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APPENDICE Á SESSÃO DE 17 DE MAEÇO DE 1888 824-A

O sr. Eduardo José Coelho: - Sr. presidente, vou proseguir na ordem de considerações, que hontera interrompi, por ter dado a hora. Dizia eu, que, segundo os relatorios officiaes, a que hontem me referi, a cadeia districtal de Coimbra póde comportar 30 cellas e a de Santarem 130.

O sr. Franco Castello Branco: - V. exa. dá-me licença? Eu peço a v. exa. se me concede, depois do seu discurso, que leve para casa esses taes relatorios, a fim de os estudar esta noite, para na segunda-feira responder a v. exa. V. exa. está argumentando com elementos, que eu não tenho. (Apoiados.)

O Orador: - Os relatorios estão á disposição de v. exa. e da camara, porque os tenho aqui, e não tenho duvida em envial-os para a mesa; mas eu já disse hontem que estes relatorios, posteriores á acta do conselho penitenciario, a que se refere o sr. ministro da justiça, não contradizem o pensamento do projecto, e por elles se prova que elle é ainda mais vantajoso, do que se deduz do mesmo projecto, e calculos estatisticos, em que elle se funda. Parece-me escusado repetir agora o que hontem disse.
Os relatorios provam, sem possivel contestação, que as duas cadeias districtaes comportam 470 cellas, e portanto a differença de despeza para mais nas duas cadeias com o custo completo d'ellas, que é de 20:000$000 réis para a de Coimbra e 8:600$000 réis para a de Santarem, é largamente compensado por aquelle augmento de cellas. (Apoiados.) Cumpre não esquecer, que o governo não póde despender um ceitil, alem da quantia mencionada no artigo 2.°, § 3.°, e por isso não se póde argumentar com os relatorios dos engenheiros senão em sentido favoravel ao projecto em discussão. (Apoiados.)
Tinha dito hontem, que não podia calcular a despeza com a cadeia geral penitenciaria de Lisboa em menos de 1.800.000$000 réis, mas acrescentei logo, que tinha de declarar á camara a cifra quasi exacta, fundada em documentos officiaes, que poderá obter até certa epocha, que não chegou exactamente ao anno de 1885, data da sua installação.
Segundo o relatorio do inquerito parlamentar e outros documentos apura-se cerca de 1.000:000$000 réis, e posteriormente nos exercicios de 1877-1878 a 1879-1880, quantia superior a 300:000$000 réis (conta geral do estado de 1886-1887, pag. 534 e 535). Pude verificar, que pela verba ordinaria de edificios publicos se despenderam proximamente 150:000$000 réis.
Devo declarar, que o exame dos documentos, ou quantias despendidas pela verba ordinaria de edificios publicos, não abrangeu todos os annos até 1885. As quantias, porem, apuradas com caracter official não são inferiores a 1.500:000$000 réis, que divididos pelo numero de cellas dá 2:604$000 réis (conta redonda) por cada uma d'ellas. É verdadeiramente assombroso, mas creio, como já disse que a realidade é ainda mais assombrosa. (Apoiados.)
Este trabalho, verdadeiramente insano, ter-se-ía poupado, se a lei tivera sido cumprida. Em todo o periodo larguissimo da construcção da penitenciaria de Lisboa não me consta, que uma só vez sequer fosse cumprido o artigo 31.º da lei de l de julho de 1867. Se o tivera sido, escusava eu de ter o trabalho paciente, a que fui compellido para chegar aos resultados obtidos, por approximação, e os illustres deputados não tinham o trabalho de contestar os meus calculos. (Apoiados.)
O illustre deputado o sr. Franco Castello Branco, referindo-se aos fundamentos invocados no relatorio do sr. ministro da justiça, disse que duas rasões havia que legitimavam este projecto, o parece-me que sublinhou as seguintes palavras:
«E por outro lado, a mais feliz conjuncção em que actualmente se encontram as finanças do pais, estão indicando a opportunidade do presente momento para preparar a conclusão da grandiosa obra esboçada em 1867.»
Para contradictar esta parte do relatorio do sr. ministro da justiça, invocou-se a opinião, ou antes algumas palavras proferidas, não sei em que occasião, em que discurso, pelo meu amigo o sr. Carlos Lobo d'Avila. Parece que as opiniões d'este distinctissimo parlamentar, dão muito cuidado aos illustres deputados da opposição. (Apoiados.)
Não me farei cargo de confrontar a opinião do meu illustre amigo e collega o sr. Carlos Lobo d'Avila com a opinião do sr. ministro da justiça, porque não me parece que a opinião d'aquelle meu amigo esteja em discussão, nem elle precisa de que eu procure justificar a sua attitude sempre correcta e digna perante o parlamento e perante o seu partido.
O que quero mostrar á camara é que o que se lê no projecto e no relatorio, na parte criticada, exprime uma realidade que todos conhecem, e não haverá declamação nem esforços de rhetorica que possam obscurecel-a.
Não é agora a occasião opportuna para discutir a questão financeira, e para confrontar a gerencia economica e financeira do actual governo com a gerencia dos governos passados. Virá essa discussão a seu tempo, e o governo não se arreceia da lucta, nem dos confrontos. (Apoiados.)
Mas, para responder ao illustre deputado que me precedeu no debate, e que estranhou que o sr. ministro da justiça alludisse á feliz conjuncção em que actualmente se encontram as finanças do paiz, não é preciso ser economista, nem financeiro; mas conhecer a historia dos emprestimos do paiz, e a historia da cotação dos fundos publicos. E não é preciso remontar ás epochas longinquas, em que o partido regenerador só podia alcançar dinheiro com juros exageradissimos; basta ter bem presente o que aconteceu á ultima situação regeneradora que, na maior parte dos casos, só podia obter capitães com juro superior a 9 por cento. (Apoiados.)

