo, passarem de assalariados a cultivadores.
E na Austrália, apesar da Austrália estar sob o dominio de uma nação de lords o do capitalistas, que empregam, permitta-se-me a phrase, todas as manhas para ter trabalho a baixo preço, na Austrália nunca se decretou essa providencia do ordem publica, que se destroe desde o momento em que haja mais de uma companhia.
Com effeito, desde que haja mais de uma companhia já os emprezarios podem disputar os trabalhadores, já os trabalhadores podem passar de uma para outra exploração. O pensamento colonisador do governo 6 pois para cada colonia uma companhia. Pode, porventura admittir-se isto?
Mas vae por, diante ainda a politica original do ministério/ Platão dizia que cada lei devia ter um preambulo que desse a rasão d'ella. Ora o preambulo do decreto do governo tem-no vindo aqui fazer o sr. ministro da marinha. Se quem ler o decreto se convenço que elle é mau, quem escutar o preambulo convence-se de que o decreto é pessimo.
Na camara dos dignos pares s. ex.ª declarou que os exclusivos do decreto eram uma providencia do ordem publica; o que traduzido em linguagem vulgar quer dizer, que é uma providencia contra 03 trabalhadores.
Na camara dos deputados, na sessão de segunda feira, s. ex.ª fez mais alguma cousa; demonstrou não só que era uma providencia contra os trabalhadores, mas contra a colonisação. S. ex.ª disse, explicando o motivo de tão vasta concessão, o seguinte:, «Estamos com receio de irmos para um certo logar; mas vae um, perde-se o medo o atraz d'esse vão centenares, e atraz d'esses centenares vão milhares». Para que não vão centenares e milhares para Moçambique e para a Zambezia s. ex.ª fez uma tão grande concessão! Que solicitude pelo sr. Paiva de Andrada! (Apoiados.) Não lhe bastava a concessão de uma grande porção de minas; era necessario fazer esta concessão tão extensa, para que não se podesse perder o medo e despertar-se a ambição, o não fossem centenares de individuos. atraz do sr. Paiva de Andrada! (Apoiados.)
O ideal de colonisação para s. ex.ª é aquella situação descripta por Virgilio. «Apparecem raros navegantes em vasto pelago».
Prevê s. ex.ª a possibilidade de irem para a Zambezia centenares, milhares de individuos, e por isso que a prevê, tem todo o cuidado do fazer uma concessão, pela qual não possa realisar-se essa possibilidade.
Bom foi, sr. ministro da marinha, bom foi que v. ex.ª viesse aqui explicar o seu pensamento. Nós não conjecturávamos, não podiamos conjecturar tanto morrer de amores pelo sr. Paiva de Andrada e tanto odio pela colonisação. Então foi para que se não despertassem as ambições e se não perdessem os receios, e não fossem centenares, milhares de individuos para a Zambezia, que v. ex.ª fez concessões d'esta ordem?
Que cuidados por um homem! mas que ministros! que colonisadores!
Parece-me que deu a hora. Peço, pois a v. ex.ª que me reserve a palavra para a sessão seguinte.
O sr. Laranjo (Na sessão do 7 de março): — O senado romano quando lho parecia que as circumstancias do estado eram anormaes, costumava dizer aos consules: «Acautelem-se os consules, não corra a republica algum perigo». E os consules diminuíam a liberdade, suspendiam as garantias, o diziam a final: «Foi uma providencia de ordem publica».
Acautele-se o sr. ministro da marinha, não corram perigo os interesses do sr. Paiva do Andrada, segredou a s. ex.ª não sei que genio familiar intimo que anda com s. ex.ª e que vela constantemente pelo sr. Paiva de Andrada; o como os consules romanos, s. ex.ª diminuiu tambem uma parte das garantias que eram concedidas aos cidadãos de poderem pesquizar as minas e adquirirem a concessão dellas; (Apoiados.) e como os consules romanos disse, tambem o sr. ministro da marinha. «Foi uma providencia de ordem publica.»
E a lei que permitte a pesquiza e exploração das minas a qualquer cidadão e clara e terminante; o d'isto dá testemunho o sr. ministro dos negocios estrangeiros, Andrade Corvo, que quando ministro da marinha e do ultramar dizia o seguinte n'um documento que vou ler á camara.
(Leu.)
Como a camara acaba de ouvir é o proprio sr. ministro dos negocios estrangeiros que reconheceu que a lei a este respeito era clara; e sendo permittido a todo e qualquer individuo explorar essas minas, é evidente que não podia fazer-se a concessão que se fez ao sr. Paiva de Andrada. (Apoiados.)
Providencia do ordem publica! Providencia contraria aos trabalhadores o á colonisação. Contraria aos trabalhadores, porque diminuindo a concorrencia na procura do trabalho, entrega os trabalhadores por um preço vil nos braços dos capitalistas; contraria á colonisação, porque impede, pela posse concedida ao sr. Paiva de Andrada, que outros emprezarios e outros capitães se empreguem no desenvolvimento d'essa colonisação. (Apoiados.)
Mas, na verdade, reputa o ministerio um mal que os trabalhadores fujam de umas para outras minas e vão explorar por sua conta? Se ámanhã uns emigrantes alliciados em Portugal, chegassem á Zambezia e lá encontrassem duas ou mais companhias que disputassem o seu trabalho, que lhes offerecessem salarios mais elevados do que os que se lhes tinham offerecido na metropole, habilitando-os com esses salarios a tornarem-se cultivadores, supporia o governo isto um mal?
Não é, de certo.
Se as emprezas disputavam os trabalhadores, offerecendo-lhes salarios mais elevados do que os offerecidos na metropole, é porque os lucros das emprezas lh'o permittiam, é porque os contratos primitivos feitos com os emigrantes eram lesivos para estes. (Apoiados.)
E oxalá que os emigrantes portuguezes encontrem sempre, em toda a parte para onde forem, essa liberdade e essa multiplicidade de emprezas que faz com que o trabalho seja bem remunerado. Oxalá que nunca encontrem diante de si providencias de ordem publica de natureza igual á d'aquella que foi decretada pelo sr. ministro da marinha, porque tal providencia acorrental-os-ha ao arbitrio dos capitalistas, e fará com que elles vivam na miseria e morram no desespero. (Muitos apoiados.)
Mas, na verdade, reputa o ministerio um mal, que, após o sr. Paiva de Andrada, vão outros emprezarios?
Diz a junta consultiva do ultramar que a lavra de qualquer das minas do estado na Zambezia daria resultados extraordinarios. E o governo concede não só qualquer dessas minas, mas todas, e, receiando pelos interesses do sr. Paiva de Andrada, ainda conceda minas que não são do estado, com o susto de que, após o sr. Paiva de Andrada, vão centenares ou milhares do emprezarios. Quer o governo, dia, occupar as colonias de Africa, para que não