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DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS
Com relação a este assumpto n. nossa legislação sobeja.
Desde o celebre regimento das madeiras do 1562 até hoje não tem escasseado legislação sobre o assumpto.
O ultimo regulamento é o de 22 do junho de 1872, mas como este se refere, principalmente, a organisação de serviços e manda observar, no artigo 52.°, as disposições policiaes, disciplinares o penaes, do regulamento de 7 de julho do 18-17, vejamos o que este diz:
«Artigo 8.° Tambem não podem os usufructuarios ou possuidores convencionar um corte desproporcionado ás forças da mata; a por isso todas as vezes que emprehenderem qualquer córte, o participarão ao administrador gorai, o qual por si ou por empregado de confiança, buscará sem demora informar-se de maneira que possa conscienciosamente dar a licença, ou modificando rasoavelmente o pedido, concedo] a no limito de se poder levar a effeito sem grave prejuizo da mata.
«Art. 9.° Em todo o caso o corte deve ser presenciado por uni empregado da administração geral, a fim de vigiar que o mesmo córte se faça nos termos precisos do que se houver determinado; e finalmente para que se não derribe pau algum dos escolhidas e marcados para uso de construcçâo naval.»
Não e só esse regulamento, é tambem o do 18 do julho do 1856 que versa sobre a exploração das florestas da índia.
Este regulamento diz que os usufructuarios não podem fazer cumerins, nem praticar ou convencionar côrtes, em alguma das ditas matas, que sejam desproporcionados ás forças das mesmas e de que possa resultar a aniquilação da mata ou do uma parto della.
«Em todo o caso, acrescenta o regulamento, o corto, desbasto ou cumerim que fizerem em uma mata devo ser convenientemente vigiado, e superintendido do modo possivel por um empregado da administração geral das matas, a fim de que a operação se faça nos termos precisos do que se houver determinado, o para que se não derribe pau algum, dos que na conformidade do artigo 9.° tiverem sido escolhidos o marcado,).»
Segundo estes regulamentos, na exploração das matas hão de observar-se duas condições. A primeira é que o córte não deve per desproporcional á força da mata, e a segunda é que não deve chegar a exploração ás madeiras necessarias para as construcções do estado. O poder executivo, dentro das suas attribuições constitucionaes, poz em vigor estes regulamentos para a exploração das florestas concedidas. Estava no pleno uso das suas faculdades.
Para que estão todos os dia?, aqui e lá fóra, n'esta e na outra casa do parlamento, a clamar que o governo permittiu a destruição das matas da Zambezia? (Apoiados.)
O decreto da concessão manda observar os regulamentos, e estes prendem de tal modo as mãos ao concessionario que elle não póde proceder de modo que resulto a destruição das matas o florestas que o estado possuo na região da Zambezia.
Alem d'isso tom do sujeitar-se o concessionario aos regulamentos futuros, o quando os actuaes partidos da opposiçâo chegarem ao poder, podem fazer regulamentos que o prendam completamento n'este ponto da concessão. (Apoiados.)
Resta a concessão de terrenos.
O illustre deputado interpellante começou por declarar que o governo não podia conceder 100:000 hectares de terrenos, porque o estado não os possuia, o que tambem se disse na outra casa do parlamento.
(Interrupção do sr. Mariano de Carvalho.)
O Orador: — Se não o disse s. ex.ª disse-o o sr. Laranjo, que reconheceu ser necessario dilatar os terrenos na Zambezia para se poder fazer a concessão.
Existem mais do 100:000 hectares de terrenos; entretanto, diga-se a verdade, a responsabilidade d'este erro não pertence á opposiçâo, mas & junta consultiva do ultramar.
É ella que declara que não havia 100:000 hectares de terrenos juntos na Zambezia, assentando esta sua asserção no officio do governador de Moçambique ácerca do pedido Walker, officio datado de 29 do maio de 1878, e que tem servido de base para se dizer que não temos terrenos com a extensão referida.
Dia o officio o seguinte:
«Em resposta á regia portaria n.°459 da serio finda, em que sou mandado informar a respeito da pretensão do subsisto inglez Walter Frederich Walker, que pede 50:000 hectares de terreno, destinados á cultura da canna de assucar, tenho a honra de participar que, segundo a opinião do pessoas fidedignas, não póde obter-se em Tete nem nas suas immediações uma tão grande quantidade do terreno apropriado á cultura indicada, porque o paiz é geralmente montanhoso.
«Assevera, comtudo, o governador de Teto, que se não exigir que os 50:000 hectares sejam no mesmo ponto, poderão, em differentes sítios de extinctos prazos da corôa, obter-se terrenos com os requisitos necessarios para a dita cultura, que dêem approximadamente aquella superficie, os mais distantes dos quaes não excederão a um dia do 'viagem de Tete, e não me parece que, n'estas circumstancias, haja inconveniente em deferir-se a concessão requerida. »
Como a camara acaba de ouvir, o governador dizia que não havia no districto de Tete 50:000 hectares de terrenos proprios para a cultura da canna de assucar, porque o terreno era geralmente montanhoso; o dizia bem; mas d'ahi não podia inferir-se em absoluto que não houvesse aquella extensão de terrenos, porque podia não haver esses 50:000 hectares de terreno proprio para uma certa cultura, mas havel-o para outras culturas. (Apoiados.)
Tambem se tem dito que não ha esses terrenos juntos.
Ora, o decreto de 26 de dezembro de 1878 não concedeu os 100:000 hectares de terrenos juntos, nora mesmo o concessionario assim os pediu.
Não se comprehende que o sr. Paiva de Andrada pedisse 100:000 hectares de terrenos juntos, isso é, approximadamente 38 leguas quadradas, n'uma superficie de quasi 9:000 leguas quadradas, que tal é a da zona mineira, sendo evidente que a idéa d'elle é estabelecer a exploração agricola juntamente com a exploração mineira, obter terrenos juntos ás minas e não a uma grande distancia dellas.
Supponha v. ex.ª que se concedia esta arca de terrenos nas proximidades de Tete, e que o concessionario começava a exploração mineira no Zumbo, na extremidade opposta da zona, é manifesto que a população da colonia agricola ficaria a muitos dias de viagem das minas em exploração, quando d'essa colonia é que deviam saír os trabalhadores empregados na mineração. (Apoiados.)
Não ha 100:000 hectares do terrenos pertencentes ao estado? Mas ouçam o que diz o sr. Xavier Botelho, que tão bom conhecia a provincia de Moçambique:
«Existem no tempo d'agora ao todo 100 prazos, distribuidos pela maneira seguinte: em Teto, 54, em Sena 31, em Quilimane 15, que, todos juntos, rendem para a corôa annualmente, entre fóros é dizimos, 1:207 maticaes de oiro, que vem a ser 1:540 oitavas, no valor medio de 17 cruzados cada matical, reputado o cruzado a 160 réis, o que tudo faz a somma total de 3:286$240 réis. Eis o proveito que tira a corôa portugueza de 3:612 leguas quadradas de terreno, que o não ha nem mais fertil, nem mais mocisso de riquezas.»
Já a camara vê que temos muito mais do que os 100:000 hectares de terreno. (Apoiados.)
E note v. ex.ª, que a maior parte dos prazos são situados nos districtos de Sena e Tete, e por isso comprehendidos na zona concedida pelo governo, e, por consequencia, elle tinha dentro d'esta area terrenos, não só para poder conceder 100:000 hectares, mas muito mais, a qualquer individuo ou companhia que os requizesse.