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CAMARA DOS SENHORES DEPUTADO

49.ª SESSÃO

EM 20 DE AGOSTO DE 1909

SUMMARIO. - Lida e approvada a acta, dá-se conta do expediente. - Teem segundas leituras um projecto de lei do Sr. Soares Branco, extinguindo a Escola Medico-Cirurgica do Funchal; outro do Sr. Valerio Villaça, relativo ao imposto de minas; outro dos Srs. Pinto dos Santos, João Ulrich, Visconde de Villa Moura, Conde de Castro e Solla e Alberto Navarro, relativo á construcção de dois edifícios para lyceus, no Porto. - O Sr. Presidente participa que estão na mesa as contas da Camara de 1903-1909, que vão ser remettidas á commissão de fazenda. - O Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros lê uma proposta de lei sobre convenções de arbitragem com a Noruega, Brasil, Argentina e Nicaragua. - O Sr. Sinel de Cordes apresenta um projecto de lei criando uma assembleia eleitoral em Oeiras. - O Sr. Pereira de Lima refere-se a um projecto de lei que apresentou em 1898, sobre fomento hydraulico-agricola, fazendo varias considerações, e termina apresentando idêntico projecto, com o fim de construir-se um canal que ligue o Tejo, o Guadiana e o Sado. Responde-lhe o Sr. Ministro das Obras Publicas. - O Sr. Tavares Festas apresenta e justifica um projecto de lei, autorizando a Camara de Viseu a contratar um emprestimo para obras, e pede providencias aos Srs. Ministros da Justiça e Obras Publicas, ao primeiro sobre factos occorridos na comarca de Oliveira do Hospital, e ao segundo sobre a crise vinicola da região do Dão. - Varios Srs. Deputados mandam papeis para a mesa. - O Sr. João de Menezes faz varias considerações sobre o projecto dê lei do Sr. Tavares Festas. - Os Srs. Ministros da Justiça e das Obras Publicas respondem ao Sr. Tavares Festas.

Na primeira parte da ordem do dia (projecto de lei n.° 11, tratado de commercio com a Allemanha), usa da palavra o Sr. Brito Camacho que faz varias considerações, a que responde o Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros.

Na segunda parte da ordem do dia (discussão do artigo 3.° do parecer n.° 8, organização da Caixa Geral de Depositos), usa da palavra o Sr. Brito Camacho, que insiste justificando a sua proposta de inquerito, anteriormente apresentada, respondendo o Sr. Ministro da Fazenda. - É encerrada a sessão por falta de numero.

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2 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Presidencia do Exmo. Sr. José Joaquim Mendes Leal

Secretarios - os Exmos. Srs.

João José Sinel de Cordes
João Pereira de Magalhães

Primeira chamada - Ás 2 horas e 30 minutos da tarde.

Presentes - 8 Srs. Deputados.

Segunda chamada - Ás 2 horas e 45 minutos da tarde.

Presentes - 60 Srs. Deputados.

São os seguintes: Abel de Mattos Abreu, Alberto de Castro Pereira de Almeida Navarro, Alfredo Carlos Le Cocq, Alfredo Mendes de Magalhães Ramalho, Alfredo Pereira, Amandio Eduardo da Motta Veiga, Anselmo Augusto Vieira, Antonio de Almeida Pinto da Motta, Antonio Hintze Ribeiro, Antonio José de Almeida, Antonio Maria Dias Pereira Chaves Mazziotti, Antonio Osorio Sarmento de Figueiredo, Antonio Sergio da Silva e Castro, Antonio Tavares Festas, Antonio Zeferino Candido da Piedade, Arthur Pinto de Miranda Montenegro, Aurelio Pinto Tavares Osorio Castello Branco, Carlos Augusto Ferreira, Christiano José de Senna Barcellos, Conde de Azevedo, Conde de Mangualde, Eduardo Valerio Augusto Villaça, Francisco Limpo de Lacerda Ra vasco, Henrique de Mello Archer da Silva, João do Canto e Castro Silva Antunes, João Carlos de Mello Barreto, João Duarte de Menezes, João Ignacio de Araujo Lima, João Joaquim Isidro dos Reis, João José Sinel de Cordes, João Pereira de Magalhães, João Pinto Rodrigues dos Santos, João Soares Branco, João de Sousa Calvet de Magalhães, Joaquim Heliodoro da Veiga, José de Ascensão Guimarães, José Cabral Correia do Amaral, José Caeiro da Matta, José Jeronimo Rodrigues Monteiro, José Joaquim Mendes Leal, José Joaquim da Silva Amado, José Maria Cordeiro de Sousa, José Maria Joaquim Tavares, José Maria de Moura Barata Feio Terenas, José Maria de Oliveira Simões, José Maria Pereira de Lima, José Mathias Nunes, José Paulo Monteiro Cancella, José Ribeiro da Cunha, Manuel Affonso da Silva Espregueira, Manuel Antonio Moreira Junior, Manuel de Brito Camacho, Manuel Joaquim Fratel, Manuel Telles de Vasconcellos, Matheus Augusto Ribeiro de Sampaio, Miguel Augusto Bombarda, Rodrigo Affonso Pequito, Vicente de Moura Coutinho de Almeida d'Eça, Visconde de Coruche, Visconde de Ollivã.

Entraram durante a sessão os Srs.: Affonso Augusto da Costa, Alexandre Correia Telles de Araujo e Albuquerque, Antonio Centeno, Antonio Duarte Rainuda Curto, Antonio de Macedo Ramalho Ortigão, Antonio Rodrigues Nogueira, Antonio Rodrigues Ribeiro, Conde de Castro e Solla, Diogo Domingues Peres, Eduardo Frederico Schwalbach Lircci, Ernesto Julio de Carvalho e Vasconcellos, Francisco Miranda da Costa Lobo, José Gonçalves Pereira dos Santos, José Maria de Queiroz Velloso, Luis Vaz de Carvalho Crespo.

Não compareceram a sessão os Srs.: - Abel Pereira de Andrade, Abilio Augusto de Madureira Beça, Adriano Anthero de Sousa Pinto, Alberto Pinheiro Torres, Alexandre Braga, Alvaro Augusto Froes Possollo de Sousa, Amadeu de Magalhães Infante de La Cerda, Antonio Alberto Charulla Pessanha, Antonio Alves de Oliveira Guimarães, Antonio Augusto de Mendonça David, Antonio Augusto Pereira Cardoso, Antonio Bellard da Fonseca, Antonio Caetano de Abreu Freire Egas Moniz, Antonio Ferreira Cabral Paes do Amaral, Antonio José Garcia Guerreiro, Antonio Rodrigues da Costa da Silveira, Arthur da Costa Sousa Pinto Basto, Augusto de Castro Sampaio Côrte Real, Augusto César Claro da Ricca, Augusto Vidal de Castilho Barreto e Noronha, Conde de Arrochella, Conde de Paçô-Vieira, Conde de Penha Garcia, Duarte Gustavo de Reboredo Sampaio e Mello, Eduardo Burnay, Emygdio Lino da Silva Junior, Ernesto Jardim de Vilhena, Fernando de Almeida Loureiro e Vasconcellos, Fernando Augusto Miranda Martins de Carvalho, Fernando de Sousa Botelho e Mello (D.), Francisco Joaquim Fernandes, Francisco Xavier Correia Mendes, Frederico Alexandrino Garcia Ramirez, Gaspar de Queiroz Ribeiro de Almeida e Vasconcellos, Henrique de Carvalho Nunes da Silva Anachoreta, João Augusto Pereira, João Correia Botelho Castello Branco, João Henrique Ulrich, João José da Silya Ferreira Netto, João de Sousa Tavares, Joaquim Anselmo da Matta Oliveira, Joaquim José Pimenta Tello, Joaquim. Mattoso da Cantara, Joaquim Pedro Martins, Jorge Vieira, José Antonio Alves Ferreira de Lemos Junior, José Antonio da Rocha Lousa, José Augusto Moreira de Almeida, José Bento da Rocha e Mello, José Caetano Rebello, José Estevam de Vasconcellos, José Francisco Teixeira de Azevedo, José J[oaquim de Sousa Cavalheiro, José Julio Vieira Ramos, José Malheiro Reymão, José Maria de Oliveira Mattos, José Osorio da Gama e Castro, José dos Santos Pereira Jardim, José Victorino de Sousa e Albuquerque, Libanio Antonio Fialho Gomes, Lourenço Caldeira da Gama Lobo Cayolla, Luis Filippe de Castro (D.), Luis da Gama, Manuel Francisco de Vargas, Manuel Nunes da Silva, Manuel de Sousa Avides, Mariano José da Silva Prezado, Mario Augusto de Miranda Monteiro, Paulo de Barros Pinto Osorio, Roberto da Cunha Baptista, Sabino Maria Teixeira Coelho, Thomás de Almeida Manuel de Vilhena (D.), Thomás de Aquino de Almeida Garrett, Visconde de Reguengo (Jorge), Visconde da Torre, Visconde de Villa Moura.

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SESSÃO N.° 49 DE 20 DE AGOSTO DE 1909 31

ABERTURA DA SESSÃO - Ás 3 horas da tarde

Acta. - Approvada.

EXPEDIENTE

Officios

Do Ministerio do Reino, remettendo uma relação de diversos documentos exigidos pelo governador civil do districto de Portalegre e copia da acta da sessão da Camara Municipal do concelho de Campo Maior, em satisfação ao requerimento do Sr. Deputado Visconde de Ollivã.

Para a secretaria.

Do Ministerio do Reino, communicando que dos registos da Secretaria de Estado dos Negocios do Reino consta, a concessão das diversas mercês honorificas, mas não a ulterior existencia dos agraciados, nem a relação das habilitações literarias ou scientificas de cada um d'elles, satisfazendo assim. ao requerimento do Sr. Deputado João de Menezes.

Para a secretaria.

Do Ministerio da Marinha, communicando que se encontram nas repartições da Majoria Geral da Armada, Hospital da Marinha e Junta de Saude Naval os documentos requeridos pelo Sr. Deputado Antonio Augusto Pereira Cardoso, os quaes desde já se acham á disposição de S. Exa.

Para a secretaria.

Do Ministerio da Marinha, remettendo, em satisfação ao requerimento do Sr. Deputado José Augusto Moreira de Almeida, copias de vinte documentos que constituem o processo relativo ás polvoras existentes no cruzador Vasco da Gama.

Para a secretaria.

Do Ministerio da Fazenda, remettendo copia do officio da Direcção Geral da Thesouraria acompanhada dos documentos referentes a divida fluctuante interna e aos saldos existentes no cofres publicos em conta com o Thesouro e da Junta do Credito Publico e uma nota dos depositos existentes no extrangeiro á ordem Governo, satisfazendo assim ao requerimento do Sr. Deputado Augusto César Claro da Ricca.

Para a secretaria.

Do Ministerio da Fazenda, remettendo copia do officio da Direcção Geral da Thesouraria acompanhada dos documentos referentes aos incendios das Repartições de Fazenda de Alijo, Murça e Valpaços, satisfazendo assim ao requerimento do Sr. Deputado Alexandre Correia Telles de Araujo e Albuquerque.

Para a secretaria.

Do Ministerio da Fazenda, remettendo copia do officio da Thesouraria acompanhada dos exemplares referentes ao relatorio da Inspecção Geral dos Impostos e das respostas dadas por alguns funccionarios que teem a seu cargo os serviços a que aquella inspecção se refere, satisfazendo o requerimento do Sr. Deputado Abel Pereira de Andrade.

Para a secretaria.

Do Ministerio da Fazenda, remettendo copia do officio da Thesouraria acompanhada dos exemplares referentes ao relatorio da Inspecção Geral dos Impostos e das respostas dadas por alguns funccionarios que teem a seu cargo os serviços a que aquella inspecção se refere, satisfazendo assim o requerimento do Sr. Deputado Francisco Miranda da Costa Lobo.

Para a secretaria.

Do Ministerio da Fazenda, remettendo um exemplar do projecto do regulamento para execução do artigo 46.° da carta de lei de 18 de setembro de 1908, satisfazendo assim o requerimento do Sr. Deputado Antonio Alves de Oliveira Guimarães.

Para a secretaria.

Do Ministerio da Fazenda, remettendo um exemplar do projecto do regulamento para execução do artigo 46.° da carta de lei de 18 de setembro de 1908, satisfazendo assim o requerimento do Sr. Deputado Antonio Centeno.

Para a secretaria.

Telegramma

Do Sr. Presidente da Junta Geral do Funchal, pedindo que sejam approvadas as medidas governamentaes referentes aos sanatorios.

Para a secretaria.

Projecto de lei

Senhores. - A Escola Medico-Cirurgica do Funchal deve ser extincta.

Depois do decreto que cerceou as garantias dos diplomados dessa escola, a frequencia diminuiu mais, de anno para anno, até que ultimamente a mesma escola deixou em absoluto de ser frequentada, tendo terminado o curso este anno os tres alumnos que lá existtam.

O numero de professores validos está reduzido a um, não havendo, portanto, a recear as dificuldades sempre predominantes no caso da extincção de uma escola.

Extincta, porem, a escola, é de justiça que os diplomados por ella possam exercer a sua profissão a bordo dos vapores portugueses, onde geralmente não querem servir os médicos das escolas do reino, e lhes seja permittida a concorrencia aos logares de medicos municipaes em localidades das ilhas adjacentes, visto que esses concursos ficam quasi sempre desertos.

É justo por outro lado que alguma compensação seja dada á cidade do Funchal, e nenhuma poderá ser de mais capital importancia do que o desenvolvimento da sua escola industrial, que tem sido até hoje das menos favorecidas do país.

Não ha n'ella o ensino da lingua inglesa e francesa, e, no entanto, em nenhuma outra terra de Portugal a necessidade de tal ensino é mais sensivel e urgente.
O commercio e a industria locaes estão em grande parte em mãos de estrangeiros, e estes só admittem empregados indigenas com a condição de conhecerem suas linguas.

A população fluctuante de estrangeiros, em visita temporaria ou em transito, cresce de anno para anno, e é manifesto que a importação de empregados estrangeiros que, por isso, de cada vez mais se impõe, redunda em prejuizo dos filhos da Madeira.

Com a criação das duas cadeiras citadas, na escola industrial, tornava-se o ensino dessas linguas accessivel a todas as classes, obviando-se aquelle mal, e, por outro lado, facultava-se aos emigrantes uma habilitação mais completa para a luta pela vida em países distantes. Por tudo isso, tenho a honra de propor á vossa approvação o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° Fica desde já extincta a Escola Medico-Cirurgica do Funchal.

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4 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Art. 2.° Os professores proprietarios continuarão a receber os vencimentos que por lei lhes pertencerem, de pois de aposentados.

Art. 3.° Os que tiverem o curso d'aquella escola podem exercer a clinica nas condições facultadas pelo decreto de 22 de junho de 1870 e exerce-la tambem a bordo de quaesquer navios portugueses.

Art. 4.° Da verba orçamental destinada ao funccionamento regular da mesma escola, mas que exceda aos ordenados devidos aos professores, será tirada a quantia necessaria para a criação e installação de uma aula de inglês e outra de francês na Escola Industrial do Funchal

§ unico. Quando a verba a que se refere este artigo não seja suficiente, será supprido o que falta com o excedente da quantia orçamental destinada ás depesas das escolas industriaes do país.

Art. 5.° Fica revogada a legislação em contrario. = João Soares Branco.

Foi admittido e enviado ás commissões de instrucção superior e especial e de fazenda.

