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Sessão de 8 de março de 1879
Presidencia do ex.mo sr. Francisco Joaquim da Costa e Silva
Secretarios - os srs.
Antonio Maria Pereira Carrilho Augusto Cesar Ferreira de Mesquita
SUMMARIO
Depois de breves explicações dos srs. Arouca, Rodrigues de Freitas e Zeferino Rodrigues, sobre o mesmo assumpto — um conflicto entre a camara municipal de Grandola e a commissão executiva da junta geral do districto de Lisboa — passou-se á ordem do dia, (interpellação sobre a concessão feita ao sr. Paiva de Andrada). — Faliam os srs. Julio de Vilhena, Pinheiro Chagas e presidente do conselho, ficando este com a palavra reservada para a sessão seguinte.
Abertura — Ás duas horas da tardo.
Presentes á chamada 59 srs. deputados.
Presentes á abertura da sessão — Os srs.: Adolpho Pimentel, Adriano Machado, Carvalho o Mello, Fonseca Pinto, Alfredo de Oliveira, Gonçalves Crespo, A. J. d'Avila, Lopes Mendes, Carrilho, Mendes Duarte, Pedroso dos Santos, Telles de Vasconcellos, Ferreira de Mesquita, Pereira Leite, Santos Carneiro, Saraiva de Carvalho, Zeferino Rodrigues, Barão de Ferreira dos Santos, Caetano de Carvalho, Sanches de Castro, Conde da Foz, Diogo de Macedo, Goes Pinto, Hintze Ribeiro, Filippe de Carvalho, Firmino Lopes, Francisco de Albuquerque, Fonseca Osorio, Francisco Costa, Sousa Pavão, Frederico Arouca, Freitas Oliveira, Osorio de Albuquerque, Gomes de Castro, Brandão e Albuquerque, Scarnichia, Barros e Cunha, Sousa Machado, J. J. Alves, Laranjo, José Frederico, Figueiredo do Faria, Rodrigues de Freitas, Sá Carneiro, Taveira e Menezes, Barbosa du Bocage, Julio de Vilhena, Luiz de Lencastre, Luiz Garrido, Faria e Mello, Manuel d'Assumpção, Rocha Peixoto (Manuel), Alves Passos, Manuel José Vieira, Mariano de Carvalho, Miguel Dantas, Pedro Barroso, Jacome Correia, Visconde de Sieuve de Menezes.
Entraram durante a sessão — Os srs.: Osorio de Vasconcellos, Tavares Lobo, Rocha Peixoto (Alfredo), Anselmo Braamcamp, Torres Carneiro, Pereira do Miranda, A. J. Teixeira, Pinto de Magalhães, Augusto Fuschini, Victor dos Santos, Carlos de Mendonça, Domingos Moreira Freire, Emygdio Navarro, Mesquita e Castro, Mouta e Vasconcellos, Gomes Teixeira, Pereira Caldas, Van-Zeller, Guilherme de Abreu, Paula Medeiros, Palma, Silveira da Mota, Costa Pinto, Jeronymo Pimentel, Anastacio de Carvalho, Melicio, João Ferrão, J. A. Neves, Almeida e Costa, Sousa Gomes, Dias Ferreira, Tavares de Pontes, Namorado, José Luciano, Ferreira Freire, J. M. dos Santos, Pereira Rodrigues, Sousa Monteiro, Mello Gouveia, Lopo Vaz, Lourenço de Carvalho, Almeida Macedo, Bivar, Freitas Branco, Pires de Lima, Correia de Oliveira, M. J. de Almeida, M. J. Gomes, Aralla e Costa, Pinheiro Chagas, Nobre de Carvalho, Marçal Pacheco, Miranda Montenegro, Pedro Carvalho, Pedro Roberto, Rodrigo de Menezes, Thomás Ribeiro, Visconde da Aguieira, Visconde do Andaluz, Visconde da Arriaga, Visconde da Azarujinha, Visconde do Balsemão, Visconde do Moreira de Rey, Visconde do Rio Sado, Visconde de Villa Nova da Rainha.
Não compareceram á sessão — Os srs.: Nunes Fevereiro, Alipio do Sousa Leitão, Emilio Brandão, Arrobas, Barros e Sá, Avelino de Sousa, Bernardo de Serpa, Eduardo Moraes, Vieira das Neves, Ornellas do Matos, Teixeira de Queiroz, J. M. Borges, Souto Maior, Miguel Tudella, Pedro Correia, Ricardo Ferraz.
Acta — Approvada.
EXPEDIENTE
Officios
1.° Do ministerio do reino, acompanhando copia da portaria de 17 de março de 1878 e o resto dos documentos pedidos pelo sr. deputado Francisco Van-Zeller.
Enviado á secretaria.
2.° Do ministerio das obras publicas, acompanhando era satisfação ao requerimento do sr. Rodrigues do Freitas, nota das despezas feitas com as obras no edificio dos tribunaes militares em Santa Clara.
Enviado á secretaria.
Representações
1.ª Dos clerigos do concelho de Ílhavo, pedindo que não seja approvada a proposta do sr. ministro da fazenda, com relação aos passaes e bens de patrimónios ecclesiasticos.
Apresentada pelo sr. deputado Braamcamp, e enviada á commissão de fazenda.
2.ª Do presidente, membros da junta de parochia da freguezia de Esmoriz e mais cidadãos do concelho da Feira, contra a proposta de lei n.º 75-B, na parte que diz respeito á annexação da freguezia de Esmoriz ao concelho do Ovar.
Apresentada pelo sr. deputado Pires de Lima, e enviada. á commissão de legislação civil.
O sr. Carrilho: — Por parte da commissão de fazenda mando para a mesa o parecer sobre o orçamento geral do estado e propostas, de lei de receita e despeza para o exercicio de 1879-1880.
O sr. Arouca: — Tinha hontem podido a palavra na occasião em que o illustre deputado o sr. Rodrigues da Freitas estava apreciando a fórma por que tinha procedido a commissão districtal em relação á camara municipal do Grandola, para dizer a s. ex.ª que desejava que suspendesse o seu juizo sobre esta questão, até ter conhecimento official dos factos a que alludia...
Eu não tinha hontem documentos que me habilitassem para poder tratar da questão, defendendo o procedimento da junta geral do districto, de que tenho a honra de fazer parte. Hoje, porém, tive cuidado de vir munido de uns documentos que, embora não sejam officiaes, são comtudo sufficientes para poder dizer duas palavras sobre este assumpto. E se o sr. Rodrigues de Freitas tiver urgencia de ver os documentos que dizem respeito ao assumpto, a commissão districtal nenhuma duvida tem em fornecer a s. ex.ª todos os esclarecimentos necessarios.
O orçamento de que se trata tinha sido remettido á commissão executiva em 11 de agosto de 1878, por ter cessado a competencia do conselho do districto, e foi distribuido em 21 do referido mez ao secretario, sr. Ferreira Braga.
Estava já pendente um recurso do escrivão da administração e do official de diligencias, este ultimo já interposto da camara municipal, por ella não querer cumprir outro accordão do conselho de districto, que elevava o ordenado do referido official.
A camara municipal, em 9 do dezembro de 1878,- officiou ao governador civil, pedindo-lhe para que elle fizesse com que a commissão districtal approvasse o seu orçamento. Entretanto baixara do conselho do districto á commissão o recurso do escrivão da administração e, com relação ao recurso do administrador do concelho, dizia-se, por parte do conselho de districto, que tinha ido a informar á camara municipal de Grandola, recursos estes que eram remettidos á commissão districtal, por não ter o conselho do districto competencia para tratar do assumpto; a commissão officiou para a camara do Grandola "prevenindo-a de que o orçamento não seria approvado sem que o re-
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curso fosse competentemente informado, para a commissão proceder conforme fosse de justiça.
A camara respondeu em 16 do mesmo mez, dizendo que não tinha recebido aquelle recurso o que julgava perfeitamente dispensavel a remessa d'elle para se poder approvar o orçamento.
Por essa occasião entendeu a commissão que devia approvar o orçamento da camara municipal, fazendo-lhe algumas alterações. '
1.ª Elevou, a 240$000 réis o vencimento do escrivão da administração.
2.ª Manteve o vencimento de 86$400 réis ao official de diligencias.
3.ª; Reduziu de 590$000 réis a 503$600 réis uma verba destinada a pagar uma certa divida.
O orçamento da camara municipal de Grandola no artigo 8.° tratava, em primeiro logar, da viação municipal, e, em segundo logar, de -differentes obras a cargo da camara, no artigo 9.° tratava do litigios, no artigo 10.° tratava do dividas passivas.