O sr. Julio de Vilhena: - O governo contrahe emprestimo?

O Orador: - Eu logo responderei, e especialmente responderei quando se discutir na especialidade o artigo 2.° § à.° do projecto, onde se diz que o encargo annual para a adquisição das cadeias districtaes e adaptação ao regimen penitenciario, não póde exceder a 33:000$000 réis.

O sr. Julio de Vilhena: - Mas o governo contrahe emprestimo?

O Orador: - Não posso dizer a s. exa. se o governo contrahe emprestimo, porque isso depende do contrato, que realisar; póde fazel-o, ou deixar de o fazer, conforme a fórma, epocha e condições do contrato.

O sr. Julio de Vilhena: - Precisa pedir ao parlamento auctorisação. (Apoiados.}
O Orador: - Não comprehendo a insistencia do illustre deputado; o governo, como já disse, póde levantar capitães por emprestimo, ou deixar de o fazer, porque para tanto fica auctorisado, se for approvado o artigo 2.° § 3.° do projecto.

O sr. Julio de Vilhena: - O que pergunto é se o governo contrahe emprestimo para comprar as duas penitenciarias.

O Orador: - Já disse, e repito que não posso dizer ao sr. deputado, se o governo contrahe ou deixa de contrahir emprestimo; isso depende da maneira por que o governo contratar com as juntas geraes, e de condições que só no momento do contrato se podem apreciar. (Apoiados.)
É certo, porém, que, tendo de realisar qualquer operação financeira, nos termos do artigo 2.° § 3.°, ninguem negará que a abundancia dos capitães, e portanto a barateza do juro, não seja uma conjuncção feliz para o emprehendimento a que o projecto em discussão se destina; ninguem negará que seja bem escolhida a opportunidade para preparar a conclusão do pensamento do sabio legislador de 1867. (Apoiados.) E se os illustres deputados querem a contraprova, é ella facil. Se o governo regenerador, na ultima situação, pretendesse comprar as cadeias diatrictaes

