779
DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS
nol-as expropriem por utilidade da humanidade, e assusta-se diante da occupação?
É verdade que, como o partido regenerador fez o milagre de tornar o sr. Paiva de Andrada equivalente a todos os homens; indo para a Zambezia o sr. Paiva de Andrada, é o mesmo que irem milhões de homens; não é preciso que vão engenheiros, emprezarios, mineiros, cultivadores; basta que vá só o sr. Paiva do Andrada. No sr. Paiva de Andrada contêem-se todos os homens, do mesmo modo que em 50:000 hectares de terrenos, que não chegava a haver para o sr. Walker, se contêem 100:000, que ha para o sr. Paiva de Andrada. A um aceno poderoso do sr. presidente do conselho, ou as terras da Zambezia se dilataram ou a arithmetica mudou. Mas que muito, se ao seu fiat apparece um novo pantheismo, o sr. Paiva de Andrada consubstanciando, todos os homens!
Conta-se de um hespanhol que, retirando-se de Madrid, lho dissera: «Adeus, Madrid, que te despovoas». O sr. Paiva de Andrada póde dizer: «Salve, Zambezia, que te colonisas».
Mas, sr. presidente, eu não tenho intenção de seguir um a um pelo lado economico os artigos do decreto; o que eu pretendo é demonstrar que as concessões quase fizeram não darão, em resultado colonisação com que nós lucremos, e que naturalmente nos fazem saír das mãos a colonia.
Não desejo cansar a attenção da camara; e que a camara está cansada vejo-o perfeitamente, porque conversa muito. Desejo por isso ser breve. Mas, para a camara se não enfadar, tenha a bondade de attender, mesmo porque me parece que se cansa mais quando ao ouvido chegam sons que a distracção não consente que se tornem idéas.
No decreto ha concessões de minas, concessões de terrenos e concessões de florestas.
Investigarei quaes são as vantagens directas das concessões do minas, quaes são as vantagens indirectas e quaes as vantagens das concessões dos terrenos, combinadas essas concessões do terrenos com as das minas.
Não fallarei das florestas, ainda que poderia demonstrar á camara, que todas as vezes que nas diversas nações se têem feito concessões de florestas, d'esta ordem, o resultado tem sido sempre a devastação d'essas florestas.
Ninguem ignora a riqueza das florestas da índia ingleza, que creio que são: muito mais importantes do que as da Zambezia; pois" quando a Inglaterra fez concessões, de florestas da ordem d'aquella que acaba de ser feita, o resultado foi a devastação d'essas florestas em lai escala, que a Inglaterra viu-se obrigada a fazer depois uma plantação de arvores, para de novo poder ter florestas, o a organisar um corpo florestal com um pessoal numerosíssimo com instrucção e conhecimentos technicos.
Esse pessoal marca as arvores que se podem abater; essas arvores são vendidas, ou em hasta publica ou em contrato particular, ou abatidas e vendidas por conta do governo; mas nunca são dadas.
Dir-se-ha que esta concessão que se fez das florestas fica subordinada a regulamentos, mas pergunto: onde estão esses regulamentos?! Pergunto mais, os regulamentos têem, porventura pés, braços, ouvidos, olhos? Os regulamentos ião de se executar por si mesmos?!
E iremos nós constituir um pessoal numeroso e dispendioso para que o sr. Paiva do Andrada ou as companhias que elle organisar, explorem, de graça as florestas? Nós, com relação ás florestas, ficámos n'este dilemma, ou o sr. Paiva do Andrada ha de devastar o cortar as florestas á sua vontade ou nós havemos de ter ali um serviço especial, com numeroso pessoal o custando-nos muito dinheiro, para que faça cumprir os regulamentos florestaes. (Apoiados.)
E convem isto á nação?! Decerto que não. (Apoiados.)
Fallemos agora da exploração de minas.
É necessario, diz-se, que desappareça o estado do charneca das nossas possessões da Zambezia o Moçambique, o para isso. faz se uma concessão enorme de minas; o que suppõe que, com a exploração d'essas minas, se consegue o resultado desejado — cultura e colonisação.
E preciso, porém, em primeiro logar, fazer uma distracção radical, absoluta entre a exploração de minas e a exploração do terrenos. (Apoiados,)
A exploração agricola, se é feita segundo 03 methodos scientificos ou pelo menos com uma certa prudencia, deixa os terrenos valendo mais do que valiam antes da exploração; a exploração das minas, embora feita pelos methodos scientificos, deixa os terrenos valendo menos do que valiam antes de explorados, por isso que lhes tirou o minerio que continham, e deixa deteriorada uma certa porção do terrenos era torno da zona de exploração.
Sabemos que phenicios, carthaginezes e romanos exploraram minas na peninsula ibérica; ahi existem como vestigios vastíssimas galerias; pergunto eu, como seriamos mais ricos, encontrando essas minas exploradas por áquelles povos, ou tendo-as para as podermos explorar?
O que determina para uma nação a utilidade de uma exploração de minas não é a exploração em si, é a consideração das pessoas que fazem a exploração, o dos effeitos agricolas, industriaes commerciaes o politicos que ella produz.
Para sabermos, pois, se na colonia é conveniente a exploração, é necessario fazer as seguintes investigações. Primeiro, investigar quaes são as companhias, se são portuguezas ou estrangeiras; segundo, investigar quem são os trabalhadores; terceiro, investigar quaes são os effeitos da exploração mineira sobre a agricultura da colonia; quarto, investigar quaes são os effeitos que produzirá no commercio; quinto, investigar quaes os effeitos politicos que se produzem nas relações da colonia o da metropole.
Parece-me que foi de todas estas investigações que o governo se esqueceu absoluta o completamento.
A exploração das minas em qualquer nação traz lucros para essa nação quando a exploração é feita por nacionaes, porque é riqueza occulta nas entranhas da terra que passa a riqueza circulante, motora do trabalho nacional, productora por seu turno do outra riqueza.
Se são, pois, os naturaes da nação que exploram as minas, a nação lucra.
Mas as companhias que ha de formar o sr. Paiva de Andrada serão companhias compostas de capitalistas portuguezes ou estrangeiros?
Confessam todos que serão estrangeiros; os lucros dos emprezarios não virão para Portugal, a não serem os do sr. Paiva de Andrada, que por muito grandes que sejam, hão do ser insignificantes em proporção aos dos capitalistas.
Vamos agora a ver quem são os trabalhadores. Serão portuguezes, e virão por isso para portuguezes os salarios?
Se eu dissesse á camara que os trabalhadores hão de ser chinezes, a camara ria se, crivava-mo de ironias, perguntava-me onda fóra eu buscar o dom da prophecia; pois é certo que hão de ser chinezes; affirmou-o, e affirmou-o muito bem, o sr. ministro dos negocios estrangeiros.
Formadas as companhias de estrangeiros, essas companhias irão buscar chinezes para o trabalho.
A rasão d'isto é simples; é que as companhias procuram sempre os trabalhadores onde os encontram mais baratos, o são os chinezes os trabalhadores mais baratos do mundo. (Apoiados.)
Portanto, já vê. v. ex.ª e já vê a camara que não virão
Sessão do 11 de março do 1879