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SESSÃO DE 20 DE JUNHO DE 1890

Presidencia do exmo. sr. Pedro Augusto de Carvalho

Secretarios-os exmos. srs.

José Joaquim de Sousa Cavalheiro
Antonio Teixeira de Sousa

SUMMARIO

Deu-se conhecimento dos seguintes officios: tres do ministerio do reino, em resposta aos officios n.01 223, 224 e 225 de 10 do corrente, emanados da presidência d'esta camara; dois do ministerio da fazenda, com documentos requeridos pelos srs. Antonio Fialho Machado e Francisco José Machado; outro do ministerio dos negocios estrangeiros, participando, em resposta ao requerimento do sr. João Cesario de Lacerda, que não podem ser enviados a esta camara quaesquer documentos relativoa aos títulos do empréstimo chamado de O. Miguel; outro da direcção geral da secretaria d'esta camara, communicando que até esta data ninguém requereu inspecção dos processos eleitoraes, depois do parecer para serem proclamados deputados por acclamnção os srs. Joaquim Pedro de Oliveira Martins e Caetano Pereira Sanchea de Castro.- Segunda leitura do projecto de lei apresentado pelo sr. Ferreira de Almeida, relativo á insrallação de estações e postos de soccorros a naufragos; renovação de iniciativa do projecto de lei, conservando a collegiada de Guimarães, apresentado na sessão de 19 de janeiro de 1889 pelo sr. Francisco José Machado. - O sr. presidente proclama deputados os srs. Joaquim Pedro de Oliveira Martins e Caetano Pereira ganches de Castro.- O sr. José Maria de Alpoim lê á camara uma carta, em que se communicava varios factos relativos aos concelhos de Vallougo e Villa Nova de Gaia, pedindo ao sr. ministro da fazenda os communicasse ao seu collegado reino.- O sr. Fernando Palha faz diversas considerações relativas á prisão de um indivíduo que andava caçando pombos no Terreiro do Paço, sobre o decreto de naturalisação dos estrangeiros no Brazil e sobre o drawback para os azeites hespanhoes. - Responde o sr. ministro da fazenda. - O sr. barão de Paço Vieira pede que seja dispensado o regimento e entre em discussão o parecer n.° 126, que conclue por que deve ser proclamado deputado por accumulação o sr. Joaquim Alves Matheus.- Declaração do sr. Emygdio Navarro em nome da opposição progressista. - Foi approvado o parecer por 58 espheras brancas.- O sr. Pinheiro Chagas manda para a mesa o parecer da commissão do bill sobre as emendas que foram apresentadas na discussão do projecto. - O sr. Freire de Figueiredo apresenta um projecto de lei, dividindo o concelho de Góes em duas assembléas eleitoraes.- O sr. Manuel Espregneira manda para a mesa diversos requerimentos.
Na ordem do dia continua em discussão o orçamento rectificado.- Tem a palavra o sr. ministro da fazenda, que manda para a mesa duas propostas de lei, fixando o contingente para a armada e exercito, e guardas municipaes e fiscaes; e continua o seu discurso da sessão anterior, respondendo ao sr. Ressano Garcia.- A requerimento do sr. José de Azevedo Castello Branco é prorogada a sessão até se votar o projecto em discussão.- O sr. Mattozo Santos prosegue na discussão da ordem do dia.- A requerimento do sr. Alves Passos julga-se discutida, e é em seguida approvada a generalidade do projecto, passando-se á discussão na especialidae.- Foi approvado sem discussão o artigo 1.°- Sobre o artigo 2.° falla o sr. Eduardo Abreu, respondendo-lhe o sr. Carrilho.- Foi approvado o artigo 2.°, bem como o 3.°, sem discussão.-O sr. Carrilho manda para a mesa a ultima redacção do projecto.

Abertura da sessão - Ás duas horas e meia da tarde.

Presentes â chamada 59 srs. deputados. São os seguintes:- Abílio Eduardo da Costa Lobo, Adolpho da Cunha Pimentel, Agostinho Lúcio e Silva, Alexandre Maria Ortigão de Carvalho, Amandio Eduardo da Motta Veiga, Antonio Augusto Correia da Silva Cardoso, Antonio de Azevedo Castello Branco, Antonio Fialho Machado, Antonio Manuel da Costa Lereno, Antonio Maria Cardoso, Antonio Maria Pereira Carrilho, Antonio Sergio da Silva e Castro, Antonio Teixeira de Sousa, Arthur Alberto de Campos Henriques, Arthur Hintze Ribeiro, Barão de Paço Vieira (Alfredo), Bernardino Pacheco Alves Passos, Custodio Joaquim da Cunha e Almeida, Eduardo Abreu, Eduardo de Jesus Teixeira, Eduardo José Coelho, Emygdio Julio Navarro, Eugênio Augusto Ribeiro de Castro, Fernando Pereira Palha Osorio Cabral, Francisco de Castro Mattozo da Silva Corte Real, Francisco José de Medeiros, João de Barros Mimoso, João Cesario de Lacerda, João Ferreira Franco Pinto Castello Branco, João Maria Gonçalves da Silveira Figueiredo, João de Paiva, João Pereira Teixeira de Vasconcellos, João Pinto Moreira, João Simões Pedroso de Lima, João de Sousa Machado, José Antonio de Almeida, José Augusto Soares Ribeiro de Castro, José de Azevedo Castello Branco, José Domingos Ruivo Godinho, José Joaquim de Sousa Cavalheiro, José Júlio Rodrigues, José Maria de Alpoim de Cerqueira Borges Cabral, José Maria Charters Henriques de Azevedo, José Maria de Oliveira Peixoto, José Maria Pestana de Vasconcellos, José Maria dos Santos, José Paulo Monteiro Cancella, Júlio César Cau da Costa, Luciano Cordeiro, Manuel d'Assumpção, Manuel Constantino Theophilo Augusto Ferreira, Manuel de Oliveira Aralla e Costa, Manuel Pinheiro Chagas, Manuel Thomás Pereira Pimenta de Castro, Manuel Vieira de Andrade, Mathens Teixeira de Azevedo, Pedro Augusto de Carvalho, Roberto Alves de Sousa Ferreira e Visconde de Tondella.
Entraram durante a sessão os srs.: - Adriano Augusto da Silva Monteiro, Alberto Augusto de Almeida Pimentel, Albino de Abranches Freire de Figueiredo, Alfredo Mendes da Silva, Antonio Eduardo Villaça, Antonio Jardim de Oliveira, Antonio José Ennes, Antonio Maria Jalles, Antonio Costa, Antonio Mendes Pedroso, Antonio Ribeiro dos Santos Viegas, Aristides Moreira da Motta, Augusto da Cunha Pimentel, Augusto José Pereira Leite, Augusto Maria Fuschini, Augusto Ribeiro, Bernardino Pereira Pinheiro, Carlos Lobo d'Avila, Carlos Roma du Bocage, Christovão Ayres de Magalhães Sepulveda, Conde de Villa Real, Eduardo Augusto da Costa Moraes, Feliciano Gabriel de Freitas, Fernando Mattozo Santos, Francisco de Almeida e Brito, Francisco Antonio da Veiga Beirão, Francisco de Barros Coelho e Campos, Francisco Felisberto Dias Costa, Francisco Joaquim Ferreira do Amaral, Francisco José Machado, Francisco Severino de Avellar, Francisco Xavier de Castro Figueiredo de Faria, Frederico Ressano Garcia, Guilherme Augusto Pereira do Carvalho de Abreu, Ignacio Ernauz do Casal Ribeiro, Joaquim Germano de Sequeira, Joaquim Simões Ferreira, José Alves Pimenta de Avellar Machado, José Bento Ferreira de Almeida, José Dias Ferreira, José Elias Garcia, José Estevão de Moraes Sarmento, José Frederico Laranjo, José Gonçalves Pereira dos Santos, José Maria Greenfield de Mello, José Maria Latino Coelho, José Maria de Sousa Horta e Costa, José Monteiro Soares de Albergaria, Júlio Antonio Luna de Moura, Luiz Augusto Pimentel Pinto, Luiz Gonzaga dos Reis Torgal, Luiz de Mello Bandeira Coelho, Luiz Virgílio Teixeira, Manuel Affonso Espregueira, Manuel de Arriaga, Manuel Francisco Vargas, Marcellino Antonio da Silva Mesquita, Miguel Dantas Gonçalves Pereira, Pedro Victor da Costa Sequeira e Wenceslau de Sousa Pereira Lima.

Não compareceram â sessão os srs.: - Abílio Guerra Junqueiro, Adriano Emílio de Sousa Cavalheiro, Albano de Mello Ribeiro Pinto, Alexandre Alberto da Rocha Serpa Pinto, Alfredo César Brandão, Alvaro Augusto Froes Possollo de Sousa, Antonio Baptista de Sousa, Antonio José Arroyo, Antonio José Lopes Navarro, Antonio Pessoa de Barros e Sá, Arthur Urbano Monteiro de Castro, Augusto Carlos de Sousa Lobo Poppe, Augusto César Elmano da Cunha e Costa, Augusto Vidal de
Castilho Barreto e Noronha, Caetano Pereira Sanches de Castro,

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Columbano Pinto Ribeiro de Castro, Conde do Covo Eduardo Augusto Xavier da Cunha, Elvino José de Sousa e Brito, Estevão Antonio de Oliveira Júnior, Fidelio d Freitas Branco, Fortunato Vieira das Neves, Frederico d Gusmão Corrêa Arouca, Henrique da Cunha Matos d Mendia, Ignacio José Franco, Jacinto Cândido da Silva Jayme Arthur da Costa Pinto, João Alves Bebiano, João José d'Antas Souto Rodrigues, João Marcellino Arroyo João Pinto Rodrigues dos Santos, Joaquim Ignacio Cardoso Pimentel, Joaquim Pedro de Oliveira Martins, Joa quim Teixeira Sampaio, José de Abreu do Couto Amo rim Novaes, José de Alpoim de Sousa Menezes, José Christovão Patrocinio de S. Francisco Xavier Pinto, José Freire Lobo do Amaral, José Gregorio de Figueiredo Mascarenhas, José Luiz Ferreira Freire, José de Vasconcellos Mascarenhas Pedroso, José Victorino de Sousa Albuquerque, Lourenço Augusto Pereira Malheiro, Luciano Affonso da Silva Monteiro, Luiz Antonio Moraes Sousa, Marianno Cyrillo de Carvalho, Marquez de Fontes Pereira de Mello e Sebastião de Sousa Dantas Baracho

Acta-Approvada.

EXPEDIENTE

Officios

Do ministerio do reino, acompanhando copias dos telegrammas a que se refere o officio n.° 223, de 10 do corrente, emanado da presidência d'esta camara.
Para a secretaria.

Outro do ministerio do reino, acompanhando as copias authenticas a que se refere o officio n.° 224, de 10 do corrente, emanado da presidência d'esta camara.
Para a secretaria.

