858 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS
Pois nós havemos de prescindir do rendimento da penitenciaria?
Mas quem é que diz que prescinde d'esse rendimento?
Porque é que s. exa. não disse, quando eu ha pouco lhe perguntei, qual era o encargo do pessoal e despezas accessorias?
S. exa. não respondeu cousa nenhuma. Pois eu lhe vou dizer qual é o encargo que resulta para o estado, alem dos 33:000$000 réis necessarios para a acquisição dos edificios.
O pessoal da cadeia penitenciaria de Lisboa, segundo o orçamento de 1887-1888, importa em 15:000$000 réis.
Pergunto eu; emquanto póde importar o encargo do pessoal das cadeias penitenciarias de Coimbra e Santarem?
Creio que tenho todo o direito de perguntar, e o sr. ministro da justiça toda a obrigação de responder-me precisamente a este ponto.
Qual é a nota dos encargos que vem para o orçamento com a organisação d'estas duas penitenciarias? S. exa. guarda comtudo o mais completo silencio. Pois eu supponho que o pessoal das duas cadeias do Santarem e Coimbra importará pelo menos, as duas reunidas, o que importa o pessoal da cadeia de Lisboa. E parece-me que é um favor que eu faço ao governo.
São pois 15:000$000 réis.
Eu supponho tambem que as despezas accessorias das duas penitenciarias de Coimbra e Santarem sejam iguaes, reunidas as duas, ás despezas accessorias da penitenciaria de Lisboa, ou 61:000$000 réis; com 15:000$000 réis do pessoal, são 76:000$000 réis.
Mas então o que ha a abater d'estes 76:000$000 réis, que hão de inscrever-se annualmente no orçamento como verba de despezas?
Ha a abater o rendimento do trabalho dos presos.
Em quanto se póde calcular o rendimento do trabalho dos presos?
No orçamento para o anno economico seguinte vem calculado este rendimento em 39:000$000 réis.
Porém no orçamento rectificado d'este anno economico em que estamos vem elle calculado apenas em 16:000$000 réis.
Será crivel que, no orçamento do anno economico seguinte, o trabalho dos presos da cadeia de Lisboa produza 39:000$000 réis, quando no orçamento rectificado do anno economico actual, isto é, até 30 de junho de 1888 elle não póde produzir mais de 16:000$000 réis?
Acho que o calculo para o anno economico futuro é exagerado.
É absurdo suppor que este rendimento suba sem transicção do 16:000$000 réis a 39.000$000 réis.
Mas eu acceito o calculo que vem no orçamento para o anno economico seguinte.
Abatam-se esses 39:000$000 réis de 76:000$000 réis, e somme se o que fica com o encargo annual de 33:000$000 réis de que falla o projecto.
Pergunto se o paiz póde com um encargo annual approximado de 70:000$000 réis que o sr. ministro da justiça vae inscrever no orçamento.
Disse o illustre ministro que a conjuncção e excellente. Acrescentou s. exa. que os factos se impõem brutalmente e que nunca o paiz esteve n'uma epocha financeira tão favoravel como esta.
Mas o que quer dizer isto?
Quer dizer que s. exa. vae contrahir um emprestimo?
Se as condições são excellentes para contrahir um emprestimo, e se s. exa. o vae contrahir, porque é que não respondeu claramente quando eu lhe perguntei se tencionava contrahil-o?! (Apoiados.)
S. exa. não viu que o paiz estivesse assustado. S. exa. viu que o paiz estava tranquillo, que o paiz estava de uma serenidade completa. Verdadeiramente olympica.
O paiz está sereno!...
O que se passou ha pouco tempo, e o que se está ainda passando, mostram realmente uma serenidade espantosa! (Apoiados.)
O governo que tem de empregar as bayonetas para manter a ordem, o governo que não teve coragem para fazer passar o projecto das licenças é que vem dizer que e paiz está tranquillo! (Apoiados.)
O sr. Marianno de Carvalho para fazer passar o projecto, chamado das licenças, teve de supprimir a sua idéa primitiva, naturalmente porque o paiz estava sereno e socegado, e porque naturalmente o paiz o que queria era o imposto das licenças! (Apoiados.)
Por fim o sr. ministro da justiça chega á terceira parte.
N'esta terceira parte s. exa. teve impetos de indignação contra nós.
Disse s. ex.ª: pois o sr. Arouca achou que não estava d'este lado a carta constitucional?! Pois a carta constitucional não está sempre no seio do partido progressista?!
Nunca ninguem observou a carta constitucional como o partido progressista e como o governo que o representa!
Pois o governo que começou por uma dictadura odiosa, o governo que depois de aberto o parlamento não tem feito senão atacar as disposições da carta constitucional (Apoiados.) tem a coragem de dizer que a carta constitucional está d'aquelle lado, que a opposição não a conhece?! (Apoiados.)
(Áparte.)
Está d'aquelle lado, está, desde o anno passado, quando os direitos e as regalias da camara eram calcadas aos pés, e quando o sr. presidente do conselho vinha dizer que uma moção de confiança absolvia o governo de qualquer attentado contra os direitos individuaes.
Mas quem se esqueceu da carta constitucional? Foi o sr. Arouca, mostrando ao sr. ministro da justiça, que fixando o pessoal e os ordenados praticava um acto que pertencia á camara, ou foi s. exa. que nem sequer leu o artigo da carta tão expresso, que tira ao poder executivo a auctoridade de fixar, ao seu arbitrio, ordenados?! É uma ingenuidade do sr. ministro da justiça!
Disse s. exa. que é completamente impossivel atacar esta auctorisação pois que tem um limite, que é o pessoal fixado para a cadeia penitenciaria de Lisboa! Realmente se o illustre ministro não tem outro argumento para empregar em sua defeza mostra que n'esta questão tem sido de uma felicidade prodigiosa; este limite procurado para a auctorisação é necessariamente para fazer rir toda a camara.
A penitenciaria de Santarem tem 80 cellas, cabe perfeitamente á vontade na quarta ou quinta parte da penitenciaria de Lisboa, pois o pessoal d'esta penitenciaria ha de necessariamente ser inferior ao pessoal da penitenciaria de Lisboa, mas apesar d'isto s. exa. redige o artigo d'esta fórma; o que era muito curioso era que o sr. ministro da justiça apresentasse um projecto, em que o pessoal da cadeia de Santarem fosse igual ou superior ao pessoal da cadeia de Lisboa! A cadeia de Lisboa tem 576 cellas, a de Santarem tem 80 cellas, mas o seu pessoal será, como s. exa. diz, nos mesmos limites marcados para o pessoal da cadeia central de Lisboa! (Apoiados.) Mas o sr. ministro diz, que este artigo 3.° não é nada! É simplesmente uma auctorisação para s. exa. crear o pessoal que julgar mais conveniente! O artigo diz o seguinte:
«O pessoal das cadeias geraes penitenciarias será fixado em decreto especial á medida que cada uma se for estabelecendo.»
Mas o concurso? Qual é a rasão porque o governo não declara, ao mesmo tempo, que os empregados hão de ser nomeados por concurso? (Apoiados.)
O sr. Marianno de Carvalho, quando em 1883 se discutiu o projecto de organisação da penitenciaria de Lisboa, propoz que o provimento se fizesse por concurso, proposta que acceitei, e qual é então a rasão porque os srs.