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de Coimbra e Santarem, e tivesse para isso de recorrer ao credito, não podia obter dinheiro por juro inferior a 9 por cento, o que quer dizer que teria de despender quasi o dobro, do que agora é preciso gastar. (Apoiados.} E não significa este confronto, que atravessãmos uma feliz conjuncção financeira, no dizer do sr. ministro da justiça? (Apoiados.}
Parecem-me tambem de todo infundadas as criticas acerbas, que os illustres deputados da opposição têem feito a este projecto, attribuindo-lhe o intuito de mutilar o pensamento do legislador de 1867 com a extincção das cadeias districtaes, e por estabelecer, que a prisão correccional será cumprida nas cadeias comarcâs construidas segundo os prescripções da lei de l do julho de 1867, ou adoptadas para esse fim.
Na primeira vez, que fallei, em resposta ao meu presado amigo Azevedo Castello Branco, expuz algumas considerações relativas á prisão correccional, como fazendo parte integrante do regimen penitenciario.
Tambem alludi á interpretação, nem sempre uniforme, que os tribunaes deram á lei de l de julho de 1867. Seria impertinencia reproduzir agora o que então expuz com algum desenvolvimento.
O que é fóra de duvida, é que, segundo o codigo penal que vigora, a prisão correccional não entra no systema penitenciario. Não é licita a menor duvida a tal respeito. A leitura dos artigos 55.º e 57.° do codigo penal convence a todos sem esforço. O nosso systema penitenciario pois só abrange as penas maiores; e sendo assim mal se comprehendem os clamores contra o projecto de lei era discussão, allegando-se que altera o pensamento do legislador de 1867. Se os illustres deputados querem a prisão correccional como elemento do systema penitenciario, e que esta pena seja cumprida com a austeridade das penas maiores, comecem por accusar a ultima reforma penal e a propria lei de l de julho de 1867 Torno a dizer, que não desconheço as tendencias de quasi todas as legislações, para que a pena de prisão correccional entre no regimen propriamente penitenciario; mas então é preciso acceitar os mesmos principios, em que essas legislações se fundam.
Alem do ser obrigatorio o trabalho para as penas correccionaes, elevam se (em algumas legislações) até cinco annos. Para chegar a este resultado entre nós, seria preciso reformar a ultima reforma penal. Elevando-se apenas de prisão correccional, é evidente que teria de alterar-se a classificação dos crimes e das penas maiores. Não póde haver, a este respeito duas opiniões. O projecto em discussão não altera a legislação anterior pelo que respeita á prisão correccional, e o artigo 1.° não é inutil, como disse o sr. deputado Franco Castello Branco, alem de outras rasões já expostas, porque dissipa uma duvida grave, derivada do artigo 64.° § unico do codigo penal.
Parece evidente que este artigo modificou os artigos 33.° e seguintes da lei de l do julho de 1867 pelo que respeita á prisão correccional, O artigo 1.° do projecto restabelece n'esta parte o imperio da lei de l de julho, e os illustres deputados accusam-n'o de attentar contra o pensamento do legislador de 1867, pelo que respeita a regimen do prisão correccional!
É necessario dizer toda a verdade. A pena de prisão correccional sem trabalho obrigatorio e sem um maximo muito superior ao da actual legislação, não exige cadeias com o apparato e com o despendio das cadeias penitenciarias. Para o cumprimento d'estas penas bastam as cadeias comarcas construidas segundo as prescripções da lei de l do julho de 1867.
As cadeias districtaes, n'estas condições, eram um enorme disperdicio. Não ha nada que as justifique.