Outro do ministerio do reino, acompanhando a copia authentica do officio do procurador geral da coroa, a que se refere o officio n.° 225, de 10 do corrente, emanado da secretaria d'esta camara.
Para a secretaria.

Outro do ministerio da fazenda, remettendo, em satisfação ao requerimento do sr. deputado Antonio Fialho Machado, o mappa fornecido pelo conselho superior das alfândegas, relativo á importação para consumo de sementes oleosas não especificadas e de óleos vegetaes fixos líquidos não especificados effectuada pelas alfândegas do continente e ilhas no anno de 1889, e nos três primeiros mezes do anno corrente.
Para a secretaria.

Outro do ministerio da fazenda, remettendo, em satisfação ao requerimento do sr. deputado Francisco José Machado, nota do numero de carruagens e cavallos de que se paga contribuição no concelho de Obidos.
Para a secretaria.

Outro do ministerio dos negócios estrangeiros, participando, em resposta ao requerimento do sr. deputado João Cesario de Lacerda, que não podem ser enviados a esta camara quaesquer documentos relativos aos titulos do empréstimo chamado de D. Miguel.
Para a secretaria.

O seguinte da direcção geral da secretaria e policia da camara dos senhores deputados:

«Illmo. o exmo. sr.- Cabe-me a honra de levar ao superior conhecimento de v. exa. que, durante o praso decorrido desde a publicação do parecer n.°... para serem proclamados deputados por accumulação de votos os srs. Joaquim Pedro de Oliveira Martins o Caetano Pereira Sanches de Castro, ninguém até hoje requereu inspecção dos processos eleitoraes para os fins do que dispõe o § 3.° do artigo 4.° da lei de 21 de maio de 1884.
«Direcção geral da secretaria e policia, da camara dos senhores deputados, em 20 de junho de 1890. = O director geral interino, Joaquim Pedro Parente,»
Para a secretaria.

Segundas leituras Projecto de lei

Senhores. - A profissão marítima é de todas a mais árdua e perigosa, não só pelos trabalhos normaes, mas pelas luctas com o tempo contrario e revolto; e alem de exposta mais que nenhuma outra, nos casos de accidente de fogo, de fome e de epidemia, no meio restricto e limitado em que ella se exerce, tem de ordinário por complemento, quando se julga chegado o terminus do trabalho, e ao almejado descanso, todas as desventuras que então se accumulam, se o navio acossado pelo temporal for desmantelar-se contra os baixios ou contra as rochas escarpadas da costa. Não basta á navegação o regular ou bom allumiamento das costas e dos parceis, que lhe sirva de referencia, ou para corrigir erros de cálculos ou para orientar a derrota em caso de desvio por accidente extraordinário da corrente e abatimento; é preciso, e muito, acrescentar a estas condições de protecção os especialmente complementares para os casos de accidente de força maior, em que o navio é lançado á costa pelo temporal, ou por causa do nevoeiro ou ainda para evitar sossobrar, quando tendo agua aberta.
É para occorrer a estes casos que a philanthropia devidamente auxiliada pelos poderes publicos nos paizes cultos, que comprehendem o grande serviço que a navegação tem prestado não só á civilisação dos povos, mas ao desenvolvimento dos differentes ramos da actividade humana, tem organisado, por meio de associações com variavel área de jurisdicção, segundo os recursos do que dispõem, estações e postos de socorros a náufragos.
Está ainda na memória de todos o sobresalto que causou o desastre do incêndio do theatro Baquet, onde pereceram muitas pessoas, que primeiro succumbiram á asphyxia produzida pelos gazes deletérios, e depois esmagadas pelas derrocadas e carbonisadas pelo incêndio; é pois justo lembrar, quanto é mais angustiosa a situação d'aquelles que, no desempenho de uma funcção utilíssima á sociedade, á navegação, vendo approximar-se o perigo do naufragio, como no caso do brigue inglez Canada, na barra da Figueira, sentem o choque das primeiras pancadas do casco de encontro ao fundo, vêem encapellar-se no mar os rolos de ondas, que os golpes successivos lhe derrubam a mastreação, esmagando uns e submergindo outros, para só depois de todas estas torturas e angustias moraes e physicas, sobrevir a morte pela asphyxia por submersão!
São antigos os estudos de algumas commissões nomeadas para resolver e preceituar sobre o assumpto, sendo notavel o relatorio da commissão nomeada em 20 do novembro de 1879, onde se encontra uma nota por si mais eloquente que qualquer outra ordem de argumentos; menciona-se ali, que emquanto em oito annos houve em Portugal 224 naufragios conhecidos, perecendo 229 pessoas, num só anno, os 269 barcos salva-vidas inglezes pertencentes às suas 269 estações de soccorros a naufragos, salvavam 885 pessoas.
Como iniciação é preciso que entre nós o governo dê o impulso, não só na organisação de uma socciedade ou socciedades similhantes às que existem noutros paizes, mas ainda que as subsidie num justo limite, até que uma bem
dirigida propaganda possa insinuar no espirito publico o alcance, necessidade e justiça de similhantes instituições, portanto quando ellas são merecedoras do seu obolo espontaneo.
Está calculada em 137:000$000 reis a installação de 30

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estações de socorros, e 32 postos secundarios, e em réis 4:598$000 a despeza de custeamento annual.
Uma outra commissão organisada em 1883 pedia a subvenção de 30:000$000 réis annuaes durante cinco annos, para se estabelecer as 62 estações e postos de soccorros a naufragos.
Parece-nos que um subsidio annual de 10:000$000 réis, como base de qualquer operação auctorisada pelo governo, e de onde saísse a annuidade para juro e amortisação da operação feita, e bem assim a verba do custeamento proporcional e crescente com as installações, póde, sem grande ónus para o thesouro, ser a base de uma medida legislativa que a camara e o governo adoptem, para um fim tão justo, sympathico e philantropico.
Um recurso tem o governo, emquanto a iniciativa particular não acudir em auxilio da instituição de que se trata, e consistiria elle em exigir que todos os compromissos marítimos, misericórdias e estabelecimentos pios não subsidiados pelo estado, e que possuam um certo fundo, concorressem com um subsidio até 2 por cento da sua receita geral para o cofre de socorros a naufragos.
Um ponto importante carece ainda consignar nesta ordem de considerações preliminares, e diz respeito ao pessoal que deve ser escolhido das praças do corpo de marinheiros com baixa de serviço, por o terem completado, tendo bom comportamento, e que pelo menos tivessem chegado á categoria de marinheiros de 1.ª classe.
Exposta e analysada a questão nos seus termos restrictos e confiando o estudo desta materia, no seu mais vasto desenvolvimento, á apreciação da camara, temos a honra de propor o seguinte projecto de lei:
Artigo 1.° É o governo auctorisado a proceder á instalação de estações e postos de soccorros a naufragos, ou por administração directa ou por meio de uma associação convenientemente organisada para esse fim, nos termos da consulta dada pela commissão nomeada em 20 de novembro de 1879.
Art. 2.° Fica o governo auctorisado a despender até á quantia de 10:000$000 réis annuaes com a installacão de estações e postos de soccorros a naufragos e seu custeamento annual.
Art. 3.° Dentro dos limites da verba fixada no artigo 2.°, e comprehendendo todos os encargos nelle consignados, póde o governo fazer ou auctorisar qualquer operação de credito por meio do qual se anticipe a acquisição de material e installações correspondentes para as estações, postos de soccorros a naufragos.
Art. 4.° Os estabelecimentos pios e misericórdias não subsidiados pelo estado, e bem assim os compromissos marítimos que possuam rendimentos de mais do 6:000$000 réis annuaes, são obrigados a concorrer com um subsidio annual até 2 por cento da sua receita geral para os cofres do estado, com applicação especial ao encargo consignado no artigo 2.°
Art. 5.° O pessoal graduado das estações e postos de soccorros a naufragos será especialmente escolhido de entre as praças com baixa, do corpo de marinheiros, com bom comportamento o aptidão reconhecida, e que pelo menos tenham chegado á categoria de marinheiros de 1.ª classe.
Sala das sessões da camara dos senhores deputados, em 20 de junho de 1890.= José Bento Ferreira de Almeida.
Lido na mesa foi admittido e enviado á commissão de marinha.

RENOVAÇÃO DE INICIATIVA

Renovo a iniciativa do projecto de lei n.° 3-M, sobre a collegiada de Guimarães, e que foi apresentado por mim na sessão de 21 de janeiro de 1889.
Sala das sessões, em 19 de maio de 1890. = F. J. Machado.
Lida na mesa, foi admittida e enviada às commissões de negocios eclesiasticos de instrucção superior e de fazenda.
Esta renovação refere-se ao seguinte:

Projecto de lei

Senhores.-E por sem duvida ponto indiscutível que os legisladores, no cumprimento da sua missão, devem orientar-se pela vontade dos povos, quando esta é racional e justa, porque é sempre perigoso, alem de insensato, alterar profundamente, sem que a natural evolução das idéas o reclame, os usos e costumes, a que a sociedade está desde longa data habituada.
É por isto, senhores, que eu julgo conveniente modificar o decreto com força de lei de 1 de dezembro de 1869, pois as representações que ácerca da sua execução têem sido enviadas ao parlamento e ao governo, e a propaganda que a tal respeito se tem feito, já nas camaras legislativas, já em comicios, já pela imprensa periódica, mostram evidentemente a necessidade de introduzir-lhe algumas modificações, de modo que sem perder de vista as idéas apresentadas no relatório que o precedeu, se attenda a reclamações tão instantes.
E se é certo que para conservar tradições gloriosas, ou memorar notaveis succedimentos não é absolutamente indispensável que as collegiadas continuem a existir, parece-me comtudo que uma excepção deverá fazer-se em relação á insigne e real collegiada de Nossa Senhora da Oliveira, da cidade de Guimarães, instituída por D. Affonso Henriques, que deu nova forma á capella real creada por eu pae o conde D. Henrique, como este havia reformado instituição de Mummadona, primitiva fundadora desta asa nos principios do X seculo, á qual estão ligadas as memorias da fundação do reino e no correr dos tempos antos e tamanhos acontecimentos da nossa historia, como nenhuma outra corporação idêntica podo jamais apresentar.
A população, a importância agrícola, commercial e industrial da cidade e concelho de Guimarães, o numero dos seus estabelecimentos de instrucção primaria e a avultada somma de estudantes d'aquelle concelho, que frequentam os diversos institutos litterarios do paiz, quer de instrucção secundaria, quer superior, de par com o amor que aquelles povos professam á religião do estado, demonstram tem claramente que são fundamentadas as muitas representações que por differentes vezes têem subido ao governo a esta camara no intuito de ser conservada a sua insigne e real collegiada.
Não é de agora a idéa da creação de cadeiras de instrucção secundaria na gloriosa cidade de Guimarães, berço da monarchia portugueza. Sem fallar dos conventos religiosos, e da própria collegiada, que em tempo offere-siam ao publico as suas aulas, vemos funccionar em Guimarães uma cadeira de latim em 1774, cujo professor foi nomeado por carta regia de 7 de janeiro d'aquelle anno, e outra de rhetorica para a qual foi nomeado professor em 24 do mesmo mez e anno, as quaes, com algumas interrupções continuaram funccionando, especialmente a de latim, até 1869. Em 1860 por decreto de 6 de junho foi ali creada uma cadeira de arithmetica, geometria, geographia, lingua franceza e ingleza para ser lida em curso biennal; decreto este que foi modificado pelo de 9 de janeiro de 1862, o qual diminue ao curso as disciplinas de geographia e lingua ingleza.
Hoje, porém, destas cadeiras resta unicamente a lembrança, e foi necessário, para que esta formosa cadeia, não se interrompesse, que a iniciativa particular, especialmente a da benemerita sociedade «Martins Sarmento», á qual são sempre minguados os preitos de homenagem que se tributem, viesse supprir a deficiencia do poder central até que este resolvesse a creação da escola industrial.
E se actualmente, pelo estabelecimento da escola «Francisco de Hollanda», a população industrial e commercial de