Projecto de lei

Senhores: - Tendo sido frequentes os conflictos, entre as empresas mineiras e os municipios, ácerca da legali dade do lançamento de contribuições municipaes sobre o valor dos minerios extrahidos pelas mesmas empresas, conflictos que teem tido a sua natural solução por via contenciosa, é indispensavel a interferencia do poder legislativo no sentido de, em uma disposição generica, pôr termo a taes desacordos.

Por mais de uma vez se tem procurado dar solução parcial ao problema por meio de medidas referentes a um certa empresa mineira ou um determinado municipio.

Os tribunaes superiores já emittiram a sua opinião sobre o assunto, apresentando argumentos todos conducentes a demonstrar a necessidade de uma providencia de caracter generico.

O imposto de minas é especial, sendo regulado pelo decreto de 30 de setembro de 1892, que, em nenhuma das suas disposições, prohibe o lançamento do imposto municipal de minas, que se acha comprehendido no artigo 68.°, e seus paragraphos do Codigo Administrativo em vigor, mas não regulamentado, e tanto assimo comprehendeu o Parlamento, que regulou os conflictos desta natureza entre á mina de S. Domingos e a Camara Municipal de Mertola, como se acha expresso no decreto de 8 de agosto de 1901.

É pois de equidade, quer para as empresas mineiras quer para os municipios, a generalização do disposto para o municipio de Mertola, fixando o imposto municipal de minas em 10 por cento do imposto mineiro cobrado pela Fazenda Publica.

Aumentam-se por esta forma os rendimentos dos municipios, que na sua maioria lutam com difficuldades financeiras, dando-se-lhes a justa compensação dos serviços por elles prestados ás empresas mineiras.

Demonstrada a necessidade da providencia legislativa a que acabo de me referir, submetto á vossa esclarecida apreciação o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° E fixada em 10 por cento sobre os respectivos impostos do Estado a taxa do imposto de minas com que as empresas mineiras contribuirão annualmente para os cofres dos municipios onde estiverem localizadas.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Sala das sessões, 18 de agosto de 1909. = Eduardo Valerio Villaça.

Foi admittida e enviada ás commissões de obras publicas e fazenda.

Projecto de lei

Senhores. - Pelo presente projecto de lei procura-se resolver um problema da maior opportunidade e interesse para o ensino secundario a installação definitiva dos lyceus do Porto em edificios proprios, expressamente construidos para esse fim, de acordo com indicações da moderna pedagogia.

No anno lectivo proximo começarão já a funccionar em edificios novos, cuja construcção está em caminho de concluir-se, os lyceus da 1.ª e 2.ª zonas escolares de Lisboa; e pelo que respeita ao da 3.ª, todas as providencias estão tomadas .para que, em prazo relativamente curto, as aulas respectivas se transfiram para nova sede, cuja construcção está já financeiramente garantida e com a maior urgencia se vae iniciar.

Dotada assim a capital do reino com este importantissimo melhoramento, estava indicada a conveniencia de se providenciar identicamente para a cidade do Porto. A densidade da sua população, a sua primacial importancia e relevo na economia nacional, a difficuldade, niaior ainda do que em Lisboa, que ali ha para se arrendarem edificios onde possam installar-se, mediocremente sequer, lyceus de grande frequencia, como teem de ser os dos grandes centros, os deveres e cuidados especiaes pela hygiene e saude de aluamos e professores, tudo isto constitue um conjunto de circunstancias especiaes e locaes, cuja eloquencia vem reforçar a obrigação geral que ao Estado assiste de velar pelo prestigio das instituições de ensino publico e pela integridade da educação official.

E só quem não viu as pessimas condições em que estão funccionando os dois lyeeus de Alexandre Herculano e de D. Manuel II, em grupos separados e até afastados, de casas absolutamente improprias, sem o minimo de cubagem, nas aulas, sem terrenos annexos que permitiam evitar aos alumnos o contacto frequente com a rua, sem disposição compativel com uma direcção e fiscalização effi-caz, sem possibilidade de installação de serviços que hoje são inseparaveis da educação media completa, poderá deixar de comprehender a opportunidade das successivas reclamações dirigidas por autoridades e particulares aos poderes publicos, e a justiça do acto official que lhes der emfim, satisfação.

Não se insiste, pois, na desnecessaria explanação de motivos que todos veem e sentem, e contra cuja exactidão e urgencia nenhuma voz sincera se levantará. Cumpre apenas mostrar que, tambem sob o ponto de vista financeiro, esta iniciativa constitue acto de boa administração e nunca será origem de encargos superiores ás forças do Thesouro.

Com effeito, o Estado paga annualmente pelas casas onde a necessidade o forçou a installar os citados lyceus quantia aproximada de 5 contos de réis, que irá crescendo pela progressão constante da carestia dos alugueres urbanos e que muito aumentaria se se tentasse e conseguisse obter melhor intallação provisoria para os dois institutos portuenses de ensino secundario official.

Descontada aquella verba do encargo proveniente da medida proposta, é ella relativamente insignificante em confronto com os beneficios que produz, e entre os quaes se devem comprehender os de caracter economico, pois não pode haver educação completa em casas más, e sem educação integral não haverá riqueza nem boa economia.

Taes são, senhores, os justos fundamentos do seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° Fica o Governo autorizado a contrahir com a Caixa Geral de Depositos um empréstimo até a quantia de 300 contos de réis, por trinta annos, a juro que não poderá exceder õ por cento, destinado á acquisição de terrenos e construcção de edificios para dois lyceus centraes na cidade do Porto, sendo o excedente applicado á acquisição de mobiliario e material para os mesmos lyceus.

Art. 2.° A partir do anno economico de 1912-1913 será consignado no Orçamento Geral do Estado, como encargo permanente, o que, alem da importancia das rendas das casas onde actualmente funccionam os referidos lyceus, for necessario para pagamento dos juros e amor-

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tização do referido emprestimo durante o prazo mencionado.

Art. 3.° A importancia do emprestimo ficará á ordem do Ministerio do Reino, e será levantada á medida que for sendo necessaria, liquidando-se semestralmente os juros das quantias levantadas até o dia 30 de junho de 1912, os quaes serão pagos pela verba que deverá inscrever-se na tabella da despesa do Ministerio do Reino.

Art. 4.° Fica revogada, a legislação em contrario. = João Pinto dos Santos = João Ulrich = Visconde de Filia Moura = Conde de Castro e Solla = Alberto Navarro.

O Sr. Presidente: - Estão sobre a mesa as contas das gerencias de 1903 a 1909. Já ha alguns annos estas contas teem sido apresentadas á commissão de fazenda, mas como se tem ciado o facto de se terem interrompido as sessões legislativas, não tem sido dado parecer, nem teem sido approvadas.

Vão á commissão de fazenda.

O Sr. Deputado Antonio José de Almeida pede á Camara permissão para sair para o estrangeiro.

Consultada a Camara, foi concedida a autorização pedida.

O Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros (Barbosa du Bocage): - Mando para a mesa uma proposta de lei sobre convenções de arbitragem com os Governos da Noruega, do Brasil, da Argentina e de Nicaragua, que passo a ler.

(Leu).

Foi mandada á commissão de negocios estrangeiros, depois de publicada no "Diario do Governo".

O Sr. Sinel de Cordes: - Mando para a mesa um projecto de lei criando uma quarta assembleia eleitoral no concelho de Oeiras, com sede em Barcarena.

Ficou para segunda leitura.

O Sr. Pereira de Lima: - Em 7 de março de 1898 apresentou a esta Camara um projecto de lei, que intitulou de fomento hydraulico-agricola, relativo a um canal que ligasse o Tejo, o Guadiana e o Sado.

A Camara recebeu auspiciosamente esse seu projecto, o Governo de então, composto de altas personalidades que representavam o partido progressista no poder, recebeu tambem com bom agrado o mesmo projecto, as commissões reunidas fizeram-lhe todos os elogios possiveis e imaginaveis, mas de repente, numa dessas valvulas de segurança em que a politica portuguesa é perenne, o projecto desappareceu no limbo da commissão respectiva. Então o agrado converteu-se um pouco em desagrado, e este senão se manifestou totalmente, pelo menos, nas conversas particulares; dizia-se nem mais nem menos do que, embora fossem muito bons os desejos do seu autor, o assunto era mais ou menos uma utopia. - Deixou passar onze annos, mais um anuo do que aquella celebre década que se diz durou a guerra de Troya, e agora tem a paciencia de vir aqui renovar a iniciativa do seu projecto e dizer que, se porventura a Camara n'essa occasião o tivesse approvado, que não implorava por parte do Governo nem subsidio nem garantia de juro de espécie alguma, o canal a esta hora seria uma realidade e importantissimos serviços teria já prestado não só ás communicações é á rede tarifaria, mas principalmente á irrigação da nossa grande provincia do Alemtejo.

Todas as nações se occupam com grande affinco de tudo quanto diz respeito ao que se chama a hydraulica moderna, mas nos estamos nesse ponto ainda mais atrasados do que estavamos em pleno seculo XVIII, porque então tinhamos um regime que se seguia para a rectificação e limpeza dos nossos rios. Hoje temos os nossos rios assoreados, os nossos portos limitam-se a um que devia, ser primeiro, mas que é secundario, Lisboa;, as questões de hydraulica agricola desenvolvem-se, os da hydraulica terrestre são para nos um mytho, e em questões de hydraulica maritima depois das poderosas iniciativas de Aguiar e de Navarro nada se tem feito.

Sobre a hydraulica moderna, quer se chame a hulha branca, verde ou de outra qualquer cor, a hydraulica applicada como energia, nada temos feito, e, no entanto, e assunto tão importante que a Suissa ainda ultimamente aumentou a sua Constituição com mais um artigo sobre o assunto.

N'este ponto, entre nos, apenas ha a louvar a iniciativa de alguns particulares, que já estão tratando cie aproveitar a hulha branca como energia electrica.

Para este assunto, que é da mais alta importancia, deve o Governo voltar a sua attenção, tanto mais que somos um país sem combustivel e que para o adquirir temos de mandar annualmente para o estrangeiro milhares de contos em ouro.

Os nossos caminhos de ferro, especialmente os do Estado, já deviam estar sendo explorados por meio da energia eléctrica, mas nada disso se faz, e ainda agora vê que se trata do prolongamento do caminho de ferro do Barreiro a Cacilhas pondo de parte o projecto do engenheiro Serrão, em que essa energia era applicada.

Elle, orador, foi o primeiro Deputado a tratar do assunto n'esta Camara, mas tanto elle como os collegas que se lhe seguiram estiveram positivamente a pregar no deserto.

Quando apresentou o seu projecto, como é o costume da terra, todos começaram a fazer a conta de qual seria a parte que a elle, orador, tocaria na companhia que se organizasse para fazer esse canal, mas essas apprehensões tratou logo de as desfazer, numa conferencia que fez no Alemtejo, em presença dos interessados, declarando que qualquer interesse que porventura lhe pudesse caber pela sua iniciativa o cederia por completo aos asylos e casas de misericordia do Alemtejo.

Elle, orador, não crê, e nisto não vae offensa, que esta Camara tenha a energia precisa para approvar o seu projecto, mas em todo o caso repete a mesma declaração, que tudo o que lhe possa competir o põe á disposição dos asylos.

A apresentação de um projecto desta ordem nesta occasião, quando o credito dos Governos portugueses não é grande e quando para se obter dinheiro é necessario dar penhor, talvez pareça extraordinario, mas tem a informar a Camara de que ha cerca de quatro meses foi procurado por dois engenheiros franceses, representando um importante syndicato da França, que lhe disseram que para o Governo Portugues só ha dinheiro com penhor, mas que para a consirucção de um canal, mesmo sem subsidio nem garantia de juro, ha sempre dinheiro, e que, portanto, podia elle, orador, renovar a iniciativa do seu projecto.

No seu projecto estabelece-se o concurso, e deve ainda dizer á Camara, como esclarecimento, que quando esse projecto foi conhecido lá fora veio logo a Lisboa um engenheiro com o dinheiro necessario para fazer o deposito, 200 contos de réis em ouro, e prontificando se a fazer o projecto á sua custa.

Como a Camara ha de estar lembrada, na ultima vez em que elle, orador, usou da palavra, quando se discutiu o tratado de commercio com a Allemanha, referiu que uma das difficuldades que os nossos productos encontravam para a sua collocação no estrangeiro era o preço excessivo das tarifas internas, que muitas vezes importavam em mais do que o preço por que elles lá fura eram vendidos.

Ora uma maneira de baratear esses transportes seria collocar canaes ao lado dos caminhos de ferro.

Foi isso que fez a Allemanha e assim tem conseguido bater a França.

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6 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Os transportes na Allemanha teein barateado por tal forma que de ha dez annos para cá as tarifas dos caminhos de ferro soffreram um abatimento de 75 por cento e os canaes 8 por cento.

No programma do Imperador da Allemanha, que não se accupa somente das cousas marciaes, mas que tambem cuida com interesse do desenvolvimento material do imperio, está a abertura de mais canaes.

Nós, com o Alemtejo aqui ao pé da porta, convertido em um perfeito Sanara, onde podiamos ter bellos trechos de verdura que dessem trabalho aos trabalhadores do norte, que se veem obrigados a emigrar para não morrer de fome, nada fazemos, quando isso era relativamente facil, bastava converter em arterias, reunindo-as, as redes venosas que se encontram dispersas.

Mas em Portugal não se trata destas cousas. O regime florestal está tambem abandonado, porque quasi não temos arvores, quando lá fora se reconhece que um país deve ter uma grande parte da sua superficie occupada por florestas.

No seu projecto, como disse, não ha subsidio nem garantia de juro, mas nem por isso deixa de ter a convicção que o concurso que se abra não ficará deserto. Ainda não ha muito tempo lhe affirmou um, engenheiro que não ha memoria de que um concurso para uma obra hydraulica ficasse deserta.

Não pede para este projecto dispensa do regimento, porque é assunto que a Camara tem de estudar, mas o que pede é que, como da outra vez, seja dispensada a segunda leitura.

(O discurso será publicado na integra aliando o orador restituir as notas tachygraphicas).

O Sr. Visconde de Coruche: - Por parte da commissão de agricultura, peço que seja consultada a Camara sobre se permitte que a mesma commissão reuna durante a sessão.

Consultada a camara, responde affirmativamente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Ministro das Obras Publicas.

O Sr. Ministro das Obras Publicas (Barjona de Freitas): - Sr. Presidente: o illustre Deputado Sr. Pereira de Lima é d'aquelles parlamentares que costumam versar nesta Casa questões da maior importancia para a economia do país. Foi com o maior agrado que eu ouvi hoje S. Exa. occupar-se de questão tão importante para a nossa economia, como é a da politica hydraulica, que S. Exa. deseja ver largamente implantada em Portugal.

S. Exa. renovou a iniciativa do seu antigo projecto de lei; que é mais uma demonstração do estudo e dedicação com que S. Exa. se occupa destas questões, e a proposito chamou a attenção do Governo para assuntos importantes. Referiu-se S. Exa. primeiro ao aproveitamento das nossas aguas, e sobre este assunto devo dizer á Camara que espero poder apresentar, ainda nesta sessão, uma proposta de lei regulando o aproveitamento das aguas tanto para as irrigações como para a energia mecanica. Esta proposta, espero, merecerá a discussão da Camara e que, se não nesta sessão, numa das sessões proximas, poderá ser convertida em projecto com as modificações que as commissões e a Camara entenderam conveniente introduzir-lhe para seu aperfeiçoamento.

Pela minha parte não tenho senão que empenhar-me para que esta proposta seja convertida em lei, porque, como S. Exa. mostrou, é indispensavel que o assunto seja regulado. (Apoiado).

