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SESSÃO DE 16 DE MARÇO DE 1885 771

La que a opposição progressista honrada e imparcialmente proclama. (Apoiados.)
Primeiramente. Como se comprehende que, estando aberto o parlamento ha mais de tres mezes, só hoje começa a discussão do bill de indemnidade, que devia Ter sido o primeiro dos trabalhos parlamentares depois de constituida a camara? (Muito apoiados.) Volvem sessões sobre sessões durante tres mezes, sem que d'ellas tenha saído nenhum beneficio publico, senão despendido para o thesouro; accumulam-se pilhas de rhetorica, repiques de campanario, projectos de leve tomo, discussões politicas de interesse duvidoso; e só não se trata do que é urgente tratar, só não se cuida de normalisar a situação anormal do governo!
De tudo cuida o governo, menos de prestar homenagem ao parlamento e ás leis, vindo pedir ás camaras, mas a tempo e a horas, a absolvição das suas culpas, que foram grandes e das suas responsabilidades, que foram tremendas. (Apoiados.)
É verdade, sr. presidente, que sempre foi considerada como circumstancia attenuante do crime a confissão do réu, e n'este momento reum habemus confitentem; mas tambem é verdade que similhante confissão, por serodia e violentada, ora parece uma irrisão, ora reveste o caracter da impenitencia; e em qualquer dos casos não merece a misericordia hypocritamente pedida, nem a absolvição solicitada n'este projecto de lei. (Apoiados.)
O paiz, que é indifferente ao que se passa n'esta casa, porque duras provas de crudelissima experiencia o arrastaram ao marasmo doentio em que se encontra, poderá Ter no cofre das suas indulgencias, que são infinitas em numero, agua lustral bastante para lavar hoje as nodoas que maculam este nefasto governo de dictadura permanente; mas quando a consciencia publica acordar um dis, todas as culpas antigas serão exemplarmente castigadas, e a justiça fará reduzir aos claróes da verdade a sua espada vingadora! (Repetidos apoiados.)
Ouvi dizer ao sr. relator que, não sendo esta dictadura justificavel, desculpa-se todavia, porque tem precedentes. Triste defeza, sr. presidente! Onde está o precedente de uma dictadura nas condições da que se praticou em 19 de maio ultimo? Onde é que o governo viu uma dictadura com o parlamento aberto? Quaes foram os governos d'este paiz, que, tendo assumido a dictadura no interregno parlamentar, estiverem tres mezes sem dar contas aos representantes do povo reunidos em assemblea parlamentar? Nos annaes parlamentares não ha registo de facto similhante. (Apoiados.)
Tem havido muitas dictaduras, mas, logo que se abriu o parlamento, os dictadores explicam o seu procedimento, pedem á camara a approvação do bill, que é a liquidação legal das responsabilidades do governo, e entram no caminho constitucional.
Quando em 1869 se apresentou ás camaras o gabinete do sr. bispo de Vizeu, o ministro da fazenda, que era o sr. conde de Samodães, declarou que nenhuma proposta de lei podia offerecer á aprecisação dos eleitos do povo, emquanto estes não absolvessem o ministerio por Ter assumido a dictadura.
Os precedentes são estes; a tradicção, tantas vezes invocada e tão mal comprehendida, é esta!
E invoca se o precedente! Se o argumento prova alguma cousa, não é por certo contra este lado da camara. (Apoiados.)
Foi para lembrar ao governo a tradicção, e ao mesmo tempo o seu dever, que tres deputados progressistas se apressaram a pedir um bill de indemnidade para a dictadura exercida em julho pelo sr. ministro do reino. Nem este aviso conseguiu acordal-o para a verdade do systema representativo, nem este exemplo logrou chamar o governo ao cumprimento do seu dever! Nunca pensei que viriam a cair em tal desprezo as regalias parlamentares!
Mas as cousas são o que são, e a triste verdade é que o gabinete presidido pelo sr. Fontes permanece em dictadura declarada desde o dia 19 de maio, e continuará na mesma situação illegal sabe Deus até quando, para vergonha nossa e escarmento da opinião que taes attentados tolera. (Apoiados.)
Alem da extemporaneidade d'este debate, outra circumstancia bastante curiosa desperta a minha attenção; como é que se encontram cumplices do mesmo delicto e responsaveis pelas mesmas culpas tres estadistas, que profundos abysmos separavam, politicos de tão differentes ideas, de opiniões tão encontradas, de tão differente modo de pensar?
Sei que a responsabilidade do gabinete é collectiva, e alcança todos os ministros que referendaram os decretos da dictadura; mas sei tambem que é maior a responsabilidade d'aquelles, por cujos ministerios se executaram os decretos dictatoriaes, e que estão n'este caso os srs. ministro da guerra, ministro da marinha e ministro do reino. A entrada do sr. ministro do reino n'esta occasião é para mim bastante agradavel, porque não sinto nenhum prazer em me referir aos ausentes.
Refiro-me aos ministros, e não ás pessoas dos ministros, porque n'este momento e n'esta casa não vejo mais do que dois poderes distinctos, o executivo representado pelas pessoas que se sentam n'aquelles bancos (apontando o logar dos ministros) e o legislativo que está representado pelos eleitos do povo. Estes dois poderes são independentes; e como não têem qualidades pessoaes, não se comprimentam mas tambem não se melindram nem offendem na sua dignidade, visto que são entidades abstractas creadas pela metaphysica da carta.
É, pois, á entidade governo que se dirige esta outra entidade, o parlamento, perguntando, no exercicio do seu direito, por que estranhas artes e por que secretos motivos se encontram hoje sob a presidencia do sr. Fontes, o sr. Pinheiro Chagas e o sr. Barjona de Freitas?
A pergunta não é ociosa, porquanto tratando-se de apreciar uma dictadura, convem saber, como preliminar, a competencia moral e politica de quem a perceptuou. (Apoiados.)
Analysemos rapidamente .
O sr. ministro do reino foi por alguns annos o chefe de uma grande romanesca, para me servir da phrase inventada por um dos seus adeptos, gironde que se desmembrou do partido regenerador e á custa d'elle viveu; e que tinha por fim deitar abaixo do altar o antigo idolo que tresandava a bolor ou porventura já não fazia o milagre de alguns despachos para os parciaes do sr. Barjona. (Riso.)
Mais: na opinião do actual ministro do reino, o sr. Fontes não passava de um Antony romantico, que não comprehendia as leis de evolução histórica, um estadista gasto e descripto, uma especie de fossil que crystalisára nos melhoramentos materiaes.
Agora pergunto: se talera o conceito que o actual ministro do reino formava do actual presidente do conselho, como se comprehendew a permanencia simultanea de ambos nos concelhos da coroa? Foi a ambição do poder que os approximou? Não encontro outro motivo; mas então declaro, que não têem auctoridade moral para exercer as altissimas e extraordinarias funções de dictador quem tão medianamente respeita o seu caracter politico, e quem exerce o poder em nome de vaidades e ambições, e não em beneficio do paiz e em nome das urgentes necessidades da occasião. (Aoiados.)
Então a camara tem o direito de não acreditar na sinceridade dos dictadores, nem na proficuidade da sua obra. (Apoiados.)