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DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS
munho de que nós somos um grande povo colonisador. (Apoiados.)
E eu tenho a convicção profunda de que o povo portuguez é um grande povo colonisador. Tenho essa convicção o prova-se isso pelo que aconteceu no Brazil.
Ao Brazil chama o sr. Beaulieu a nossa obra prima de colonisação, e assim é.
Nós o que temos é que as nossas faculdades colonisadoras são inteiramente diversas das faculdades colonisadoras dos povos da raça germânica.
Os povos da raça germânica colonisam pela expansão, o nós colonisâmos pela assimilação.
A colonisação dos povos germânicos é, por assim dizer, a continuação das suas antigas migrações.
Os povos da raça germânica atravessam o oceano atlantico como seus paes atravessavam os rios o as montanhas da Europa oriental, e vão estabelecer do lado de lá do mar os seus lares, a sua familia, fundam ali a reproducção da sua patria, afastando para longe de si ou aniquilando muitas vezes as raças indigenas.
Nós sabemos que na America do norte, por exemplo, as numerosas e fortissimas tribus indias que primitivamente povoavam aquelle territorio, ou foram aniquiladas pela espada dos conquistadores ou foram recuando successivamente diante da civilisação até se circunscreverem nos ultimos desertos que o progresso da união americana lhes deixou, desertos onde ainda se mantem hostis e intransigentes contra o povo dominador.
Na Austrália a povoação indígena, a dos maoris, foi completamente aniquilada pelos inglezes.
NÓ3, não procedemos assim. Os indios do Brazil receberam a nossa civilisação, aldeiaram-se, e nós, que nunca tivemos preconceitos nem orgulho de raça, fizemos entrar muitos dos seus chefes nas mais altas classes da sociedade portugueza.
Sabe-se, por exemplo, que o índio Potyguarassú, conhecido por D. Antonio Filippe Camarão, foi fidalgo portuguez, recebeu o habito de Christo, o combateu comnosco nas guerras contra os hollandezes.
Nós, portanto, possuimos esta ausencia completa de preconceitos, (Apoiados.) admittimos nas nossas fileiras qualquer individuo, seja qual for a sua côr e a sua raça, (Apoiados.) o esta faculdade do assimilação constituo uma das mais importantes qualidades para um paiz colonisador. (Apoiados.)
E a prova d'isso é ainda que no oriente, onde a nossa missão não foi pacifica, onde uma parte dos nossos antepassados foram conquistadores cruéis e praticaram mesmo atrocidades, conserva-se, comtudo, ainda hoje o nosso prestigio.
Em Ceylão, conta o sr. Du Hailly, em Ceylão, que ha dois seculos deixou de ser nossa, que esteve sujeita ao dominio hollandez, e que está hoje debaixo do dominio inglez, ainda a lingua portugueza é a que mais se conhece, o cunho portuguez é o que ali se conserva.
Em Malaca, os descendentes dos nossos antigos conquistadores formam uma especie de aristocracia muito respeitada.
A colonia portugueza de Bombaim, forte e numerosa, conserva na grande cidade ingleza a sua perfeita autonomia.
Não se vê na Africa, pela recente guerra dos zulus e por muitas outras, a incompatibilidade dos inglezes com as populações indigenas?
Acontece, pelo contrario, que um punhado de portuguezes que ali estão estabelecidos não encontram difficuldades senão quando as levantam á força de prepotencias das auctoridades. (Apoiados.)
Por consequencia, n'estas condições, nós somos o povo que mais serviços póde prestar á civilisação nos territorios de Africa.
Desde o momento que temos estas altas qualidades de colonisação; desde o momento que possuimos tão vastos territorios, é licito que haja um ministro da marinha e do ultramar que trato d'estes negocios com tão pouca seriedade? Um ministro que conceda á primeira pessoa que lha appareça e que lhe pede os territorios da Zambezia sem nenhumas garantias absolutamente?»
E este systema que eu lamento, porquê elle não serve senão para o dispêndio do tempo e do dinheiro. (Apoiados.)
Quando o ministro da marinha vem pedir 200:000000 réis para a Guiné; quando organisa expedições de obras publicas para o ultramar, dispersando o pessoal para todos os pontos das differentes possessões, de maneira que nada se póde fazer e nada se poderá alcançar, lamento o dinheiro que se gasta, porque vejo que elle é completamento perdido para as obras da verdadeira civilisação.
Quando esteve no ministerio o sr. José de Mello Gouveia, sabendo que em algumas provincias do Brazil havia! cidadãos portuguezes que estavam em más circumstancias convidou-os a ir para Africa, offerecendo-lhes terras e meios para se transportarem. Isto fez grande impressão no Brazil: muita gente quiz ir para Africa, e chegada lá encontrou-se sem recursos, sem trabalho, e uns tiveram que retirar-se e outros morreram, e foi necessario suspender esta. corrente, porque não havia meios para os sustentar.
Se este dinheiro que se gasta loucamente com estados maiores administrativos, fosse empregado em constituir um fundo de colonisação, podia ter dado excellentes resultados e grande vantagem para o paiz. Mas estas questões serias e que se não tratam; o que se trata apenas é de proporcionar nas colonias um meio ao sr. presidente do conselho de poder dar com ellas um brinde ou um presente!
Ninguem põe em duvida nem a honestidade, nem o amor pela causa publica do sr. presidente do conselho; eu até estou persuadido de que, se o governo fez esta concessão ao sr. Paiva de Andrada, não foi levado a isso por nenhum pensamento de prejudicar as colonias. O sr. Visconde da Arriaga aqui nos revelou a idéa do governo: «Esta concessão não fez mal nenhum, e póde ser que faça algum bem»» Não tem nada de séria. Nunca se realisa. Ha de figurar na região dos sonhos. E por isso não valia realmente á pena desgostar este cavalheiro, que é um excellente rapaz, moço muito estimável, negando-lhe uma cousa que a final de contas para nada lhe serve o que não faz mal á ninguem. (Apoiados.) E aqui está a seriedade com que estes negocios se tratam.
O governo deseja o bom do paiz, mas esse desejo da servir a causa publica, e ao mesmo tempo de sé tornar agradavel aos amigos particulares dos srs. ministros, tem dado origem entre nós a uma classe similhante & dos politicians americanos, que têem feito da politica um campo da exploração. E por isso que o sr. presidente do conselho» vendo que o velho omhibus do partido regenerador se transformou n'um comboio de tresentas carruagens, que tem por estação terminus, o funccionalismo, vê-se obrigado a alargar os quadros da administração para satisfazer todos os apetites.
Todas as medidas que lêem sido propostas tendem a augmentar o quadro do funccionalismo, e assim o registo civil foi proposto unicamente para á creação da repartição do registo civil; (Apoiados.) assim o desastre da Guinés veiu a proposito para o governo crear um governo independente; (Apoiados.) assim é augmento dos direitos do tabaco foi proposto para a creação de grande numero da fiscaes, ainda augmentado com a proxima vertigem das aposentações; (Apoiados.) assim a modificação das contribuições directas trouxe a creação de uma classe de visitadores. (Apoiados.)
Não ha uma reforma que não se traduza no augmento do funccionalismo, quando todos sabem que a melhor reforma que se podia tentar seria a simplificação do. serviço. (Apoiados.)
Declaro a. v. ex.ª e á camara que detesto o fim politico
Sessão de 8 de março de 1870