Póde, pois, a opposição repetir mais uma vez, que ha de revogar todos os codigos feitos durante o governo progressista; póde proclamar que não ficará lei alguma que esta nefasta situação promulgar, mas o que lhe affirmo é que as cadeias districtaes não resuscitam. Estão mortas muito bem mortas. Tomem conta d'esta prophecia. (Apoiados.}
Não me parece que deva dar maior desenvolvimento á minha resposta n'esta parte.
Sr. presidente, os illustres deputados que atacaram o projecto, especialmente o sr. Julio de Vilhena, viram em todos os artigos auctorisações dadas ao governo que são outros tantos attentados contra as prerogativas parlamentares. Parece-me que o illustre deputado caíu em grandes exagerações. Não fallando, por emquanto, da fixação dos quadros e respectivos vencimentos, e a que mais tarde terei de referir-me, parece evidente que as disposições dos artigos 1.° e 2.° e respectivos paragraphos, não encerram auctorisações ou delegações do parlamento, que possam qualificar-se de abdicação parlamentar.
A proposta ministerial, em primeiro logar, declara que é preciso, para completo regimen penitenciario entre nós, elevar o numero de cadeias geraes penitenciarias fixado no artigo 28.° da lei de l de julho de 1867, não podendo exceder a 1:700 o numero de cellas.
O parlamento acceita ou rejeita o pensamento do projecto; julga se é ou não necessario alterar, n'esta parte, a lei de l de julho de 1867. Se approva, ninguem sustentará que vota uma auctorisação; reconhece que as necessidades de repressão criminal fundamentam o pensamento primordial do projecto.
Costumam-se chamar abdicações parlamentares a certas auctorisações e delegações no poder executivo attinentes á organisação de serviços, o assumptos análogos, que o parlamento póde e deve fazer de preferencia por si directamente. Comprehendia, por exemplo, que se chamasse abdicação parlamentar a auctorisação incondicional para remodelar as circumscripções, administrativas ou judiciaes e outras analogas; mas elevar a tal categoria o reconhecimento da necessidade de crear mais cadeias penitenciarias, alem do numero fixado no artigo 28 ° da lei de 1867, parece-me verdadeiro exagero. E devo dizer ao illustre deputado, que nunca se procedeu de outro modo; apresento-lhe o bom modelo da lei de l de julho de 1867, artigo 28.° (Apoiados.)
O mesmo digo da auctorisação a que só refere o artigo 2.° § 3.° do projecto.
Como já tive a honra de expor á camara, o governo não dissimula, que o seu intuito é adquirir as cadeias districtaes de Santarem e Coimbra, e adaptal-as inteiramente ao regimen penitenciario. A nossa legislação criminal presuppõe o complemento do pensamento de legislador de 1867, quanto ao regimen penitenciario.
Não ha que duvidal-o. O numero do cadeias geraes penitenciarias, segundo o artigo 28.º d'aquella lei é insufficiente.
Tambem já está demonstrado, e seria impertinente reproduzir a demonstração. Tendo as juntas geraes de Coimbra e Santarem construido as cadeias, de que se trata, de modo a poderem se adaptar ao regimen penitenciario, e estando essa construcção quasi completa, o governo adquirindo-as e adaptando-as aos fins da lei de 1867, presta um relevante serviço ao paiz. (Apoiados.)
E não se diga que o governo estando auctorisado pela lei de 1867 a construir tres cadeias geraes penitenciarias, o estando só construida a de Lisboa, só depois de construidas as cadeias que faltam, é que podia pedir que se elevasse o numero de penitenciarias, caso as necessidades do repressão criminal o exigissem.
Este argumento é especioso e não attenta na realidade das cousas.
Se o governo não podesse adquirir de prompto as cadeias districtaes do Coimbra e Santarem e do prompto adaptal-as ao regimen penitenciario, confesso que a impugnação teria bastante plausibilidade.
O estado da questão, porém é outro. Ninguem duvida