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Guimarães póde adquirir os conhecimentos theoricos e praticos para o exercicio das suas profissões especiaes, é necessario tambem que as demais classes não sejam privadas dos benefícios de instrucção; é necessario que os filhos da classe media tenham, como os da classe operaria, um estabelecimento aonde possam aprender todas ou grande parte das disciplinas que dão ingresso nos cursos superiores e que hoje vão adquirir com gravosos despendios a terras, estranhas.
Á satisfação d'esta necessidade, á realisação das aspirações, tantas vezes manifestadas pelos vimaranenses, mira este projecto, que tenho a honra de apresentar ao vosso esclarecido exame.
É, porém, certo, senhores, que a natureza e fins dos bens da collegiada de Guimarães não consentem que elles sejam applicados, senão em conformidade com o direito canónico recebido no reino, o portanto às necessidades da Igreja, e tal devia ser uma das considerações que pesou no animo do illustrado ministro da justiça, o sr. conselheiro Beirão, quando em 11 de junho de 1888 affirmou que em tivesse o governo não se oppunha á conservação da collegiada de Guimarães, comtanto que não ficassem prejudicados os principies religiosos que devem presidir áquella instituição.
Estas rasões, que não devem ser descuradas, levaram-me ao estudo de uma solução, já por mim indicada em 17 de março de 1888, a qual me parece conciliar os princípios religiosos e interesses da Igreja com as intenções e desejos do povo de Guimarães. E a conservação da collegiada com a fundação de um pequeno seminario.
E sabido que em França e nos paizes em que se acham bem organisados os estudos ecclesiasticos é esta instituição muito vulgar e ha dioceses em que existe mais de um petit seminaire. Sirvam de exemplo os arcebispados de Paris e Reims e os bispados de Orleans, Angers e outros. Entre nós tambem se tem reconhecido esta altissima conveniencia, como no bispado do Porto, aonde por iniciativa do ordinário só creou um segundo seminario; no arcebispado de Évora, conservando-se para o mesmo fim o seminario do extincto bispado de Eivas; no de Coimbra, conservando-se o do supprimido bispado de Leiria. E se em algumas dioceses do reino se reconhece a conveniência da fundação de um segundo seminario, na archidiocese de Braga torna-se esta conveniencia em uma imperiosa necessidade, não só pela grandíssima extensão e população do arcebispado, como pelo grande numero de alumnos que se dedicam ao estudo ecclesiastico e mesmo porque o actual edifício do seminario bracharense é insufficiente para os alumnos que n'elle pretendem ser admittidos.
A collegiada de Guimarães possue os edifícios necessários para a installacão das aulas que se crearem, e quando n'elles sejam precisas algumas obras para se aecomraoda-rem ao novo fim a que se destinam, podem estas ser feitas á custa do rendimento accumtilado da cadeira do D. Prior, que se acha em cofre, ficando o excedente para ser applicado conforme o projecto que apresento.
Adoptando-se, pois, o projecto que elaborei, attende-se a todas as indicações que ficam expostas, que por certo pesarão, alem de outras que a vossa intelligencia vos suggerir no espirito da camara para dar a approvacão ao seguinte projecto de lei:
Artigo 1.° É auctorisado o governo a conservar a insigne e real collegiada do Nossa Senhora da Oliveira, da cidade de Guimarães, com todos os seus haveres e rendimentos, e impondo se ao respectivo quadro capitular a obrigação de ensino, nos termos d'esta lei.
§ 1.° O quadro capitular é fixado em sete conegos e quatro beneficiados, incluindo as respectivas dignidades, obrigados todos ao serviço quotidiano do côro.
§ 2.º Neste numero não se inclue o D. Prior, que é o parocho da freguezia de Nossa Senhora da Oliveira, presidente da corporação capitular e do conselho escolar.
§ 3.° Dois beneficiados indicados pelo D. Prior e confirmados pelo prelado diocesano, serão coadjutores ordinarios e effectivos do parocho.
Art. 2.° O provimento do D. Prior, conegos e beneficiados, será por concurso documental feito nos termos da legislação em vigor para o provimento dos canonicatos das sés cathedraes.
Art. 3.° E auctorisado o governo a crear na cidade de Guimarães um pequeno seminario annexo á collegiada da mesma cidade, que sob a superintendência do prelado diocesano será dirigido pelo D. Prior.
§ 1.° Todas as despezas com a installacão do pequeno seminario, na qual se incluem as obras a fazer na residência do D. Prior e mais edifícios para a sua accommodação, para as aulas e para a admissão dos alumnos internos, serão feitas á custa do rendimento em cofre pertencente á cadeira do D. Prior, e as despezas subsequentes do pessoal, material, expediente, sustento de aluirmos gratuitos, se os houver, e mais accessorios, ficam a cargo dos haveres da referida collegiada, nos quaes ficam incluídos os que são privativos do D. Prior ou de algumas outras dignidades.
§ 2.° As despezas da fabrica e culto da igreja collegiada e parochial de Nossa Senhora da Oliveira, incluindo os legados de missas e outros encargos pios que oneram os bens do D. Prior, das dignidades e todos os outros da collegiada, ficam igualmente a cargo da mesma.
§ 3.° O remanescente, que houver, da importância em cofre da cadeira do D. Prior, bem como o do actual e futuro rendimento da collegiada depois de satisfeitas as despezas referidas, reverterá para o fundo da dotação do culto e clero.
Art. 4.° O ensino do pequeno seminario comprehenderá as matérias indispensáveis para a matricula no curso theologico:
l.° Lingua e litteratura portugueza (primeira e segunda parte).
2.° Lingua franceza.
3.° Mathematica elementar (primeira parte).
4.° Lingua latina (primeira parte).
õ.° Geographia e historia.
G.° Philosophia elementar.
Art. 5.° Estas cadeiras serão regidas pelos sete conegos.
§ 1.° Durante os impedimentos temporários no exercicio do magisterio de alguns dos conegos professores será a respectiva cadeira regida por turno por um dos beneficiados, isentos das funcções parochiaes, recebendo pró rata a correspondente gratificação.
§ 2.° O prelado diocesano dispensará na residência chorai, quando haja incompatibilidade entre esta e o exercicio do magisterio.
Art. G.° O ordenado annnal do D. Prior é fixado em 700$000 réis, e de cada um dos conegos em 400$000 réis, e o de cada um dos beneficiados em 3GO$000 réis.
§ 1.° Os conegos vencerão mais a gratificação de réis 100$000 annuaes cada um, e o cónego secretario alem d'esta receberá mais a de 100$000 réis para as despezas do expediente, etc.
§ 2.° O D. Prior tem residência no edifício do pequeno seminario.
Art. 7.° Os conegos que sem motivo justo faltarem ao cumprimento do serviço do magisterio, alem de serem privados da gratificação pro rata, soffrem o desconto de metade do vencimento que lhes competir pelo beneficio, devendo a deducção assim feita ser applicada ao fundo da dotação do culto e clero.
Art. 8.° Haverá um continuo, o qual servirá tambem de amanuense da secretaria, com o ordenado annual de réis 180$000, e dois serventes ou guardas com o ordenado de 80$000 réis cada um.
§ unico. Havendo internato no pequeno seminario, serão

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creados dois Jogares do prefeitos com o ordenado annual de 180$000 réis cada um.
Art. 9.° Vagando algum beneficio na collegiada e no pequeno seminário o D. Prior, e na sua falta o conego mais antigo que o eleve substituir em todos os seus encargos, fará immediata conzinunicação ao ordinario da diocese e este ao governo, para mandar annunciar o concurso e prover o logar vago nos termos d'esta lei.
Art. 10.º O pessoal inferior é nomeado pelo ministro dos negocios ecclesiasticos sob proposta de tres nomes, feita pelo D. Prior e remettida, pelo ordinario.
§ unico. Esta proposta não terá logar para as primeiras nomeações a fazer.
Art. 11.° Os conegos com mais de trinta annos de bom e effectivo serviço têem direito á aposentação nos termos das leis em vigor.
Art. 12.° (Disposição transitória). Os actuaes conegos ficam fazendo parte do corpo capitular e unicamente sujeitos às obrigações do culto e coro, recebendo a porção beneficiaria que lhes competia ao tempo da publicação do decreto de 1 de dezembro de 1869, nunca, devendo ser inferior á fixada para os novos conegos.
§ unico. Para o preenchimento do quadro fixado nesta lei não se terão em conta os actuaes conegos.
Art. 13.° A corporação da curaria annexa á collegiada é extincta e os seus haveres ficam fazendo parte do fundo da dotação do culto e clero.
§ 1.º Os actuaes membros da curaria, emquanto não obtiverem qualquer beneficio ecclesiastíco, receberão do dito fundo a porção beneficiaria ou quota, que actualmente constituo o seu ordenado.
§ 2.° Pelo mesmo cofre serão satisfeitos os legados de missas e outros encargos pios, que oneraremos bens desta communidade.
Art. 14.° O governo, ouvido o prelado diocesano, dará as providencias necessarias para a execução desta lei.
Art. 15.° Fica revogado nesta parte o decreto com força de lei de 1 do dezembro de 1869 e mais legislação em contrario.
Sala das sessões da camara dos deputados, 19 de janeiro de 1889. - Francisco José Machado.