A commissão districtal entendeu que podia reduzir por este anno ò pagamento d'aquella divida para com essa verba se completar o augmento de ordenado áquelles dois empregados; mas, como o orçamento estava mal organisado; a commissão districtal não sabia se aquelle dinheiro tinha de saír do cofre da viação municipal, e, quando soube, officiou immediatamente á camara municipal de Grandola para, se por acaso se tivesse cumprido aquelle despacho, se remediar o erro que se tinha praticado involuntariamente. Tudo isto em virtude de estar o orçamento mal organisado.
A commissão disse então que era conveniente fazer o orçamento supplementar, não só para pagar as quotas que tinham sido distribuidas pela junta geral do districto para as despezas extraordinarias, mas tambem para repor as quantias que; se tivessem tirado do cofre da viação.
Por essa occasião a camara disse positivamente que não fazia o orçamento supplementar e que não cumpria as determinações da commissão, porque não podia tirar do cofre da viação: dinheiro algum, e disse bem, mas foi a primeira vez n'este assumpto que desejei cumprir a lei.
Era vista d'isto decidiu a commissão, em 13 de fevereiro d'este anno, ordenar á camara que procedesse á formação do orçamento supplementar, fazendo-lhe notar que devia constituir, como receita d'elle, a differença para mais na receita do orçamento geral, porque, tendo a camara consignado n'elle a contribuição directa de repartição na rasão de 73 por cento aos proprietarios residentes no concelho e na de 36 1/2 por cento aos não residentes, devia necessariamente resultar aquella differença, pois que pelo artigo 115.° do codigo administrativo a referida contribuição deve ser igual em todo o concelho.
Ora, esta verba era mais que sufficiente para pagar os ordenados ao escrivão da administração e ao official de diligencias.
A commissão determinou mais que, se no praso do vinte dias a camara não cumprisse esta decisão, estava resolvida a usar dos meios que a lei lhe faculta no artigo 121.° do codigo administrativo, isto é, a fazer o orçamento.
E sabe v. ex.ª o que a camara resolveu?
A camara disse que tinha resolvido manter a sua decisão, que hão augmentava os ordenados a ninguem o que não cumpria com as determinações da commissão.
Por essa occasião a commissão, vendo que a camara se oppunha terminantemente ás resoluções que ella tomava, ordenou, por um alvará, ao thesoureiro do concelho que pagasse o ordenado ao escrivão da administração, e o presidente da camara declarou novamente que se recusava a cumprir as resoluções da commissão, e que, se acaso o obrigassem a cumprir aquellas determinações, elle e os mais vereadores deporiam nas mãos dos seus constituintes o mandato que elles lhes tinham confiado.
O administrador do concelho enviou á commissão uma certidão de que tinha intimado o thesoureiro do concelho a cumprir as resoluções da commissão e informou a mesma commissão do que não. só a camara não queria pagar os ordenados a estes empregados, mas que tambem tinha entrado nos cofres da camara maior quantia do que a que estava calculada no orçamento em relação a certas dividas activas.
O thesoureiro do concelho officiou á commissão districtal, dizendo que não cumpria o alvará, por lho constar que era demittido, se o cumprisse, e a commissão officiou-lho assegurando lho que não seria demittido por cumprir as determinações superiores.
Ha mais um officio do administrador do concelho, remettendo á commissão districtal a nota da cobrança do varios rendimentos municipaes, e outro officio dizendo que o thesoureiro do concelho tinha dado cumprimento ao alvará por estar ali estacionada a força publica.
Aqui tem v. ex.ª o modo como se passaram os factos, e não me parece que d'aqui possa caber censura alguma á commissão districtal. Só em vista da má organisação do orçamento é que se commetteu um erro que era facilmente reparavel.
Por esta occasião peço licença para dizer ao illustre deputado o sr. Rodrigues de Freitas, por quem tenho grande respeito, não só como homem particular, mas como homem publico, que sinto que s. ex.ª fizesse accusações a uma corporação que não tem voz no parlamento e portanto não se podia defender. (Apoiados.)
Estes e outros factos fazem-me acreditar que hão' se podia ser juiz com taes mordomos e que não se póde ser tutor com taes pupillos.
Ha grandes difficuldades em fazer comprehender ás camaras municipaes que, se têem direitos, têem tambem deveres a cumprir.
Se as deliberações das commissões districtaes não têem de ser cumpridas, então é melhor fechar as portas das salas das suas sessões, e entregarem o seu mandato á junta geral do districto.
O sr. Conde da Foz: — Tinha pedido a palavra para quando estivesse presente o sr. ministro da guerra, mas, como s. ex.ª não se acha presente, rogo a v. ex.ª é favor do m'a reservar para quando s. ex.ª comparecer.
O sr. Rodrigues de Freitas: —... (O sr. deputado' não restituiu o seu discurso a tempo de ser publicado n'este logar.)
O sr. Goes Pinto: — Vou mandar para a mesa seis requerimentos de primeiros sargentos do exercito, pertencentes ao regimento de infanteria n.º 3, os quaes pedem ao parlamento a votação de medidas que lhes melhorem a situação, já pelo augmento de vencimento, já por uma reforma na lei do promoções.
Já ha dias eu tenho esses requerimentos em meu poder, o na ultima sessão v. ex.ª sabe, sr. presidente, que eu cedi da palavra que me coube, por não estar presente nenhum dos membros do gabinete.
Dá-se hoje o mesmo caso, que lamento, principalmente' porque, ao apresentar estas petições, eu desejara chamar a attenção do nobre ministro da guerra para um assumpto tão importante, como é este do serviço, remuneração e decesso do uma classe valiosissima, a dos officiaes inferiores do exercito.
Eu devo declarar a v. ex.ª o á camara, que não concordo completamente com a doutrina expendida pelos requerentes, na parte que diz respeito ás alterações a fazer nas leis de promoções, mas quizera que o sr. presidente do conselho me dissesse se quer tornar effectiva uma proposta promettida por s. ex.ª em a sessão do anno passado, se bem me lembra, em virtude da qual os sargentos dos corpos de infanteria e cavallaria, teriam collocações em quadros não pertencentes ao exercito propriamente dito, mas dependentes do ministerio da guerra.
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Na ausencia do sr. ministro entendo não dever proseguir n'estas considerações.
Estando com a palavra, consinta-me v. ex.ª que eu me refira a algumas palavras pronunciadas aqui pelo nobre ministro, em resposta ás instancias feitas por mim e por mais alguns srs. deputados, para a prompta remessa de esclarecimentos e documentos que temos pedido. Respondeu s. ex.ª, com o modo e entono de quem dá uma resposta triumphante, que eram 148 os srs. deputados, o d'ahi a difficuldade do satisfazer todos os pedidos.
Ora, eu dei-mo ao trabalho de revêr o Diario das camaras, e vi que até 1 õ de fevereiro appareciam apenas uns doze ou quinze requerimentos a pedir esclarecimentos pelo ministerio da fazenda!
Eu tenho toda a consideração o respeito pela pessoa do meu antigo mestre, o sr. Antonio de Serpa, mas pareceu-me que a resposta de s. ex.ª não foi uma resposta seria, uma resposta grave, como entendo devia ser a resposta de um ministro.
O sr. Zeferino Rodrigues: — Pedi a palavra para dai á camara algumas explicações com relação ao conflicto que se ha dado entre a camara municipal de Grandola e a commissão executiva da junta geral d'este districto, a que se referiu o sr. deputado Rodrigues de Freitas na sessão de hontem.
O sr. deputado Arouca, que é meu collega tambem na junta geral, precedeu na sua explicação que tinha a dar, e narrou com toda a exactidão e clareza os factos que se têem passado, mostrando quanto foi injusto o sr. deputado Rodrigues de Freitas para com a commissão executiva na exposição que fez á camara, e se s. ex.ª se tivesse contentado completamente com as explicações que tinham sido dadas, eu não teria necessidade de acrescentar nada mais, o só agradecer ao meu collega o sr. deputado Arouca as suas explicações em defeza do procedimento da mesma commissão executiva; assim permitta-me v. ex.ª, que ainda observe ao sr. deputado Rodrigues de Freitas, que a commissão executiva approvou o orçamento geral da camara municipal de Grandola com algumas modificações, elevou o ordenado do escrivão da administração por entender de justiça dar provimento ao recurso por este interposto, e manter a resolução do conselho de districto emquanto ao augmento do ordenado do official de diligencias da mesma administração já resolvida no anno anterior a que a mesma camara municipal não quiz dar cumprimento, não creando no seu orçamento receita para este augmento de ordenado.