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APPENDICE Á SESSÃO DE 17 DE MARÇO DE 1888 824-C

que as delongas, e incidentes de construcções d'esta natureza, são enormes.
A escolha do local, os trabalhos preparatorios e por ultimo a construcção, tudo isto importa demoras taes, que só passados alguns annos podiamos ter mais uma ou duas penitenciarias para n'ellas cumprirem as penas os delinquentes sujeitos a este regimen. (Apoiados.)
E não se argumente, que a condemnação em penas alternativas, satisfaz a este regimen de transição.
A condemnação em alternativa é uma ficção, a que foi preciso recorrer, prevendo a falta de cadeias penitenciarias.
É, porém, verdadeiramente iniquo que o mesmo crime tenha penas, que se equivalem nos effeitos legaes, mas que presuppõem dois systemas de cumprimento de penas diametralmente oppostas. (Apoiados.)
Cumpre não esquecer que o pensamento do projecto, elevando de tres a cinco o numero das cadeias geraes penitenciarias, nunca póde augmentar as despezas, quando a necessidade da repressão criminal o não exigirem de um modo imperioso e inadiavel. E a rasão é clara e peremptoria: o governo não póde construir cadeia alguma penitenciaria, sem que o parlamento auctorise a indispensavel despeza,- e para isso o poder executivo, ou ha de soccorrer-se ao disposto no artigo 31.° da lei de l de julho de 1867, ou terá de submetter ao parlamento alguma proposta de lei n'este sentido.
É, pois, evidente, que o reconhecimento de elevar o numero de cadeias geraes penitenciarias, não importa o reconhecimento do arbitrio do poder executivo para gastar os rendimentos do estado sem intervenção do parlamento. (Apoiados.)
Devo declarar que a limitação do artigo 2.°, § 3.°, quanto aos encargos a annaes com a acquisição das cadeias districtaes e sua adaptação ao regimen penitenciario, foi dictada pelo respeito ás prerogativas parlamentares.
O governo, na proposta primitiva, nada dizia a este respeito. Se a proposta ministerial, tal qual apresentou o illustrado ministro, fosse convertida em lei, o governo só podia obter meios para acquisição de cadeias, ou construcção d'ellas, segundo os tramites marcados na lei de l de julho de 1867, e essa lei só põe por limite ao arbitrio ministerial as circumstancias do thesouro.
Pareceu á commissão de fazenda e de legislação criminal que era preferivel marcar o limite d'essa despeza, obrigando o governo a dar conta ás côrtes do uso que fizer d'esta auctorisação.
De modo que esta disposição do § 3.° tão atacada, encerra uma verdadeira limitação ao arbitrio do governo, e uma verdadeira homenagem ao parlamento, porque é elle quem fixa o limite maximo da despeza, e ao mesmo tempo ordena que o governo dê conta ás côrtes do uso que fizer d'esta auctorisação. Eu já disse que era este o pensamento do § 3.°, mas não tenho duvida em que elle se redija mais claramente, se é necessario.

O sr. Franco Castello Branco:-Não é novidade para aqui. Todas as auctorisações estão n'este caso.

O Orador: - Eu estou demonstrando a v. exa. e á camara que esta auctorisação não é d'aquellas que se possa impugnar com o fundamento de que a camara abdica da sua prerogativa parlamentar. Foi essa ordem de idéas que eu vi apresentada pelo sr. Julio de Vilhena, e é n'esta ordem de idéas que eu estou respondendo. (Apoiados.)

O sr. Franco Castello Branco:-É phrase sacramental.

O Orador: - Não sei se é phrase sacramental. Se este preceito da lei não vale perante o parlamento, e elle não tem força para o tornar effectivo, não sei quaes são as formulas protectoras que salvam as prerogativas parlamentares. (Apoiados.)

O sr. Arroyo: - V. exa. não repara que todos os de acabam com essa phrase sacramental, que o governo dará conta ás côrtes, e deixa por isso de ser dictadura?