REQUERIMENTOS DE INTERESSE PUBLICO

Requeiro que, pelo ministerio da marinha e ultramar, sejam remettidos com urgência a esta camara os seguintes esclarecimentos:
1.° Nota das pessoas que constituem os corpos gerentes da sociedade do caminho de ferro de Mormugão, com a designação das suas respectivas residencias;
2.° Copia dos relatórios apresentados á assembléa geral dos accionistas da mesma sociedade, desde a sua constituição até esta data;
3.° Relatorios apresentados às assembléas, geraes de accionistas da companhia do caminho de ferro de Loanda a Ambaca, desde a formação da sociedade até esta data;
4.° Copia dos contratos realisados pela mesma companhia para a construcção da linha ferrea de Loanda a Ambaca, e para a emissão ou collocação de acções ou obrigações em Londres, se esses contratos não constarem na integra dos relatorios acima pedidos. = O deputado, M. Espregueira.

Requeiro que, pelo ministerio das obras publicas, se remetta a esta camara copia do parecer da procuradoria geral da coroa, datado do 3 de agosto de 1889, sobre a reclamação da companhia nacional de caminhos de feito, relativo á garantia das despezas de exploração na linha de Foz Tua a Mirandella. = O deputado, M. Espregueira.
Mandaram-se expedir.

DECLARAÇÕES DE VOTO

Declaro que se estivesse presente na sessão de hontem teria votado contra o projecto do bill de indemnidade. - O deputado, M. Espregueira.

Declaro que se estivesse presente nas sessões em que se votaram as moções dos srs. deputados barão de Paço Vieira (Alfredo) e Pinheiro Chagas as teria approvado. = VV. de Lima.
Para a acta.

O sr. Presidente: - Em virtude da participação que acaba de ser lida e da qual consta não haver reclamação alguma contra a eleição dos srs. Joaquim Pedro do Oliveira Martins e Caetano Pereira Sanches de Castro, proclamo deputados os referidos senhores.
O sr. José Maria de Alpoim: - Pedi a palavra para dar conta á camara dos attentados praticados em alguns concelhos por auctoridades administrativas.
Como não está presente o sr. Arroyo, peço ao sr. ministro da fazenda que seja, junto do sr. Antonio de Serpa, o phonographo do que vou dizer.
O governador civil do Porto mandou proceder a uma syndicancia á camara municipal de Vallongo. Não me queixarei das causas dessa syndicancia, que são extraordinárias, mas quero referir-me a um facto particular praticado pelo administrador do concelho, e que consta da carta que vou ler.
Não faço considerações a este respeito, mas já v. exa. vê que se commetteu uma grande violencia.
Com respeito a Villa Nova de Gaia, tenho tambem as seguintes informações:
(Leu.}
Peço ao sr. ministro da fazenda que de conta d'estes factos ao sr. presidente do conselho, e que inste com s. exa. para que do uma vez para sempre terminem estas violencias ditas eleitoraes, que mal se comprehendem na quadra eleitoral, mas que fora d'ella é absolutamente inadmissivel que continuem a praticar-se. (Apoiados.)
(S. exa. não reviu as notas tachygraphicas.)
O sr. Ministro da Fazenda (Franco Castello Branco): - Tenho a declarar ao illustre deputado que o sr. ministro do reino não póde comparecer hoje por ser dia de assignatura real; mas communicarei a s. exa. as observações do illustre deputado, e se os factos forem verdadeiros, o sr. ministro do reino, continuando a seguir as normas de que tem dado tantas provas, ha de empregar todos os esforços para pôr cobro a esses abusos e serem devidamente castigados.
O sr. José Maria de Alpoim: - Sem concordar com as sobejas provas que o sr. Antonio de Serpa tem dado, concordo comtudo que o sr. ministro da fazenda comunicará a s. exa. as minhas observações.
O sr. Fernando Palha: - Tenho de occupar-me de tres assumptos, mas só um diz respeito á pasta da fazenda, e por isso suppondo, o sr. ministro me fará a honra de me responder, o deixo para o fim.
O primeiro, embora pareça insignificante, no fundo tem grande importancia.
Li ha dias em um jornal, que um cidadão que se divertia em caçar pombos no Terreiro do Paço, com um elastico e chumbo, fora preso e conduzido ao governo civil para pagar uma multa.
Não me consta que haja qualquer disposição legal que prohiba que qualquer possa caçar pombos vadios. Pois é do que se trata.
Os pombos que se vêem no Terreiro do Paço não têem dono, são res nullius, e, por consequência, a todos é licito utilisar-se d'elles.
Lamento que o sr. ministro do reino não esteja presen-

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te, pois se ha assumpto que esteja em harmonia com a sua personalidade é este, tão ligeiro, tão aereo. E não creia a camara que eu tenha desamor aos animaes e muito menos aos pombos, symbolo do amor, embora não de fidelidade conjugal, porque essa não existe entre elles, como por experiencia o tenho conhecido.
Mas se os pombos merecem toda a protecção, os homens, os cidadãos portuguezes merecem-na ainda mais do que elles; não vejo rasão para que se prenda um cidadão, porque um dia, provavelmente para completar o menu do seu magro jantar, se lembrou caçar pombos com elastico e chumbo no Terreiro do Paço, sem risco algum para ninguem.
Acho graça que a policia se arvore em legislador, e imitando os exemplos que vem de cima, faça tambem dictadura. Faz-me lembrar uma caricatura bem conhecida, em que um mandarim de botão de diamante castiga um mandarim de botão de crystal, o qual igualmente castiga um de botão mais pobre, e assim successivamente até ao mandarim que desanca o pobre desgraçado coolie que não tem botão.
Eu sou fraco jurisconsulto, é possível que hajam disposições quaesquer legaes que auctorisassem a policia a fazer isto; mas não as conheço, e tendo já consultado um collega meu, jurisperito, disse-me que não tinha conhecimento de que haja lei que tal auctorise, e sendo assim é um abuso grave praticado pela auctoridade.
Se o facto fosse inspirado por desejo de dar protecção aos animaes, os primeiros a reprimir seriamos nós, seria Sua Magestade El-Rei, que ainda ha dias os jornacs diziam ter ganho a primeira poule no tiro aos pombos da Tapada, e seria eu também, que apesar de muito imperito, tenho da mesma forma e por mero divertimento morto alguns pombos. Quando nós por divertimento commettemos distas maldades sem castigo, não é justo, nem rasoavel que um cidadão qualquer que teve a lembrança, bastante engenhosa, de querer aproveitar aquillo que ninguem aproveita, seja punido com uma pena que corresponde a um verdadeiro delicio. (Apoiados da esquerda.)
O assumpto, já o disse, tem um que de insignificante, mas no fundo representa um attentado contra a liberdade individual; não ha insignificancia quando se trata de factos desta natureza.
Peço ao sr. ministro da fazenda que refira as minhas palavras ao sr. presidente do conselho e ministro do reino, para que, se eu tenho rasão e as minhas observações colhem, tome alguma providencia a esto respeito.
O assumpto a que me vou referir agora tem mais gravidade e não se refere tambem á pasta da fazenda.
Não está presente o sr. ministro dos estrangeiros, o que não me espanta. (Apoiados da esquerda.) O meu sentimento desde a sessão nocturna de hontem, a que assisti, relativamente ao sr. ministro da fazenda, é pelo menos de dó. Fui-me embora mais cedo do que tencionava para não me impressionar de mais. - Olhava para s. exa. e lembrava-me a scena de abandono do rei de Lahore; via-o isolado, desacompanhado, alvo dos ataques de todos e tendo apenas por cyrineu o sr. Carrilho, cyrineu permanente de todos os ministros da fazenda. (Riso.) Não me admira, pois, que s. exa. continue hoje no mesmo isolamento. Parece que está condemnado a isso.
Tenho pena, porque alem da amisade pessoal que me liga a B. exa., não posso deixar de admirar, e não só eu, como todos, as intenções tão nobre e audazmente manifestadas por s. exa. na lei de meios.
Creia s. exa. que se eu fosse de facto, como sou de direito, presidente da camara municipal de Lisboa, havia de propor aquella illustrada corporação, que diante de cada ministerio se pozesse um bebedouro, não para os animaes, mas para os homens políticos, e que em vez do dístico que se lê n'esses que hoje existem em Lisboa, se lesse o que s. exa. inseriu na lei de meios, tão conveniente me parece que não se esqueça.
Temo-nos occupado largamente das questões africanas, talvez não tanto quanto seria necessario e quanto desejaríamos) mas estamos esquecidos de que ha colónias portu-guezas que têem mais importância e valor do que as de Africa, porque até offerecem a vantagem de não termos n'ellas soberania, e estarmos por consequência livres de recebermos insultos como acabamos de receber por causa de colónias africanas.
Escuso de rememorar os factos que se têem passado no Brazil, ha mezes a esta parte. Toda a gente conhece o decreto dictatorial ou revolucionário, como lhe quizerem chamar, pelo qual se torna obrigatória a naturalisação de todos os cidadãos estrangeiros residentes ali na occasião da revolução.
Sei que o governo transacto iniciou negociações tendentes a uma acção collectiva de todos os paizes que têem interesses do Brazil para que aquelle decreto fosse modificado. Não sei se o governo actual se tem occupado de tão momentosa questão, e eu o que desejava era chamar para ella a attenção do sr. ministro dos negócios estrangeiros.
Os jornaes francezes já nos annunciaram que o governo d'aquella nação reconhecera o governo provisório do Brazil, recebendo em troca disso vantagens excepcionaes para os súbditos francezes.
Eu respeito muito qualquer sentimento de delicadeza, ou como lhe queiram chamar, que nos possa levar a hesitar em reconhecer o governo da republica brazileira; mas, se esse sentimento vae até ao ponto de prejudicar interesses tão vitaes como os que ali temos, deixa de merecer respeito para só merecer censura.
Não preciso rememorar factos históricos, lembro que se olharmos bem para o que se passou na occasião da independência não são muitas as causas dos nossos escrúpulos alem do intimo parentesco com a família real portugueza, que todos respeitámos.
Lembro ao governo a resposta do marquez de Pombal, depois do terramoto, a quem lhe perguntaram o que havia a fazer: cuidar dos vivos e enterrar os mortos.
O império está morto, vivos continuam os interesses dos nossos concidadãos residentes n'aquelle paiz.
E d'elles que convém cuidar.
Sou o primeiro a reconhecer justificados os escrúpulos que haja em o nosso governo tomar a iniciativa de reconhecer a nova forma do governo; mas lembrava que ha um tratado de commercio pendente, de grande interesse para o paiz e que por mais justificados que sejam esses escrúpulos, era conveniente que se aproveitasse habilmente essa negociação, a fim de podermos conseguir vantagens reaes para Portugal.
E agora é de negocio que diz respeito á pasta do sr. ministro da fazenda que me vou occupar.
Eu não posso ser taxado de quebrar lanças pela agricultura; pelo contrario, entre os agricultores sou tido como inimigo da agricultura. E um absurdo, porque d'ella vivo e não vivo de outra cousa. Mas é assim, e por isso quando venho tratar de agricultura, mais imparcial deve ser considerada a minha voz do que a de outros que se apresentam como paladinos encartados d'ella.
Quando eu pertenci á outra casa do parlamento e se tratou ali do drawlaclt concedido aos azeites italianos o francezes, eu combati as affirmações de um membro daquella casa que se insurgia contra aquella concessão.
A minha opinião é que emquanto existir uma industria importante, a da conserva de sardinhas em latas, e outras, como existo hoje, não é licito deixar de conceder o drawback ao azeite exclusivamente necessario para essas conservas.
Esse azeite é o azeite italiano e o francez de primeira ordem.
Já não está no mesmo caso o azeite hespanhol, que é