Tudo quanto se refere á exportação dos nossos productos occupa, desde o primeiro dia em que tomei posse da pasta das Obras Publicas, a minha attenção e continuará a occupá-la.

Farei quanto caiba nas faculdades do Governo e no pouco tempo que elle pode dedicar ao estudo destas questões para que alguma cousa se consiga no sentido de baratear os nossos productos e torná-los facilmente exportaveis (Apoiados); isso porem não é só com tarifas que se consegue, mas com outras medidas. Alguma cousa ha que aperfeiçoar tanto no fabrico e na escolha de produe-tos como na embalagem e em outras questões connexas com esta que podem facilitar a exportação dos nossos productos. (Apoiados).

Pelo que se respeita ao regime florestal, a Camara reconhece que bastante tem feito o Governo, o Parlamento e tambem muitos particulares.

Este é um dos assuntos cuja importancia está hoje geralmente reconhecida. Muito se tem caminhado e espero ainda, que mais se poderá caminhar. O Governo não descura o assunto e é provavel que até a proxima sessão possa fazer alguma cousa com respeito ao regime florestal.

Não me recordo se S. Exa. se referiu a qualquer, outro ponto...

O Sr. Pereira de Lima: - Disse que desejava saber a opinião do Governo sobre o projecto nas suas linhas geraes, não artigo por artigo.

O Orador: - Se o illustre Deputado me pergunta o que penso sobre a conveniencia da existencia de canaes, quer o!e navegação, quer de irrigação - e a sua funcção os differencia - não posso dizer senão que a acho desejavel. Agora, quanto ao projecto, nada posso dizer sem ter ouvido sob o ponto de vista technico, as estacões competentes do meu Ministerio. O que posso é affirmar a S. Exa. a minha sympathia pela sua iniciativa e o cuidado com que o meu Ministerio se está occupando das questões de hydraulica agricola, tanto sob o aspecto technico das irrigações como sob o que chamarei administrativo, a mais equitativa forma de distribuir a agua pelos que devam utilizá-la. Pode S. Exa. estar seguro que todos estes assuntos merecem cuidadosa attenção do Governo.

(O orador não reviu).

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Tavares Festas. Previno V. Exa. que faltam tres minutos para se passar á ordem do dia.

O Sr. Tavares Festas: - Não pode, nos tres minutos que faltam para se passar á ordem do dia, versar o assunto de que deseja occupar-se e por isso pede que seja consultada a Camara sobre se lhe concede mais alguns minutos.

A Camara annuiu.

Agradece á Camara e promette não abusar. O seu fim é apresentar um projecto de lei autorizando a Camara Municipal de Viseu a contratar um empréstimo de 90 contos de réis para applicar a varias obras, como construcção de una cemiterio, abastecimento de aguas, etc.

Este projecto vae acompanhado do parecer dos quarenta maiores contribuintes, approvando o pedido da Camara, menciona de uma forma clara e precisa a applicação que o emprestimo deva ter e leva tambem junto a indicação de onde se ha de ir buscar a verba para o emprestimo.

Como o projecto é imposto não só á saude publica como á hygiene d'aquella cidade, considera-o urgente, e por isso pede que seja dispensado o regimento a fim de entrar, hoje mesmo em discussão.

Vendo presente o Sr. Ministro da Justiça, deseja referir-se a S. Exa., devendo comtudo accentuar que nas suas palavras não veja S. Exa. nenhum azedume nem má vontade, porque, tendo sido seu companheiro e amigo durante

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muitos annos, não esquece a boa camaradagem que sempre mantiveram, seja qual for a distancia que hoje os separa, porque acima de tudo põe os dictames do seu caracter e o que entende, ser a honra individual de cada um.

Num jornal que tem presente, dá-se noticia de factos graves occorridos em Oliveira do Hospital.

Está ali um juiz que foi seu condiscipulo, que sabe que é um magistrado integerrimo e um perfeito homem de bem, mas que, nos termos que a lei lhe faculta, tem feito com que as partes paguem menos do que pagavam até aqui. Isto levantou protestos da parte dos funccionarios judiciaes, que viram diminuidos os seus interesses, e d'ahi as accusações que se fazem ao juiz. Esse magistrado foi ali collocado pelo actual Sr. Ministro da Justiça, e S. Exa. poderá dizer se elle é ou não um magistrado recto e justiceiro.

Por sua parte, o que pede ao Sr. Ministro da Justiça é que, por pessoa recta e imparcial, mande proceder a uma syndicancia aos actos de esse juiz para que justiça seja feita.

Ao Sr. Ministro das Obras Publicas deseja tambem fazer uma pergunta.

Representa ha annos nesta Camara uma região, a mais pobre do país, e que tem sido sempre tratada com desamor pelos poderes, talvez porque não se tenha imposto pela forma como o teem feito outras regiões para que tem havido todas as attenções. Não vem insurgir-se contra isso, porque não tem por habito queixar-se dos outros para que o attendam, o que vem é simplesmente pedir o cumprimento da lei.

Quando foi da lei vinicola ficou-se de publicar um regulamento que tardava em apparecer, o Douro impôs-se, queimaram-se algumas repartições de fazenda, e o regulamento appareceu. mas só para uma região. Elle, orador, o que pede, e com isso não quer mais do que o cumprimento estricto da lei, é que o mesmo se faça para a sua região, e nesse sentido se dirige ao Sr. Ministro das Obras Publicas pedindo-lhe que, de uma maneira formal e categorica, declare se esse regulamento estará publicado até á primeira quinzena de novembro.

(O discurso será publicado na integra quando o orador restituir as notas tachygraphicas).

O Sr. Presidente: - Os Srs. Deputados que pediram a palavra para antes da ordem do dia e que tiverem papeis a mandar para a mesa podem faze-lo.

O Sr. Pereira de Lima: - Mando para a mesa o seguinte

Requerimento

Requeiro, que com toda a urgencia, ine sejam enviadas a esta Camara copias de qualquer parecer, ou consulta, existentes nas repartições do Ministerio das Obras Publicas, a proposito do meu projecto do canal transtagano, quando e apos a sua primeira apresentação nesta Camara em 8 de março de 1898. - J. M. Pereira de Lima.

Mandou-se expedir.

O Sr. Ernesto de Vasconcellos: - Mando parada mesa um projecto de lei reconhecendo o direito de reforma, pelo Ministerio da Marinha, ao amanuense da classe civil César Augusto Ferreira de Moraes, do quadro da Direcção Geral de Marinha, completando o prazo legal.

Ficou para segunda leitura.

O Sr. João de Magalhães: - Mando para a mesa o seguinte

Requerimento

Requeiro com urgencia, pelo Ministerio das Obras Publicas copia do parecer da commissão technica nomeada para examinar os estragos do mar de Espinho e propor as medidas a tomar para impedir a invasão. E bem assim copia do parecer ou pareceres do Conselho Superior de Obras Publicas e Minas sobre p mesmo assunto ou de quaesquer estações. technicas que sobre elle tenham sido ouvidas. = O Deputado, João de Magalhães.

Mandou-se expedir.

O Sr. Presidente: - Vae ler-se o projecto mandado para a mesa pelo Sr. Tavares Festas.

Projecto de lei

Senhores.- Deliberou a Camara Municipal de Viseu, em sessão de 3 de dezembro ultimo, realizar naquella cidade, as obras de empreterivel urgencia a que se refere a sua representação que acabo de ter a honra de ler á Camara e que aqui dou como reproduzida; nestes termos e para tal fim, tenho a honra de apresentar o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° É o Governo autorizado a conceder á Camara Municipal de Viseu permissão para contrahir um empréstimo até 90 contos de réis, levantado por series de 10 contos de réis, com-destino á conclusão da exploração das aguas para abastecimento da cidade, das obras do edificio dos paços do concelho, do alargamento da Praça Dois de Maio, da Rua Presidente Luis Ferreira e da abertura e construcção das das do bairro de Massorim; ás obras para alargamento do cemiterio, ou construcção de outro, para collocação de canos de esgoto nas das da cidade, para construcção de um ou mais tanques asepticos onde vão despejar esses canos, e para terraplenagem.do leito do no Pavia, em frente e a seguir do edificio do. matadouro municipal; ainda que os encargos do empréstimo juntos com os dos empréstimos anteriores excedam a quinta parte das suas receitas ordinarias.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Sala das sessões da Camara dos Senhores Deputados, 20 de agosto de 1909. = Antonio Tavares Festas = Paulo Cancella = Anselmo Vieira = Conde de Mangualde = Alexandre de Albuquerque.

O Sr. Presidente: - Tendo o Sr. Deputado Tavares Festas pedido a urgencia para o projecto que acaba de ser lido, vou consultar a Camara sobre se o considera urgente.

Consultada a Camara, resolveu affirmativamente.

O Sr. Presidente: - Está em discussão.

O Sr. João de Menezes: - Mais uma vez a Camara acaba de dar razão ás queixas por elle, orador, feitas na ultima sessão. Dispensa-se o regimento para tudo, tudo é considerado urgente menos o tratar-se dos assuntos que realmente interessam ao país, como ha dias succedeu quando elle, orador, quis referir-se ao telegramma em que o commercio de Loanda declarava que suspendia as suas importações da metropole, e como tem succedido com as intecpellações ha tempo annunciadas por dois collegas seus sobre o convénio com o Transvaal.

Elle, orador, não sabe já quantos projectos teem sido votados com dispensa do regimento concedendo autorizações ás camaras municipaes, o que sabe é que ha tempos foi enviada a esta Camara uma representação da Camara Municipal do Porto reclamando que lhe fosse concedida autorização para proceder em harmonia com os interesse" daquella cidade e que não obteve deferimento; o que sabe é que essa camara já protestou contra deliberações do Governo, e que até hoje ainda ninguém se levantou para dizer uma palavra a proposito d'essa reclamação.

E não se diga que é porque a Camara é republicana, porque a sua maioria é monarchica. O Sr. Fontes, que é regenerador e membro dessa cansara, em uma sessão declarou que fora solicitado pelos seus amigos para acceitar

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esse logar, que elle não queria, mas que, desde que entrou para a camara, com o proposito de administrar honradamente, esses seus amigos politicos e o Governo foram os primeiros a contrariá-lo.

Como não quer attribuir a outrem palavras que elle não tenha pronunciado, vae buscar aos extractos das sessões da Camara Municipal do Porto as palavras, de S. Exa., e vae lê-las, porque ellas constituem uma lição nos tempos que vão correndo e que talvez seja proveitosa, porque já se annunciam dias bem tristes para este país, pois a oligarchia financeira, que estremeceu um pouco ha cousa de dois annos, parece agora resuscitar.

O anno passado, quando veio aqui a representação do Porto, os leaders de todos os partidos disseram as mais bonitas palavras e fizeram as melhores promessas, mas a verdade é que a Camara Municipal do Porto não foi attendida nem em uma só das suas reclamações.

O que o vereador Fontes disse em uma das sessões da camara, e que consta do respectivo extracto, vae elle, orador, lê-lo á Camara.

O que se está passando com a Camara Municipal do Porto é inadmissivel.

O Sr. Presidente: - Diz que nem de longe quer chamar, o illustre Deputado á questão, mas pede-lhe, no entanto, o favor de se cingir um pouco mais ao assunto.

O Orador: - Vae restringir-se. Declara que não tem procuração nem dos vereadores do Porto, nem dos eleitores do Porto, nem de classe nenhuma d'aquella cidade, para estar falando na Camara em sua defesa. Tem o direito, porem, como Deputado, para protestar quando veja praticar injustiças como as que se teem commettido com a Camara Municipal do Porto, cuja maioria, repete, é monarchica.

Disse no outro dia que a Camara apenas trata em especial de politiquice e do campanario. Mais nada. Os graves interesses do país não são tratados como devem ser e de tal maneira as classes que se dizem dirigentes estão corrompidas que, na audácia de protestar contra os Deputados republicanos quando elles, no momento em que essas classes teem pendentes assuntos que lhes interessam exclusivamente, falam e protestam, são considerados como inimigos do país.

Mas uma vez tem o prazer de dizer que não é, na Camara, representante de classes, nem de interesses particulares de ninguem. Ha de dizer o que entender.

Despreza absolutamente todas essas oligarchias politicas ou financeiras; despreza todos os caciques; despreza todos os influentes, e não se importa absolutamente nada com a sua candidatura. Ha de dizer o que entender e julgue necessario a favor do seu país.

Emquanto a Camara estiver aberta não deixará de aproveitar o ensejo para formular o seu protesto contra este descalabro para que todos vamos.

Quer aproveitar tambem a occasião para lamentar que a commissão de inquerito parlamentar aos actos do ultimo reinado não tenha ainda recebido das differentes Secretarias de Estado a nota dos adeantamentos feitos a particulares e a companhias. E lembra-a essa commissão - sem querer aconselhá-la ou censurá-la -que nesta Camara foi votada por acclamação uma proposta sua autorizando os membros dessa commissão a entrarem em todas as Secretarias de Estado.

O Sr. João Pinto dos Santos (interrompendo): - É da commissão de inquerito e tem a declarar que os membros que a compõem assentaram em não ir ás Secretarias de Estado. Tantos documentos lá existem que se fossem a analysá-los detidamente nada se discutta e lançava-se depois á commisBão a responsabilidade de não terem averiguado cousa nenhuma. Para se orientarem na busca de todos os documentos necessarios nas Secretarias de Estado era preciso o auxilio de uma bussola. Quis-se, portanto, deixar ao Governo toda a responsabilidade.

O Sr. Presidente: - Pede ao Sr. João de Menezes o favor de se cingir ao assunto.

O Orador: - Tem de completar o seu pensamento depois da advertencia do Sr. João Pinto dos Santos. S. Exa. confirmou absolutamente tudo quanto elle, orador, disse, e associou-se aos seus protestos ao Governo, por este não enviar todos os documentos que a commissão reclamava.

Não se pretenda, pois, illudir o país com mystificações, com projectos de assalto.

O Sr. Presidente: - Pede ao Sr. João de Menezes que attenda ás suas instancias. Roga de novo a S. Exa. o favor de se cingir ao assunto, que não tem absolutamente nada com o que S. Exa. está produzindo.

O Orador: - Diz que fez essas considerações para que todos soubessem que não se deixa ludibriar, nem é cumplice consciente ou inconscientemente para occultar os adeantamentos illegaes.

Dito isto, que se ligou com o seu discurso, tem a declarar que não vota o projecto apresentado pelo Sr. Tavares Festas, como não vota projectos de camaras municipaes que peçam autorizações emquanto nesses projectos não vierem os orçamentos da camara e os relatorios das suas gerencias.

(O discurso será publicado na integra, quando o orador restituir as notas tachygraphicas).

O Sr. Presidente: - Está esgotada a inscrição. Vae ler-se o artigo 1.° para se votar. Lido na mesa, é approvado.

O Sr. Presidente: - Vae ler-se o artigo immediato.

(Leu-se na mesa).

Está em discussão.

(Pausa).

Ninguem pede a palavra vae votar-se. Os Srs. Deputados que approvam o artigo que acaba de ser lido tenham a bondade de se levantar.

Foi approvado.

O Sr. Antonio Osorio: - Mando para a mesa o parecer da commissão de marinha sobre a proposta de lei n.° 67-A de 1908, que define as situações de licença illimitada e inactividade temporaria em que se podem encontrar os officiaes da armada.

Foi a imprimir.

O Sr. Presidente: - O Sr. Pereira de Lima requereu a urgencia sobre a renovação do seu projecto, de lei. Os Srs. Deputados que autorizam a urgencia requerida, quer dizer, que o projecto, em vez de ficar amanhã para segunda leitura, vá ser enviado á respectiva commissão, teem a bondade de. se levantar.

