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DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS
ros, quasi todos concordam em que as grandes propriedades, a falta do pequenas concessões de terrenos impedem que os emigrantes passem do salariados a cultivadores; o este phenomeno de passagem dos emigrantes de salariados a cultivadores é um phenomeno simplississimo, que se nota em todas as colonisações prosperas, e que signalam todos os economistas e entre elles Adams Smith.
Nos Estados Unidos á delimitação geometrica dos terrenos, a venda d'elles em lotes desde um minimo de 56O hectares até um maximo de 9:000 hectares, deu em resultado essa passagem gradual dos emigrantes de salariados para cultivadores e por ella a rapida formação d'essa nação gigante.
O resultado das grandes concessões é a exploração das colonias, contra todos os methodos agricolas, a devastação dos terrenos, a falta de cultura de viveres, as crises de fomes.
As grandes concessões de terrenos estão coordenadas com a escravatura; do mesmo modo que na Europa as propriedades' dos senhores feudaes e dos morgados estavam coordenadas com os servos da gleba e com as differentes Ordens.
Coordenadas com a escravatura, sim, ou legalisada ou do facto, mas facto que não se póde destruir sem se destruirem essas; concessões. O modo de ser da propriedade tem uma acção inevitavel sobre as relações entre os homens. Onde uns forem os proprietarios de leguas e leguas de terrenos e outros não possuirem terras, uns serão os escravos dos outros, embora a lei os declaro todos livres, todos iguaes. " Não são convenientes as, grandes concessões; e d'esta opinião "é tambem o sr. Andrade Corvo e tambem o sr. presidente do conselho; e eu vou provar o que digo com documentos assignados por s. ex.ªs
O sr. Andrade Corvo, n'umas instrucções dadas ao governador geral de Moçambique, em maio de 1874, diz o seguinte « Os terrenos (dos prazos da corôa) devem ser repartidos em lotes, que devem ser. dados aos indigenas para serem cultivados.»
Estou perfeitamente do accordo com estas idéas.
E n'uma consulta do conselho ultramarino, assignada pelo sr, presidente do conselho, diz-se o seguinte:
(Leu.)
Um dos problemas da politica portugueza, actualmente, é fazer derivar uma parte da emigração do Brazil para as nossas colónias"; estas grandes concessões vão impedir a resolução do problema; vamos constituir nas colonias o mesmo estado do prosperidade que no Brazil impede a prosperidade da nossa emigração agricola.
Ò unico meio de colonisar Moçambique, continuando a colonia a ser nossa, é colonisar por meio de portuguezes e por meio de indigenas; e estas concessões impedem uma o outra cousa.
Mas se ás grandes concessões têem estes inconvenientes, elles augmentam quando essas concessões se combinam com ás concessões de minas. Concedem-se explorações de minas.
Era conveniente que em torno das explorações se concedessem aos trabalhadores pequenos lotes 'de terreno; isso permitter-lhes-ía passarem de salariados a cultivadores, conservaria os salarios elevados, contribuiria para se fazer a colonisação; mas se ao mesmo tempo que se fazem concessões do minas, se fazem do terrenos ás mesmas companhias, é claro que essas companhias se apoderarão dos terrenos que ficarem mais proximos, e no seu interesse não os deixarão passar ao estado de propriedade particular dos trabalhadores, conservar-se-hão baixos os salarios, não se fará a colonisação.
Disse ha dias n'esta camara o sr. dr. Bocage que a nossa colonisação contava tres seculos de erros, tres seculos -de primes.
A camara applaudiu.
Eu pergunto agora á camara em que consistiram esses erros, em que consistiram esses crimes? Não foi um dos maiores erros constituir enormes propriedades? Não foi um d’esses crimes cultival-as por meio de escravos? E b que é isto agora senão constituir enormes propriedades? E não darão ellas em resultado a escravatura de facto, como a dá sempre a grande vastidão da propriedade? E quando as nações que constituiram as concessões vastas conhecem que se enganaram o procuram um regimen de pequena propriedade que o governo portuguez favorece o regimen contrario nas colonias? (Apoiados.)
Não repitamos os erros e os crimes que commettemos; ha tres seculos teriamos talvez desculpa; eramos inexperientes; abríamos o caminho á Europa; hoje somos os ultimos e é necessario que do mesmo modo que os nossos erros lho aproveitaram a ella, os erros o os acertos d'ella nos aproveitem a nós.
Considerámos as concessões pelo lado economico, consideremol-as agora nos seus effeitos politico?.
A Inglaterra, a nação que pelas suas circumstancias naturaes, reforçadas por meios artificiaes centralisou em si a industria e se fez a officina do mundo, vê se hoje a braços com uma crise prevista de ha muito pelos homens da sciencia. É claro que á proporção que as diversas nações que serviam de mercado á Inglaterra, forem progredindo industrialmente, o poder da Inglaterra ha de ir, diminuindo. Vão-se fechando já hoje:uma grande parte dos mercados da Inglaterra, e a activa nação vê que só a Africa a póde salvar. Rodeia-nos pelo sul, disputou-nos a bahia de Lourenço Marques, e os seus escriptores não se conformam ainda hoje com a sentença do Mac-Mahon; nega o nosso direito ás terras do interior, por falta do effectiva occupação; cerca-nos do estabelecimentos pelo norte; é pelos nossos portos o é pelas nossas terras que póde fazer se com facilidade o seu commercio, e ha pouco se noticiava que se tinha formado na Inglaterra uma companhia com o intuito de fazer" um caminho do ferro que passe pela Zambezia, e a Revista Britannica affirma que esta região lhe cairá fatalmente na mãos.
A Inglaterra é pois a mais interessada em formar a companhia de que precisa o sr. Paiva de Andrada, e ou ella a formará ou as acções passarão em breve para ella. E o que fará a Inglaterra?
O sr. ministro dos negocios estrangeiros, cujo saber eu respeito muitissimo, disse que não havia que receiar da Inglaterra, que a Inglaterra não quer terrenos, que a Inglaterra tem o nobre e generoso pensamento de levar á Africa a civilisação, o de extinguir para sempre o nefando trafico da escravatura.
Como está mudada a Inglaterra! a nação em que nasceu a philosophia do util, o que tem por principaes representantes em sciencias sociaes Bentham e Spencer, que se riem da moral da dedicação o que affirmam que é tratando cada um de si que se faz o bem, a Inglaterra a morrer pela humanidade, a Inglaterra a pregar o sermão da montanha, a Inglaterra feita o Christo das nações!
Mas, se a Inglaterra não quer terrenos, porque foi que nos disputou Bolama, porque foi que nos disputou a bahia de Lourenço Marques, porque é que nega o nosso direitos uma parto das nossas colonias? Pois é porque não quer terrenos que nos disputa terrenos? Para mostrar que temos que receiar da Inglaterra, não relembrarei a politica que ella tem sempre seguido comnosco, apontarei um facto passado com o sr. ministro dos negocios estrangeiros.
Todos sabem que nós e os inglezes temos ao sul da China, duas colonias, que são feitorias commerciaes importantes: Macau e Hong-Kong. Um governador energico de Macau, um martyr dos interesses o da honra de Portugal, Ferreira do Amaral, vilmente assassinado pelos chinezes, fez entrar no dominio effectivo de Portugal, ilhas que rodeiam Macau e fez levantar a alfandega chineza que se tinha estabelecido perto d'aquella colonia. Os chinezes tentaram restabe-
Sessão de 11 de março de 1879