As modificações feitas no orçamento geral foram para que se abonasse das despezas imprevistas o fornecimento dos livros necessarios para o registo civil, e que se reduzisse de 590$600 réis a 503$600 réis a verba votada para o pagamento de uma divida a um empreiteiro, que a commissão executiva entendeu por mais conveniente para haver receita nos termos em que se achavam descriptos os capitulos das despezas do mesmo orçamento; mas logo que a commissão executiva teve conhecimento que esta reducção recaía em uma verba que tinha de ser paga pelo fundo da viação, porque a camara municipal confeccionara mal a classificação das despezas do seu orçamento, ordenou-lhe que som demora procedesse a um orçamento supplementar, não só para indemnisar o fundo da viação, mas tambem para crear receita para pagamento das quotas que pela junta geral tinham sido distribuidas para os serviços districtaes.
A camara municipal respondeu que não pagavam os augmentos dos ordenados, nem fariam orçamento supplementar para não sobrecarregar os povos com mais contribuições. - Em vista pois d'esta formal recusa, a commissão executiva determinou que no seu orçamento supplementar se constituisse como receita d'elle a differença que para mais devia resultar na receita do orçamento geral, porque, lendo consignado n'elle a contribuição directa de repartição na rasão de 73 por cento aos proprietarios residentes no concelho, e de 36 1/2 por cento aos proprietarios não residentes, devia necessariamente resultar a mais da receita, aquella differença pois, pelo artigo 115.° do codigo administrativo a referida contribuição deve ser igual em todo o concelho, advertindo a mesma camara que, se no praso de vinte dias não cumprisse estas determinações, usariam das providencias do artigo 133.° do codigo administrativo.
Tendo o administrador do concelho informado, que no cofre municipal, devido ás suas diligencias, entrára quantia superior á que fóra calculada no orçamento pelo rendimento de dividas activas, a commissão executiva em vista da disposição do artigo 136.° e § 1.° do mesmo codigo, expediu, por intermedio do administrador do concelho, alvará ao thesoureiro da camara para fazer os pagamentos que tinham sido ordenados á camara, ao que deu cumprimento.
Aonde estão pois as irregularidades no procedimento da commissão executiva?
Se a camara se julga offendida nos seus interesses, cumpre-lhe interpor os competentes recursos, mas o que não póde é desobedecer ás determinações que lhe foram dadas, visto que as despezas ordenadas são obrigatorias, e não póde por isso deixar de votar a receita necessaria.
A commissão executiva, dando provimento ao recurso do escrivão da administração, entendeu praticar um acto de justiça, regulando se, para assim o decidir, pelo vencimento que têem os mesmos empregados em concelhos de igual categoria, não me parecendo por isso justas as apreciações} que a este respeito fez o sr. deputado Rodrigues de Freitas.
A commissão executiva tem procedido com toda a legalidade na questão sujeita, cujos actos foram referidos á camara com muita lucidez e exactidão, pelo sr. deputado Arouca, que foi ás actas da commissão buscar os precisos esclarecimentos, o leu toda a correspondencia trocada entre a commissão e a camara municipal de Grandola; mas, para socegar completamente o meu digno collega o sr. Rodrigues de Freitas, comprometto-me a mandar para a mesa um relatorio da commissão executiva, acompanhado da copia de toda a correspondencia official a este respeito, e espero que s. ex.ª modificará ainda mais a sua opinião, e, se o entender conveniente, se requererá a sua impressão no Diario do governo.
Pela minha posição especial entendi do meu dever dar tambem algumas explicações á camara, e peço desculpa do tempo que lhe tomei.
ORDEM DO DIA
Continuação da interpellação do sr. Mariano de Carvalho ao sr. ministro da marinha, ácerca da concessão de terrenos na Zambezia ao capitão Paiva de Andrada.
O sr. Julio de Vilhena: —...(O sr. deputado não restituiu o seu discurso a tempo de ser publicado n'este logar.)...
O sr. Ministro do Reino (Rodrigues Sampaio): — O meu collega o sr. ministro da fazenda, encarregou-mo de apresentar á camara a seguinte proposta. (Leu.)
Leu-se na mesa a seguinte
Proposta
Senhores. — Em conformidade do artigo 3.° do acto addicional á carta constitucional da monarchia, pede o governo á camara permissão para que o sr. deputado José Maria Pereira. Rodrigues accumule, querendo, o exercicio do seu emprego de vogal e secretario supplente do conselho geral das alfandegas com o das funcções legislativas. v
Ministerio dos negocios da fazenda, gabinete do ministro, em 7 de março do 1879. = Antonio de Serpa Pimentel.
Foi logo approvada.
O sr. Pinheiro Chagas: — Quando deserta do seio da um partido um homem como o sr. conde do Casal Ribeiro, quando deserta, segundo a expressão, talvez pouco feliz, do sr. Julio de Vilhena, um homem, que elle mesmo classifi-
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cou Como um dos marechaes do partido regenerador, é licito perguntar se esse marechal não levou comsigo a bandeira gloriosa d'esse partido, e se não são os que ficam muitas vezes os que desertam. (Muitos apoiados.)
Quando o general Bonaparte deu o golpe de estado de 18 de brumario, muitos dos seus officiaes mais valentes, muitos dos camaradas que o tinham acompanhado emquanto se tratára do defender nos campos de batalha a gloria da França; desertaram tambem, porque Bonaparte marchava para o despotismo, e elles retrocediam para a liberdade. (Vozes: — Muito bem.)
Quando em 1828, em Lisboa, no seio do governo, se estabeleceu o despotismo, houve muitos officiaes briosos, muitos soldados intrépidos que desertaram, o desertaram para bem longe, para o estrangeiro; mas os desertores levavam comsigo as esperanças e os destinos da liberdade portugueza. (Apoiados. — Vozes: — Muito bem.) Quando aquelle que se arroga o direito do ser chefe de partido, de lhe dirigir os seus destinos, atraiçoa os seus principios, rasga o seu programma, rasga a sua bandeira, e esquece as suas tradições; a deserção dos seus companheiros mais fieis e dedicados deve fazer reflectir os que blasonam do soldados fieis. (Apoiados.)
Não basta stygmatisar com o epitheto de desertores os que se afastam, é necessario saber qual o motivo da deserção, porque ha deserções honrosas. Quando um homem como o sr. conde do Casal Ribeiro dá esse passo, com mágua profunda do sou coração, como declarou, pondo de parto os sentimentos e affectos mais queridos, obedecendo simplesmente ás regras da sua consciencia, é licito dizer que a sua deserção é legitima e é sagrada. (Apoiados. — Vozes: — Muito bem.)
Sr. presidente, ninguem aqui contesta a moralidade, nem por sombra a honestidade do sr. ministro. Ninguem levanta uma suspeita contra a sua honestidade, que temos obrigação de respeitar. (Apoiados.) ¦
Já ha dois seculos um homem illustre e perspicaz, grande politico tambem do seu tempo, o padre Antonio Vieira, dizia: «Ha venalidades que muitos commettem sem ter a consciencia d'isso». Ha muitos ministros que são incapazes de se deixar peitar por dinheiro ou por dadivas, que são verdadeiramente incorruptíveis, mas que se deixam perlar comtudo pela amisado, pelo favor e pelo empenho. Não têem a consciencia de que isto seja venalidade.
São estes actos de pouca moralidade politica, que nós condemnâmos e temos direito de condemnar. (Apoiados.)
E senão vejamos quaes foram os motivos do interesso publico que dictaram ao governo a concessão que se está discutindo.
Quando nós aqui contestámos a moralidade o a justiça d'esta concessão, pergunta-nos sempre o ministerio se não queremos as colonias prosperas o desenvolvidas, visto querermos que se repitta este cidadão que appareceu entro nós para sr. o redemptor das nossas colonias.;
Mas onde está a prova de que o sr. Paiva de Andrada será o redemptor das nossas colonias? (Apoiados.) Onde estão as provas da sua missão? Onde brilha a estrella dos réis magos? (Apoiados.) Appareceu um cidadão, um cavalheiro que respeito ç considero muitissimo com as mais altas qualidades, mas vem sosinho, não tem atrás de si nem capitães»- nem companhias, nem conhecimentos especiaes d'este assumpto. Chega ao sr. ministro da marinha e troca-se entre elles este simplicissimo dialogo: «Dê cá a Zambezia.»— «Aqui tem a Zambezia.» - «Está salva a Zambezia.» (Apoiados e riso.)