Foi approvado.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Hintze Ribeiro pede a publicação no Diario do Governo de uns documentos pelo Ministerio da Marinha.

Os Srs. Deputados que autorizam a referida publicação teem a bondade de se levantar.

Foi approvada a autorização.

O Sr. Ministro da Justiça (Francisco José de Medeiros): - Peço a V. Exa.; Sr. Presidente, que consulte a Camara sob se permitte que eu use da palavra antes da primeira parte da ordem do dia, para responder ao Sr. Deputado Tavares Festas.

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Vozes de todos os lados da Camara: - Fale! Fale!

O Sr. Presidente: - Em vista da manifestação da Camara pode V. Exa. usar da palavra.

O Sr. Ministro da Justiça (Francisco de Medeiros): - Sr. Presidente: agradeço em primeiro logar á Camara a bondade de que usou para commigo, permittindo que eu responda ás considerações feitas pelo illustre Deputado Sr. Tavares Festas.

Poucas palavras tenho a dizer a S. Exa. em resposta ás observações que fez.

Desde ha muito que sou amigo do illustre Deputado e tenho por S. Exa. a maior consideração. Invoco o proprio testemunho do Sr. Tavares Festas, com quem fiz durante largos annos uma excellente e leal camaradagem nesta Camara, onde pude apreciar os fulgores do seu talento e os primores do seu caracter. (Apoiados).

Dito isto, vou referir-me ao facto passado era Oliveira do Hospital, a que o illustre Deputado alludiu.

Devo dizer que desconheço inteiramente tal occorrencia, passada nessa comarca entre um escrivão e. o juiz de direito.

No entanto conheço esse magistrado. Sei que é integerrimo, de grande valor, que possue as mais altas qualidades de caracter, sempre digno e modesto. Isto posso eu assegurar a S. Exa. e estou certo de que o Sr. juiz de direito a que me refiro procedeu, relativamente ao facto mencionado, em harmonia com os ditames da sua consciencia. Mas para melhor me certificar disso mandei proceder á uma syndicancia minuciosa para averiguar a verdade dos factos, e se houver motivo para castigo, mandá-lo hei applicar áquelles que o mereçam.

Pode estar certo o illustre Deputado de que procederei como as circunstancias o exigirem e que procurarei mais uma vez e sempre desempenhar com inteira lealdade o cargo que exerço, em harmonia com os principios da justiça e os ditames da minha consciencia!

Tenho dito. (Vozes: - Muito bem).

(O orador não reviu).

O Sr. Ministro das Obras Publicas (Barjona de Freitas): - Peço a V. Exa., Sr. Presidente, que consulte a Camara sobre se permitte que eu tambem responda á observações feitas pelo Sr. Deputado Tavares Festas, referentes á pasta que tenho a honra de gerir.

O Sr. Presidente: - Os Srs. Deputados que entendem que devo dar a palavra ao Sr. Ministro das Obras Publicas para responder ao Sr. Tavares Festas antes da primeira parte da ordem dia teem a bondade de se le vantar.

Foi approvado.

O Sr. Ministro das Obras Publicas (Barjona de Freitas): - Sr. Presidente: em resposta ás considerações feitas pelo Sr. Deputado Tavares Festas, asseguro a S. Exa. que o regulamento de vinhos respeitante á região do Dão, a que S. Exa. pertence, será publicado o mais depressa possivel.

Tenho dito.

PRIMEIRA PARTE DA ORDEM DO DIA

Continuação da discussão do projecto de lei n.° 11 - Tratado de commercio com a Allemanha

O Sr. Presidente: - Vae entrar-se na segunda parte da ordem do dia.

Continua em discussão o parecer n.° 11.

Tem a palavra o Sr. Brito Camacho.

Previno V. Exa. de que tem 20 minutos ainda para terminar o seu discurso, alem de um quarto de hora que regimento lhe confere. Usando V. Exa. da palavra durante esse quarto de hora, termirá V. Exa. o seu discurso as cinco horas e um quarto.

O Sr. Brito Camacho: - Sr. Presidente: não farei, a proposito do tratado que se discute, uma dissertação larga sobre politica economica.

Ser-me-hia fácil repetir o que sobre o assunto se encontro em livros e revistas, enunciando de cor as soluções theoricas dos varios problemas que em toda a parte se impõem á consideração dos homens de Estado, por maneira a dar a impressão de um estudo que não fiz e de uma erudição que não possuo.

Coube-me em sorte, na sessão passada, discutir a lei das sobretaxas, a que dei o meu voto, lamentando que ella não fosse precedida de uma reforma total da pauta. Nenhuma duvida tenho em confessar, que essa lei armava o Governo de um bom instrumento para negociações commerciaes, contanto que d'ella fizesse um uso ponderado é intelligente.

Tambem me coube por sorte agora discutir o tratado com a Allemanha, apregoado com o melhor titulo de gloria do Sr. Presidente do Conselho. Foi elle assinado no Porto quando ali estava o Rei, e muito celebrou a coincidencia a imprensa de todos os matizes monarchicos, especialmente a que mais affecta se mostra sempre para com o Sr. Presidente do Conselho.

O enthusiasmo foi delirante quando se soube que a convenção fora assinada, e, como succede com frequencia, as pessoas mais enthusiasmadas eram as que a respeito d'ella estavam na mais profunda e cerrada ignorancia. Sabia-se vagamente o que era o tratado, muito vagamente, mas entoavam se louvores ao Sr. Ministro dos Estrangeiros, como se elle tivesse alcançado sobre a Allemanha um assinalado triunfo.

Não direi, porque dizendo-o faltaria á verdade que o tratado nada tem de bom; mas direi, sem receio de ser injusto, que elle de forma alguma justifica o com de louvores com que foi recebido.

Não é meu costume desmerecer no trabalho ou nas aptidões de quem quer que seja, mas julgo me no direito de dizer que teria sido possivel arrancar maiores vantagens ao Governo Allemão em troca das superiores vantagens que lhe damos.

Dadas as tendencias protecionistas que são hoje dominadoras em toda a parte, os tratados de commercio representam um elemento de defesa que é indispensavel utilizar da melhor maneira possivel. Mas é preciso não exagerar o valor dessa arma, attribuindo-lhe virtudes que ella não tem nem pode ter.

Nunca em Portugal se pensou a serio e de forma intelligente em fomentar a riqueza publica, e como saltava aos olhos de todos o espectaculo da nossa inferioridade em relação ao avanço dos outros, vá de pedir tratados de commercio, como se pede um remedio conhecido para curar um mal impertinente.

Foram sem duvida esses clamores que levaram os nossos Governos a empenhar-se na realização de tratados de commercio muito mais do que no fomento da riqueza publica.

A politica dos Estados é hoje essencialmente economica, e as velhas allianças perderam o caracter que tinham, para serem meramente convenções commerciaes, no género da que se está discutindo.

Um tratado de commercio representa para as nações que o fazer um meio de protecção e uma arma de defesa, mas não se deve esquecer que a melhor arma que um país pode ter para se aguentar vantajosamente na luta de interesses com os outros países é esta - produzir muito, produzir bom e produzir barato.

O nosso solo está muito longe de produzir o que é le-

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gitimo esperar da sua capacidade de producção: as nossa industrias são ainda balbuciantes, arrastando uma vida difficil, apesar 4a protecção que disfrutam; o nosso commercio está por organizar, e quasi nada fizemos ainda para estabelecer o ensino technico, sem o qual uma boa parte do nosso esforço de producção é consumido em pura perda.

Cingindo-me á analyse do tratado, observo em primeiro logar que elle foi de uma gestação muito demorada e muito difficil, pois andou em preparação durante dezaseis annos.

Não era por certo a Allemanha o país que mais se no impunha para a realização de um tratado de commercio embora ali as nossas mercadorias encontrassem o rigor d uma pauta quasi prohibitiva.

Mal se comprehende que ainda não tenhamos um tratado de commercio com o Brasil, e parece-me que muito difficilmente o teremos agora, visto a Allemanha não consentir que demos aos açucares brasileiros, um tratamento de favor.

Sempre os Governos Portugueses entenderam que no tratados a realizar com qualquer nação deviam resalvar o direito de favores especiaes para o Brasil. Estava isso já na tradição, que o presente tratado interrompeu, sem nenhuma vantagem compensadora.

A Allemanha não admitte que façamos um tratamento de favor para os açucares brasileiros, sob pena de considerar desde logo denunciada a convenção que estipulou comnosco.

Comprehende-se o interesse da Allemanha em colloca aqui os seus açucares de beterraba; mas comprehende-se tambem o interesse de Portugal em fazer com o Brasil um tratado de commercio, estreitando assim as relações de toda a ordem que mantém com aquella florescente Republica.

Será ainda possivel remediar o mal que vem de longe, e que se aggrava agora com o tratado em discussão?

Muito sinceramente o desejo, como do resto o desejam todos os portugueses, visto como para todos o Brasil e apenas, para alem do oceano, o prolongamento da pátria portuguesa.

A clausula referente ao açucar do Brasil torna o tratado contingente, mas outra estipulação ha n'elle que torna essa contingencia maior. Refiro-me ao numero do protocollo fina que diz respeito, ao systema de percepçcão dos imposto alfandegarios.

Estou convencido de que mais agora mais logo haver; necessidade de recorrer ao pagamento em ouro, na totalidade ou em parte, dos direitos aduaneiros; mas no dia em que o fizermos a Allemanha denuncia o tratado, que deixará de estar em vigor seis meses depois. Assim o Governo permittiu que se inserisse no tratado uma clausula que restringe a nossa liberdade monetaria, e está no animo de muitos dos politicos portugueses mais versados n'esta materia que nos teremos absoluta necessidade de recorrer a essa medida na primeira desordem cambial que ahi se produza.

Fico em duvida, estudando o tratado, qual a opinião do Governo sobre a possibilidade de se desenvolver a nossa marinha mercante.

Ou não sei interpretar o convénio, ou elle permitte aos navios allemães fazerem todo o nosso commercio de cabotagem, não simplesmente a grande cabotagem tal como a define o acto de navegação de 1900, mas a pequena cabotagem, o que vulgarmente se chama o commercio costeiro.

Nem se diga que o artigo 17.° do tratado já figurava na convenção de 1872, e tem sido constante em todos os projectos de tratado que constam do Livro Branco. A verdade é que elle contém a possibilidade de um monopolio em favor da marinha mercante, de Portugal.

Em 1898, o Governo Allemão offereeeu ao Governo Portugues um projecto de tratado de commercio; pois n'esse projecto as vantagens que a Allemanha pedia, no que respeita a commercio de cabotagem, eram muito mais limitadas do que as agora concedidas.

É possivel que ainda neste ponto interprete mal o tratado; mas, sinceramente o reputo perigoso para nos, monopolizando em favor da Allemanha o commercio dos fretes maritimos.

Se não estou em erro, apenas 3 por cento da importação e exportação commercial do nosso país se faz sob a bandeira portuguesa.

Chamo para o facto a attenção do Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros, porque um tal estado de cousas não pode continuar, a menos que renunciemos á pretensão de sermos alguma cousa no mundo.

Um navio estrangeiro pode, em qualquer porto, metter a carga que quiser mediante a irrisoria licença de 5$000 réis.

Um navio português não pode, em qualquer porto estrangeiro, metter carga sem pagar direitos de tonelagem, que se reduzem para os navios nacionaes a 50 por cento. Dá o tratado ao Governo á faculdade de alterar a pauta em muitos dos seus artigos, reduzindo-os em beneficio da Allemanha, conforme o estipulado na tabella B.

O Parlamento não pode, não deve dar ao Governo umas taes autorizações, reconhecendo embora a necessidade de modificar a pauta.

Ha dezaseis annos que vivemos em regime ferozmente proteccionista, e posto sejam mediocres os beneficios dessa protecção, ainda se pretende torná-la maior. Está escrito no Livro Branco que a pauta de 1892 já não protege eficazmente a industria e o commercio nacional, e que a conservar se deve ser usada como pauta minima.

Assim se explica que o Governo peça autorização para elevar ao dobro certos direitos pautaes, que passarão a representar, alguns d'elles, 146 por cento do valor da mercadoria.

Não podia o commercio deixar de erguer o seu protesto contra tal furia proteccionista, e já apparecem, effectivamente, a protestar perante a Camara o Centro Commercial do Porto e a Associação Commercial dos Lojistas de Lisboa.

Observa-me o Sr. Relator que não se trata de aumentar ou diminuir direitos, mas simplesmente da faculdade de poder faze-lo conforme as exigencias de momento. Perfeitamente de acordo; mas essa instabilidade da pauta constitue um grave transtorno para o commercio, que nunca saberá a que preço pode comprar e a que preço poderá vender.

Tive o cuidado de ler todo o Livro Branco, e não me arrependo de ter feito essa leitura. Em primeiro logar fiquei conhecendo o modo como foram encaminhados os negocios que levaram á realização do tratado que se discute, e depois informei- me ácerca de qual tem sido a orientação dos Governos Portugueses em materia de politica commercial.

Como traço caracteristico da nossa proverbial ligeireza de espirito, figura no Livro Branco o ofierecimento feito. 3elo Governo Português ao Governo Allemão de lhe vincular não a pauta em vigor, como elle queria, mas um projecto de pauta que estava sujeito ao exame e votação do Parlamento. O caso deve ter feito sorrir o Ministro alemão, a quem se fez a offerta, mas deve ter-lhe dado ao mesmo tempo a impressão, aliás justa, de que os Governos Portugueses nenhuma consideração teem pelo Parlamento, dispondo do seu voto como cousa sua. Seja rne permittido dizer, aproveitando o ensejo, que o meu empenho em ver discutido nesta sessão legislativa o tratado com o transvaal deriva apenas do meu desejo de ver restabelecido, cá dentro e lá fora, o prestigio das instituições par-

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lamentares. Um Parlamento que constanteraente abdica dos seus direitos é um Parlamento que se degrada, e tal é, infelizmente, o nosso caso.

Para os productores e commerciantes de vinhos do Porto o tratado é excellente, e não podem queixar-se d'elle os productores e commerciantes de vinhos da Madeira. A verdade deve sempre dizer-se, e a verdade é que o tratado, no que diz respeito a vinhos, não deixa talvez muito a desejar.

O mesmo se não pode dizer d'elle com respeito á cortiça, que todavia constituo um dos nossos mais valiosos artigos de exportação. A cortiça em bruto sairá para a Allemanha livre de direitos, e de lá nos virá, como já vem, a rolha, sem pagar direitos na alfandega. Somos, depois de Argelia, o país productor de cortiça que menor exportação faz deste producto manufacturado. Escuso encarecer o que isso significa para os interesses do productor e do industrial e ainda e principalmente para os interesses do operariado, que aos Governos devia merecer mais alguma solicitude. A Allemanha e a Inglaterra, sem terem cortiças, criaram uma industria rolheira, e de rolhas fornecem povos como o Japão, que devia ser nosso cliente directo.

Quero deixar ao Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros o tempo bastante não só para defender o tratado, que não é da sua responsabilidade, mas tambem para expor á Camara o seu plano de palitica economica, particularmente no que diz respeito a tratados de commercio. Oliveira Martins era de opinião que deviamos procurar restringir o mais possivel a nossa importação, e oppunha-se a que negociássemos qualquer tratado sobre a clausula unica de nação mais favorecida. Esta clausula é de um grande effeito para o publico, mas quem conhece, embora pela rama, estes assuntos, sabe muito bem que, alem de restringir muito a nossa liberdade de contratar, ella representa um grave prejuizo para os interesses do Thesouro, pela diminuição que importa nas receitas aduaneiras.

