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DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

rios casos que podem occorrer, e nos quaes se dá verdadeiro empate.

Todas as vezes que a assembléa se compuzer de um numero de membros par, não ha evidentemente solução, sempre que este numero par se divida em duas partes iguaes, metade approvando, o metade rejeitando, a lista proposta pelo presidente.

Supponhamos que são quarenta os membros presentes; vinte approvam e vinte rejeitam; o presidente não póde votar. Por consequencia, não existo meio de se decidir a questão; é um caso omisso; ha um verdadeiro empate, mas de natureza differente do que se considerou já. E n'esta hypothese não se encontra solução alguma. A eleição não póde fazer-se.

Agora, pois, que se trata de reformar a lei eleitoral, eu creio que a illustre commissão deve attender a estas considerações, que eu faço apenas para que este trabalho fique o mais perfeito possivel.

Mas ha outro ponto importantissimo para o qual chamo a attenção dos meus illustrados collegas. É o § 2.° do artigo que diz:

«§ 2.° Se a proposta do presidente da camara for rejeitada pela maioria dos membros presentes, mandal-os-ha elle dividir em direita e esquerda, a fim de que os da direita, combinando-se entre si, escolham pelo methodo, indicado no § antecedente, tres cidadãos, que estejam recenseados para os cargos municipaes, e os da esquerda, combinando-se tambem, escolherão outros tres, que estejam no mesmo caso.»

Ora a doutrina d'este paragrapho dá logar a factos muito curiosos, e absolutamente contrarios ao fim, que o legislador teve em vista.

E é por isso que eu, embora respeite muito o principio da representação das minorias, e deseje que sejam representadas todas as opiniões, desconfio sempre do systema com que se pretende fazer essa representação, quando o não vejo sanccionado pela experiencia.

Este methodo, com que se quer fazer representar as minorias, dá os seguintes resultados:

Todas as vezes que a maioria da assembléa dos quarenta maiores contribuintes for superior em mais de uma unidade A minoria, e se estiver alem d'isso combinada com o presidente, isto é, se este for da politica da maioria, esta elege toda a commissão do recenseamento. (Apoiados.)

Esta descoberta não é minha: foi feita pelos nossos concidadãos da India, e creio que já em alguns districtos do continente foi tambem praticada.

Eu trago aqui os numeros relativos a diversos casos, para se poder apreciar bem, como se procede contra o espirito da lei; mas basta referir uma hypothese.

Supponhâmos que a assembléa é composta de 40 membros: a quarta parte são 10. Como é preciso que haja mais do que a quarta parte para que a minoria possa ter representação, imaginemos que ha uma minoria de 11 votos. 40 menos 11 são 29. Os 11 rejeitam a lista proposta pelo presidente, que é de politica opposta á d'elles. Dos 29 rejeitam 12 e approvam 17.

Uma voz: Não póde ser.

O Orador: — Eu tenho aqui o calculo feito, e não tenho só este, mas cento e quarenta e cinco hypotheses differentes.

Vou ler ao illustre deputado os numeros d’este primeiro calculo.

(O orador lendo):

Aqui está! Rejeita a minoria composta de 11. Da maioria tambem rejeitam 12 e approvam 17. Como ao todo rejeitam 23 e approvam só 17, fica rejeitada por maioria a lista do presidente. Então este manda dividir a assembléa em direita e esquerda, passando para aquelle lado os 23 que rejeitaram, e para este os 17 que approvaram.

Mas os 17 que têem de eleger 3 membros, e são da politica do presidente, escolhem logo os seus tres representantes.

Os outros vinte e tres não se combinam, porque são de politica differente: 11 da verdadeira minoria, e 12 da maioria, que rejeitaram de proposito.

Ha portanto escrutinio secreto, e como ahi basta a maioria relativa, os 12 vencem o 11 da minoria, e ficam tambem eleitos representantes da maioria. Este mesmo lado mais numeroso, composto de 23, ou antes os 12 que supplantam os 11, elegem tambem o presidente, na conformidade da doutrina do § 3.° do mesmo artigo.

Saem, pois, eleitos todos os vogaes da commissão da mesma politica, e assim se contraria o principio da representação das minorias. É por isso que eu tenho sempre muito receio da sophismação que se póde fazer a estes systemas aliás justos em theoria. E agora, visto que se mantem o principio da representação das minorias, entendo que se deve manter com toda a lealdade, e por isso desejo que se destrua completamente o sophisma apontado, e como disse, praticado já em uma das nossas provincias ultramarinas, e creio que n'alguns districtos do continente.

Sr. presidente, se o artigo 24.° do decreto eleitoral, de 30 de setembro de 1852, não tivesse os grandes defeitos, que eu acabo de apontar á camara, talvez não valesse a pena alterar a constituição das assembléas dos 40 maiores contribuintes, e não houvesse grande inconveniente em deixar n'ellas representado apenas o elemento da riqueza, que existe em todos os partidos; mas depois das ponderações feitas, e dos exemplos apresentados, similhante organisação não póde subsistir, e parece-me que a illustrada commissão não terá o capricho de sustentar o artigo 24.° Mas se ha de ser alterado, para que se garanta lealmente a representação das minorias, então parece-me conveniente que se harmonise a constituição d'estas assembléas com o projecto, que está em discussão, por fórma que entrem n'ellas os dois elementos, a que a illustre commissão deu justamente toda a importancia: o elemento do interesse material, que já lá está representado, e o elemento do interesse moral, as maiores habilitações litterarias e scientificas, que é indispensavel ahi introduzir.

Uma voz: — Alguem ha de eleger.

O sr. Marçal Pacheco: — As camaras municipaes.

O Orador: — Deus nos livre d'isso! Aqui, ainda estão representados todos os partidos; mas nas camaras municipaes, muitas vezes não. (Apoiados.)

Repito, por tanto. Desde que se tem de alterar a constituição da assembléa dos 40 maiores contribuintes, entendo que ha dois principios sobre os quaes se deve basear a sua constituição: um, indicado pelo maior censo, e que representa os mais elevados interesses sociaes; outro, que representa os mais elevados interesses moraes, indicado pelas maiores habilitações scientificas e litterarias. Com estes dois elementos é facil constituir as assembléas, que hão de eleger as commissões de recenseamento.

Uma voz: — Na pratica é difficil.

O Orador: — Na pratica não apresenta inconveniente nenhum.

Onde podia haver alguma difficuldade, era em Lisboa, Porto ou Coimbra, em consequencia do grande numero de pessoas com habilitações superiores.

Eu não sou suspeito; por que sempre forcejei por prestar homenagem ao verdadeiro merecimento, mas entendo que em igualdade de circumstancias devem preferir os mais antigos ou os mais velhos. Quando, pois, houvesse mais de vinte individuos, que tivessem em regra igualdade de habilitações litterarias e scientificas, escolhiam-se pela ordem indicada. Nas outras terras, infelizmente, não ha perigo de grande concorrencia de nomes, para organisar as commissões de recenseamento.

Termino aqui as minhas considerações feitas com a mais benevola intenção. Não quero dar a estas poucas reflexões a proporção de um discurso. O meu desejo é sómente concorrer com as minhas pequenas forças, para que se tirem alguns defeitos, que existem, na legislação eleitoral.