Quando se nos falla tanto nas colonias, na necessidade absoluta de trabalhar pelo seu desenvolvimento, pelo seu bem estar o pelo sua prosperidade, trata-se ao mesmo tempo do se concederem as suas minas, as suas florestas, e os seus terrenos ao homem que não offereço a mais levo garantia de que possa tornar essa concessão proveitosa. (Apoiados.)
O sr. Julio de Vilhena no seu brilhantissimo discurso, brilhante como todos os que profere n'esta casa essa privilegiada intelligencia, começou por declarar que achava pequena e mesquinha a questão da legalidade, e começou por estranhar ao illustre deputado interpellante que tivesse collocado a questão n'esse terreno.
Confesso a v. ex.ª e á camara que estou até certo ponto de accordo com o illustre deputado o sr. Julio de Vilhena.
O que admira apenas é a ingenuidade com que os meus collegas dá opposição disseram aqui o provaram, tornaram a dizer e a provar, que o governo n'esta questão tinha violado as leis.
Oh! sr. presidente! A violação da lei é hoje cousa que espante? Está palavra sacratissima lei tem hoje, por acaso, significação? (Apoiados.)
O sr. Mariano de Carvalho, quando fallou na violação da lei, pensou que fallava n'uma cousa de que talvez podesse resultar a queda dos Tarquinios; e ha annos que a lei deixou de 'ser Lucrécia para passar a ser Messalina. No periodo eleitoral não houve regedor de parochia que não violasse á vontade (Riso), e quando a maioria d'esta casa o confessava, não se levantavam os cabellos a ninguem. (Apoiados.)
Pois não veiu o sr. ministro da fazenda dizer-nos que tinha creado muitos guardas das alfandegas, o, portanto, que violara, não só a lei, mas a carta, invadindo uma attribuição parlamentar, e invadindo-a por verdadeiro luxo de illegalidade, porque quando creára esses guardas estavam as côrtes abertas, e o governo tinha uma maioria benevola que lhe votava tudo quanto elle quizera; e houve alguem que se espantasse com isso? Não houve. (Apoiados.)
A magestade da lei, outrora augusta o respeitada, tornou-se magestade irrisoria. E, para cumulo do opprobrio, fazem-na presidir, vestida de ouropel e coroada de lentejoulas, a essa orgia que por ahi vae.
Tem a lei breves honras e ephemero triumpho. Aqui discutida e votada com grande apparato, passa para a camara dos dignos pares e lá torna a ser discutida e votada com; grande pompa; vae á; sancção regia, e apparece depois no Diario do governo. E esta a sua hora brilhante. Durante uma manhã é lida, commentada, apreciada por todos os leitores d'aquella folha; durante uma manhã vive e triumpha. Depois morreu, passou, ninguem mais pensou n'ella.
Et, rose, elle a veeu ce que vivent les roses L’espace d'un matin.
Mas isto é tão profundamente verdadeiro, que o confessa o proprio governo, tanto assim que 0 governo, quando pretende que se cumpra alguma disposição contida n'uma lei, abre um verdadeiro termo de revaccinação.
Todos conhecem umas celebres portarias que apparecem de vez em quando no Diario do governo, e têem a seguinte formula: «Manda Sua Magestade El-Rei suscitar a observancia da lei tal».
Este systema, a que eu chamei na imprensa, de revaccinação administrativa, prova bem o que são os nossos costumes constitucionaes.
Ao passo que em Inglaterra se cumprem escrupulosamente leis que têem datas de seculos, entro nós e preciso suscitar a observancia de leis publicadas na vespera.
Por isso tem rasão o sr. Julio de Vilhena, em achar pequena a questão de legalidade. Mas é pena que assim seja; é pena que se julgue facto do minima importancia o violar o governo a lei, que é a expressão da vontade parlamentar, á vontade parlamentar que é a expressão da vontade do paiz. (Muitos apoiados.),
Apesar de achar pequena a questão da legalidade, o sr. Julio de Vilhena não deixou do a tratar, o que faz com que eu deva seguil-o n'esse terreno.
Na ordem em que tive de entrar no debato, v. ex.ª o a camara avaliam a posição difficil em que me vejo, tendo
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de responder a um deputado do grande talento e vastissima erudição, e que é alem d'isso um profundo jurisconsulto.
S. ex.ª, comtudo, estava collocado n'um terreno tão falso, que me parece que elle tambem não deixou de nos ensinar principios de direito desconhecidos na universidade de Coimbra, do que s. ex.ª alias é um dos mais brilhantes ornamentos.
Vou apresentar algumas duvidas que me foram suscitadas pelas palavras proferidas pelo illustre deputado.
Dizia s. ex.ª: «a lei de 1869 ordena que as concessões de minas não se façam a sociedades ou companhias».
O decreto da concessão diz que as minas são concedidas ao sr. Paiva de Andrada o á companhia que elle organisar. Portanto a lei cumpriu-se, porque as minas foram concedidas a companhias.
A lei de 1869, continua o sr. Julio de Vilhena, não exige que as companhias sejam organisadas. Muito bem! mas peço ao sr. Julio de Vilhena que me diga o que, é uma companhia que não está organisada. (Apoiados.)
Companhias não organisadas não são companhias. (Apoiados.)
Parece me, portanto, que a asserção do sr. Julio do Vilhena faz com que possamos acrescentar a nova phrase, ha pouco citada pelo sr. Julio de Vilhena, e cuja paternidade não ficou bem averiguado a quem pertencia.: «O melhor monopolio 6 a ausencia do monopólio», est’outra: «A melhor companhia é a ausencia de companhia». (Riso.)
Apreciando ainda as disposições d'este decreto, e confrontando com elle as disposições do decreto do 1869, deu o sr. Julio de Vilhena uma singularissima definição do que b. ex.ª entende por zona mineira.
Vou ler as proprias palavras do s. ex.ª, de que tomei nota textualmente. São as seguintes:
E Zona mineira é um tracto de terreno que tem minas.»
Por consequencia Portugal é uma zona mineira, por ser um tracto do terreno onde existem minas; a Europa é uma zona mineira, porque é um tracto de terreno que tem minas; e, finalmente, o mundo inteiro é uma zona mineira, porque tambem é um tracto de terreno onde existem minas. (Riso.)
Contra este argumento.
(Interrupção do sr, Julio de Vilhena.)
Exactamente. E a lei que concede a exploração do uma zona mineira...
(Interrupção do sr. Julio de Vilhena.)
São os limites da zona scientifica os da zona geológica.
(Interrupção que se não percebeu.)
Não me incommodo, pelo contrario. V. ex.ª está desenvolvendo e acrescentando o seu argumento, e como eu lhe estou respondendo, obsequeia-me com os seus commentarios.
Effectivamente a lei diz que o governo póde conceder «uma zona mineira». Ora, se a essas palavras «zona mineira» não correspondesse uma idéa definida o clara, bastava que a lei dissesse que o governo póde conceder as minas que quizer no espaço que lhe agradar.
O sr. Julio de Vilhena propunha ha pouco tres hypotheses, e são ellas: «Ou a zona scientifica é igual á zona concedida pelo decreto de 26 de dezembro, ou é menor, ou é maior».
No caso de a zona scientifica ser menor, e é essa a hypothese que nós tememos e indicámos, póde o governo, sendo auctorisado pela lei a conceder uma zona mineira, ter feito uma concessão tal que abranja mais do que essa zona. (Apoiados.)
Tambem o sr. Julio de Vilhena entendeu que o governo estava perfeitamente dentro da lei, concedendo ao sr. Paiva de Andrada o direito do pesquizar as minas.
O argumento do s. ex.ª é muito simples e curioso, o consiste em que o governo póde perfeitamente conceder a, pesquiza de minas, ou em terrenos seus, ou, usando do direito da tutela administrativa, em terrenos alheios.
Mas a lei concedo a todo e qualquer cidadão o direito do pesquiza, emquanto que por este modo concede-se só esse direito ao sr. Paiva de Andrada, o que é um privilegio, em prejuizo de todos quantos na Zambezia queiram fazer pesquizas de minas! O privilegio é que a lei prohibe expressamente. (Apoiados.)
(Interrupção do sr. Julio de Vilhena e da varios srs. deputados.)
O sr. Presidente: — Peço aos srs. deputados que não interrompam o orador.
O Orador: — Com relação á concessão do florestas tambem o sr. Julio de Vilhena me parece que foi pouco feliz na sua argumentação, ou que pelo menos se collocou exactamente na contradicção com todos os precedentes do ministerio, cujas doutrinas e opiniões elle estava sustentando o defendendo. (Apoiados.)