A commissão de tratados de commercio, conforme consta do Livro Branco, foi sempre de parecer que se deviam realizar acordos commerciaes sem estipulações a respeito da navegação, mas o negociador deste tratado pensou de modo contrario, e foi levado, como já procurei demonstrar, a comprometter gravemente o futuro da nossa marinha mercante.

Não quero alongar muito as minhas considerações, mas desejo ouvir a opinião do Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros a respeito da municipalização de seguros. Sabe S. Exa. que ha uma grande tendencia a municipalizar esse serviço, convertendo eni rendimentos municipaes os altos lucros que realizam as empresas de seguros.

O artigo 15.° do tratado, pela forma por que está redigido, pode talvez permittir a interpretação de que o Governo Português renuncia, em favor da Allemanha, ao direito de prohibir que exerçam aqui essa industria quaesquer individuos ou collectividades, transferindo esse serviço para os municipios.

Um ponto ainda para o qual desejo chamar a attenção do Sr. Ministro dos Estrangeiros é o que se refere ao indice remissivo da pauta, e constituo uma das reclamações da Associação dos Lojistas. É indispensavel que esse indice seja completo, o que não acontece ao actual, pobre de informações e permaittindo as mais desencontradas interpretações quanto á natureza.de certos artigos e sua classificação.

A nomenclatura scientifica e industrial dos artigos comprehendidos na pauta nunca será demasiadamente rigorosa, e só com escrupulos de rigor poderá evitar-se a anomalia tão frequente de certo artigo ser classificado, e tributado de uma forma em Lisboa e de forma differente no Porto, succedendo ás vezes ser classificado differenternente na mesma alfandega, conforme o verificador.

Muito teria ainda que dizer a respeito do tratado, mas a deficiencia da minha analyse será preenchida pelos oradores que se me seguirem. Sem nenhuma paixão, sem nenhum intuito de atacar alguem, tomando como pretexto o tratado, procurei mostrar os defeitos de um instrumento diplomático que tamanha importancia ha de ter na fortuna do país.

Pena foi que a respeito d'elle não tivessem sido ouvidas ás associações de classe, associações industriaes, de commercio e agricultura, porque sem duvida ellas teriam dado uma collaboração vantajosa, e o tratado viria á Camara mais são e escorreito do que saiu das mãos do negociador.

O Parlamento Portugues é demasiadamente burocrata: tem excellentes medicos, excellentes advogados, excellentes advogados, excellentes militares, excellentes engenheiros, excellentes professores, excellentes officiaes de secretaria, mas não tem excellentes technicos, homens do metier que em assuntos da sua especial competencia possam ser ouvidos com respeito.

Peço desculpa á Camara do tempo que lha tomei e agradeço-lhe a attenção com que me ouviu.

(O orador não reviu).

O Sr. Costa Lobo (por parte da commissão de agricultura) : - Mando para a mesa é parecer da mesma commissãò sobre a proposta de lei n.° 24-B de 1909, prorogando por mais dois annos o prazo a que se refere o § 2.° do artigo 22.° da carta de lei de 18 de setembro de 1908, relativo á suspensão da faculdade de plantar vinhas.

Foi a imprimir.

O Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros (Barbosa du Bocage):- Procurará responder, tão cabalmente quanto lhe permitiam as suas faculdades, ás observações de ordem particular feitas pelo illustre Deputado a quem responde, o Sr. Brito Camacho, com relação ao tratado de commercio com a Allemanha.

Procurará responder aos pontos concretos das observações, e depois dirá, tanto quanto lhe permitia a escassez do tempo, quaes são as suas ideias sob um ponto de vista mais largo, ácerca da nossa politica commercial, alargamento das relações de navegação, sobre os meios que nas relações entre as diversas nações podem procurar-se para fomento economico, para o desenvolvimento da riqueza publica, para o alargamento do nosso commercio e para a protecção das nossas industrias, especialmente para a industria agricola.

Não esquecendo, no entanto, que não pode nunca considerar isoladamente o Portugal continental com todo o nosso vastissimo dominio colonial, que tem uma larga e preponderante influencia no viver da nação portuguesa, e não pode considerar restrictara ente este fragmento da peninsula iberica que constituo a nação portuguesa, desprendendo os vastissimos territorios que estão sob o dominio da bandeira portuguesa.

E sem sair deste modo de ver, começará a responder ao Sr. Brito Camacho ácerca das considerações que S. Exa. fez a respeito do abandono parcial de um direito que para nos resalvámos ao negociar este tratado de commercio, sobre as concessões especiaes feitas ao Brasil.

Este direito está precisamente consignado no tratado. Resolveu-se por nina troca de notas simultaneas como é de uso ser em semelhantes casos: as menções de excepção, as explicações especiaes, as criações parciaes.

Em convenções desta natureza geralmente procura-se dar uma forma quanto possivel constante. As nações adoptam uns determinados typos e ao negociar-se ou tratar-se, ou se procura no tratado anterior que deixou de existir, clausulas e condições que podem subsistir ou se

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procura em outros já existentes a mesma forma, a mesma redacção, o mesmo typo.

Para não alterar este bom e pratico preceito que existe de não modificar senão aquillo. que as novas condições economicas impõem que se modifique, conserva-se simplesmente no mesmo texto do tratado a declaração de que nos era livre fazer ao Brasil concessões especiaes. Isto é: que a clausula da nação mais favorecida por nos concedida á Allemanha não se considerava quebrada quando fizéssemos ao Brasil concessões especiaes.

Impõe-nos a reserva com relação a Espanha a propria natureza do solo da peninsula iberica só com a Espanha temos a fronteira terrestre e a possibilidade do contrabando terrestre, e essa razão basta para que procuremos corrigir pelo direito convencional entre as duas nações os perigos, os riscos e as tentações do contrabando.

Esta razão, quando outras não houvesse, bastava pata que se resalvasse a Espanha. Mas temos as razões de sentimento, que tambem não podemos desfazer.

O Brasil é a continuação da nossa pátria. O Brasil fala a nossa lingua, tem a mesma historia. Muitos milhares de portugueses habitam o Brasil e trabalhando lá trazem a Portugal as suas economias. Razões dessa ordem são razões superiores que fazem dizer: que o sangue é mais pesado do que a agua e que a união do sangue é a união dos povos.

Não pode nenhum português que seja digno desse nome esquecer por um momento os laços de fraternidade ou paternidade que nos liga ao Brasil.

É Portugal um todo completo coto as suas colonias e ás suas ilhas adjacentes: são inseparaveis sob o ponto de vista economico.

Segue a affirmação do Sr. Brito Camacho quando S. Exa. disse que a nossa producção de açucar nas duas possessões de Angola e Moçambique, principalmente nesta, poderia bastar para as necessidades do consumo interno e, talvez com o tempo, abrir mercados para os açucares produzidos nas nossas colonias.

O crescimento da producção tem sido rápido e proveitoso, e o favor que nos offerecessemos ao Brasil seria um favor mentido, offereciamos o que amanhã não podiamos dar.

Como base unica e estavel nas relações economicas com o Brasil, dariamos um beneficio que havia de ser dado em proprio detrimento e prejuizo que devia faltar no dia em que a nossa producção de açucares for superior.

Deseja elle, orador, muitissimo alargar as nossas relações commerciaes, principalmente com o Brasil. Envida para conseguir tal fim todos os seus esforços. Logo no primeiro dia que entroli no Ministerio dos Negocios Estrangeiros affirmou ao illustre Ministro do Brasil, na nossa Corte, o seu sincero e decidido empenho para estabelecer com o Brasil as mais intimasse estreitas relações commerciaes. Procurará emquanto occupar o seu logar, com o maior esforço alargar as relações commerciaes, e nesse ponto pode a Camara ter a mais absoluta certeza. Para isso é preciso, pois, encontrar uma plataforma que não seja em nosso detrimento e não podemos fazer beneficios que não sejam reaes.

Neste tratado só tem a honra de o defender, porquanto o seu negociador foi o Sr. Wenceslau de Lima, actual Presidente do Conselho.

Referiu-se o Sr. Brito Camacho a outros pontos, designadamente á cortiça. A este respeito vae responder em poucas palavras.

É certo que a nossa maior exportação para a Allemanha é a cortiça em bruto, ou em prancha simplesmente aparada. Exportavamos até agora muito pouco em cortiça manufacturada. Á exportação de cortiça em bruto é livre, e no tratado nada se tinha a fazer. Emquanto á cortiça em obra o que podiainos fazer era lutar com armas iguaes, ás de outras nações concorrentes.

Dir-se ha talvez que havendo a clausula de nação inais favorecida podiamos pedir mais. Todavia, a politica economica da Allemanha, que é a de todas as grandes nações de grande intensidade commercial, é hoje a politica dos tratados de commercio, a politica das duas pautas: a pauta geral ou hostil e a pauta commercial ou benefica.

Querermos tambem impor uma orietação politica diversa d'aquella que é seguida, seria perfeitamente absurdo.

Não podendo nos sair da orientação geral das nações com quem havemos de tratar, teremos de acceitar a pauta hostil e procurar por meio de tratados de commercio obter os beneficios da pauta amiga e acolhedora para os nossos productos.

Este tratado visa precisamente a obter favores especiaes para productos que representam privilegio natural, como sé dá com os vinhos do Porto e da Madeira.

No tratado claramente se consigna a maneira de proteger os nossos vinhos contra a concorrencia desleal e fraudulenta.

Emquanto á cortiça dirá ainda que é desejo de todos nos desenvolver o fabrico porque lemos em casa materia prima excellente, mas não é por meio de um tratado de commercio que isso se pode fazer.

Referiu-se S. Exa. a uma interpretação que julga poder dar se á parte do tratado que fala sobre a cabotagem. Causa a S. Exa. serios cuidados o artigo 17.° dizendo que tal disposição consigna um privilegio á navegação allemã, contra o desenvolvimento da nossa navegação, que muito nos interessa e todos nos desejamos alargar, defender e melhorar.

Para procurar tranquiilizar S. Exa. pôr uma forma que não deve restar duvidas, lê o orador o incriminado artigo 17.° do tratado actual, presente ao Parlamento, e o artigo 14 ° do tratado anterior feito com a Allemanha em 1872. Vinte annos - acrescenta - esteve este tratado em vigor e nunca houve uma reclamação, uma duvida sobre a sua significação e alcance.

Sobre este ponto não ha duvidas, nem perigos. E a proposito lembra quanta conveniencia ha em se consignar nos tratados formulas identicas aos anteriores.

O Sr. Presidente: - Diz que decorreu o tempo destinado á primeira parte da ordem do dia. Continua S. Exa. amanhã com a palavra.

Vozes: - Fale, fale.

O Sr. Presidente: - Consulta a Camara sobre a preterição da ordem do dia.

A Camara decidiu affirmativamente.

O Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros (Barbosa du Bocage): - Agradece a manifestação da Camara, concedendo-lhe que por mais alguns minutos use da palavra.

Referindo-se ao aumento de tributação permittida pelas tabellas annexas ao tratado, demonstra que a Allemanha nos reconhece a faculdade de aumentar e reduzir a pauta.

Crê ter respondido se não completamente, pelo menos aos pontos concretos a que S. Exa. se referiu, mas como o Sr. Brito Camacho deseja bem como toda a Camara que elle, orador, alguma cousa diga sobre a sua orientação geral em materia de diplomacia economica, da melhor vontade falará. Não será longo. Dirá apenas que dada a situação em que hoje se encontram as relações economicas dos diversos povos, e dada a tendencia manifesta nas mais poderosas nações para o restabelecimento das pautas hostil e benefica, as nações como a nossa não podem deixar de enfileirar-se com as outras e procurar obter para si a applicação da pauta benéfica, concedendo os favores que pedem as nações poderosas de quem necessita.

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E a politica de tratados de commercio que é hoje o forçado correctivo da politica de hostilidades e de protecções que mais e mais se accentua em quasi todas as nações europeias.

Ha pouco ainda vimos a America elevar consideravelmente a sua pauta na intenção de estabelecer pautas convencionaes, concedendo favores a quem lhos concedesse.

No Parlamento francês, tambem ha pouco se debateu a necessidade de substituir e elevar a pauta proteccionista, porque a tendencia geral, hoje, não é a tendencia do livre cambio, é a tendencia do proteccionismo.

Não quer discutir em these essas duas theorias, mas tem que apreciá-las na hypothese do que ellas são, com applicação á situação actual e aos primeiros dez annos do seculo XX que em materia de politica economica estão bem longe já dos tempos saudosos em que elle, orador, se encontrava nesta Camara com o seu querido amigo Oliveira Martins.

Deve dizer - porque é verdade - que a politica economica então adoptada tinha no espirito de Oliveira Martins e em muitos dos que o acompanharam, a sua maioria mesmo, a mim, a ideia, num correctivo: no estabelecimento de tratados commerciaes.

A maioria de tratados de commercio, porem, nunca chegaram a realizar-se. Criaram-se, assim, falsas industrias que não teem na vida economica da nação razão de ser, que são como um producto de estufa, especie de orchidea conservada com exagerado aquecimento, que morre quando lhe falta alimento: quando lhes faltam as pautas protectoras - industrias que não teem raizes, que não devem existir. Mas essas industrias criaram-se e vivem; ligaram-se-lhes interesses, e a politica economica da nação não pode ser destruida de um jacto porque os capitães foram applicados ao abrigo da lei.

Assegura que no Ministerio dos Estrangeiros nem um só dia se passa sem que se occupe de tratados de commercio com todas as nações com que é possivel negociá-los; entende, porem, que para o alargamento das nossas relações commerciaes muito contribue, como pcderoso elemento, a navegação.

Julga inutil encarecer a difficuldade do problema quando a tendencia geral é a do navio immenso e rapido, mas crê que deve pensar-se em que já é, importante factor o desenvolvimento grande que tem tido a navegação dos nossos portos e que, na escala das nações cujo movimento cresce desde 1888 a 1905, Portugal occupa o segundo logar, tendo sido, apenas, excedido pelo Japão.

Entretanto para que tudo se consiga, como é desejo de todos, é necessario que o esforço a empregar seja commum e que a divisa a seguir seja: pelo provir e pelo bem-estar do país.

(O discurso será publicado na integra quando o orador restituir as notas tachygraphicas).

O Sr. Presidente: - Vae passar-se á segunda parte de ordem do dia.

Continua em discussão o artigo 3.° do parecer n.° 8.

(Pausa).

Como ninguem pede a palavra vae votar-se.

O Sr. Brito Camacho: - Peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Brito Camacho.

O Sr. Brito Camacho: - Não tencionava falar segunda vez sobre o projecto que se discute; mas tendo tomado a iniciativa de uma proposta de inquerito que mereceu acolhimento favoravel da parte do illustre relator e do titular da pasta da Fazenda e que lá foi recebida com um certo azedume e má vontade, precisa consignar que a sua intenção foi apenas contribuir para que não ficasse sobre a administração da Caixa Geral de Depositos a mais leve sombra de suspeita.

O facto de durante dezaseis annos não se publicarem relatorios nem contas é que podia levar a suspeições, embora hoje se diga que a situação é desafogada e prospera.

Depois de apresentada a minha proposta appareceu publicado um folheto, cuja autenticidade não pode ser contestada, em que um antigo empregado da Caixa vem dizer que se davam irregularidades, fraudes, que largamente historia, e este facto ainda mais indispensavel, se é possivel, torna o inquerito que propôs e que, a meu ver, não pode ser desprezado porque vae nisso não só o interesse , da Caixa e do Thesouro, mas a tranquilidade dos depositantes.

