SESSÃO DE 17 DE MARÇO DE 1886 651
aliás na minha opinião, muito para estudar, contidas no projecto que o illustre deputado offereceu á apreciação da camara.
Devo dizer a s. exa. que estou na intenção de apresentar uma proposta de lei para a reforma da magistratura judicial, da magistratura fiscal, ou ministerio publico, e dos officios de justiça.
Dizer, porém, quaes são as bases e os termos em que hei de propor a nova organisação parece-me extemporaneo.
Já comecei esse trabalho, já pedi na secretaria alguns elementos que hão de servir de base á reforma que tenciono propor, mas não posso dizer ainda qual será a minha idéa definitiva a respeito das variadissimas questões comprehendidas na nova organisação da magistratura judicial.
O que posso afiançar é que o governo ha de adoptar todos es principios tendentes a assentar em bases mais solidas a independencia e a inamovibilidade do poder judicial.
Esta é a idéa capital da reforma.
Quanto aos outros pontos sobre que ella ha de constar, como, por exemplo, a prova por concurso a que o illustre deputado se referiu, não me parece occasião opportuna de os discutir, devendo dar a s. exa. a segurança de que todos se hão de subordinar áquelle principio capital.
Tudo isto virá na reforma e s. exa. terá occasião de a discutir.
Com relação ao codigo civil perguntou o digno deputado se eu o considero como eterno. Eu não posso considerar cousa humana como eterna, muito menos o codigo civil, e sabe perfeitamente que nos codigos ha sempre um artigo, que permitte a revisão parcial d'aquelles, cujas disposições não estiverem em harmonia com as circumstancias.
S. exa. sabe perfeitamente que na lei de 1 de julho de 1867, que poz em execução o codigo civil, ha um artigo que auctorisa o inserir no logar proprio toda a modificação no direito que de futuro se fizesse sobre materia n'elle contida.
Não considero o codigo civil como eterno, repito, e por isso não teria duvida em tomar as providencias necessarias para o modificar, em qualquer ponto, se as circumstancias o exigissem.
Com relação ás questões de direito a que s. exa. se referiu, e que alem de especiaes, são das mais graves e espinhosas, não me parecem próprias para se resolverem desde já aqui. Como havemos de discutir, n'este momento, a conveniencia e os effeitos da separação dos conjuges, o regimen matrimonial dos binubos, e os outros gravissimos assumptos de que s. exa. tratou?
S. exa. comprehende perfeitamente que não é esta a occasião propria para isso.
Com relação aos concursos para delegados, conservadores e curadores geraes dos orphãos, eu penso em substituir o actual systema por outro em que, alem de outras reformas, só admitta o concurso por provas oraes.
O concurso é hoje só escripto, e como as funcções de alguns d'esses empregados precisam exercer-se, não só pela escripta mas tambem pela palavra, é minha idéa de que esses concursos se façam por provas escriptas e oraes.
Eu devo dizer que, comquanto a minha personalidade seja muito humilde, tenho alguma experiencia d'esses concursos; fui eu o primeiro que passou por elles, e, alem d'isso, algumas vezes, tenho feito parte do jury, n'esses concursos.
Conheço-os pois, permitta-se-me a phrase, activa e passivamente.
Com respeito ao artigo do codigo do processo civil, sobre que s. exa. perguntou a minha opinião, eu direi que se ha um artigo, n'este codigo, que obrigue um cidadão a assignar um papel qualquer, sem o ter lido, eu proporei a reforma d'esse artigo.
Mas não conheço artigo algum, nem nos relativos a conselhos de familia, nem a outros quaesquer assumptos, que obrigue alguem a assignar um papel sem o ler.
Tenho assistido a muitos conselhos de familia, não só como vogal, mas como representante de interessados, e nunca vi ninguem obrigar um membro d'esses conselhos a assignar cousa alguma sem ler.
(Interrupção do sr. Rocha Peixoto, que não se ouviu.)
V. exa. assignou porque quiz, e é por isso que eu não posso propor a reforma d'esse artigo.
O sr. Pedro Diniz: - Mando para a mesa dois requerimentos sobre assumptos de interesse particular, e peço, por parte da commissão de marinha, que sejam enviados ao governo, para que este informe o que se lhe offereça.
O sr. Arouca: - Pedi a palavra para fazer uma pergunta ao sr. ministro das obras publicas, sobre um negocio de que, por varias vezes, me tenho já occupado n'esta camara; refiro-me á idéa de se regulamentar a saída dos vinhos pela barra do Douro.
Tenho visto, sobre este assumpto, publicadas em diversos jornaes, algumas noticias e necessito que o governo declare se, porventura, são verdadeiras ou se carecem de rectificação.
Dois jornaes publicados em Lisboa, o Economista e o Commercio de Portugal, diziam que estavam em Lisboa alguns cavalheiros que fazem parte da commissão de defeza dos interesses do Douro, e que, tendo procurado o sr. ministro das obras publicas, a resolução tomada n'essa conferencia fôra a seguinte, segundo a versão do Economista:
«A commissão ficou de apresentar ao sr. ministro a indicação das providencias com que, sem de nenhum modo se embaraçar a liberdade de commercio dos vinhos das demais regiões do paiz, nem se estabelecerem restricções que seriam actualmente intoleraveis, se possa comtudo contribuir para manter lá fora o credito dos vinhos da região do Douro.»
E, segundo a versão do Commercio de Portugal, o seguinte:
«O illustre ministro mostrou a melhor vontade de attender ás justas reclamações da lavoura do Douro, achando de conveniência e justiça os fundamentos em que ellas são apoiadas. Esperava que cavalheiros que tão patrioticamente se empenham numa questão tão momentosa lhe prestariam os elementos para se adoptarem praticamente as medidas que assegurassem todos os direitos e interesses legitimos de producção e de commercio, e desde que lhe offerecessem um plano que fizesse respeitar o que é do Douro, a marca dos seus vinhos, e attendesse tambem ao exercicio da liberdade legitima do commercio e da industria, não teria duvida em lhe prestar todo o seu apoio e protecção.»
Ora, estas duas noticias, a meu ver, apresentam muita differença. (Apoiados.)
Eu sou o primeiro a reconhecer quaes são as difficuldades com que lucta a lavoura do Douro, e não será pela minha parte que o governo ha de encontrar embaraços, quando elle possa melhorar os males que affligem a agricultura d'aquelle districto; mas até agora as justas pretensões, de que se falla no Commercio de Portugal são as que constam do Diario do governo de segunda feira, 8 de março, em que foi publicado o projecto de regulamento apresentado por essa commissão.
Ora esse projecto é verdadeiramente assustador, (Apoiados.) porque tendo vinte e seis artigos e sendo formulado por uma commissão, que tem por fim promover a exportação dos vinhos, apenas em dois d'esses artigos, se trata d'esse assumpto e nos outros a commissão arroga-se poderes legislativos para estabelecer penas e poderes judiciaes para absolver delictos; põe debaixo das suas ordens todas as auctoridades judiciaes e administrativas, e alem d'isso estabelece uma matricula para os negociantes, obri-