Effectivamente, se na lei actual existo o direito do governo fazer concessões de côrtes do madeiras, qual foi o motivo por que o sr. Andrade Corvo veiu á camara pedir, por mais do uma voz, auctorisação para fazer essa concessão?!
Desde o momento que s. ex.ª veiu pedir á camara uma auctorisação para isso, reconheceu que não tinha na lei o direito sufficiente para o fazer, e precisava da auctorisação do parlamento. (Muitos apoiados.)
Tratou s. ex.ª de correr rapidamente pelo assumpto da legalidade da concessão, collocou - a questão debaixo do ponto de vista economico, o n’esse ponto quasi que resumiu a sua argumentação em discutir as doutrinas do sr. Laranjo, ou antes em ler um livro de s. ex.ª, oppondo ás doutrinas economicas apresentadas pelo sr. Laranjo na sessão de hontem, as doutrinas apresentadas n'um livro publicado pelo mesmo sr. Laranjo, ha tempo; doutrinas que não pude apreciar porque não se póde apreciar um livro pela simples leitura de diversos trechos, mas que creio são em favor do monopolio ê do exclusivo nas colonias, emquanto ali não exista sufficiente capital e sufficiente desenvolvimento para se poder adoptar o regimen da liberdade.
Ora se se trata simplesmente de ler e de confrontar a que se escreveu, com aquillo que se diz agora, lamento que o sr. Julio de Vilhena não lesse toda a legislação portugueza a este respeito, acceito pelo governo, applaudida pela maioria, e cuja revogação o governo não propõe e que advoga exactamente os principios contrarios áquelles que advogou o sr. Julio de Vilhena. (Apoiados.)
O sr. Julio do Vilhena acha que têem rasão os que sustentam e defendem a necessidade do monopolio e do exclusivo nas colonias incipientes, e toda a legislação portugueza, essa legislação que, no entender do sr. Julio de Vilhena, o governo não violou, consagra o principio da libar dado. (Apoiados.)
Ora se são estas as doutrinas do sr. Julio de Vilhena e da maioria, qual é o motivo por que não vem o sr. Thomás Ribeiro propor á camara a revogação da legislação existente? Qual é o motivo por que não faz triumphar esses, principios nas nossas colonias, esses principios que reputa os unicos que podem produzir a sua felicidade e prosperidade? Nós sabemos com que sinceridade se trata d'estas questões; nós sabemos, e não admira, que o sr. Julio de Vilhena e a maioria estejam em perfeito desaccordo com q governo n'esta doutrina, quando vemos que no proprio governo a unidade de pensamento é pouca, ou não existe.
O sr. Julio de Vilhena censurou que o sr. Laranjo usasse de palavras que podiam envolver desconsideração e menos respeito para com a Inglaterra, e sustentou brilhantemente contra a vantagem da alliança com a Inglaterra. Não ouvimos nós tambem o que disse o sr. Corvo a este respeito e no mesmo sentido?
E não sabemos que essa alliança é o terror do sr. Thomás Ribeiro, que tem as idéas maia contrarias á alliança
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com a Inglaterra, o que na imprensa com toda a coragem combateu asperamente esta alliança? (Apoiados.)
Se o sr. Julio de Vilhena quer que continuemos com este systema das leituras, nós teriamos de ler não só o livro do sr. Laranjo, mas. tambem a prosa brilhante do Thomé do Diu. (Apoiados.) E bom foi que o sr. Thomás Ribeiro não estivesse presente quando o sr. Julio de Vilhena fallou, porque me parece que s. ex.ª teria de pedir a palavra para responder á accusação do illustre deputado.
O sr. Julio de Vilhena disse aqui duas palavras que são a condemnação mais completa e absoluta da concessão, são as seguintes: «eu não pertencia ainda á procuradoria geral da corôa quando o sr. Mártens Ferrão publicou uma consulta a respeito de um podido de uma concessão feita em tempo por dois cavalheiros, mas acceito e perfilho completamente as suas idéas». A consulta diz.
(Leu o trecho em que o sr. Mártens Ferrão se pronuncia contra as concessões feitas a individuos que depois as vão vender, e em que declara que é necessario que os concessionarios dêem garantias serias, por meio de um forte deposito de dinheiro, de que farão a exploração da concessão que requerem.)
Pergunto ao governo, ao sr. Julio de Vilhena e á maioria quaes são as garantias que têem de que esta concessão seja devidamente aproveitada? (Apoiados.)
Qual é a garantia que têem de que existe a companhia de que se falla e a quem é feita a concessão? Falla-se em companhias serias! Onde estão essas companhias com capitães sufficientes para poderem aproveitar-se da concessão? (Apoiados.)
i Essas companhias hão de ser portuguezas, e hão de ter a sede em Lisboa? Que garantias dá essa condição? A crise de 1876 provou perfeitamente que ha muitas companhias anonymas, instituidas com todas as condições de legalidade, e que estão muito longe de ser serias, debaixo do ponto de vista dos capitães, é claro.
O que tudo isto prova evidentemente é que o governo principia pôr não saber o que concede; e tambem é verdade que não sabe a quem concede. (Apoiados.) A formula algébrica d'esta concessão parece-me que podia ser a seguinte. O governo concede o terreno x á companhia y. (Riso.).
Eu acceito perfeitamente, como o sr. Julio de Vilhena, esta doutrina apresentada pelo sr. Mártens Ferrão, porque tive sempre a mais profunda repugnancia por este facto de poder entrar um homem n'uma sociedade industrial ou commercial levando apenas como capital sou a influencia que possa ter com o governo do seu paiz. (Apoiados.)
Repugna-me profundamente pensar, que se o sr. Walker, cujo nome foi citado aqui pelo sr. Saraiva de Carvalho, em vez do ter escolhido para seu. representante em Lisboa, o sr. Alcobia, ou outro qualquer individuo, tivesse escolhido o sr. Paiva de Andrada ser-lhe-ía com certeza feita a concessão que..pediu. (Apoiados.)
Repugna-me profundamente isto, porque entendo que este modo de fazer concessões pela amisade que possa ligar um dos membros do governo a um certo e determinado individuo, constituo falta de moralidade politica o um favoritismo; que é a gangrena mais profunda que póde affectar uma sociedade; (Apoiados.) E se não foi o favoritismo que presidiu a esta concessão, digam-nos qual foi o motivo que a dictou.
Percorrendo a biographia, aliás honrosissima, do sr. Paiva de Andrada, nós vemos que elle não tem capitães seus proprios, nem companhia para a empreza que tenta realisar, que elle nunca voltou a sua attenção para os estudos africanos, que applicou exclusivamente a sua alta capacidade á sciencia militar, a que se tem dedicado toda a sua vida, e principalmente n'um dos seus ramos mais importantes e da balistica, tem-se concentrado todo n'esses assumptos sem nunca pensar nos assumptos coloniaes; portanto mesmo n'esta parte não póde dar a garantia moral do ser um homem que entenda e conheça profundamente a especialidade do que vae occupar-se, e de que possa inspirar confiança aos capitalistas do se lhe poderem associar para tirar proveito da concessão feita e das explorações a que ficam auctorisados a proceder nos terrenos concedidos. Nem 'mesmo essa condição ou garantia existe. Não existe nada, absolutamente nada. Não existe senão o facto que o sr. Saraiva de Carvalho citou, que poderá não ter influido n'esta concessão, mas que é o unico que se póde citar, o de ter sido o sr. Paiva de Andrada companheiro de viagem do sr. Fontes Pereira de Mello na sua peregrinação ao estrangeiro. (Apoiados.) Não digo que fosse essa a causa. Mas se não foi essa a causa, então digam-nos qual foi. (Apoiados.)
Como é que o sr. Paiva de Andrada ha de ser, como se diz, o redemptor das nossas colonias? Porque? Tem' dinheiro para isso? Não. Tem companhia? Não. Tem estudos especiaes? Não. Não tom nada, absolutamente da que possa concorrer para tornar effectiva esta concessão. (Apoiados JE como não tem nada d'isso concede-se-lhe immediatamente tudo o que elle pede, mais do que elle pede (Apoiados.), sem a mais leve hesitação, porque toda a hesitação seria anti-patriotica.
Como é absurdo, faça-se já. (Apoiados.) Como não tem seriedade alguma, não ousem contestal-a.
