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APPENDICE A SESSÃO N.° 48 DE 20 DE MARÇO PE 1896 748-A

Discurso do sr. deputado Dias Ferreira que devia ler-se a pag. 748 da sessão de 20 de março

O sr. Dias Ferreira: - O artigo 13.° do projecto da illustre commissão de legislação, que esta sujeito ao exame da camara, representa, na sua essencia, nas suas linhas geraes, e nos seus intuitos fundamentaes, nada mais e nada menos do que a obrigação para o condemnado, a quem não forem encontrados bens sufficientes para pagar as custas, de pagal-as com o corpo na cadeia.

É ao que se reduz toda a economia do projecto. O seu objectivo e o seu fim é destruir uma garantia liberal que estava reconhecida expressamente no decreto de 15 de setembro de 1892, e que já antes disso poderia considerar-se fundada no codigo do processo civil.

Ha mais de um século que fóra abolida entre nós a prisão por dividas, que alias ainda subsiste nas leis de povos bem adiantados na carreira da civilisação Nenhum povo nos precedeu a nós no amor a liberdade.

Quem quizer encontrar verdadeiros monumentos de disposições liberaes, póde percorrer a nossa legislação, tanto nova como velha.

Ainda no regimen absoluto, em que as instituições politicas pendiam para o despotismo, havia capitulos de direito particular eminentemente liberaes.

Bem discutido foi em 1865 o novo regimen do casamento civil, quando na nossa legislação velha tinhamos já disposições bem mais avançadas sobre este contrato fundamental da sociedade civil.

Levantava-se em 1865 fortissima opposição ao preceito liberal do ensamento civil, quando havia tres seculos estava escripto nas nossas leis que a convivencia de homem e de mulher durante certo tempo em casa tenda e manteuda, e em publica voz e fama de marido e mulher, era o bastante para a communhão dos bens e para a legitimidade da prole.

Considero muito a legislação dos paizes estrangeiros. Mas em nenhuma encontro exemplos mais frisantes de instituições liberaes de que em Portugal, tanto no novo como no antigo regimen.

Em materia de leis prefiro aos monumentos estrangeiros os monumentos nacionaes, quando houver de invocar auctoridades, posto que eu prefira a auctoridade das rasões ás rasões da auctoridade.

Dos treze artigos em que se divide o projecto, só um o define e o caracterisa, que é o da remissão das custas com o corpo na cadeia.

Os outros verdadeiramente, ou estavam na legislação anterior, ou nos principios de direito; e, se algum artigo foi introduzido de novo, e em contrario do disposto no decreto de 15 de setembro de 1892, significa, ou uma inutilidade, ou offensa aberta ás liberdades individuaes dos cidadãos.

Para que era necessario, por exemplo, consignar no projecto que ao juiz de direito compete julgar subsistente o corpo do delicto?

Pois será possivel entrar na cabeça de alguém, com a mais elementar noção da nossa jurisprudencia, que o juiz de paz tenha competencia e jurisdicção para declarar subsistente o corpo de delicto?

Auctorisa tambem o projecto o julgamento dos crimes de policia correccional em ferias.

Mas esse preceito estava já no decreto de 15 de setembro de 1892. Usa este decreto da linguagem "processo correccional" como usam ahi todos os dias as decisões judiciaes; mas evidentemente se refere aos processos de policia correccional, porque o declara no relatorio, e porque ao processo correccional; muito conhecido pelo processo de galão branco, declara o decreto de 15 de setembro de 1892 applicavel, depois da pronuncia, as deposições anteriores do decreto n.° 2 de 29 de março de 1890.

Tambem não está; nem podia estar no decreto de 15 do setembro, que, esgotada a inquirição das vinte testemunhas do corpo de delicto sem se ter apurado qual era o delinquente, a justiça ficasse privada de o perseguir, quando fosse descoberto.

Não permittem as nossas leis a repetição da querela contra a mesma pessoa pelo mesmo crime. Mas não obstam a que por qualquer crime se querele contra quem por elle nunca foi determinadamente querelado.

Em todo o caso o decreto de 15 do setembro de 1892 não representa uma reforma larga no processo criminal.

Nós limitamo-nos a introduzir disposições indispensaveis para reduzir as despezas dos serviços publicos, e consignamos ao mesmo tempo importantes garantias liberaes, que davam tambem diminuição de encargos.

Encontrámos seis juizes do crime em Lisboa, e julgamos que bem podiam supprimir-se dois logares, comtanto que fossem simplificados os serviços.

N'esta ordem de idéas acabamos com os summarios, porque todos os que conhecem praticamente o processo criminal sabem que a maior parte das vezes o summario se limitava a reproduzir os depoimentos das testemunhas já inquiridas no corpo de delicto.

A legislação anterior não se contentava com a petição de querela. Exigia ainda que esta fosse reduzida a auto!

Com os summarios, havendo testemunhas fóra da comarca, tornavam-se indispensaveis, pelo menos, duas deprecadas no processo preparatorio, uma para a inquirição das testemunhas no corpo de delicto, e outra para a inquirição das testemunhas no summario, o que originava ás vezes grandes demoras, e sempre complicações para o serviço judicial.

Ora no corpo de delicto indirecto raro é o caso de não se descobrir o delinquente, como se descobre no summario.

Não significam as minhas observações reparo de especie alguma a alteração da providencia da minha responsabilidade. Pelo contrario, associo-me a todas as alterações e additamentos convenientes a administração da justiça; e tanto que se não estivesse já votado o artigo 5.° do projecto, quando entrei na sala, teria sido eu o primeiro a propor um melhoramento necessario na nossa legislação criminal, de que não cogitou o decreto de 15 de setembro, e de que não se occupa o projecto em discussão.

Quando o réu estiver envolvido em crimes a que correspondam processos diversos, diz o artigo que deve adoptar-se o processo competente para o crime mais grave. Não era, porém, esse ponto que precisava de resolução. Esse ponto estava resolvido na lei e na jurisprudencia.

Não era a questão do processo, mas a questão da competencia que precisava da intervenção do legislador. O que se tornava indispensavel determinar era quem seria o julgador, sendo o mesmo réu accusado de varios crimes, uns dos quaes fossem da exclusiva competencia do juiz e outros carecessem da intervenção do jury.

Por exemplo, é tabellião arguido de receber salarios indevidos, crime da competencia exclusiva do juiz do direito, que é ao mesmo tempo arrastado ao tribunal por crime de furto ou de offensas corporaes, em que tem de intervir o jury, por quem ha de ser julgado?

Ha de ser julgado num dos crimes só pelo juiz que conhece de facto e de direito, e no outro pelo jury em

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