SESSÃO N.° 48 DE 20 DE MARÇO DE 1896 747
parte em que ella fixava o limite maximo do praso das prestações, o que a final seria so favoravel para os empregados que recebem dinheiro, mas não para os condemnados que o pagam, peço a v. exa. que consulte a camara, se me permitte retirar a minha proposta.
Foi retirada a proposta e approvado o artigo 10.°
Lê-se o
Artigo 11.° Serão isentos do referido pagamento os réus que provarem a sua indigencia por attestados dos parochos e regedores das freguezias do seu domicilio, jurados e devidamente reconhecidos.
§ unico. A prova da indigencia poderá ser feita no acto do julgamento, ou até terminar o decendio posterior a citação na respectiva execução, que n'este caso se julgara extincta.
O sr. Presidente: - Está em discussão.
O sr. Carlos Braga: - Pedi a palavra, porque em verdade não concordo com esse termo "indigencia" que se lê no artigo 11.° do projecto.
V. exa., sr. presidente, sabe que a lei esta sujeita a muitas interpretações, e que ha magistrados que têem entendido por esta palavra "indigencia" o estado de um individuo absolutamente reduzido a ultima miséria. Só os que se encontram n'estas condições é que esses juizes julgam isentos da obrigação de effectuar o pagamento das custas.
Ora, francamente, parece-me que não póde ser este, o pensamento, nem do auctor do decreto, sobre o qual assenta o presente projecto, nem o pensamento da camara que o esta discutindo n'este momento. (Apoiados.)
Parece-me que a camara quererá significar que está isento do pagamento das custas quem pelo seu estado de reconhecida pobreza não as poder pagar; deixando-se, porém, esta palavra no projecto, da origem a que se levantem difficuldades e duvidas nos tribunaes, e que os advogados estejam sempre a laborar n'um turbilhão de receios, quando se lhes apresente um constituinte que apesar de pobre e de não ter meios com que effectue o pagamento das custas, não seja absolutamente indigente.
N'estas condições creio que o sr. relator não terá duvida em concordar na substituição da palavra "indigencia" pela palavra "pobreza"; e concordando s. exa. n'esta substituição, a mim parece-me que não fará mais do que cortar duvidas que no futuro podem surgir, dando ao mesmo tempo mais uma prova de que o seu desejo é acceitar as emendas que tendam a esclarecer o pensamento do projecto e concordando com esta substituição parece-me que resulta vantagem incontestavel para o processo criminal.
O sr. Cabral Moncada (relator): - Não lhe parece necessaria a proposta do sr. Carlos Braga; entretanto, como, a meu ver, as palavras "indigencia" e "pobreza" têem significação perfeitamente igual, não tem duvida em acceitar a substituição.
(O discurso será publicado na integra, e em appendice a esta sessão, quando o orador restituir as notas tachygraphicas.)
O sr. Amadeu Pinto: - Eu dou-me em parte por satisfeito com a declaração do sr. relator, que constituo uma interpretação authentica a esta lei, declarando que são indigentes os individuos que não têem meios nenhuns de fortuna; mas eu tenho ainda outras considerações a fazer sobre este artigo, considerações que me são suggeridas pela deficiencia de provas que n'elle se estabelecem para o accusado ou condemnado poder provar a sua indigencia ou pobreza.
Diz o artigo: "Serão isentos do referido pagamento os réus que provarem a sua indigencia por attestados dos parochos e regedores das freguezias do seu domicilio, jurados e devidamente reconhecidos".
Eu proponho a substituição d'estas palavras pelas seguintes: "Serão isentos do referido pagamento os réus que provarem por attestados dos parochos e regedores das freguezias do seu domicilio ou residencia habitual jurados ou devidamente reconhecidos, ou por meio de testemunhas até ao numero de cinco, que não têem pelos seus bens e pelos lucros da sua profissão possibilidade de pagar aquellas custas e sellos".
O paragrapho, como no projecto.
Fica assim definido o que seja "pobreza" ou "indigencia" para os effeitos d'este artigo e ampliam-se os meios de prova concedidos aos accusados ou condemnados para a justificarem.
Disse o sr. Moncada, e eu concordo, que é difficil definir o que é indigencia ou pobreza, mas por esta minha proposta parece-me que fica perfeitamente definida, dizendo-se que é a impossibilidade de pagar as custas e sellos quer pelos bens que cada um tenha, mobiliarios ou immobiliarios, quer pelos lucros da sua profissão.
Concederem-se como unico meio de prova da pobreza dos réus os attestados do parocho e do regedor, parece-mo pouco, e pouquissimo, se esse regedor e parocho tiverem de ser os do domicilio do réu, em qualquer caso. Póde muitas vezes succeder que o individuo condemnado tenha domicilio n'um logar onde não seja conhecido onde nunca tenha estado até, e resida habitualmente noutro. Um menor, por exemplo. O logar da residencia habitual nem sempre é o do domicilio.
Póde tambem succeder que o réu seja das ilhas, das provincias ultramarinas, ou estrangeiro.
Como arranjar o attestado n'este caso?
Pôde ainda succeder que o condemnado tenha domicilio numa freguezia ha muitissimo pouco tempo, e todavia desde que o parocho e regedor não attestem a sua pobreza - e não podem fazel-o porque não o conhecem - este fica obrigado ao pagamento das custas, e se não arranja com que as pague tem de ir para a cadeia. No projecto não se previne nenhuma d'estas hypotheses.
Parece-me, portanto, injusto restringir a prova da indigencia ou da pobreza aos attestados do parocho e do regedor da freguezia do domicilio do réu, devendo dar-se ainda a este a faculdade de fazer provar a impossibilidade de pagar as custas e sellos não só por attestados do parocho e do regedor da freguezia da sua residencia habitual, mas tambem por testemunhas. Se a prova testemunhal é admittida em tantos casos, não sei a rasão por que não se ha de admittir n'este, tanto mais que o attestado póde deixar de ser dado por má vontade do parocho ou do regedor, e contra essa má vontade é que não fica recurso nenhum.
Não digo já nas grandes cidades, onde o maior perigo de uma recusa injusta de attestado esta na possibilidade de ignorancia d'aquelles funccionarios ácerca dos meios de fortuna dos réus; mas nas aldeias, onde as luctas politicas revestem um caracter inteiramente pessoal, de que resultam inimisades que não perdem occasião de se manifestar; mas nas pequenas terras, onde falta de illustração torna frequentes as vinganças mesquinhas, deixar exclusivamente nas mãos do parocho e de um funccionario politico a prisão por custas, é um perigo tanto maior quanta aquelles que a elle ficam sujeitos são pobres e não se podem defender.
E depois, e em geral, coarctar os meios de defeza aos réus nunca me parece justo. Por isso envio para a mesa a substituição que proponho ao artigo.
Leu-se na mesa, foi admittida e ficou em discussão conjunctamente com o artigo.
O sr. Cabral Moncada (relator): - Mal comprehende que o individuo que não póde provar a sua pobreza por meio de um attestado do regedor ou do parocho, possa estar ainda a requerer justificação judicial.