O Orador: - Não quero agora distrahir-me do assumpto, nem discutir se tem havido muitas ou poucas, boas ou más dictaduras.
O assumpto tem sido discutido, e essas responsabilidades liquidadas.
Se porventura ha muitas dictaduras e ellas se reiteram, a culpa não é das dictaduras; é dos parlamentos e do paiz. (Apoiados.)

O sr. Franco Castello Branco: - É dos parlamentos em votarem estas auctorisações. (Apoiados.)

O Orador: - Esta é d'aquellas auctorisações que o parlamento não póde deixar de dar, logo que reconheça a urgencia do melhoramento.
Não ha outro meio de realisar um melhoramento d'esta ordem, reconhecido urgente, e imposto por uma imperiosa conveniencia publica, senão pela fórma prevista n'este projecto.
Já disse, que assim procedeu o legislador de 1867. (Apoiados.)

O sr. Franco Castello Branco: - Desejava unica e simplesmente que s. exa. antes de acabar o seu discurso lesse á camara o § 14.° do artigo 15.° da carta, para vermos se esta é das auctorisações que o parlamento não póde negar.

O Orador: - Não percebi a leitura do artigo, a que se refere o illustre deputado, mas isso não altera em cousa alguma a ordem da minha argumentação.
Se se trata da fixação do quadro e vencimentos dos empregados, isso será largamente respondido, quando se discutir o artigo 3.° do projecto, e sobre este assumpto alguma cousa espero dizer ainda hoje.
Não me parece que seja procedente a argumentação do illustre deputado sr. Franco Castello Branco, dizendo que este projecto se devia reduzir a um só artigo: «fica o governo auctorisado a comprar as cadeias districtaes de Coimbra e Santarem.»
Já demonstrei que o projecto tem mais largo alcance, e não podia, mesmo no ponto restricto da questão, dar-se-lhe a redacção indicada.
O governo póde comprar, ou deixar de comprar, como já se disse, esta, ou aquella cadeia districtal: como não ha contrato definido, não podia o § 3.° ter uma redacção no sentido criticado.
A auctorisação é mais ampla. O governo fica auctorisado a adquirir qualquer edifício (não este, nem aquelle), que for construido para prisão nos termos da lei de l de julho de 1867, e que se possa adaptar ao regimen penitenciario. (Apoiados.)

Uma voz: - Onde estão elles?

O Orador: - Não me preoccupa isso: é uma questão de administração, que o governo não carece communicar ao parlamento, (Apoiados.)
Mas, repito, o governo não dissimula que o seu intento é adquirir as cadeias de Coimbra e Santaréem, o que aliás póde deixar de fazer, quanto a ambas, ou quanto a uma d´ellas, segundo acceitar, ou não as condições, que se lhe imponham.
Outro ponto, e este é o mais grave, de que se occupou o sr. Julio de Vilhena, refere-se ao artigo 3.°, que trata do pessoal das penitenciarias.
Segundo a ordem das idéas que expuz á camara e segundo os principies que professo, parece-me que sobre este assumpto é que a discussão póde propriamente recair sob o ponto de vista das chamadas abdicações parlamentares.
Tão despreoccupadamente discuto este projecto pelo que respeita ás conveniencias partidarias, que não tenho duvida em confessar, que a impugnação do projecto n'esta parte póde motivar serias objecções e reparos, e por isso me cumpre explicar, quanto possivel, o pensamento do projecto, e desde já declaro que acceito, ou directamente