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peior do que o nosso, como toda a gente sabe, e se ha algum que seja melhor ou esteja nas condições do azeite italiano e do francez é em tão pequena quantidade que é absorvido completamente pelo mercado interno.
N'estas condições o pedido de concessão do drawback ao azeite hespanhol significa apenas uma tentativa de descaminho de direitos e mais nada.
Segundo me consta, note v. exa. que estou fazendo obra por informações extra-officiaes, por isso que tendo amigos no ministerio da fazenda, sigo sempre a regra de não pedir aos meus amigos informações que podem ser profissionaes, e que a sua amisade os leve a dar ou que a sua posição profissional os obrigue a negar; segundo me consta, digo, no drawback ao azeite italiano concede-se que o peso do azeite em cada caixa de sardinhas represente o terço.
Isto é absolutamente inexacto.
O azeite contido na caixa pesa muito menos do que o terço da totalidade d'aquillo que entra na caixa, succedendo por consequência que, se na concessão do drawback aos azeites italianos e francezes não ha desvantagem absolutamente nenhuma para o lavrador portugues, por isso que não devemos ter a pretensão de substituir o nosso azeite por aquelle no fabrico da conserva de sardinhas, e porque
O saldo não e vendido para consumo por ter maior valor do que os preços do nosso mercado, ha desvantagem para o fisco, porque depositando-se para o pagamento do direito a quantia que o fisco suppõe necessaria para uma certa e determinada quantidade de caixas, e como o azeite dá para muito maior numero de caixas do que o fisco suppõe, succede que, pelo menos, nas caixas consumidas no interior do paiz, o azeite escapa aos direitos que pagaria se só se concedesse o drawback ao azeite exactamente necessario para as conservas.
Mas o que vae agora succeder com o drawback ao azeite hespanhol é que, â sombra desta desigualdade, desta dif-ferença entre o azeite que se suppõe entrar na caixa e o que realmente entra, ha de sem pagar direitos, entrar azeite hespanhol para o consumo, com grande prejuizo do azeite nacional.
Pergunte v. exa. a quem quizer, não entra em Lisboa 1 litro ou 1 kilogramma de azeite hespanhol, que possa servir para a fabricação de conservas de sardinhas. Logo não ha rasão para se lhe conceder o drawback.
Poderia haver rasões politicas, diplomaticas; mas estas rasões não existem, porque, como o sr. ministro sabe melhor do que eu, não temos tratado de commercio com a Hespanha, nem modus vivendi, concedendo o tratamento de nação mais favorecida, aliás teriamos de sujeitar-nos, ap-pellando para futuras negociações e podermos chegar a qualquer accordo com a nação vizinha.
Assim o favor é absolutamente gratuito e em prejuízo evidente do lavrador portuguez.
Eu sei que o despacho que se concedeu a esse drawback é devido á inexperiência do sr. ministro da fazenda; mas não é com o animo de incommodar s. exa. que eu faço estas reflexões, assim como não me póde taxar de cruel por eu lhe chamar inexperiente, porque a experiencia só dá o tempo, e s. exa. tem tantas outras qualidades dignas de elogio e de louvor que póde bem com esta classificação.
Lembro este facto a s. exa. para que se acautele e que a pretexto de boa harmonia de relações para com uma nação amiga e vizinha não venha favorecer, nem mesmo subditos dessa nação... nem quero dar o nome que merecem os que á sombra desse bom sentimento de s. exa. vem guerrear-nos nos nossos justos e ligitimos interesses.
E creia s. exa. e d'ahi as iras dos meus collegas agricultores, que se não fossem justos e ligitimos 03 interesses porque pugnam não era eu que me levantava a defendel-os.
O sr. Ministro da Fazenda (Franco Castello Branco) : - Com relação aos pontos tratados pelo meu amigo e illustre deputado o sr. Fernando Palha, que se referem a assumptos dependentes das pastas do reino e estrangeiros, eu, accedendo, como é meu dever, ao pedido de s. exa., transmittirei as suas observações aos meus collegas que pessoalmente se apressarão a vir conversar com s. exa. a tal respeito.
Não me farei agora cargo de fazer quaesquer observações nem de dar resposta senão á parte era que s. exa. se dirigiu directamente a assumptos dependentes da minha pasta e de mais a mais de minha responsabilidade absoluta e completa.
Effectivamente foi concedido muito recentemente que os azeites hespanhoes gosassem provisoriamente do mesmo beneficio concedido aos azeites italianos e francezes, quando fossem empregados em conservas de peixe.
O sr. Fernando Palha arreceia-se principalmente da minha ignorancia no assumpto; o effectivamente, sou eu o primeiro a confessar que não tenho conhecimento especial nem concreto d'este assumpto, tambem tão especial e tão concreto; mas como ha formulas legaes em virtude das quaes o ministro ignorante tem de recorrer aos technicos que têem de attender e ouvir, o governo ouviu sobre o assumpto o conselho de commercio, junto do ministerio das obras publicas, o o conselho superior das alfandegas, junto do ministerio da fazenda.
O primeiro apreciou a questão sob o ponto de vista economico e dos interesses geraes da nação; e o segundo sob o ponto de vista fiscal, para indicar a conveniencia ou inconveniencia fiscal da concessão por causa da possível de fraudação dos direitos.
Ambos estes conselhos deram de parecer ao governo que fizesse , a concessão provisoria do drawback concedido aos azeites francezes o italianos, aos azeites hespanhoes, porque entendiam não haver em tal concessão perigo ou prejuízo para o fisco nem para os interesses económicos da nação.
Se me e permittido, apresentarei agora a minha opinião a este respeito, dizendo a s. exa. que me parece não deverá vir longe a occasião da podermos prescindir do azeite hespanhol como materia prima da industria de conserva de peixe, assim como a do termos de rever a legislação sobre este drawback. O que effectivaraente eu não tinha era fundamento algum para negar a uma nação amiga com a qual todos aconselham que estreitemos relações, a uma nação que nos tem dado tantas provas de deferência e com quem ainda ha pouco chegámos a um accordo para a industria da pesca, o que haviamos concedido á Itália e depois se tornara extensivo a França.
S. exa. comprehende que as boas relações entre os paizes são como as boas relações entre os homens; desenvolvem-se, fortificara-se ou enfraquecem, conforme a cordialidade do trato e os processos como são tratados os interesses de cada um.
Que rasão podia eu dar, para negar á Hespanha o que havíamos concedido á Italia e á França?
Por termos com estas nações relações mais cordeaes e mais intimas?
Ninguém seguramente o sustentará!
Disse s. exa. que os azeites hespanhoes não são ainda hoje bem fabricados nem de molde a poderem servir como materia prima na industria da conserva. Mas então não tem o facto consequência alguma pratica. (Muitos apoiados.)
Não posso comprehender que um industrial, podendo ter azeite bom para a sua industria, e toda a gente sabe a importância que tem o azeite n'aquella industria, não comprehendo como este industrial ha de preferir o azeite hespanhol, aliás de inferior qualidade.
O sr. Fernando Palha: - V. exa. não attende a isto.
O Orador: - Attendo e já vou responder.
(Interrupção do sr. Fernando Palha.)
S. exa. diz que ha um saldo, mas eu já disse que consultei os conselhos superior das alfandegas e de commercio,

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os quaes, se houvesse saldo, não deixariam de dizer a importância que teria sob o ponto de vista dos direitos; mas disseram que nenhum prejuízo, nenhuma perda de interesses adviria para a fazenda do drawback concedido aos azeites hespanhoes nas mesmas condições em que o for aos azeites italianos e francezes.
E se o facto allegado por s. exa. é verdadeiro, com estes azeites se daria a fraude.
O sr. Fernando Palha:-Faça a experiencia em sua casa.
O Orador: - Eu não vou estabelecer em minha casa a industria da conserva de peixe. Ainda mesmo que eu não fosse ministro da fazenda não me dedicaria a esta industria, e portanto não posso fazer experiencia, nem agora nem mais tarde.
Torno a repetir, o governo não procedeu de leve nesta questão. Consultou as estações competentes, que são os conselhos superior das alfândegas e de commercio, e um e outro aconselharam o governo a que concedesse o drawback tambem aos azeites hespanhoes.
Estes conselhos não tiveram o mesmo receio, nem viram os perigos apresentados pelo sr. Fernando Palha, principalmente o conselho do commercio, o desde que isto succede, pergunto, que resposta deviamos nós dar â Hespanha sobre este assumpto? (Apoiados.)
Eu entendo que ha uma grande conveniencia em se fazer uma revisão da nossa legislação a este respeito, mas em quanto essa revisão não só fizer, devem fixar-se a estas bases provisorias.
Tenho muita consideração e respeito pelas opiniões do sr. Fernando Palha, mas s. exa. não me levará a mal que eu, tendo por um lado dois corpos, consultivos a indicar-me um certo caminho, e por outro lado s. exa. a apresentar-me outro caminho, eu siga aquelle que seguia, e continue a julgar que com isto não prejudico os verdadeiros interesses do paiz, e dou uma prova sincera do desejo que devemos ter em conservar as melhores relações com uma nação vizinha e a que nos prendem relações perfeitamente affectuosas. (Apoiados.)
Antes de terminar, e como o ar. Fernando Palha é um dos meus melhores amigos, não quero deixar s. exa. impressionado com o isolamento em que o illustre deputado disse que me deixavam os meus collegas.
Se s. exa. frequentasse ha mais annos as discussões da camara teria notado que nas questões de fazenda, de si aridas e pouco interessantes, o ministro da fazenda muitas vezes se acha aqui só; e eu mesmo, se não fosse por dever do cargo, não vinha a cilas. Alem disso, como já disse, hoje ora dia de assignatura real, o não tendo os ministros o dom da ubiquidade, como Santo Antonio, não poderiam estar em muitas partes ao mesmo tempo.
(S. exa. não reviu as notas tachygraphicas.)
O sr. Barão de Paço Vieira (Alfredo): - Por parte da commissão de verificação de poderes requeiro a v. exa. que consulte a camara sobre se, dispensando-se o regi mento, permitte que entre já em discussão o parecer D.° 126 que se refere a um deputado por accumullação. O parecer acha-se impresso e distribuído ha mais de quarenta e oito horas.
Foi despensado o regimento.
Leu-se na mesa o parecer que é o seguinte:

PARECEU N.º 126

Senhores.- A vossa primeira commissão de verificação de poderes foram presentes os processos eleitoraes relativos a todos os círculos do continente e ilhas adjacentes, e bem assim as synopses organisadas pelas tres commissões de verificação de poderes, dos votos obtidos pelos diversos candidatos a deputados por accumulação.
Desses documentos vê-se:
Que forão votados

José Maria de Alpoim Cerqueira Borges Cabral .... 56:092 votos
Luiz Gonzaga dos Reis Torgal .... 46:477 votos
Francisco José de Medeiros .... 38:093 votos
Foaquim Pedro de Oliveira Martins .... 30:849 votos
~aetano Pereira Sanches de Castro .... 33:588 »
Tose Augusto Correia de Barros .... 29:097 votos
Joaquim Alves Matheus .... 28:680 votos
Guilhermino Augusto de Barros .... 26:907 votos
Anselmo de Assis Andrade .... 23:870 votos
Júlio Carlos de Abreu e Sousa .... 23:587 votos
Álvaro de Castro Araújo Cardoso .... 5:789 »
Joaquim Carlos Paiva de Andrade .... 5:705 »

Que já se acham proclamados deputados os tres primeiros cidadãos, e apurados os dois seguintes, faltando, portanto, agora unicamente apurar qual deve ser o sexto leputado por accumulação, em harmonia com o disposto no artigo 4.º da lei de 21 de maio de 1884;
Que o cidadão José Augusto Correia de Barros obteve no districto do Porto 9:566 votos, sendo:

Na Povoa de Varzim ..... 506 votos
Santo Thyrso .... 2:160 votos
Felgueiras .... 2:200 votos
Amarante .... 100 votos
Marco de Canavezes .... 2:000 votos
Paredes .... 600 votos
Bouças .... 500 votos
Villa Nova de Gaia .... 1:500 votos

Que n'este ultimo circulo foi apresentado na assembléa do apuramento geral dos votos um protesto, assignado pelo presidente da assemblca, contra o apuramento dos votos que n'elle recairam, com o fundamento deste cidadão não poder ser votado, visto ter deixado de ser governador civil do districto do Porto ha menos de seis mezes, e ser assim inelegivel, nos termos do artigo 4.8 da lei de 23 de novembro de 1859.
Em vista disto, depois de demorado estudo e larga discussão, e
Attendendo que o cidadão José Augusto Correia de Barros foi exonerado, a seu pedido, do cargo de governador civil do districto do Porto, por decreto de 14 de janeiro de 1890 (Diário do governo, n.° 13, de 17 do mesmo mez e anno), e que as eleições tiveram logar no dia 30 do mez de março, imo havendo, portanto, decorrido ainda seis mezes contados desde a exoneração, quando se procedeu às eleições;
Attendendo a que não se contando os 9:566 votos do districto do Porto, o numero total d'elles ficará de 29:907, reduzido a 20:341, e assim candidato mais votado o cidadão Joaquim Alves Matheus, que obteve 28:680 votos;
Considerando que os governadores civis não podem ser votados para deputados na área da sua jurisdicção, quer emquanto a exercem, quer durante os seis mezes seguintes á sua exoneração (artigo 12.º § 1.° do decreto de 30 de setembro de 1852 e artigo 4.° da lei de 23 de novembro de 1859), e que, portanto, são nullos e nenhum effeito produzem os votos obtidos n'estas condições:
A vossa commissão é de parecer que deve ser proclamado deputado por accumulação o cidadão Joaquim Alves Matheus.
Sala das sessões da primeira commissão de verificação do poderes, em 12 do junho de 1890. = Pedro Victor da Costa Sequeira - José Estevão de Moraes Sarmento - Luciano Monteiro = Marcellino Mesquita - Luiz Bandeira Coelho, vencido = Barão de Paço Vieira (Alfredo), relator.

O sr. Emygdio Navarro: - Sr. presidente o parecer,

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que está, em discussão se for votado no sentido que a commissão propõe, aproveita a um correligionário nosso; se for votado noutro sentido, aproveita tambem a outro nosso correligionário. A opposição progressista entende que neste caso não deve pronunciar-se a esse respeito, e por isso pede licença para se retirar da sala.
A opposição progressista retirou-se da sala.
Em seguida procedeu-se á votação por espheras, sendo o parecer approvado por 08 espheras brancas.
O sr. Pinheiro Chagas: - Mando para a mesa o parecer da commissão do bill sobre as emendas que foram apresentadas na discussão do projecto.
Peço a v. exa. que se digne consultar a camara sobre se dispensa o regimento, para este parecer entrar já em discussão.
(Leu-se.)
Foi despensado o regimento.
O parecer é o seguinte:

Pertence ao n.° 109

Senhores. - A vossa commissão, tendo considerado detidamente as numerosas emendas que foram mandadas para a mesa durante a discussão do bill, entendeu de accordo com o governo que ellas naturalmente se juntaram em tres grupos diversos, o das emendas que tendiam a combater a economia do projecto, a contradizer a doutrina dos decretos, ou a substituir alguns d'elles no seu todo ou nas suas partes essenciaes, e essas emendas não pode deixar de as rejeitar; o das emendas cuja adopção lhe pareceu inopportuno agora, mas que entendeu que podiam ser submettidas às commissões que se occupam dos assumptos a que ellas se referem, e que, acceitando-as, as poderão converter em projectos de lei especiaes, e finalmente das emendas que lhe pareceu que podiam melhorar os decretos ou reparar alguns lapsos, e que por conseguinte acceitou, são estas:
A proposta do sr. Manuel de Arriaga para que seja substituida a palavra applicadas por applicaveis no artigo 5.º do decreto n.° 2 de 29 de março. Esta emenda foi proposta tambem pelo sr. Elvino de Brito, pelo sr. Cancella e pelo sr. Medeiros;
A proposta do sr. Roberto Alves para que sejam supprimidas as palavras de petição, no n.° 3 do artigo 3.° do decreto n.° 2, de 29 de março;
A segunda do sr. Medeiros para que se supprimam as palavras «transgressão de posturas ao regulamento municipal» no § unico do artigo õ.° do decreto n.° 2 de 29 de março; esta emenda tambem foi apresentada pelo sr. Roberto Alves;
A oitava do sr. Medeiros para um additamento ao artigo 19 do decreto n.° 3, supprimindo se porém, nesse additamento as seguintes palavras : «assim como lhe ficam pertencendo todas as mais attnbuiç3es que pertenciam aos juizes municipaes».
A proposta n.° 11 do sr. Medeiros;
A decima sexta proposta do sr. Eduardo José Coelho com relação a tribunaes de commercio;
Á decima oitava do sr. Eduardo José Coelho com relação a jurados commerciaes, esta foi tambem apresentada pelo sr. Cancella;
As duas propostas do sr. Adolpho Pimentel, uma relativa á dissolução das associações, outra relativa ao material typographico no decreto regulador da liberdade de imprensa;
As duas propostas do sr. João Pinto Moreira, uma emendando o § 7.° do artigo 1.° do decreto n.° 4, no mesmo sentido em que essa emenda foi proposta pelo sr. Roberto Alves, outra emendando o § 2.° do artigo 6.° do decreto n.º 6;
As duas propostas do sr. Pereira Leite, uma emendando a parte inicial do artigo 15.° do decreto n.° 3, outra fazendo um additamento ao artigo 3.° do decreto n.° 2 ;
A emenda do sr. Mattozo Corte Real relativa á contagem do tempo de serviço aos magistrados que vindo do ultramar ficam á disposição do ministerio da justiça;
Pareceu á commissão que deviam ser enviadas á commissão de beneficencia a emenda do sr. Vieira de Andrade ao decreto relativo às sociedades de soccorros mutuos, á de marinha as emendas do er. Ferreira de Almeida relativas á reorganisação de serviços de marinha, á de fazenda a emenda do sr. Ruivo Godinho relativa ao decreto das incompatibilidades. Outras emendas talvez poderiam ainda ser consideradas por diversas commissões e convertidas em projectos de lei, mas aos seus auctores fica evidentemente salvo o direito de as transformar em projectos que as commissões apreciarão.
Sala das sessões, em 20 de junho de 1890. = Luciano Cordeiro = João Pereira Teixeira de Vasconcellos = Aristides Moreira da Motta - José Estevão de Moraes Sarmento = J. B. Ferreira de Almeida = P. Victor - Pinheiro Chagas, relator.
Posto á votação o parecer foi approvação.
O sr. Albino de Figueiredo: - Mando para a mesa um projecto de lei, dividindo o concelho de Goes, do circulo n.° 45 (Arganil) em duas assembléas eleitoraes, a primeira com sede em Goes e a segunda com sede em Alvares.
Ficou para segunda leitura.
O sr. Espregueira : - Mando para a mesa os seguintes requerimentos e peço a v. exa. se digne dar-lhe o destino conveniente.
Os requerimentos vão publicados a pag. 795.
Mandaram-se expedir.

ORDEM no DIA

Continuação da discussão de projecto de lei n.° 122 (orçamento rectificado)

O sr. Ministro da Fazenda (Franco Castello Branco): - O discurso do orador será publicado na integra e em appendice a esta sessão, logo que s. exa. haja revisto as notas tachygraphicas.)
O sr. José de Azevedo Castello Branco (para um requerimento.}:-Peço a v. exa. se digne consultar a camara sobre se quer prorogar a sessão até se votar este projecto.
Consultada a camara resolveu afirmativamente.
O sr. Francisco Machado:-Eu tinha pedido a palavra sobre o modo de propor.
O sr. Presidente:-Está votado.
O sr. Francisco Machado: - Continuem a fazer isto e digam que o systema parlamentar vae em decadencia. (Apoiados da esquerda.)
Requer-se a prorogação para se votar um projecto e não se dá a palavra sobre o modo de propor. (Apoiados da esquerda.)
Vozes: -Ordem, ordem.
O sr. Presidente : -Tem a palavra o sr. Mattozo Santos.
O sr. Mattozo Santos: - (O discurso será publicado na integra, e em appendice a esta sessão, quando s. exa. restituir as notas tachygraphicas.)
O sr. Alves Passos: - Requeiro a v. exa. que consulte a camara sobre se julga a matéria suficientemente discutida, na generalidade.
O sr. Francisco Machado: - Eu peço a v. exa. que mande verificar pelos srs. secretários se na sala ha numero sufficiente para uma votação.
Tendo-se verificado estarem na sala 62 srs. deputados, foi approvado o requerimento do sr. Alves Passos, e em seguida a generalidade do projecto.
Passando-se á discussão na especialidade foi votado sem discussão o artigo 1.°