Entendo, portanto, que o inquerito que propus deve effectuar-se, mesmo que o projecto volte para a commissão para ter, segundo ouvi, o mesmo destino do das casas baratas.

O Sr. Ministro da Fazenda (Paula de Azeredo): - Sr. Presidente: pedi a palavra para dizer alguma cousa sobre as considerações que acaba de fazer o Sr. Brito Camacho.

S. Exa. apresentou uma proposta de inquerito numa das sessões passadas e hoje quis resalvar o mau effeito que, porventura, essa proposta pudesse ter na opinião publica relativamente á confiança que a Caixa Geral de Depositos deve merecer.

Agradeço a S. Exa. as boas intenções com que fez referencia á sua proposta, entretanto esta questão de lançar o credito ou o descredito sobre uma instituição não está unicamente dependente de declarações mais ou menos favoraveis que se possam fazer em qualquer assembleia (Apoiados), sobretudo desde o momento em que essas declarações, embora favoraveis, sejam contraditadas por factos que necessariamente hão de produzir o descredito.

Eu já disse que desde o momento em que era proposto o inquerito não me oppunha a elle; não posso, não quero oppor-me.

Entretanto, nessa occasião disse tambem que se me encontrasse na situação do Sr. Brito Camacho teria hesitado muito antes de fazer uma tal proposta, e teria hesitado precisamente pelas razões que S. Exa. acaba de expor; portanto, o meu modo de ver sobre a necessidade do inquerito estava bem definido pelas palavras que então pronunciei.

Não considerava o inquerito necessario, não o considero hoje; mas desde o momento em que elle é proposto, desejo deixar inteira liberdade á Camara, liberdade que de resto não posso coarctar.

Somente quis significar que se uma questão de deferencia para com o Ministro ou os empregados da Caixa podia influir no animo da Camara, eu desejava libertá-la dessa influencia e queria que resolvesse na perfeita independencia de toda e qualquer pressão.

Alludiu S. Exa. a revelações lidas num folheto que lhe foi distribuido, folheto feito por um empregado da Caixa, de ha 27 annos.

É muito extraordinario que um empregado da Caixa, que afinal é indiscutivelmente um estabelecimento bancario, venha para publico com declarações sobre o que se passa dentro d'ella sem fazer d'ellas sciente nem o administrador da Caixa, nem o Ministro da Fazenda, seus superiores hierarchicos e responsaveis, mas eu ponho essa questão de parte e apenas farei notar que não é menos extraordinario que um empregado da Caixa assista callado a todas essas irregularidades durante vinte e tantos annos e só se lembre de as assoalhar no dia em que não foi nomeado thesoureiro como desejava. (Apoiados).

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Isto inquina de uma maneira evidente todas as declarações.

Mas vejamos quaes são essas declarações. Parece que são revelações de cousas extraordinarias, que ninguem sabe.

Não é assim. Que a administração da Caixa não corria com grande regularidade, sabe-se de ha muito.

O que trouxe á tela da discussão essas irregularidades foi precisamente o esforço que se fez para acabar com ellas.

No dia em que o administrador da Caixa se lembrou de pôr a claro toda a historia do estabelecimento a seu cargo durante os ultimos annos, desde que entendeu que devia regularizar a escrita e fornecer ao publico elementos para apreciar .º que ali se passava, é precisamente que todos criticam o que sem protesto se passou na Caixa durante tantos annos.

Qual será o administrador da Caixa, ou de outro estabelecimento, que ousará vir dizer para publico o que lá se passa?

Immediatamente começariam criticas interminaveis e por fim viria o inquerito, que, por mais que quisessem dizer que não era dirigido contra elle não podia deixar de o magoar.

Mas ha mais, a accusação grave é que na caixa forte estavam os valores mal acondicionados.

É preciso ver nesse folheto, que o illustre Deputado o Sr. Brito Camacho teve a amabilidade de me dizer que existta, mas de que tive difficuldade em obter, por emprestimo, um exemplar, qual é a grande accusação.

Não se diz que na caixa forte faltem objectos, affirma-se que estavam mal arrumados. Ora, infelizmente, succede isso em muitas caixas fortes, não só nas do Estado, mas de empresas particulares, e emquanto a atrasos de escrituração perdõe-me S. Exa., mas creia que ha muitas casas commerciaes e das mais importantes, em que, por vezes, a escrita está mais atrasada do que S. Exa. imagina.

Não quero com isto defender de maneira nenhuma os atrasos que houve na Caixa.

O balanço á caixa forte fez-se, e posso dizer que, segundo informações que me foram fornecidas pela administração e contra o que se podia suspeitar, não faltou cousa alguma.

O que tem havido pois é este defeito muito nosso, negligencia e abandono, mas não houve falta de fidelidade. E devo ainda notar que é facil de comprehender como isto tem succedido.

O fazer-se a verificação da caixa forte era tarefa para muitos dias e muitos meses. Sei que se estava procedendo a elle, não se fez mysterio: no Diario do Governo pela designação das tarefas se vê as que foram dedicadas para este serviço.

As regras de escrituração adoptadas na Caixa desde o seu inicio eram deficientes, e ainda hoje o são em parte.

Os objectos entravam por assentamento, que era a regra estabelecida, de modo que passados annos, quando os assentamentos eram ás dezenas e centenas de milhares, não tendo havido o cuidado de fazer contas correntes especiaes ou extractos desses assentamentos, a verificação tornava-se difficil e ainda hoje alguns casos antigos são extremamente difficeis de apurar.

Por isso comprehende-se que quando se diz que a escrituração não existia não se diz a verdade, embora, pelo modo como estava arrumado em milhares de livros, o resultado pratico fosse o, mesmo que dizer que não se podiam verificar muitas folhas sem um improbo labor.

O director da Caixa Geral desde que tomou conta do logar tem procurado remediar estes inconvenientes.

Não tem havido falta de honestidade e seriedade, só tem havido falta de iniciativa para corrigir erros que veem desde o inicio da Caixa.

São estas as considerações que tinha a fazer, de resto só tenho que agradecer a boa intenção com que no principio do seu discurso o Sr. Brito Camacho quis mostrar a honestidade com que são feitas as transacções da Caixa, para que não ficasse no espirito publico má impressão, e isso seria tanto mais deploravel quanto é certo que a Caixa precisa estabelecer ramificações por todos os pontos do país, diffusão que seria inutil desde o momento que elle não inspirasse confiança ás populações e corporações locaes.

A respeito da sorte que aguarda o projecto, permitta-me S. Exa. que lhe diga que quando tive a honra de falar pela primeira vez sobre o assunto declarei em que pontos julgava indispensavel ou facultativa a sua approvacão, mas depois do que se tem passado acrescentarei que hoje convem que o projecto passe com as emendas que a commis-são entenda dever acceitar, porque depois de toda a discussão que tem havido, uma syndicancia e rejeição do projecto, deixando ficar por fazer a respectiva liquidação, e por mais tempo em aberto a divida do Estado, são factos que terão duras referencias sobre o credito e a situação da Caixa, que, podendo e devendo ser prosperas, ficarão em situação precaria.

Por isso repito: depois do que se tem passado, entendo que a Camara deve approvar o projecto.

Tenho dito. (Vozes: - Muito bem).

(O orador não reviu).

O Sr. Rodrigues Nogueira: - O Sr. Brito Camacho fez referencia á minha adhesão ao inquerito á administração da Caixa.

Já declarei que o acceitava em meu nome pessoal e não em nome da commissão. Acceitei-o pela seguinte razão:

V. Exa. sabe que faz parte do conselho fiscal uma pessoa das minhas relações e da minha familia.

Desde que se propunha um inquerito que ia apreciar os seus actos, eu não podia rejeitar essa proposta.

O Sr. Presidente: - Está esgotada a inscrição. Vae ler-se, para ser votado, o artigo 3.° do projecto.

Lê-se na mesa. Consultada a Camara, é approvado. São lidos e approvados sem discussão, sucessivamente, os artigos 4.°, 5.° e 6.° do projecto.

O Sr. Queiroz Velloso: - Envia para a mesa a seguinte

Proposta

Proponho a seguinte substituição ao artigo 7.° da base 3.ª do projecto de lei relativo á Caixa Geral de Depositos e Instituições de Previdencia:

"Artigo 7.° O conselho da Caixa Geral de Depositos e Instituições de Previdencia compõe-se de cinco membros: um Deputado, eleito pela Camara dos Deputados; um Par do Reino, eleito pela Camara dos Pares; um vogal effectivo do Supremo Tribunal Administrativo, eleito pelo mesmo tribunal; um vogal effectivo da Junta do Credito Publico, eleito pela mesma junta; e o director geral da Thesouraria". = O Deputado, Queiroz Velloso.

Foi admittida.

São lidas na mesa.

O Sr. Rodrigues Nogueira (relator): - Pelas considerações feitas por mim, em harmonia com a commissão de fazenda, na resposta ao discurso do Sr. Abel Andrade, em que criticou a constituição do conselho fiscal, a commissão não pode acceitar as propostas de emenda que acabam de ser lidas.

O Sr. Presidente: - Está approvado o projecto. Estão sobre a mesa differentes propostas de emenda, sobre as quaes a Camara resolveu que opportunamente se havia de pronunciar.

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Desde que se votou o projecto, ha dois caminhos a seguir: ou desde já a Camara pronunciar se sobre essas emendas ou irem á commissão.

O Sr. Rodrigues Nogueira (relator): - O requerimento do Sr. Abel Andrade, pela forma como foi redigido, não obrigava a ida das emendas á commissão. Todas as vezes que os oradores mandaram quaesquer emendas, eu tive o cuidado de, sobre cada proposta, emittir o parecer da commissão.

Portanto, a Camara, já conhece o parecer da commissão sobre as emendas.

O Sr. Presidente: - Vou pôr á votação successivamente as propostas de emendas enviadas á mesa.

O Sr. Affonso Costa: - Mando para a mesa o seguinte

Requerimento

Requeiro a contagem. = Affonso Costa.

(Pausa).

É lido na mesa.

O Sr. Presidente: - Vae proceder-se á contagem.

(Pausa).

O Sr. Presidente: - Estão na sala 45 Srs. Deputados, numero insufficiente para continuar a sessão.

A proxima sessão é amanhã, 21, á hora regimental, com a mesma ordem do dia que estava dada para hoje.

Está encerrada a sessão.

Eram 6 horas e 15 minutos da tarde.

Documentos mandados para a mesa nesta sessão

Proposta de lei enviada para a mesa pelo Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros

Proposta de lei n.° 28-A

Senhores. - As convenções de arbitragem que tenho a honra de submetter á vossa esclarecida apreciação são quatro e celebraram-se com os Governos das seguintes nações da Noruega, do Brasil, da Argentina e Nicarágua.

As mais das clausulas de que taes acordos se compõem figuram em convenções da mesma indole e caracter, por nos anteriormente celebradas. Não tenho neste momento portanto de occupar-me d'ellas. Mereceram já a superior approvação do Parlamento. Referir-me-hei pois somente ás clausulas que se não encontram senão em um ou outro ou em nenhum dos acordos anteriormente approvados. Será escusado affirmar que essas differencas, a que não tivemos duvida em assentir, pois nenhuma vantagem haveria em negar-lhes assentimento e nenhum inconveniente em dá-lo, differenças quasi sempre determinadas pelas condições especiaes dos países com quem os celebrámos, são, como vereis, poucas e reduzem-se ao seguinte:

Sa Majesté le Roi de Portugal et des Algarves et Sa Majesté le Roi de Norvège désirant, en application des principes enoncés aux articles 15-19 de la Convention pour le reglement pacifique des conflits internationaux, conclue à la Haye le 29 juillet 1899, entrer en negociations pour la conclusion d'une Convention d'arbitrage obligatoire, ont nommé pour leurs Plénipotentiaires, savoir:

Sa Majesté le Roi de Portugal et des Algarves: le sous-signé, Son Ministre des Affaires Étrangères; et

A convenção concluida com a Noruega, em razão de successos politicos de todos conhecidos e sem embargo da. que existia com a Suécia, inclue um protocbllo de assinatura attribuindo a cada uma das altas partes contratantes a faculdade de apreciar se a divergencia entre ellas produzidas entende ou não com sua independencia e affirmando que por esta convenção se não revogam as disposições do artigo 16.° do tratado de commercio de 31 de dezembro de 1895. Analogo protocollo existiu e existe na alludida convenção de arbitragem com a Suecia e mereceu a approvação das Côrtes.

O artigo 2.°, que não existe em outra convenção de arbitragem, entrega ao tribunal de Haya a resolução do desacordo que se manifeste a este respeito quando directamente o não possam obter as partes interessadas. Está esta clausula plenamente de acordo com o espirito e a letra da convenção da Haya (1899) por nos approvada e ratificada e de cujo artigo. 19.° procedem, como se sabe, todas estas convenções. Nenhuma hesitação poderia pois haver da nossa parte em acceitar tal clausula.

O artigo 1.° da convenção com o Brasil estabeleceu em principio como arbitro nos desacordos que se produzam o tribunal permanente de Haya. É esta a doutrina preexistente para todos os signatarios da conferencia da Haya. Permitte todavia recurso previo a Chefe de Estado amigo, ou a arbitros particulares e alheios a esse tribunal. Esta innovacão limita-se a consignar doutrina que não offerece nem pode offerecer duvida.

O artigo 2.° reserva para as duas casas do Congresso Brasileiro a ratificação dos compromissos arbitraes que em recursos ao arbitro hajam de firmar as partes em litigio. Esta clausula é determinada por especial disposição da lei fundamental brasileira. Igual reserva existe na convenção ha pouco celebrada com os Estados Unidos e foi approvada.

Allude-se. no preambulo á intimidade das relações de toda a ordem e á perfeita harmonia do sentir entre os dois povos ligados por tão estreitos laços. A solemne affirmação de um facto, que o futuro confirmará sempre, tem por certo no documento de que se trata justa e optima cabida.

Pela razão supra indicada com respeito á Republica dos Estados Unidos do Brasil insere-se nas convenções de arbitragem com a Argentina e Nicaragua igual reserva relativa aos compromissos arbitraes determinada por motivo igual.

Ainda uma observação. As convenções com a Republica Brasileira e com a Argentina alludem á convenção de arbitragem da Haya de 1907 que ainda não foi por nós ratificada. Mas os artigos d'ella a que se allude, existem na de 1899, que por nos foi approvada e devidamente ratificada em 25 de agosto de 1900.

Tenho pois a honra de submetter á vossa approvação o seguinte

Artigo 1.° São approvadas, para serem ratificadas pelo poder executivo, as convenções de arbitragem celebradas tias datas n'ellas indicadas com a Noruega, os Estados Unidos do Brasil, a Republica de Nicaragua e a Republica Argentina.
Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario. Secretaria de Estado dos Negocios Estrangeiros, em 20 de agosto de 1909. = Carlos Roma du Bocage.

(Traducção)

Sua Majestade o Rei de Portugal e dos Algarves e Sua Majestade o Rei da Noruega, desejando, em applicação dos principios enunciados nos artigos 15.°-19.° da Convenção para solução pacifica dos conflictos internacionaes, celebrada na Haya aos 29 de julho de 1899, encetar negociações para conclusão de uma Convenção de arbitragem obrigatoria, nomearam por seus plenipotenciarios, a saber:

Sua Majestade o Rei de Portugal e dos Algarves: o abaixo assinado, Seu Ministro dos Negocios Estrangeiros e

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Sa Majesté le Roi de Norvège: le soussigné, Son Envoyé Extraordinaire et Ministre Plénipotentiaire près Sa Majesté Tres Fidèle;

Lesquels, après s'être communiqué leurs pleins pouvoris, trouvés en bonne et due forme, sont convenus des articles suivants:

ARTICLE 1

Les differends qui viendraient à se produire entre les Hautes Parties Contractantes et qui n'auraient pu être réglés par la voie diplomatique, seront soumis à la Cour Permanente d'Arbitrage établie par la Convention du 29 juillet 1899, à la Haye, à la condition toutefois qu'ils ne mettent en cause ni les intérêts vitaux, ni l'indépendance des États Contractants, et qu'ils ne touchent pas aux intérêts de tierces Puissances.