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proporei quaesquer emendas ou additamentos, que tirem todas as duvidas, e que traduzam os intentos do governo, que não foram, nem podiam ser, attentar contra as prerogativas do parlamento. (Apoiados)
Sendo necessario installar a cadeia penitenciaria de Lisboa, é claro que não podia fazer-se sem fixar o quadro do seu pessoal e respectivos vencimentos; e entendeu se, o muito bem, que isso só podia e devia fazer-se por meio de uma lei. Desde o momento, porém, que temos a lei do 29 de maio de 1884, pareceu ao governo e á commissão, que não se carecia de lei especial, bastando que se impozesse ao governo a obrigação de seguir o modelo da lei de 1884. (Apoiados.)
O governo, pois, fica sem arbitrio, porque tem de restringir se em tudo aos preceitos da lei de l884, e se não os respeitar, o parlamento lhe tomará restrictas contas. (Apoiados.) E não pareçam estas minhas affirmativas estranhas, como observo pela altitude dos illustres deputados. Tendo de installar-se uma nova penitenciaria, é evidente que eito identicos os serviços, é evidente que deve ser identico o pessoal, e que devem ser identicos os vencimentos, quando a nova penitenciaria tiver o mesmo numero de cellas. (Apoiados.)
E ou só ha de pedir a reforma dos quadros e vencimentos da lei de 1884, ou se ha de concluir que ahi está o verdadeiro modelo para organisar serviços da mesma natureza. (Apoiados.)
Podendo, porém, acontecer que a nova penitenciaria não tenha o mesmo numero de cellas, e que pela situação e local d'ella, os vencimentos devam ser inferiores, d'ahi vem que o governo deverá manter, quanto possivel, uma verdadeira proporção entre o pessoal e vencimentos da penitenciaria de Lisboa e qualquer outra que se estabelecer. (Apoiados.)
Não se presta o artigo ás subtilezas academicas e graciosas, de que a palavra «proporção» queira significar um «terço de um director» ou um aquario de capellão», como tão espirituosamente aqui se tem dito.
O pensamento do artigo é manifesto. (Apoiados.) Não ha, pois, por este artigo, a abdicação parlamentar que tanto irrita os illustres deputados.