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800 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Entrou em discussão o antigo 2.°, que é o seguinte:
Art. 2.° As despezas totaes do estado, ordinarias e extraordinarias, na metropole, do mesmo exercicio de 1889-1890, são rectificadas nos seguintes termos: ordinarias 43.3154:9870242 réis, extraordinarias 7.976:184$823 réis, tudo de accordo com a legislação vigente e com os mappas n.ºs 2 e 3, juntos a esta lei e que d'ella fazem parte.
§ unico. O governo decretará nas tabellas de distribuição de despeza do exercicio de 1889-1890 as rectificações necessarias em conformidade d'este artigo.
O sr. Eduardo Abreu: - Sr. presidente, eu tenho absoluta certeza de que todos n'esta casa são snfficientemente justos e rascáveis para não me alcunharem de atrevido, impertinente ou imprudente por entrar n'um debate d'esta natureza, e que pela sua importância e gravidade dos assumptos e problemas que n'elle estão incluidos só póde ser tratado por estaturas financeiras como aã dos oradores que me precederam, sr. Ressano Garcia, ministro da fazenda e Fernando Mattozo.
E uma sciencia esta, a das finanças, que não tenho nenhum receio do declarar á camara, nunca conheci, não conheço, e já agora na idade em que estou é demasiado tardo para aprendel-a.
Declaro francamente que não sei ler o orçamento geral do estado, o que não admira, porque ainda hontem um nosso collega, creio que o sr. Columbano, ainda mais velho do que eu, me disse que ruio percebia o orçamento. Por consequência tenho mais collegas na desgraça. (Riso.)
Mas, sr. presidente, como não sei nem percebo destas questões financeiras, procurei saber d'aquclles que as sabem e percebem; e n'esta derrota financeira tenho um barómetro precioso, da machina a mais perfeita e maravilhosa que se conhece, e a mais bem acabada, mais sensível e mais correcta (vá mais este adjectivo por conta do sr. ministro dos negócios estrangeiros), (Riso.} das que eu conheço n'estas questões financeiras.
É o meu respeitavel amigo e illustre parlamentar, o sr. Carrilho. (Riso.)
Na sessão de hontem e hoje, emquanto fallava o sr. ministro da fazenda, eu estava constantemente a espreitar a sympatbica phisionomia do sr. Carrilho.
Pois, posso affirmar a v. exa. que emquanto fallava o sr. ministro da fazenda, nem um só gesto de approvação, nem uma só palavra de applauso, e comtudo, ha dezesete ou vinte annos a esta parte sempre pela canicula, (Riso.) por esta epocha, costumo ver o sympathico director geral da contabilidade publica sentar-se n'aquella cadeira e dar um solemne apoiado no momento solemne em que ali se levanta o ministro da fazenda para abrir o orçamento geral do estado. (Riso.)
Ha dezesete ou vinte annos costumo ver o muito sympathico director geral da contabilidade publica pronunciar no momento solemne, em que fé discute o orçamento, um aparte que elle invariavelmente costuma dirigir às opposições parlamentares.
O áparte é este: Isto é incrivel! (Riso.) E comtudo, este anno, pela primeira vez, fallou o sr. ministro da fazenda e ainda se não ouviu o apoiado solemne do sr. Carrilho, que vale milhões, que vale toneladas de inscripções, que vale a farda de um ministro! (Riso.)
É esta a prova mais solemne, a não ser que o silencio do sr. Carrilho seja interpretado por elle estar extasiado perante o sr. ministro da fazenda; que o considere superior a Fontes, a quem s. exa. dava o seu apoiado solemne, a Serpa Pimentel, a Barros e Cunha, a Barros Gomes, a Hintze Ribeiro, a Marianno de Carvalho, a Lopo Vaz, a todos os ministros que ali se têem tentado.
A não ser que o seu solemne silencio seja por estar extasiado de admiração perante o sr. ministro fia fazenda, significará então que a obra financeira do sr. Franco Castello Branco está muito pessimamente collocada.
E o que posso deduzir do silencio do sympathico director geral da contabilidade.
Longe de mim a idéa de responder á decima parte do que disse o sr. ministro da fazenda, porque resposta cabal e brilhante foi a que lhe deu o sr. Fernando Mattozo; (Apoiados.) mas hontem á noite o sr. ministro da fazenda pronunciou aqui umas phrases sobre as quaes eu meditei profundamente ate hoje, e meditei profundamente, porque o sr. ministro da fazenda, estranhando que se trouxesse para esta casa uma certa questão, dizia ao sr. Ressano Garcia que não podia trazer uma tal questão para esta casa.
Pois então não basta a questão com a Inglaterra?
Na no ministerio da fazenda alguma cousa que se não possa trazer para esta casa?
Então e necessario que por simples noticias telegraphicas se saiba do ultimatum de 11 de janeiro, e o governo de Sua Magestade não diz nada ao parlamento?
Então lê-se um officio de um governado a de uma colonia no ultramar, em que se diz que tinham sido mortos dois soldados portuguezes e queimada a bandeira portu-gucza, e o governo não procede ou diz que vae proceder a uma. syndicancia, e que é uma questão tão grave que nem em sessão secreta se póde d'ella tratar no parlamento?
Depois, levanta-se um deputado, profere umas palavras, e o sr. ministro levanta-so e diz que para o parlamento portuguez não se podem trazer uns certos factos que são importantes! Isto para mim é extraordinario!
Sr. presidente, é-me muito doloroso entrar na parte especialissima do projecto que se refere á verba de réis 40:000$000 que entra no capitulo da beneficência publica, e é-me dolorosa porque os unicos documentos que tenho sobre esta questão foram enviados á camara e foram-me entregues por um illustre deputado que os pediu, figurando n'elles duas pessoas que muito respeito, e que pedem se lhes entregue esse dinheiro.
São dois homens que respeito, um dos quaes é meu collega, e o outro cavalheiros tenho motivos para o respeitar, e até é meu correspondente em Lisboa; mas eu entendo que, quando os deputados estiverem dispostos a perder um bocadinho das suas relações pessoaes, para cumprirem o seu dever, isso será motivo para as questões caminharem um pouco melhor.
Apesar de figurarem nessa questão dois cavalheiros com quem tenho relações de amisade, se fossem meu pae e meu irmão, eu vinha contestar do mesmo modo o direito com que se pede este dinheiro.
Ainda não ouvi dentro desta casa emittir uma só opinião favorável á entrega d'estes 40:000$000 réis, e até agora não tem sido esta verba defendida por pessoa alguma.
E não ha de haver um só deputado que falle contra isto!
E extraordinario isto, sr. presidente.
Ha quatro annos vagava pelos corredores desta camara uma senhora de quarenta o tantos annos, em cuja physionomia, macerada pelos desgostos, se viam ainda os vestigios da belleza, e cujo trato mostrava quanto ella era distincta, e quanto era distincta a sua familia, que eu conheci.
Esta senhora, que era viuva do um official do exercito, andou tres mezes pelas secretarias d'estado, com um grande masso do papeis debaixo do braço, para lhe serem pagos 72^500 réis que se tinham ficado a dever ao marido, que tinha morrido.
Faltava um documento legal, e a repartição que se negava á entrega do dinheiro, procedia conforme a lei, procedia legalmente.
A exigencia do documento era perfeitamente justificada.
Ella não possuía este documento, e por isso andou tres mezes pelas secretarias sem conseguir cousa alguma.
Eu andei com ella alguns dias, e nada tambem consegui.

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SESSÃO DE 20 DE JUNHO DE 1890 801

O estado não podia pagar por faltar aquelle documento só, entre o masso de documentos que a pretendente possuia.
Isto para se pagarem 72$500 réis.
Essa senhora morreu acabrunhada de desgostos por isto.
Agora, para se pagarem 40:000$000 réis não é preciso nem contas, nem recibo, nem opinião do tribunal de contas, nem nada; bastam simplesmente duas linhas! (Vozes: - Muito bem.)
Nem o chefe do estado, enviando uma carta, seja a quem for, ainda que vá acompanhada pelos sellos do estado, podo exigir, sem as formalidades legaes, que lhe paguem o que quer que seja; (Apoiados) quanto mais qualquer cidadão portuguez, seja elle quem for, sejam quaes forem os motivos que o recommendem á sympathia publica. (Apoiados.)
Para que serve o tribunal de contas, e para que servem todas essas exigencias burocráticas, para que o mais humilde funccionario possa receber os seus honorários? (Apoiados.)
Para que é isso tudo? (Apoiados.)
O nobre ministro da fazenda apresentou hontem aqui um argumento contra o qual eu protesto energicamente.
Disse s. exa., e disse-o entre os applausos da sua maioria, que não era justo que, tendo-se praticado acto de beneficencia para com uns, não se praticassem tambem para com outros; e portanto que se deviam pagar os 40:000$000 réis.
Ah! sr. ministro da fazenda, eu queria que v. exa. visse, como eu vi muitas vezes, á porta dos hospitaes da universidade de Coimbra, chegarem ali doentes da Beira Alta e da Beira Baixa, depois de terem passado a noite em claro e depois de terem caminhado a pé, para a final serem repellidos, porque o orçamento do estado não permittia que fossem soccorridos!
Isto existe em documentos públicos; e produziu-me uma indignação tão profunda que no próprio acto em que estava defendendo theses protestei contra a violencia que ali se estava fazendo aos sacratíssimos principies de humanidade, não se admittindo doentes n'aquelle hospital, porque não o permittiam as forças do orçamento.
Pois o estado é assim cego e surdo às portas de um hospital, negando a uns, aquillo que permitte a outros, o ha de com esse principio que o sr. Franco Castello Branco aqui apresentou, ir dar 40:000$000 réis, porque metade desse dinheiro foi explorado e roubado pelos agiotas? Pois que?! Diz-se e está provado por estes documentos, que estes cavalheiros que perderam o dinheiro, foram, segundo elles confessam, na sua boa fé enganados, roubados e ludibriados, e querem passar este ludibrio, este roubo, este atrevimento dos agiotas de Lisboa para um encargo do estado, e elles ficarão com os braços cruzados muito descansados?!
De quem é a responsabilidade? Do sr. Luciano de Castro? Não é. (Apoiados.)
Era preciso ver-se e conhecer-se o sr. Luciano de Castro na sua secretaria destado, sempre que se tratava de despezas publicas, para se observar o quanto s. exa. era cuidadoso e meticuloso, até ao ponto de pedir que muitas commissões fossem exercidas gratuitamente a fim do não sobrecarregar a sua secretaria como despezas. Isto é um facto que se passou commigo e se tem passado com muita gente.
Foi illudido na sua boa fé? Seria. S. exa. não podia por forma nenhuma pensar que a verba do fundo de beneficencia, que é limitadíssima, fosse excedida na importantíssima somma do 40:000$000 réis.
Nunca o podia imaginar; e as cartas e documentos trocados que se publicaram defendem completameate o procedimento d'aquelle cavalheiro. (Apoiados.)
Mas se aquelle illustre cavalheiro errou, que não errou, se procedeu mal, que não procedeu, se exorbitou, que não exorbitou, o governo que está ahi em nome da economia e da moralidade, porque não procede energicamente, recusando o pagamento dos 40:000$000 réis? Isto é logico e claro.
Sc os srs. ministros estão realmente ahi em nome das economias e da moralidade. (O sr. Ministro da Fazenda: - Apoiado.) Só os srs. ministros estào realmente ahi, para castigar erros o abusos, sejam realmente enérgicos, lutem contra tudo o contra todos, recusem o pagamento dos 40:000^000 réis e façam recair essa responsabilidade inteira sobre aquelle que, na minha opinião, não a tem.
Era isto apenas o que tinha a dizer. Creia v. exa. que ficaria profundamente desgostoso, se no desempenho da minha missão do deputado, não protestasse energicamente, e creio que nisso mo acompanham todos os deputados da opposição (Apoiados.) e na sua consciência, todos os que estão dentro d'esta casa, o que mais e do que tudo, se não protestasse digo, contra este facto, sustentando que o estado não póde nem deve pagar os 40:000$000 réis.
Eu sei que se diz aqui «para pagamento do que se liquidar». Mas, como eu no orçamento nem mesmo nas próprias entrelinhas sei ler, appellava para a lealdade e provada competência do meu amigo o sr. Pereira Carrilho para que se dignasse, querendo, esclarecer-me a este respeito; e se não faço esto pedido ao nobre ministro da fazenda, é porque s. exa. está relmente fatigado.
Parece-me que n'aquillo que disse poderia tel-o maguado politicamente, mas pessoalmente não o maguei em cousa nenhuma.
E uma opinião perfeitamente respeitável a que s. exa. tem, mas o sr. Luciano de Castro não tem responsabilidade absolutamente nenhuma nesso facto. Colloque-se s. exa. na situação d'aquelle cavalheiro no dia em que lhe foi dirigida aquella carta, no dia 12 de janeiro.
O sr. Ministro da Fazenda (Franco Castello Branco): - V. exa. está enganado. Não houve carta nenhuma. A carta foi em março.
O Orador: - Mas em 12 de janeiro foi a carta dirigida com a do sr. governador civil...
Unia voz :- Houve a promessa verbal.
O Orador: - Peior ainda. N'aquelle momento, que era triste, cruel e duro, é que houve este accordo verbal! Foi no dia 12 de janeiro, quando estava o ministerio vacilante, que se estabeleceu o accordo!...
O sr. Ministro da Fazenda (Franco Castello Branco): - Se o ministerio estava vacilante, mais uma rasão para não tomar um compromisso d'aquella natureza; exactamente quando estava para largar o poder, é que toma uma auctorisação, que não estava na lei nem no regulamento!
O Orador: - Pois se s. exa. entende que a lei não auctorisa este pagamento, como é que como ministro da coroa, vem pedir que se vote para que se paguem estes 40:000$000 réis? (Apoiados.)
O sr. Ministro da Fazenda (Franco Castello Branco) : - Vim pedir ao parlamento.
O Orador: - Isso fique descansado; o parlamento dá-lhe a auctorisação. Mas se não lhe pedisse auctorisação s. exa. dava a prova mais solemne da sua verdadeira energia. S. exa. e muito enérgico, mas eu sou muito excêntrico, e as minhas excentricidades no caso actual consistem em exigir de s. exa., não o mesmo que tem feito, mas uma pequena cousa, ser inabalável, intransigente, que resista e que não pague estes 40:000$000 réis, porque não ha lei nenhuma que me defenda por eu os pagar. (Apoiados.)
Espero portanto que o sr. Carrilho me tranquilise. Faço este appello, que não é muito parlamentar, pedindo a um deputado que me responda; e estou certo de que s. exa. me responderá, pela muita consideração que tenho por s. exa.
(S. exa. não reviu as notas tachygraphicas)

