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rendimentos a que me referi, mas não posso deixar de insistir pela primeira parte, que tem por fim marcar-se a cifra da emissão, porque o governo póde fazer um calculo approximado da quantia nominal que tem a emittir para servir de garantia á quantia effectiva que tem a levantar.
O projecto ha de votar-se, quer de uma maneira quer de outra, e por consequencia escuso de continuar n'esta discussão. Sómente peço a v. ex.ª que ponha á votação a minha moção, principalmente pelo que respeita á primeira parte, porque d'esta parte não cedo.
Leu-se na mesa a seguinte
Proposta
Será designada a cifra das inscripções a emittir e a fonte d'onde devem saír os juros para os titulos a emittir. = O deputado, A. J. de Seixas.
Foi admittida.
O sr. Carlos Bento (sobre a ordem): — Pedi a palavra sobre a ordem e a minha moção era para que v. ex.ª consultasse a camara sobre se me concedia a palavra para poder fallar como membro da commissão de fazenda, a que tenho a honra de pertencer. (Vozes: — Falle, falle.)
Ha um relator, mas parece-me que deve ser licito a qualquer membro da commissão apresentar as suas rasões, porque todos elles são responsaveis pelo parecer que esta sobre a mesa.
Comquanto eu reconheça a urgencia da approvação d'este projecto, parece-me que faço um serviço ao governo, sendo de opinião de que essa urgencia não consiste no confisco da palavra aos deputados que quizerem fallar; e não supponho mesmo que o nosso credito se arruine por discutirmos isto um pouco mais largamente.
Esta questão não é nova para mim; tenho votado auctorisações d'esta natureza e a ministros com cuja politica não estava identificado; por consequencia não é n'esta occasião que eu posso negar o meu apoio a esta proposta, quando os meus precedentes estão de accordo com ella.
Referindo-me á proposta que foi mandada para a mesa pelo illustre deputado que acabou de fallar, o sr. Seixas, declaro que me não posso conformar com ella pela rasão que vou apresentar.
Entendo que a fixação da quantia maxima ou minima das inscripções a emittir por virtude d'esta lei, longe de ser vantajoso, trazia mais inconvenientes do que deixar a auctorisação ao governo Como esta no projecto (apoiados). Se fossemos fixar na lei o numero das inscripções a emittir, podiamos, sem querer, prender a liberdade ao governo, collocando-o em embaraços de que podia resultar grave prejuizo para o estado.
Esta idéa do illustre deputado não é nova; foi aqui suscitada n'outra occasião, e eu não a acompanhei; não me convenci das rasões que então se apresentaram em sua defeza, e ainda hoje entendo que fiz bem.
Quando o sr. ministro da fazenda, Casal Ribeiro, veiu á camara em 1859 pedir igual auctorisação para reforçar penhores, fez-se aqui proposta identica á que o illustre deputado acaba de mandar para a mesa; a camara não approvou a proposta, e sabe o illustre deputado o que aconteceu? Foi que o sr. Casal Ribeiro não precisou fazer uso dessa auctorisação. Eu, se se tivesse determinado na lei a quantia das inscripções que o governo podia emittir, estou persuadido de que o panico havia de ser maior do que o que resultou da simples auctorisação concedida ao governo sem designação de quantia.
Estou em parte de accordo com o illustre deputado o sr. Gomes, meu antigo amigo, de que as circumstancias em que se votou em 1866 uma auctorisação d'esta natureza não são as mesmas em que nos achâmos hoje; as circumstancias do momento em que era pedida aquella auctorisação não são exactamente as mesmas em que nos encontrâmos hoje, mas as circumstancias de hoje muito facilmente nos encaminham ao mesmo estado; e já a apresentação da lei de meios que o sr. ministro da fazenda acaba de mandar para a mesa nos colloca nas mesmas circumstancias de então; quer dizer, é indispensavel fixar o deficit e os meios de lhe fazer face. Se eu não estivesse intimamente convencido da necessidade que o governo tem de fazer uso d'esta auctorisação, e oxalá que o não tivesse, sem esforço nenhum, heroico nem politico, votava contra a proposta; mas como entendo que a camara tem por força de apreciar o deficit de uma maneira determinada e de votar as sommas para lhe fazer face, não tenho duvida agora, como a não tive em 1859, e como a não tive em 1866, em lhe dar o meu voto de approvação.