O arbitrio ministerial não existe, porque o parlamento indica as cautelas a seguir, e define os preceitos que cumpre observar na fixação do quadro e respectivos vencimentos. (Apoiados.)
Não póde o poder legislativo, pois, suppor que o poder executivo abusa ou viola a lei; esta supposição é contraria aos bons principios, porque a presumpção é que o parlamento faz leis sabias e justas, e que o poder executivo as respeita, cumpre e faz cumprir honrada e lealmente. (Apoiados.)
Repito: interpertado lealmente o pensamento do artigo 3.°, e lealmente executado, tanto importa fixar o quadro por lei especial, como preceituar que elle se modele pelos preceitos da lei de 29 do maio de 1884. (Apoiados.)
Começando por dizer, ao discutir este artigo, que os reparos dos illustres deputados que o impugnaram, mereciam larga resposta, a qual fica dada, não tenho duvida em declarar, de accordo com o governo, que acceito emendas ou additamentos a este artigo, que desvaneçam todas as duvidas, que afastem todas as suspeitas, ficando bem patente que o governo respeita n'esta parte, como em tudo, as prerogativas parlamentares. (Apoiados.)
O sr. deputado Castello Branco terminou o seu discurso referindo-se ás incompatibilidades parlamentares.
A camara comprehende que sendo esse assumpto completamente alheio ao projecto que se discute, eu não devo entrar n'elle, nem demorar-me com quaesquer considerações a este respeito.
Já disse n'outra occasião que a questão do incompatibilidades parlamentares é assumpto momentoso; creio que alguma cousa se deve fazer, porque estou longe de affirmar que as nossas leis não carecem de alguma reforma.
Sendo de esperar que venha ao debate parlamentar algum projecto de lei n'este sentido, teremos todos então ensejo de affirmar e definir as nossas responsabilidades individuaes e parlamentares.
Por este motivo, abstenho me de responder n'esta parte ao discurso do sr. Franco Castello Branco.
Referiu-se o sr. deputado Castello Branco á possibilidade das cadeias districtaes de Coimbra e Santarem serem compradas pelo governo, e portanto ter do figurar n'essa compra o banco hypothecario, ou a companhia geral do credito predial portuguez, e assim envolvidas n'esta compra as pessoas que dirigem e superintendem n'aquelle estabelecimento de credito hypothecario.
Não procedem as allegações do illustre deputado; e, primeiro que tudo, preciso explicar o equivoco, a que se presta a redacção da acta do conselho penitenciario nas palavras: com relação á penitenciaria de Santarem, conta poder contratar nas mesmas, senão nas melhores condições.
Tendo a junta geral de Coimbra declarado, que uma das condições seria a transferencia para o estado dos encargos dos emprestimos levantados pelo districto com a mesma applicação, podia inferir-se que o governo tinha acceitado esta condição, e que ella seria igualmente acceita quanto á junta geral de Santarem.
O sr. ministro da justiça já explicou, que não podia ser essa a interpretação, e eu declaro, de um modo positivo, que nunca foram esses, e não podiam ser, os intuitos do governo.
A junta geral de Coimbra apresentou as bases da sua proposta; o governo não acceitou, nem repudiou nenhumas, porque ainda não resolveu cousa alguma definitivamente. (Apoiados.)
As bases propostas, parecem-lhe acceitaveis, como principio de negociação, e nada mais. Mas declaro que o governo não acceita, e nem podia acceitar, a clausula, ou condição do passarem para o estado os encargos dos emprestimos levantados pelos districtos respectivos. E não póde acceitar essa condição, porque é contra lei expressa e indole das operações, que realisa a companhia geral do credito predial portuguez. (Apoiados.)
A lei e estatutos d'aquella companhia, prohibem-lhe quaesquer contratos com o governo, e portanto é evidente que este nada tem e nada póde ter, com quaesquer contratos que se realisem entre as juntas geraes e a companhia. (Apoiados.)
A situação juridica da companhia geral do credito predial é sempre a mesma. Para ella é completamente indiferente, que as juntas geraes façam quaesquer contratos com o governo, porque em nada diminue, ou fortalece os seus contratos, garantidos na lei.
É completamente inexacto, que a companhia geral de credito predial tinha melhor garantidos os seus direitos, porque, como já disse, esses emprestimos estão garantidos por lei, e os encargos d'elles entram como despezas obrigatorias para o districto. Por outro lado, cumpre não esquecer, que ainda nenhuma camara municipal o junta geral deixou de cumprir religiosamente os seus compromissos, o que quer dizer, que a companhia geral de credito predial não tem motivo nem para se alegrar, nem para se entristecer com quaesquer contratos, que estas corporações façam, e que as habilitem a pagar, por antecipação, os emprestimos contrahidos. Isso é completamente indifferente pelo lado da segurança dos seus contratos. (Apoiados.) Quem conhece a indole d'aquelle estabelecimento não ignora que elle é prejudicado todas as vezes, que se paga por antecipação qualquer emprestimo, porque deixa de receber a commissão, unico lucro dos emprestimos.
O que, porém, é categorico e decisivo é que a companhia não póde contratar senão com as juntas geraes, camaras municipaes e particulares, e nunca com o governo. Essa situação legal é a mesma, ainda que este projecto

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APPENDICE Á SESSÃO DE 17 DE MARÇO DE 1888 824-E

seja lei do paiz, e portanto julgo desnecessario insistir n'este assumpto. (Apoiados.}
Sr. presidente, este projecto, ao que parece, terá ainda larga discussão na especialidade, e por isso não me parece que deva dar maior desenvolvimento á minha resposta aos oradores que me precederam no debate. Termino dizendo, e repetindo, que podem os illustres deputados da opposição insistir no propósito do tornar esta discussão politica e partidaria, que isso não nos demove de aproveitar da discussão tudo o que podér tornar o projecto mais perfeito, o pensamento n'elle contido mais claro e definido, sob todos os pontos de vista, que elle comprehende, repressivo, economico e administrativo.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem.
(O orador foi comprimentado.)

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