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802 DIABIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

O sr. Carrilho: - Vou responder cabalmente á pergunta feita pelo illustre deputado relativamente ao parecer que se está discutindo.
Pergunta s. exa. se o governo ou o thesouro vae ou não pagar esta importância na sua totalidade e logo que passar este projecto de lei. O governo ha de pagar, até esta importância a somma que se liquidar e que for devida; nem mais, nem menos. Paga por que ainda não pagou, e não pagou por que teve todas as duvidas em fazer-se pagamento porque não tinha nenhuma auctorisação legal para poder fazel-o.
Pergunta qual é a rasão por que submette á sancção parlamentar o pedido para este pagamento; porque encontrou uma promessa solemne feita por um seu antecessor que a manteve, e por consequência não teve remedio senão apresentar ao parlamento a providencia necessaria para respeitar a fé da palavra do poder executivo. (Apoiados da direita.)
Se s. exa. me pergunta, individualmente, se eu dava esta auctorisação nos termos em que foi feita, eu respondo que não a dava. Cada um tem o seu feitio.
Accusou-me s. exa. ha pouco de eu applaudir quasi todos os ministros. Peço a s. exa. que se lembre de quantas vezes tenho levantado a minha voz para protestar contra enormes augmentos de despeza que se têern aqui feito, enormes augmentos de que todos, direita e esquerda, se estão queixando. (Apoiados.) Portanto se havia alguém nesta casa com o direito a criticar demasias de despezas, era eu, que por muitas vezes pedi até á camara que me desse uma votação nominal para saber quem tinha votado essa despeza; nem de um, nem de outro lado da camara me davam essa votação, e eu tinha de fazer uma declaração de que havia votado contra o projecto.
Para não demorar direi a s. exa. que o pagamento ha de ser feito em conformidade com o que se liquidar, á vistados documentos que hão de ser submettidos ao exame do tribunal de contas, em conformidade da lei, mas documentos que não podiam ir anteriormente á auctorisação do parlamento e á approvação da verba para este pagamento se effectuar. (Apoiados.)
Tenho dito.
(S. exa. não reviu as notas tachiygraphicas.)
Não havendo mais nenhum sr. deputado inscripto foi approvado o artigo 2.°
O sr. Presidente: - Vae ler-se o artigo 3.°
É o seguinte:
Artigo 3.° Fica por esta forma modificado o disposto na carta de lei de 19 de junho de 1889 e no decreto da mesma data, e revogada toda a legislação contraria a esta.
Foi approvado sem discussão.
O sr. Carrilho (por parte da commissão de redacção):- Mando para a mesa a ultima redacção do projecto de lei que acaba de ser approvado, ao qual a commissão não fez alteração nenhuma.
Enviado á camara dos dignos pares.
O sr. Presidente: - A ordem do dia para amanhã é a continuação da que vinha para hoje.
Está levantada a sessão.

Eram sete horas e meia da tarde.

Propostas de lei apresentadas n'esta sessão pelos srs. ministros da marinha e guerra

Proposta de lei n.º 133-D

Senhores. - A carta de lei de 26 de junho do anno proximopassado fixou em 13:350 recrutas o contingente para o exercito, armada o para as guardas municipaes e fiscal, e em 3:000 recrutas o contingente da segunda reserva para o effectivo do exercito em pé de guerra, e para o anno de 1889.
Não tendo o governo usado ainda da auctorisação que lhe foi concedida pelo decreto n.° 2 de 10 de fevereiro ultimo, não ha motivo para que no actual anno seja alterado o contingente de recrutas para o exercito, fixado em 12:000 homens, em harmonia com o disposto no decreto com força de lei de 19 de maio de 1884, e o de 3:000 homens, destinado á segunda reserva.
Havendo-se, porém, realisado a reforma do corpo de marinheiros, e a das guardas municipaes de Lisboa e Porto, e tendo a experiencia demonstrado ser extremamente diminuto o numero de 30 recrutas que pela citada lei devia ser augmentado ao contingente da armada, com destino ao regimento de engenheria e á companhia de torpedeiros, torna-se indispensavel elevar de 350 o numero de recrutas do contingente do actual anno, sendo 300 para a armada e 50 para as guardas municipaes.
Em vista do exposto temos a honra de apresentar ao vosso esclarecido exame a seguinte proposta de lei:
Artigo 1.° O contingente para o exercito, armada e para as guardas municipaes e fiscal é fixado no anno de 1890 em 13:700 recrutas, e será distribuído pelos districtos administrativos e concelhos autónomos do continente do reino e das ilhas adjacentes, pelo governo, nos termos do artigo 10.° da lei de 12 de setembro de 1887, e do respectivo regulamento, sendo 12:000 destinados para o serviço do exercito, 950 para o da armada, 450 para o das guardas municipaes e 300 para o da guarda fiscal.
Art. 2.8 Ao contingente da armada augmentar-se-hão 60 recrutas, a fim de serem destinadas ao regimento de engenheria e á companhia de torpedeiros, conforme as necessidades do serviço, sendo este numero deduzido do contingente activo votado para o exercito, e os ditos recrutas escolhidos dentre os mancebos de profissões marítimas, proclamados para o serviço de marinha de guerra, que tiverem sido sorteados com os numeros mais altos nas respectivas freguezias e na proporção do contingente naval, que for distribuído a cada uma das mesmas freguezias.
§ unico. Os recrutas, aos quaes se refere este artigo, podem ser recebidos no regimento de engenheria ou na companhia de torpedeiros, com a altura exigida para os da armada, e ficam sujeitos ao tempo de serviço, que se acha estabelecido para as praças de pret do exercito.
Art. 3.° O contingente de 750 recrutas para as guardas municipaes e fiscal será previamente encorporado no exercito, e distribuído do mesmo modo e na mesma tabeliã, devendo a força das referidas guardas ser fornecida por praças transferidas do exercito que estejam nas condições exigidas para o serviço das ditas guardas, preferindo-se as que voluntariamente se offereçam para o preenchimento deste contingente.
Art. 4.º O contingente da segunda reserva para o effectivo do exercito em pé de guerra é fixado, no anno de 1890, em 3:000 recrutas, e distribuído do mesmo modo pelos districtos administrativos e concelhos autónomos.
Art. 5.° Fica revogada a legislação contraria a esta.
Camara dos senhores deputados, aos 17 de junho de 1890.= A. de Serpa Pimentel = João Ferreira Franco Pinto Castello Branco = Julio M. de Vilhena.

Proposta de lei n.° 133-B

Artigo 1.° A força naval para o anno económico de 1890-1891 é fixada em 3:600 praças, distribuídas por um navio couraçado, quatro corvetas de vapor, quatorze

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SESSÃO DE 20 DE JUNHO DE 1890 803

canhoneiras de 1.ª classe, dez canhoneiras de estação, dois transportes, um navio escola do artilheria, dois navios escolas de alumnos marinheiros, um rebocador, uma barca de vela e quatorze embarcações menores para policia de rios.
Art. 2.° O numero e qualidade dos navios armados poderão variar, segundo o exigir a conveniência do serviço, comtanto que a despeza não exceda a que for votada para a força que se auctorisa.
Art. 3.° Fica revogada a legislação em contrario.
Secretaria d'estado dos negocios da marinha e ultramar, 19 de junho de 1890. - A. de Serpa Pimentel - Júlio M. de Vilhena.
Foram enviadas às commissões respectivas.

O redactor = Lopes Vieira.

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