Eu entendo que os governos fazem bem em transigir n'estas questões, aceitando quaesquer modificações tendentas a melhorar as disposições da lei,.e o sr. Fontes, ministro da fazenda em 1866, fez-me a honra de aceitar uma proposta que mandei para a mesa; apresentei-a suppondo que era em beneficio do credito publico, e o governo não teve duvida em a aceitar, sem querer saber d'onde partia. Mas essa proposta tinha por fim a designação dos rendimentos publicos que haviam de fazer face aos encargos das inscripções que se creavam para occorrer ás despezas publicas. A proposta do illustre deputado não esta n'este caso e por isso não estou de accordo com ella. O illustre deputado quer que desde já se dote a junta com a receita necessaria para pagamento dos juros d'estas inscripções. Não julgo isto necessario. Esta receita não é mais do que um jogo de contas; não ha necessidade de crear desde já juros para pagamento de inscripções.
O sr. Seixas: — O governo ha de dar a alguem o titulo, e esse alguem, que tem o titulo na sua mão, reputa-o com direito a juro.
O Orador: — Essa não é a questão. O governo precisa ser auctorisado para a emissão, note-se bem, e ahi é que esta a necessidade da creação de uma propriedade a que nos Estados Unidos dão o nome de grande propriedade. A propriedade não se póde crear senão pela auctorisação que o governo pede, e o corpo legislativo lhe concede. Não quer dizer que o governo tenha esse encargo, a que se referiu o illustre deputado, emquanto não alienar as inscripções. Bem basta o inconveniente de muitas vezes ter de desembolsar com antecipação sommas de que no fim de tudo senão serve. Era muito melhor que se estabelecesse isto pelo jogo de contas; e muitos inconvenientes têem vindo de se ter feito de outra fórma.
Eu n'esta occasião, para não prejudicar o credito, não indico essa questão de methodo. Não só não julgo necessario crear effectivamente rendimentos para fazer face a essa despeza, mas até muito prejudicial seria se não simplificasse o serviço de maneira que o governo não soffresse com a demora que mais tarde viesse pela fixação d'esses rendimentos.
N'estas circumstancias não tenho duvida em votar esta emissão, e voto-a tambem por outra rasão, porque o governo se preoccupa como deve da questão da divida fluctuante.
O governo apresenta em todos os seus relatorios e propostas a idéa da suppressão completa da divida fluctuante; e eu acompanhando-o nos seus desejos, não o acompanho nas suas esperanças infelizmente (apoiados). Entendo que alguma cousa mais ha a fazer, alem de reduzir a divida fluctuante, que é melhorar as condições em que existe essa divida fluctuante no nosso paiz, em comparação das circumstancias em que se encontra a divida fluctuante nos outros paizes (apoiados).
Eu pedia ao illustre ministro da fazenda que tivesse a bondade de mandar publicar a consulta da commissão externa de fazenda, a que tive a honra de pertencer, na qual, conjunctamente com alguns cavalheiros, manifestei as minhas idéas sobre esse ponto; e essas idéas, note a camara, deviam prender-me mais do que a nenhum outro sr. deputado, para dar esta auctorisação ao governo, se por acaso não entendesse que era uma auctorisação de simples expediente, do qual nós não podemos prescindir. Acreditando muito na efficacia das regras permanentes, agora é impossivel segui-las na presença das difficuldades em que se encontra o estado do thesouro, e é preciso ter a condescendencia de aceitar o expediente. A inflexibilidade das regras é muito boa para um estado normal e satisfactorio; mas querer o despotismo das regras inflexiveis quando o thesouro, e o governo, por consequencia, se encontram em uma situação excepcional, é querer o que menos convem. E querer uma cousa, muito boa em hypothese, sacrificando outra que se torna boa, porque é indispensavel satisfazer aos encargos actuaes do estado.
Por consequencia devia ter mais duvida do que os illustres deputados em votar essa proposta. Sabe v. ex.ª e a camara porque? Porque não estou extático de admiração diante d'este expediente de que nós temos usado, que o governo não inventou, de dar penhor pela divida fluctuante.