Eu lamento profundamente que se trate assim esta questão gravissima, porque entendo realmente que o futuro das nossas colonias e o desenvolvimento da sua prosperidade será o maior elemento da nossa prosperidade futura. E n'este ponto estou de accordo com o sr. Thomás Ribeiro. Tambem entendo que devemos manter a nossa integridade colonial; e entendo isto, não por velhas rasões rhetoricas, não por serem as colonias um padrão das nossas glorias, não por serem uma relíquia da nossa grandeza, mas porque áquelles territorios não são terrenos que nós possamos explorar ou vender, mas constituem o prolongamento asiatico ou africano do nosso territorio nacional, porque os povos d'ali lêem sido educados sob o regimen portuguez; que pela mãe patria têem sido considerados cidadãos portuguezes, dando-lhes iguaes direitos civis o politicos. Podem ser-nos arrancados como foram arrancados á França os povos da Alsacia e Lorena, mas não podemos fazer d'elles objecto de um trafico mercantil. (Apoiados.)
E não se diga que eu fujo da declamação por um lado para entrar na declamação por outro lado.
Mas eu entendo que a mais alta missão historica que póde incumbir a um povo, é ir até aos confins mais remotos do globo plantar vergonteas do seu tronco primitivo, fundar estados filiais da mão patria, ser emfim uma dessas raças mãos, que, propagando-se e multiplicando-se, hão de conquistar um dia a hegemonia do planeta. (Vozes: — Muito bem.)
E esses estados, que ainda depois de separados dá mãe patria conservam com ella a communidade dos interesses economicos, contribuem poderosamente para o desenvolvimento e prosperidade da metropole. (Apoiados.)
Não sabemos nós perfeitamente que o Brazil hoje é talvez de mais recurso para nós do que no tempo em que o dominávamos, do que no tempo em que era nossa colonia?
Acontece o mesmo com os Estados Unidos e a Inglaterra.
Conta o sr. Leroy Beaulieu, quando se refere á separação dos Estados Unidos da nação ingleza, que os negociantes inglezes estavam assustadíssimos, porque imaginavam, que tinha cessado o seu commercio com aquelle paiz, mas que, pelo contrario, esse commercio tinha augmentado, tinha duplicado ou triplicado, e que fóra emfim uma nova fonte de rendimentos e de prosperidades para a Gran-Bretanha.
Portanto, longe de me fazer horror a idéa de que Angola e Moçambique hão de vir a ser independentes, anceio pelo momento em que essas colonias possam dar mais esse teste
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munho de que nós somos um grande povo colonisador. (Apoiados.)
E eu tenho a convicção profunda de que o povo portuguez é um grande povo colonisador. Tenho essa convicção o prova-se isso pelo que aconteceu no Brazil.
Ao Brazil chama o sr. Beaulieu a nossa obra prima de colonisação, e assim é.
Nós o que temos é que as nossas faculdades colonisadoras são inteiramente diversas das faculdades colonisadoras dos povos da raça germânica.
Os povos da raça germânica colonisam pela expansão, o nós colonisâmos pela assimilação.
A colonisação dos povos germânicos é, por assim dizer, a continuação das suas antigas migrações.
Os povos da raça germânica atravessam o oceano atlantico como seus paes atravessavam os rios o as montanhas da Europa oriental, e vão estabelecer do lado de lá do mar os seus lares, a sua familia, fundam ali a reproducção da sua patria, afastando para longe de si ou aniquilando muitas vezes as raças indigenas.
Nós sabemos que na America do norte, por exemplo, as numerosas e fortissimas tribus indias que primitivamente povoavam aquelle territorio, ou foram aniquiladas pela espada dos conquistadores ou foram recuando successivamente diante da civilisação até se circunscreverem nos ultimos desertos que o progresso da união americana lhes deixou, desertos onde ainda se mantem hostis e intransigentes contra o povo dominador.
Na Austrália a povoação indígena, a dos maoris, foi completamente aniquilada pelos inglezes.
NÓ3, não procedemos assim. Os indios do Brazil receberam a nossa civilisação, aldeiaram-se, e nós, que nunca tivemos preconceitos nem orgulho de raça, fizemos entrar muitos dos seus chefes nas mais altas classes da sociedade portugueza.
Sabe-se, por exemplo, que o índio Potyguarassú, conhecido por D. Antonio Filippe Camarão, foi fidalgo portuguez, recebeu o habito de Christo, o combateu comnosco nas guerras contra os hollandezes.
Nós, portanto, possuimos esta ausencia completa de preconceitos, (Apoiados.) admittimos nas nossas fileiras qualquer individuo, seja qual for a sua côr e a sua raça, (Apoiados.) o esta faculdade do assimilação constituo uma das mais importantes qualidades para um paiz colonisador. (Apoiados.)
E a prova d'isso é ainda que no oriente, onde a nossa missão não foi pacifica, onde uma parte dos nossos antepassados foram conquistadores cruéis e praticaram mesmo atrocidades, conserva-se, comtudo, ainda hoje o nosso prestigio.
Em Ceylão, conta o sr. Du Hailly, em Ceylão, que ha dois seculos deixou de ser nossa, que esteve sujeita ao dominio hollandez, e que está hoje debaixo do dominio inglez, ainda a lingua portugueza é a que mais se conhece, o cunho portuguez é o que ali se conserva.
Em Malaca, os descendentes dos nossos antigos conquistadores formam uma especie de aristocracia muito respeitada.
A colonia portugueza de Bombaim, forte e numerosa, conserva na grande cidade ingleza a sua perfeita autonomia.
Não se vê na Africa, pela recente guerra dos zulus e por muitas outras, a incompatibilidade dos inglezes com as populações indigenas?
Acontece, pelo contrario, que um punhado de portuguezes que ali estão estabelecidos não encontram difficuldades senão quando as levantam á força de prepotencias das auctoridades. (Apoiados.)
Por consequencia, n'estas condições, nós somos o povo que mais serviços póde prestar á civilisação nos territorios de Africa.
Desde o momento que temos estas altas qualidades de colonisação; desde o momento que possuimos tão vastos territorios, é licito que haja um ministro da marinha e do ultramar que trato d'estes negocios com tão pouca seriedade? Um ministro que conceda á primeira pessoa que lha appareça e que lhe pede os territorios da Zambezia sem nenhumas garantias absolutamente?»
E este systema que eu lamento, porquê elle não serve senão para o dispêndio do tempo e do dinheiro. (Apoiados.)
Quando o ministro da marinha vem pedir 200:000000 réis para a Guiné; quando organisa expedições de obras publicas para o ultramar, dispersando o pessoal para todos os pontos das differentes possessões, de maneira que nada se póde fazer e nada se poderá alcançar, lamento o dinheiro que se gasta, porque vejo que elle é completamento perdido para as obras da verdadeira civilisação.
Quando esteve no ministerio o sr. José de Mello Gouveia, sabendo que em algumas provincias do Brazil havia! cidadãos portuguezes que estavam em más circumstancias convidou-os a ir para Africa, offerecendo-lhes terras e meios para se transportarem. Isto fez grande impressão no Brazil: muita gente quiz ir para Africa, e chegada lá encontrou-se sem recursos, sem trabalho, e uns tiveram que retirar-se e outros morreram, e foi necessario suspender esta. corrente, porque não havia meios para os sustentar.
Se este dinheiro que se gasta loucamente com estados maiores administrativos, fosse empregado em constituir um fundo de colonisação, podia ter dado excellentes resultados e grande vantagem para o paiz. Mas estas questões serias e que se não tratam; o que se trata apenas é de proporcionar nas colonias um meio ao sr. presidente do conselho de poder dar com ellas um brinde ou um presente!
Ninguem põe em duvida nem a honestidade, nem o amor pela causa publica do sr. presidente do conselho; eu até estou persuadido de que, se o governo fez esta concessão ao sr. Paiva de Andrada, não foi levado a isso por nenhum pensamento de prejudicar as colonias. O sr. Visconde da Arriaga aqui nos revelou a idéa do governo: «Esta concessão não fez mal nenhum, e póde ser que faça algum bem»» Não tem nada de séria. Nunca se realisa. Ha de figurar na região dos sonhos. E por isso não valia realmente á pena desgostar este cavalheiro, que é um excellente rapaz, moço muito estimável, negando-lhe uma cousa que a final de contas para nada lhe serve o que não faz mal á ninguem. (Apoiados.) E aqui está a seriedade com que estes negocios se tratam.
O governo deseja o bom do paiz, mas esse desejo da servir a causa publica, e ao mesmo tempo de sé tornar agradavel aos amigos particulares dos srs. ministros, tem dado origem entre nós a uma classe similhante & dos politicians americanos, que têem feito da politica um campo da exploração. E por isso que o sr. presidente do conselho» vendo que o velho omhibus do partido regenerador se transformou n'um comboio de tresentas carruagens, que tem por estação terminus, o funccionalismo, vê-se obrigado a alargar os quadros da administração para satisfazer todos os apetites.