ARTICLE II

En cas de divergence ser le point de savoir si le différend qui se será produit met en cause les intérêts vitaux de l'une ou l'autre des Hautes Parties Contractantes et de ce chef doit être compris parmi ceux qui, aux termes de l'article procédent, sont exceptés da l'arbitrage obligatoire, la dite divergence sera soumise à la Cour d'Arbitrage susnommée.

ARTICLE III

Dans chaque cas particulier les Hautes Parties Contractantes, avant de s'adresser à la Cour Permanente d'Arbitrage, signeront un compromis spécial, determinant nettement l'object du litige, l'étendue des pouvoirs des Arbitres et les délais à observer en ce qui concerne la constitution du Tribunal Arbitral et la procédure.

ARTICLE IV

La présente Convention, qui será ratifiée, est conclue pour une durée de cinq années, à partir de l'échange des ratifications, qui aura lieu aussitôt que faire se pourra. Dans le cas ou aucune des Hautes Parties Contractantes n'aurait notifié, six mois avant la fin de la dite période, son intention d'en faire cesser les effets, la Convention demeurera obligatoire jusqu'à l'expiration d'une année à partir du jour ou l'une ou l'autre des Hautes Parties Contractantes l'aura dénoncée.

En foi de quoi les Plénipotentiaires ont signé la presente Convention et y ont apposé leurs cachets.

Fait á Lisbonne, en double expédition, le huit décembre mil neuf-cent huit.

(L. S.) Wenceslau de Lima.
(L. S.) Wedel Jarlsberg.

Protocole de signature

Au moment de proceder à la signature de la Convention d'arbitrage conclue à la date de ce jour, les Plenipotentiaires soussignés déclarent qu'il est entendu qu'il appartient à chacune des Hautes Parties Contractantes d'apprécier si un differend qui se será produit met en cause son indépendance et par conséquent est de nature à être excepté de l'arbitrage obligatoire, et qu'il est en outre entendu que la Convention n'abroge pas les dispositions de l'article 16, du traité de commerce entre la Norvège et le Portugal, conclu à Lisbonne le 31 décembre 1895.

En foi de quoi les Plenipotentiaires respectifs ont dressé le présent Protocole de signature qui aura la même force et la même valeur que si les dispositions qu'il contient étaient inserées dans la Convention elle même.

Fait à Lisbonae, en double expedition, le huit décembre mil neuf-cent huit.

(L. S.) Wenceslau de Lima.
(L. S.) Wedel Jarlsberg.

Sua Majestade o Rei da Noruega: o abaixo assinado Seu Enviado Extraordinario e Ministro plenipotenciario junto de Sua Majestade Fidelissima.

Os quaes, depois de haverem reciprocamente communicado os seus plenos poderes, achados em boa e devida forma, convieram nos artigos seguintes:

ARTIGO I

As divergencias que venham a dar-se entre as Altas Partes Contratantes e não tenham podido resolver-se pela via diplomática serão sujeitas ao tribunal permanente de arbitragem instituido na Haya em virtude da Convenção de 29 de julho de 1599, comtanto que não entendam com os vitaes interesses e a independencia dos Estados Contratantes e que não affectem os interesses de terceira Potencia.

ARTIGO II

Em caso de desacordo sobre o ponto de saber se a divergencia que se tiver dado entende com os vitaes interesses de uma ou outra das Altas Partes Contratantes, e deve por isso ficar comprehendida nas que, segundo o artigo anterior, são exceptuadas da arbitragem obrigatoria, será mesmo desacordo submettido ao Tribunal de Arbitragem acima citado.

ARTIGO III

Para cada caso particular e antes de recorrerem ao Tribunal Permanente de Arbitragem, assinarão as Altas Partes Contratantes um compromisso especial em que se defina claramente o assunto em litigio, o alcance das faculdades dos arbitros e os prazos que tenham de adoptar-se no que respeita á constituição do Tribunal Arbitrai e ás normas do processo.

ARTIGO IV

A presente Convenção, que será ratificada, ficará em vigor durante cinco annos, contados da troca das ratificações, que se effectuará o mais breve que for possivel. No caso de nenhuma das Altas Partes Contratantes notificar, seis meses antes de expirar o periodo acima indicado, a sua intenção de fazer cessar os effeitos da mesma Convenção, ficará esta em vigor durante um anuo, contado do dia em que uma ou outra das Altas Partes Contratantes a tiver denunciado.

Em fé do que os Plenipotenciarios assinaram e sellaram a presente Convenção.

Feita em Lisboa, em duplicado, a 8 de1 dezembro de 1908.

(L. S.) Wenceslau de Lima.
(L. S.) Wedel Jarlsberg.

Protocollo de assinatura

No momento de proceder á assinatura da Convenção de arbitragem celebrada nesta data, os Plenipotenciarios abaixo assinados declaram dever entender-se que a cada uma das Altas Partes Contratantes compete apreciar se, qualquer divergencia occorrida entende com a sua independencia e é, por consequencia, de natureza tal que tenha de exceptuar se da arbitragem obrigatoria, e que a convenção não revoga as disposições do artigo 16.° do tratado de commercio entre Portugal e a Noruega, celebrado em Lisboa a 31 de dezembro de 1895.

Em fé do que os respectivos Plenipotenciarios lavraram o presente protocollo de assinatura, o qual terá a mesma força e valor que teria se as disposições que contém estivessem inseridas na propria convenção.

Feito em Lisboa, em duplicado, a 8 de dezembro de 1908.

(L. S.) Wenceslau de Lima.
(L. S.) Wedel Jarlsberg.

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SESSÃO N.° 49 DE 20 DE AGOSTO DE 1909 17

Convenção de arbitramento entre Portugal e o Brasil Convenção de arbitramento entre o Brasil e Portugal

Sua Majestade El-Rei de Portugal e dos Algarves e o Presidente da Republica dos Estados Unidos do Brasil:

Considerando que a perfeita harmonia das intenções e a absoluta cordealidade dos sentimentos que entre si unem Portugal e o Brasil requerem a realização de quanto possa concorrer para mais claramente confirmar a sinceridade e assegurar a permanencia de taes intenções e sentimentos, e para manter e mais dilatar, se é possivel, as intimas relações politicas e economicas das duas nações;

Considerando que para tão justos fins devem contribuir efficazmente a maior facilidade e presteza na solução de quaesquer desacordos que acaso possam dar-se entre ellas;

Resolveram concluir uma Convenção de Arbitramento, em conformidade com os principios enunciados nos artigos 15.° a 19.° e 21.° da Convenção para o concerto pacifico dos conflictos internacionaes assinada na Haya aos 29 de julho de 1899 e nos artigos 37.° a 40.° e artigo 42.° da que, com o mesmo objecto, foi tambem assinada na Haya aos 18 de outubro de 1907;

E para tal fim nomearam por seus Plenipotenciarios, a saber:

O Presidente dos Estados Unidos do Brasil, o Sr. José Maria da Silva Paranhos do Rio Branco, Ministro de Estado das Relações Exteriores; e

Sua Majestade. El-Rei de Portugal e dos Algarves, o Sr. Conde de Selir, Seu Enviado Extraordinario e Ministro Plenipotenciario em missão especial no Brasil;

Os quaes, devidamente autorizados, convierám nos seguintes artigos:

ARTIGO I

Os desacordos que occorrerem entre as duas Altas Partes Contratantes sobre questões de caracter juridico ou relativas á interpretação de tratados em vigor, existentes ou que venham a existir entre ellas, e que não tenham podido resolver-se por via diplomatica, serão submettidos ao Tribunal Permanente de Arbitragem instituido na Haya em virtudeda Convenção de 29 de julho de 1899, comtanto, porem, que as referidas questões nada envolvam que entenda com os interesses vitaes, a independencia ou a honra de um ou outro dos Estados Contratantes ou com interesses de outro Estado, e ficando, alem disso, entendido que, se uma das duas Partes o preferir, qualquer arbitramento motivado pelas questões a que se refere a presente Convenção se realizará perante um Chefe de Estado ou um Governo amigo, ou perante um ou mais arbitros sem limitação aos que fazem parte das listas do precitado Tribunal Permanente da Haya.

ARTIGO II

Em cada caso particular, antes de recorrerem a algum arbitro singular, ao Tribunal Permanente da Haya ou a outros arbitros, as duas Altas Partes Contratantes assinarão um compromisso especial que claramente determine a materia do litigio, a extensão dos poderes do arbitro ou arbitros e as condições que hajam de ser observadas no tocante aos prazos para a constituição do tribunal ou a escolha do arbitro ou arbitros, assim como aos tramites do processo arbitral.

Fica entendido que os compromissos especiaes só poderão ser ratificados pelo Presidente dos Estados Unidos do Brasil com a approvação das duas Camarás do Congresso Nacional.

ARTIGO III

A presente Convenção vigorará, pelo espaço de cinco annos contados do dia da troca das ratificações. Se não for denunciada seis meses antes do vencimento desse prazo, continuará em vigor durante um novo periodo de cinco annos e assim successivamente.

O Presidente da Republica dos Estados Unidos do Brasil e Sua Majestade El-Rei de Portugal e dos Algarves:

Considerando que a perfeita harmonia das intenções e a absoluta cordealidade dos sentimentos que entre si unem o Brasil e Portugal requerem a realização de quanto possa concorrer para mais claramente confirmar a sinceridade assegurar a permanencia de taes intenções e sentimentos, e para manter e mais dilatar, se é possivel, as intimas relações politicas e economicas das duas nações;

Considerando que para tão justos fins devem contribuir èificazmente a maior facilidade e presteza na solução de quaesquer desacordos que acaso possam dar-se entre ellas;

Resolveram concluir uma Convenção de Arbitramento, em conformidade com os principies enunciados nos artigos 15.° a 19.° e 21.° da Convenção para o concerto pacifico dos conflictos internacionaes assinada na Haya aos 29 de julho de 1899 e nos artigos 37.° a 40.° e artigo 42.° da que, com o mesmo objecto, foi tambem assinada na Haya aos 18 de outubro de 1907;

E para tal fim nomearam por seus Plenipotenciarios, a saber:

Sua Majestade El-Rei de Portugal e dos Algarves, o Sr. Conde de Selir, Seu Enviado Extraordinario e Ministro Plenipotenciario em missão especial no Brasil; e

O Presidente dos EstadosUnidos do Brasil, o Sr. José Maria da Silva Paranhos do Rio Branco, Ministro de Estado das Relações Exteriores;

Os quaes, devidamente autorizados, convierám iios seguintes artigos:

ARTIGO I

Os desacordos que cccorrerem entre as duas Altas Partes Contratantes sobre questões de caracter juridico ou relativas á interpretação de tratados em vigor, existentes ou que venham a existir entre ellas, e que não tenham podido resolver-se por via diplomatica, serão submettidos ao Tribunal Permanente de Arbitragem instituido na Haya em virtudes da Convenção de 29 de julho de 1899, comtanto, porem, que as referidas questões nada envolvam que entenda com os interesses vitaes, a independencia ou a honra de um ou outro dos Estados Contratantes ou com interesses de outro Estado, e ficando, alem disso, entendido que, se uma das duas Partes o preferir, qualquer arbitramento motivado pelas questões a que se refere a presente Convenção se realizará perante um Chefede Estado ou um Governo amigo, ou perante um ou mais arbitros sem limitação aos que fazem parte das listas do precitado Tribunal Permanente da Haya.

ARTIGO II

Em cada caso particular, antes de recorrerem a algum arbitro singular, ao Tribunal Permanente da Haya ou a outros arbitros, as duas Altas Partes Contratantes assinarão um compromisso especial que claramente determine a materia do litigio, a extensão dos poderes do arbitro ou arbitros e as condições que hajam de ser observadas no tocante aos prazos para a constituição do tribunal ou a escolha do arbitro ou arbitros, assim como aos tramites do processo arbitral.

Fica entendido que os compromissos especiaes só poderão ser ratificados pelo Presidente dos .Estados Unidos do Brasil com a approvação das duas Camaras do Congresso Nacional.

ARTIGO III

A presente Convenção vigorará pelo espaço de cinco annos contados do dia da troca das ratificações. Se não for denunciada seis meses antes do vencimento desse prazo, continuará em vigor durante um novo periodo de cinco annos e assim successivamente.

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18 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

ARTIGO IV

Preenchidas as formalidades exigidas pelas leis constitucionaes em cada um dos dois países, será esta Convenção ratificada por Sua Majestade El-Rei de Portugal e dos Algarves e pelo Presidente dos Estados Unidos do Brasil, e a troca das ratificações será feita na cidade do Rio de Janeiro no mais breve prazo possivel.

Em fé do que, nos, os Plenipotenciarios acima nomeados, assinamos o presente instrumento em dois exemplares, appondo n'elles os nossos sellos, na cidade de Petropolis, aos 25 dias do mês de março de 1909.

(L. S.) Conde de Selir.
(L. S.) Rio Branco.

Sua Majestade El-Rei de Portugal e dos Algarves e Sua Excellencia o Presidente da Republica de Nicarágua, desejando, de acordo com os principios enunciados nos artigos 15.° a 19.° da Convenção para solução pacifica dos conflictos internacionaes, assinada na Haya em 29 de julho de 1899, celebrar uma Convenção de arbitragem, nomearam para tal fim por seus Plenipotenciarios, a saber:

Sua Majestade o Rei de Portugal e dos Algarves ao Sr. Carlos Roma du Bocage, Coronel do Estado Maior de Engenharia, Par do Reino, Seu Ajudante de Campo Honorario, Ministro e Secretario de Estado dos Negocios Estrangeiros, Grande Official da Real Ordem Militar de S. Bento de Avis, Commendador da Ordem de S, Tiago, do merito scientifico, literario e artistico, etc.;

Sua Excellencia o Presidente da Republica de Nicarágua, ao Sr. Dr. Dou Simon Planas Suarez, Commendador da Ordem de Nossa Senhora da Conceição de Villa Viçosa, Cavalleiro da Ordem Militar de Nosso Senhor Jesus Christo, condecorado com varias Ordens estrangeiras, seu Enviado Extraordinario e Ministro Plenipotenciario junto de Sua Majestade o Rei de Portugal e dos Algarves;

Os quaes, depois de haverem reciprocamente commu-nicado os seus plenos poderes, achados em boa e devida fornia, convieram nos artigos seguintes:

ARTIGO I

As divergencias de caracter juridico ou relativas á interpretação dos tratados vigentes entre as duas Altas Partes Contratantes, que venham a produzir-se entre ellas, e não possam resolver-se por via diplomatica, serão submettidas ao Tribunal Permanente de Arbitragem instituido na Haya pela Convenção de. 29 de julho de 1899, comtanto que não entendam com os vitaes interesses, a independencia ou a honra das duas Partes Contratantes, ou os interesses de terceira Potencia.

ARTIGO II

Em cada caso particular e antes de recorrerem ao Tribunal Permanente de Arbitragem assinarão as Altas Partes Contratantes um compromisso, especial que determine claramente o assunto em litigio, o alcance das faculdades attribuidas ao arbitro, e os prazos que tenham de adoptar-se no que respeita á constituição do Tribunal e ás normas do processo.