Não sou dos que se admiram, dos que se enthusiasmam por esse systema; mas conheço que é indispensavel dar ao governo os meios de viver, e meios de viver como tinham exigido as administrações anteriores que se achavam em casos analogos. Por consequencia voto pelo projecto que esta em discussão.
Mas não digo que voto por elle, porque tenho confiança no governo; porque realmente acho que votar o projecto por motivos de confiança seria deslocar a questão da situação em que a devemos collocar (apoiados).
Entendo que n'esta questão, quando voto pelo projecto, não dou ao governo confiança, nem lh'a tiro; mas dou ao governo os meios que daria a todos os governos nas mesmas circumstancias para gerirem os negocios do paiz (apoiados).
E não espero que os srs. ministros me paguem o meu voto com a gratidão ministerial, porque não é um voto officioso, é um voto convencido, é a manifestação de que entendo que o governo carece de estar armado com esta auctorisação, da qual comtudo póde deixar de precisar, como em 1859 o sr. Casal Ribeiro não precisou de uma auctorisação que lhe foi dada (apoiados).
Oxalá que o governo não precise usar d'ella! Elle ha de ser o primeiro a desejar ver inutilisada a auctorisação que a camara lhe dá (apoiados).
Creio que é inutil dizer mais alguma cousa, e estou convencidissimo do que tenho dito.
Approvando o projecto não faço favor nenhum aos srs. ministros, sigo as inspirações da minha consciencia, e vou de accordo com as minhas tradições de votos analogos sobre projectos similhantes (apoiados).
Vozes: — Muito bem, muito bem.
Foi julgada a materia discutida, a requerimento do sr. Augusto de Faria, e approvou-se o parecer na sua generalidade.
Passando-se á especialidade, entrou em discussão o artigo 1.°
O sr. José de Moraes: — Pedi a palavra, não para impugnar o artigo, porque já declarei que approvava o projecto, principalmente pelas seguranças consignadas no seu artigo 2.°, mas porque para a discussão d'elle trouxeram a minha humilde e insignificante pessoa.
Eu não estranhava, e esperava mesmo que o illustre deputado por Arganil, pelos seus vastos conhecimentos financeiros, viesse tratar da medida que tem estado em discussão; mas o que estranhei e não esperava foi o aviso que me deram, posto que tarde e a más horas, alguns collegas que me estão ouvindo, de que o illustre deputado viera para aqui entreter-se a discutir a minha humilde pessoa.
Eu podia tomar o exemplo de um caracter respeitavel e nosso collega, que tambem foi já mimoseado pelo illustre deputado como agora me acontece a mim e que não respondeu; mas não quero que se diga que fujo com o corpo (riso), e por isso responderei em poucas palavras.
O meu respeitavel amigo, o sr. Freitas e Oliveira, que foi um estudante distincto na universidade, onde eu o conheci e apreciei logo o seu elevado talento por um brilhante exame que fez, e tão brilhante, que se houvesse premios elle de certo teria obtido um, o sr. Freitas e Oliveira, instruido e illustrado como é, não é sufficiente para me ensinar...
O sr. Freitas e Oliveira: — Já é velho.
O Orador: — Diz o illustre deputado que sou velho. E verdade, estou velho pela idade, mas não o estou pela energia. Outro tanto não póde dizer o illustre deputado. Eu lamento que s. ex.ª não seguisse a carreira a que primeiro se dedicou, a da marinha, na qual teria necessariamente feito uma figura brilhante. Lastimo que o illustre deputado tivesse abandonado aquella carreira, porque de certo teria n'ella chegado a obter um nome muito elevado e muito honroso. Mas o illustre deputado, abandonando a marinha, dedicou-se a outra carreira, digníssima tambem, e em que tem dado exuberantes provas do seu grande talento. Eu não tenho mais nada que dizer a este respeito ao illustre deputado, senão que agradeça a Deus te-lo dotado ou favorecido com tão grande intelligencia. A minha é pequena, mas, apesar de pequena, continuo no meu caminho como posso, e desempenhando os meus deveres o melhor que sei.