Todas as medidas que lêem sido propostas tendem a augmentar o quadro do funccionalismo, e assim o registo civil foi proposto unicamente para á creação da repartição do registo civil; (Apoiados.) assim o desastre da Guinés veiu a proposito para o governo crear um governo independente; (Apoiados.) assim é augmento dos direitos do tabaco foi proposto para a creação de grande numero da fiscaes, ainda augmentado com a proxima vertigem das aposentações; (Apoiados.) assim a modificação das contribuições directas trouxe a creação de uma classe de visitadores. (Apoiados.)
Não ha uma reforma que não se traduza no augmento do funccionalismo, quando todos sabem que a melhor reforma que se podia tentar seria a simplificação do. serviço. (Apoiados.)
Declaro a. v. ex.ª e á camara que detesto o fim politico
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do governo que actualmente preside aos destinos da nação, que é unica e exclusivamente o do favoritismo. (Apoiados.)
Com este systema, por mais que se alonguem em cânticos o declamações patrioticas, não é possivel concorrer-se para o serviço da causa publica e para o bem do paiz. (Apoiados.)
O patriotismo é tambem uma religião, mas uma religião que não tem só pompas e Te-Deums, tem tambem deveres sagrados.
Não cumprem os seus deveres os sacerdotes que estão sentados nas cadeiras dos conegos, incensando e thuribulando a imagem da patria, o distribuindo pelos acolytos os rendimentos da igreja. (Apoiados.)
É necessario ir tambem pelo áspero caminho da missão, levar aos povos que a ignoram a palavra redemptora. É necessario saber-se que n'este momento grave e solemne, que estamos atravessando, não é permittido ao governo conservar-se no poder sem outra idéa que não seja a de favorecer os seus afilhados, e fazer concessões, das quaes não podem resultar beneficio algum para o paiz.. É necessario que se saiba que n'este momento é indispensavel que o sr. ministro da fazenda não resuma o seu plano financeiro, em fazer do orçamento aquillo que o sr. Fontes disso que não podia ser um rol de receita e despeza..
Diz-se hoje: receita, 25.000:000$000 réis; despeza, réis 28.000:000$000; deficit, 3.000:0000$000 réis.. Passados seis mezes, vem dizer-nos: senhores, a receita foi de 28.000:0000$000 réis, e a despeza de 32.000:000$000 réis; portanto temos um deficit de 4.000:000$000 réis. No fim dó anno economico voltam com outra conta, e dizem-nos que o deficit foi do 7.000:000$000 a 8.000:000$000 réis. Depois, para cobrir este deficit, ha a divida fluctuante, e para matar essa divida, ha o emprestimo consolidado.
Ora, sr. presidente, para isto não vale a pena ler nas cadeiras do ministerio um economista e um financeiro, porque qualquer amanuense que saiba fazer uma conta de diminuir, é sufficiente. (Apoiados.)
Não é possivel estar no ministerio da guerra sem ter um plano, de defeza, que não seja o da compra de armas, sem conta, sem systema, nem medida; estar no ministerio da marinha, sem um plano de colonisação, que não seja colonisar com governadores geraes e fazer concessões a companhias desconhecidas. (Apoiados.)
Eu percebo que a ambição do poder é uma ambição legitima de todo o homem publico; mas ha dois modos de ambicionar o poder. Ha aquelle que o ambiciona pelo amor da gloria; e outro que o ambiciona pelo amor do poder...
Percebo que deve ser um nobre jubilo o de concorrer para o desenvolvimento do seu paiz; o de lhe abrir de par em par as portas da civilisação, de ser na historia um d'estes fanaes luminosos, que indicam a entrada dos portos, que são às escalas dá humanidade na tormentosa navegação do progresso.
Mas amar o poder; simplesmente pelo poder, amar o poder simplesmente para presidir ao desmororamento material, moral e financeiro do paiz; amar o poder para assistir de braços cruzados ao decrescimento do nivel da instrucção, amar o poder não para crear instituições, mas para crear empregos; amar o poder, não para desenvolver as colonias, mas para talhar n'ellas umas capitanias, e para dar essas capitanias, não a João do Barros, que contou as peregrinações do Vasco da Gama, mas ao sr. Paiva de Andada, que só póde contar as peregrinações do sr. Fontes; amar o poder não para crear uma importante marinha, mas para comprar uma barca de banhos couraçada e para mandar para os rios e esteiras de Guiné uma especie de vapor cacilheiro, (Riso.) isso é que me não pároco digno de espiritos superiores (Apoiados.) O sr, Fontes, que teve já na sua vida politica as nobres
sensações do amor da gloria, o sr. Fontes que póde sentir um nobre orgulho, ouvindo o primeiro silvo agudo da locomotiva nos campos de Portugal, e lembrando-se que á sua iniciativa se devia poder-se ouvir essa primeira nota do cântico do progresso, não sei como póde resignar-se a ouvir agora simplesmente o silvo da lisonja do afilhado que lhe agradeço o emprego! E parece impossivel com não se convenceu ainda de que a sua permanencia no poder é prejudicial para a sua gloria o para os interesses do paiz! (Muitos apoiados.)
A opinião publica manifesta-se contra s, ex.ª As duas cidades mais importantes do reino mandaram á representação nacional deputados opposicionistas, e se não aconteceu o mesmo na maior parto dos circulos do reino, foi porque se recorreu a todos os velhos recursos obliterados de antigas e nefastas eleições. (Apoiados.)
Os seus amigos mais dedicados e fieis vêem-se forçados a abandonal-o, lamentando a sua cegueira. (Muitos apoiados.)
E s. ex.ª, afferrando-se ao poder, está provando que essa lei physiologica que faz com que na velhice dos individuos, que é a idade das trasingencias, haja mais amor á vida, do que na mocidade, que é a idade dos heroísmos, se applica tambem ás entidades collectivas.
Vou concluir. Estou fatigado e não quero fatigar a attenção da camara. Mas antes, direi pela ultima vez que appello para o patriotismo do sr. presidente do conselho.
O sr. presidente do conselho disse mais de uma vez, quando se discutiu a organisação militar do paiz, que emquanto fosse poder não a proporia, mas que se quem lhe succedesse a viesse propor, teria o prazer em a apoiar e approvar.
Estamos atravessando uma crise economica, uma crise politica na Europa, uma crise que se póde chamar colonial.
Se o ministerio tem força para a conjurar, governe e trabalhe, mas se para affrontar a crise economica, não tem outro systema senão a organisação do deficit como instituição permanente; se para affrontar a crise politica não tem outro systema senão o da nomeação de governadores para fortalezas sem guarnição nem canhões; se para affrontar a crise colonial, porque é certo que para ella se voltam todas as attenções da Europa civilisada, como necessidade de abrir novos mercados á industria superabundante, não tem outro systema senão o de concessões ao sr. Paiva de Andrada, então sáiam dos conselhos da corôa, e deixem aos que os substituirem o poder realisar as idéas que s. ex.ªs não têem força para realisar, (Apoiados.) e não pensem os srs. ministros que eu estou appellando para um sentimento que não se póde invocar n'esta occasião.
Se os srs. ministros têem a maioria do paiz o a confiança da corôa, então governem desassombradamente, mas entendam que governar é resolver as altas questões do estado (Apoiados), e não sejam nas cadeiras do poder um obstaculo á realisação de todas as idéas que podem levantar Portugal á altura a que deve subir (Apoiados.) e não sejam no poder como aquelle personagem oriental do quem Tiron dizia: Il ne fait rien, et nuit á qui veut faire.
Tenho dito.
Vozes: — Muito bem.
(O orador foi comprimentado por muitos srs. deputados.)
O sr. Presidente do Conselho de Ministros (Fontes Pereira de Mello): — O acto do governo está justificado pelos proprios discursos dos illustres deputados da opposiçâo. (Apoiados.)
O illustre orador que acabou do fallar não discutiu a questão que se agita, e limitou-se a manifestar o sentimento da opposiçâo, sentimento que lhe germina no espirito, superior a todos os outros, e este é que o governo deve abandonar as cadeiras do poder.
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Sabeis, senhores, porque a questão da Zambezia, isto é, porque o acto do governo é illegal?
É porque não temos organisado o exercito!
Sabeis porque o acto do governo é illegal e porque merece as censuras da opposiçâo?
É porque não organisámos a nossa marinha!