Fez o illustre deputado uma allusão a respeito de popularidade. Pois no que disse enganou-se redondamente. Eu nunca pedi, nem a este nem a governo algum, favor para a minha candidatura. Quando se trata de eleições, se tenho a fortuna de ver triumphar a minha candidatura, não é isso tanto devido aos meus esforços, como aos dos numerosos amigos que tenho no districto de Coimbra (apoiados). E tenho ali numerosos amigos, porque sei capta-los, porque eu quando recebo um favor, não sou como a víbora, não mordo em quem me faz beneficio (riso).
O illustre deputado que tem amigos, póde perguntar ao sr. ministro da fazenda se n'uma occasião em que a sua candidatura não estava muita segura, se eu, que não valho nada, não concorri, quanto me foi possivel, para que os meus amigos protegessem essa candidatura, sendo preciso até eu fazer uma jornada de quatro leguas, a fim de ir assistir a uma reunião politica, onde ía tratar-se d'este negocio, e onde alcancei que os meus amigos, com toda a dedicação, se empenhassem no bom resultado da eleição.
Fallou tambem o illustre deputado em deputados que são opposição ou que são governo. Eu declaro ao illustre deputado que eu nem sou da opposição, nem do governo; quem me faz opposição ou governo é o proprio governo; pelas, medidas que apresenta. Portanto não estou hypothecado a nenhum ministro, nem a nenhum ministerio (riso). Nem todos podem dizer o mesmo.
Fallou o illustre deputado em popularidade. O illustre deputado é que tem muita popularidade, e tem tanta que, sem esforços nem influencia da auctoridade, saíu unanimemente eleito deputado pelo circulo da Arganil! Tem tanta, que nem teve candidato que se lhe oppozesse; já a mim me não aconteceu isso, infelizmente.
Disse tambem que = se tinham proposto grandes economias, que se queria o acabamento das ajudas de custo; mas que se não fallava em subsidio =.
Em resposta a esta observação feita pelo illustre deputado, replicarei eu com as reflexões que em 1863 ou 1864 - fiz n'esta casa, respondendo ao sr. Antonio de Serpa, quando aqui apresentou um projecto para que acabasse o subsidio. Disse que substituiria o artigo 2.° d'esse projecto pelo 1.°, e que faria em primeiro logar o seguinte.
Quer V. ex.ª saber o conteudo désse artigo 1.°? Eu lh'o, digo.
« Artigo 1.° Todo o empregado publico que for de Lisboa, e que tiver assento na camara, durante todo o tempo que for deputado, não receberá subsidio.»
Em resposta a uma outra observação feita por s. ex.ª, tenho a dizer que estimo muito que a commissão dê parecer sobre um projecto importantissimo que ha dias foi apresentado n'esta casa, para que acabe a interferencia das auctoridades nas eleições, porque folgando muito que o illustre deputado tenha sempre uma cadeira n'esta casa, vejo que se esse projecto for approvado, terá s. ex.ª a satisfação de ser eleito deputado por uns poucos de circulos.
Emquanto á satisfação que o illustre deputado sentiria se me visse naquellas cadeiras (apontando para os logares dos srs. ministros), tenho a responder que reconheço a minha insufficiencia, e que eu é que hei de ter brevemente o regosijo de ver sentado nas cadeiras dos ministros o meu amigo o sr. Freitas e Oliveira.
O sr. Fradesso da Silveira: — Sinto certa difficuldade em entrar no debate, porque tendo nós sido levados até Arganil, não é facil voltar ao ponto d'onde partimos.
Não tive duvida em approvar este projecto na generalidade, e teria ficado em silencio, se as declarações hontem feitas pelo sr. presidente do conselho me não tivessem obrigado a pedir a palavra. Pouco tempo tomarei á camara.
Quando em 1866 se apresentou n'esta casa um projecto similhante, eu dirigi ao sr. ministro da fazenda de então uma pergunta, com o fim de me esclarecer ácerca de um dos artigos do mesmo projecto, e a resposta que então obtive auctorisava-me a deixar de fazer agora a mesma pergunta.
As explicações do sr. presidente do conselho, levando-me, a pedir a palavra, obrigam-me a fazer algumas considerações, que serão breves, porque não quero de modo algum fatigar a camara.
Para mim era clara a lei, depois dos esclarecimentos dados pelo sr. ministro da fazenda, e antes das explicações do sr. presidente do conselho. Pareceu-me que o praso de