Sabeis porque a questão da Zambezia deve ser condemnada?
É porque temos um deficit permanente, e não temos conseguido ainda, apesar de todos os esforços do governo e dos de todos os nossos amigos que nos têem acompanhado constantemente, igualar a receita com a despeza!
E porque a força dos acontecimentos, e a propria natureza, se têem conspirado contra nós; é porque apesar dos esforços que temos empregado constantemente, não. temos conseguido que o cambio do Brazil nos seja mais favoravel; é porque não temos emfim conseguido muitas cousas a que o destino se tem opposto!
O illustre orador que me precedeu não proferiu uma palavra sobre o assumpto. (Apoiados.)
O illustre deputado, que tem altos dotes e uma elevada capacidade, que ê um dos talentos peregrinos que eu conheço, e comprazo-me de o declarar em publico, não achou uma phrase, um unico argumento para combater o acto que se discute.
Que melhor triumpho para o governo?! (Apoiados.)
Pois, se um talento d'aquelles não achou no arsenal da sua vasta intelligencia um argumento para combater o acto do governo, que melhor justificação para nós?! (Apoiados.)
O illustre deputado que precedeu o sr. Pinheiro Chagas fez um dos mais brilhantes e dos mais notaveis discursos que tenho ouvido n'esta casa. (Apoiados.)
Tratou a questão ex professo. Tratou a questão economica, tratou a questão legal, e disso que não tratava a questão moral; mas tratou-a de um modo tão levantado, tão alto, que sou obrigado, por todas as considerações, a tributar-lhe os meus sinceros agradecimentos..
Sou obrigado a tributar-lhe os meus sinceros agradecimentos, não por ter reconhecido a minha probidade pessoal, porque a esse respeito não desço á discussão; (Apoiados. — Vozes: — Muito bem.) mas por ter reconhecido e ter feito justiça aos meus sentimentos patrioticos, estabelecendo a proposição de que o governo não era capaz de praticar este ou outro acto qualquer se não fosse o seu desejo imperioso e irresistivel de servir bem o seu paiz. (Apoiados.)
Nós podemos ter errado, nós podemos ter-nos enganado, mas é preciso que se prove que nos enganámos e que errámos. E preciso que, em logar de declamações apaixonadas, se apresentem argumentos com que se prove, pelos quaes se demonstre que o acto do governo é illegal, com que se prove, pelos quaes se demonstre, que o governo praticou um acto de favoritismo, em logar de praticar um acto aconselhado pelos interesses publicos. (Apoiados.)
E isto que é necessario que se prove, e não se prova.
Não basta dizer que se fez uma concessão ao ex-secretario do presidente do conselho; não basta dizer que essa concessão é illegal, immoral, inutil e inconveniente para a causa publica, porque isso não prova nada. (Apoiados.)
Eu, que não tenho a pretensão de convencer os meus adversarios e que respeito as suas intenções, posto que ás vezes não respeitem as minhas; eu que não tenho a vaidade de imaginar que com o meu discurso posso esclarecer a assembléa, porque a reputo largamente esclarecida pelos discursos que se têem pronunciado de um e outro lado, sou obrigado a dizer, para restabelecer a verdade dos factos, tomando toda a responsabilidade, más toda inteira e precipua do acto que se praticou, que não tive conhecimento d'elle senão quasi no fim, quando quasi estava feito.
Digo isto debaixo da minha palavra de honra, e diante dos meus collegas que aqui estão (Apoiados.)
Eu que sou accusado de praticar um acto de favoritismo, que sou accusado de querer entregar a um amigo, a um companheiro de viagem, toda a provincia de Moçambique, como já se disse, não soube do acto que se praticou, senão quando elle estava quasi proximo a realisar-se.
E não me inquietei com elle, não me pareceu extraordinario, não me surprehendeu, não achei que houvesse mais motivos para censurar este acto do que tenha havido para censurar tantos outros similhantes que os meus adversarios têem praticado quando estão no poder, ou apoiado quando estão fóra d'elle (Apoiados.)
Achei que era a cousa mais natural, mais simples rasoavel, dentro dos limites das leis, e segundo a nossa doutrina economico-colonial, que é possivel imaginar-se.
Declaro a v. ex.ª que foi com a mais completa surpreza que vi levantar-se no paiz uma certa corrente de opinião, porque se levantou, e as correntes de opinião são faceis de levar para um ou outro lado, quando os homens politicos que estão á frente dos partidos, procuram envenenar os actos dos seus adversarios. (Apoiados.)
Não ha nada que se preste mais a formar uma opinião contraria a um governo qualquer, do que procurar convencer o publico de que esse governo, em logar de servir a causa publica, está servindo a causa de um afilhado.
Não ha nada mais facil, (Apoiados.) e é o que se fez.
Imagino que se fez conscienciosamente, porque eu, repito, não condemno as intenções dos meus adversarios, como ás vezes condemnam as minhas; acredito que, se fez com o convencimento de que se fazia uma cousa justa, mas disse convencimento, que estava sobre bases falsas, sobre principios errados e sobre factos que não existiam, d'esse convencimento nasceu, ainda que momentaneamente, uma certa corrente de opinião, a opinião de que o acto do governo, era condemnavel.
Sr. presidente, eu conheço o sr. Paiva de Andrada, e tenho muito prazer em declarar aqui, no seio da representação nacional, que é um dos officiaes mais benemeritos que conheço no exercito portuguez. (Muitos apoiados.) Não póde ter praticado grandes serviços, porque ainda é novo, mas é de uma alta instrucção, de uma grande capacidade, e de uma probidade e de uma honradez incontestaveis. (Apoiados.)
O sr. Paiva de Andrada estava em París, por ordem do governo portuguez, e tinha uma commissão do governo; não fui eu que lh'a dei. Fui a París, com licença do governo, tratar da minha saude, encontrei-o lá, e elle pediu auctorisação ao governo portuguez — que não era o meu, que era o governo que os illustres deputados apoiavam, para me acompanhar, por occasião da minha viagem á Italia e á Allemanha, a fim de examinar os estabelecimentos militares, porque estava encarregado d'esse exame.
O governo portuguez, que não era meu ou dos meus amigos politicos, auctorisou o sr. Paiva de Andrada a acompanhar-me; e veja a camara que crime, que mal houve effectivamente em percorrer com elle diversos estados da Europa! Entrava nos arsenaes, nos quarteis, nas fortificações, examinava os estabelecimentos militares, e elle entrava e examinava commigo, porque, como já disse, estava especialmente encarregado d'este estudo.
Resultará d'aqui desdouro para mim, ou para o sr. Paiva de Andrada, que me acompanhou auctorisado pelo governo do seu paiz? Não creio. (Apoiados.)
Mas depois d'isso, e passado tempo, é que o governo de que tenho a honra de fazer parte lhe fez o que faria a qualquer outro individuo nas suas circumstancias: fez-lhe uma concessão de terrenos e minas, como se têem feito outras' concessões, com as mesmas condições, nos mesmos termos, com a mesma facilidade e com as mesmas garantias, taes e quaes, como hei de provar á camara. {Muitos apoiados.)
Onde ha aqui o favoritismo? Onde está aqui o acto de immoralidade? Onde a transgressão das leis? (Apoiados.)
Esta accusação de immoralidade, ainda que não seja senão de immoralidade politica, fere sempre os homens, e eu
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hei de perguntar aos illustres deputados, meus adversarios, quando discutir este ponto, se tambem declaram immoraes áquelles que têem praticado actos identicos e nas mesmas condições.
Agora, sr. presidente, não trouxe nenhuns apontamentos, porque não julgava fallar hoje, e peço a v. ex.ª que me reserve a palavra para a sessão seguinte.
Vozes: — Muito bem, muito bem. (S. ex.ª não revê os seus discursos.)
O sr. Presidente: — A ordem do dia para segunda feira é a que estava dada, e mais o projecto n.º 80.
Está levantada a sessão.
Eram mais de cinco horas da tarde.
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Nota por concelhos dos recrutas que no anno de 1878 foram inspeccionados pela junta de revisão no districto de Braga, com indicação dos que foram isentos, dos que foram julgados aptos para o serviço, e dos que foram temporisados, e das molestias que determinaram as isenções, tirada das actas das respectivas sessões.
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Nota dos facultativos que compozeram a junta de revisão no anno de 1878 nos mezes abaixo designados,
tirada das actas das respectivas sessões
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Está conforme. — Secretaria do governo civil em Braga, 12 de fevereiro de 1879. = O secretario geral, Manuel Justino Marques Murta.
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