Fica entendido que esse compromisso especial s

ARTIGO III

A presente Convenção subsistirá por espaço de cinco annos, contados do dia da troca das ratificações, e se não for denunciada por qualquer das duas Partes Contratantes seis meses antes de expirar o dito prazo, continuará em vigor durante um anno e assim suecessivamente.

ARTIGO IV

Preenchidas as formalidades exigidas pelas leis constitucionaes em cada um .dos dois países, será esta Convenção ratificada pelo Presidente dos Estados Unidos do Brasil e por Sua Majestade El-Rei de Portugal e dos Algarves e a troca das ratificações será feita na cidade do Rio de Janeiro no mais breve prazo possivel.

Em fé do que, nos, os Plenipotenciarios acima nomeados, assinamos o presente instrumento em dois exemplares, appondo n'elles os nossos sellos, na cidade de Petropolis, aos 25 dias do mês de março de 1909.

(L. S.) Rio Branco.
(L. S.) Conde de Selir.

Su Excelencia el Presidente de la República de Nicaragua y Su Majestad El-Rey de Portugal y de los Algarves, deseando, de acuerdo con los principios enunciados en los articulos 15 á 19 de la Convención para la solucion pacifica de los conflictos internacionales firmada en La Haya en 29 de Julio de 1899, celebrar una Convencion de Arbitraje, han hombrado para tal fin por sus Plenipotenciarios, á saber:

Su Excelencia el Presidente de la Republica de Nicaragua al Señor Doctor Don Simon Planas Suarez, Comendador de la Orden de Nuestra Senora de la Concepcion de Villa Viçosa, Caballero de la Real Orden Militar de Nuestro Senõr Jesucristo, condecorado con varias otras Ordenes estranjeras, su Enviado Extraordinario y Ministro Plenipotenciario ante Su Majestad El-Rey de Portugal y de los Algarves;

Su Majestad El-Rey de Portugal y de los Algarves, al Senõr Carlos Roma du Bocage, Coronel dei Estado Mayor de Ingenieria, Par dei Reino, Su Ajudante de Campo Honorario, Ministro y Secretario de Estado de Negocios Estranjeros, Gran Oficial de la Real Orden Militar de San Benito de Avis, Comendador de la Orden de Santiago, del merito scientifico, literario y artistico, etc.;

Los cuales, después de haberse comunicado reciprocamente sus respectivos plenos poderes, hallados en buena y debida forma, convinieron en los articulos siguientes:

ARTICULO I

Las divergencias de caracter juridico é relativas á la interpretacion de los tratados vigentes entre las dos Altas Partes Contratantes, que lleguen á producir-se entre éllas y que no puedan resolver-se por la via diplomática, serán sometidas al Tribunal Permanente de Arbitraje instituido en La Haya por la Convención de 29 de Julio de 1899, con tal que no afecten ni los interesses vitales, la independencia é la honra de las dos Partes Contratantes, ó los interesses de tercera Potencia.

ARTICULO II

En cada caso particular, y antes de recurrir al Tribunal Permanente de Arbitraje, firmarán las Altas Partes Contratantes un corapromiso especial que determine claramente el asunto en litigio, la extension de las facultadas atribuidas al arbitro y los terminos que tengan que adoptar se en lo que respecta á la constitucion del Tribunal y á las normas del proceso.

Queda entendido que ese coinpromiso especial será, por parte de la Republica de Nicaragua, hecho según las formalidades estabelecidas en sus leys constitucionales.

ARTICULO III

La presente Convencion estará en vigor por espacio de cinco años, contados desde el dia del canje de las ratificaciones, y, si no fuere denunciada, por cualquiera de las dos Partes Contratantes, seis meses antes de expirar dicho plazo, continuará em vigor por un año, y asi sucesivamente.

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SESSÃO N.° 49 DE 20 DE AGOSTO DE 1909 19

ARTIGO IV

A presente Convenção será ratificada pelas duas Altas Partes Contratantes em harmonia com as suas leis constitucionaes.

As ratificações serão trocadas em Lisboa, no mais breve prazo possivel.

Em testemunho do que os respectivos Plenipotenciarios assinaram e sellaram a presente Convenção.

Feita em duplicado, nas linguas portuguesa e espanhola, em Lisboa, aos dezasete de julho de mil novecentos e nove.

(L. S.) Carlos Roma du Bocage.

O Governo de Sua Majestade Fidelissima, signatario das Convenções para solução pacifica dos conflictos internacionaes celebradas na Haya em 29 de julho de 1899 e 18 de outubro de 1907 e o Governo da Republica Argentina adherente á primeira d'aquellas Convenções e signatario da segunda;

Considerando que pelo artigo XIX da Convenção de 29 de julho de 1899 e pelo artigo XL da de 18 de outubro de 1907, as Altas Partes Contratantes se reservaram o direito de celebrar acordos no intuito de submetter á arbitragem todos os casos que por arbitragem possam ser resolvidos:

Autorizaram os abaixo assinados a concluir a seguinte Convenção:

ARTIGO I

As divergencias de caracter juridico ou relativas á interpretação dos tratados vigentes entre as duas Partes Contratantes, que venham a produzir-se entre ellas e não possam resolver-se por via diplomática, serão submettidas ao Tribunal Permanente de Arbitragem instituido na Haya pela Convenção de 29 de julho de 1899, para solução pacifica dos conflictos internacionaes e mantido pela de 18 de outubro de 1907, com tanto que não entendam com os vitaes interesses, a independencia ou a honra dos dois Estados Contratantes, e não affectem os interesses de terceira Potencia.

ARTIGO II

Em cada caso particular, as Altas Partes Contratantes, antes de recorrerem ao Tribunal Permanente de Arbitragem, assinarão um compromisso especial que determine claramente o assunto em litigio, o alcance das faculdades dos arbitros e os prazos a observar quanto á constituição do Tribunal Arbitral e ás normas do processo. Fica entendido que esses acordos especiaes, por parte da Republica Argentina, serão submettidos ás normas preceituadas pela sua constituição e suas leis.

ARTIGO III

A presente Convenção subsistirá por espaço de cinco annos, contados do dia da troca das ratificações, e continuará em vigor passado este prazo até que uma das Partes notifique á outra com um anno de antecipação a sua intenção de lhe pôr termo.

ARTIGO IV

A presente Convenção será ratificada por Sua Majestade El-Rei de Portugal em harmonia, com as leis constitucionaes do Reino e pelo Presidente da Republica Argentina de acordo com a Constituição e as Leis da Nação. As ratificações serão trocadas em Lisboa no mais breve prazo possivel.

Feita em duplicado nas linguas portuguesa e espanhola, em Lisboa, no dia nove de agosto do anno de 1909.

(L. S.) Carlos Roma du Bocage.

ARTICULO IV

La presente Convención será ratificada por las dos Altas Partes Contratantes en armonia con sus leyes constitucionales.

Las ratificaciones se canjearán em Lisboa en el más breve plazo posible.

En testimonio de lo cual los respectivos Plenipotenciarios firmaron y sellaron la presente Convención.

Hecha em duplicado en las lenguas espanola y portuguesa en Lisboa, á los diezisiete de Julio de mil novecien tos y nueve.

(L. S.) Simon Planas Suarez.

El Gobierno de la República Argentina, adherente al Convenio de Julio 29 de 1899 y signatario del de Octubre 18 de 1907, y el Gobierno de Su Majestad Fidelisima, signatario de ambos mencionados Convénios, ajustados en la Haya, respectivamente, para la solucion pacifica de los conflictos internacionales;

Tomando en cousideración que por el articulo XIX del Convenio de Julio 29 de 1899 y por el articulo XL del de Octubre 18 de 1907, las Altas Partes Contratantes se han reservado el derecho de celebrar acuerdos con el objeto de acudir ai arbitraje en todas las cuestiones que consideren posibles someter á este procedimiento:

Han autorizado á los insfranscriptos para concluir el siguiente Convenio:

ARTICULO I

Las diferencias de carácter legal é relativas á la interpretación de tratados existentes entre las dos Partes Contratantes que puedan suscitarse entre ambas y que no haya sido posible arreglar por la via diplomática, serán sometidas al Tribunal Permanente de Arbitraje establecido en El Haya por el Convenio de Julio 29 de 1899, para la solucion pacifica de los conflictos internacionales, y mantenido por el de Octubre 18 de 1907, siempre que y con tal que no afecten los intereses vitales, la independencia ó la honra de los Estados Contratantes y no atanem los intereses de terceras partes.

ARTICULO II

En cada caso particular las Altas Partes Contratantes antes de apelar al Tribunal Permanente de Arbitraje, firmarán un compromiso especial que determine claramente la materia del litigio, el alcance de los poderes de los arbitros y los plazos que se fijem para la constitucion del Tribunal Arbitral y para sus procedimientos. Queda entendido que dichos acuerdos especiales, en lo que concierne á la Republica Argentina, serán sometidos al procedimiento requerido por su Constitucion y sus leyes.

ARTICULO III

Se concluye el presente acuerdo por un periodo de cinca anos, contados desde el dia dei canje de las ratificaciones, y continuará en vigor después de este plazo, hasta que una de las Partes notifique á la otra, con un año de anticipación, la intención de poner le término.

ARTICULO IV

El presente Convénio será ratificado por el Presidente de Ia Republica Argentina de acuerdo con la Constitución y las leyes de la Nacion, y por Su Majestad el Rey de Portugal en harmonia con las leyes constitucionales del Reino. Las ratificaciones de este Convenio serán canjeadas en Lisboa en el mas breve plazo posible.

Fecho por duplicado en lengua española y portuguesa, en Lisboa, el dia nueve de agosto dei ano 1909.

(L. S.) Baldomero Garcia Sagastume.

O REDACTOR = Gaspar de Abreu de Lima.

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APPENDICE Á SESSÃO N.° 49 DE 20 DE AGOSTO DE 1909 21

Discurso proferido pelo Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros (Roma du Bocage), que1 devia ler-se a pag. 11 da sessão n.° 49 de 20 de agosto de 1909

O Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros (Roma du Bocage): - Sr. Presidente, procurarei responder, tão cabalmente quanto mo permitiam as minhas faculdades, ás observações feitas pelo illustre Deputado a quem respondo, o Sr. Brito Camacho, com relação ao tratado de commercio com a Allemanha. Procurarei responder aos pontos concretos das suas observações e depois direi, tanto quanto mo permitta a escassez do tempo, quaes são as minhas ideias no ponto de vista mais largo da nossa politica commercial, do desenvolvimento da navegação, dos meios que nas relações entre as diversas nações podem procurar-se para o fomento economico, para o desenvolvimento da riqueza publica, para o alargamento do nosso commercio, para a protecção ás nossas industrias, especialmente á industria agricola, não esquecendo que nunca poderei considerar isoladamente o Portugal continental. O nosso vastissiino dominio colonial tem uma tão larga, tão preponderante influencia no viver da nação portuguesa, que não posso considerar estrictamente este fragmento do solo iberico que é o Portugal continental como constituindo a nação portuguesa, desprendendo-o dos vastissimos territorios que estão sob o dominio da nossa bandeira; e, sem sair deste meu modo de ver, começarei a responder a S. Exa. nas considerações que fez a respeito do abandono parcial de um direito, que para nos resalvámos ao negociar este tratado, de fazer ao Brasil concessões especiaes.

Esse direito está claro e precisamente consignado no tratado. Resalvou-se por uma troca de notas, simultanea, como é de uso serem, em semelhantes casos, as menções de excepção, as explicações especiaes, as correcções par-ciaes, etc. Em convénios desta naturesa, procura-se geralmente dar-lhes uma forma quanto possivel constante. As nações adoptam uns determinados typosr e, ao negociar- se, ou se procuram no tratado anterior que deixou de existir clausulas e condições que podem subsistir, ou se tomam para norma outras já existentes, com outras nações, dando-lhes quanto possivel a mesma forma, a mesma redacção, o mesmo typo.

Para não alterar este bom e pratico preceito, que consiste em não modificar senão aquillo que as nossas condições economicas impõem que se modifique, conservou-se simplesmente no texto do tratado a declaração de que nos era livre de fazer ao Brasil concessões especiaes, isto é, que a clausula de nação mais favorecida por nos concedida á Allemanha, como pela Allemanha concedida a nos, não se considerasse quebrada quando fizéssemos á Espanha e ao Brasil concessões de caracter exclusivo. Impõe-nos a resalva com relação á Espanha a propria natureza do solo da peninsula iberica, que estabelece entre as duas nações peninsulares relações de uma ordem peculiar a. nenhuma outra comparaveis.

Só com a Espanha nos temos fronteira terrestre, e, por conseguinte, a possibilidade do contrabando terrestre, e essa razão basta para que procuremos resolver pelo direito convencional entre as duas nações os perigos, os risco e tentações de um commercio iilicito.

Esta razão, quando outra, não houvesse, bastava para que nos tivéssemos sempre de resalvar a Espanha nos nossos tratados com outras nações.

Razões de uma outra ordem, porem, razões de sentimento, tão fortes como as razões economicas, que nem hoje nem nunca as nações poderão pôr de parte, porque muitas vezes, como agora succede, são a sua continuidade historica, levam-nos a resalvar o direito de fazermos ao Brasil concessões que não faremos a nenhuma outra nação.

O Brasil não é para nos estrangeiro, é a continuação da nossa patria, fala a nossa lingua, tem a nossa historia, é um glorioso e honroso desdobramento da nossa raça.

Muitos milhares de portugueses existem no Brasil e trazem para o nosso país as suas economias, o preço do seu trabalho, o que nos ajuda a equilibrar a nossa balança economica.

São estas razões superiores que se teem feito sentir nos povos modernos; são razões que fazem dizer que o sangue é mais pesado que a agua e que nem o oceano pode transformá-lo ou enfraquecer os vinculos que este estabelece.

Nenhum dos Governos anteriores tem pensado, nem o Governo actual ou qualquer português digno deste nome pensa sequer, em pôr de parte, em esquecer, por momentos os laços que nos ligam ao Brasil.

Mas Portugal, com as suas colonias e ilhas adjacentes, forma um todo inseparavel no ponto de vista economico; e essa circunstancia não a podemos esquecer quando tratarmos da producção de assucar nas duas grandes possessões de Angola e Moçambique, quando observamos que em breves dias o assucar produzido n'esta ultima colonia poderá bastar para occorrer ás necessidades de consumo interno.

Devemos, porém, pensar em abrir mercados ao açucar produzido em Angola e Moçambique?

O crescimento de producção tem sido tão rapido que nos não podemos, sem cercear os rendimentos fiscaes, abrir de par em par, as portas ao assucar produzido n'aquella nossa possessão.

Se isto é hoje, continuando a producção a crescer com a mesma rapidez, não tardará muito que cheguemos ás 33:000 toneladas que Portugal consome. Em taes circunstancias se permittissemos favores pautaes ao açucar do Brasil, ou teriamos de sacrificar ás nossas proprias possessões, ou haviamos de offerecer aquillo que, dentro em pouco tempo não poderiamos dar.

Eis o motivo porque não deviamos estabelecer como base unica e estavel das nossas relações economicas com o Brasil o beneficio especial concedido ao açucar; na verdade, ou lhe dariamos em nosso proprio prejuiso ou faltariamos ao que houvéssemos promettido no dia em que o consumo na metropole fosse inferior á producção das nossas colonias.

(Interrupção que se não ouviu).

O Orador: - Eu desejo muitissimo alargar as nossas relações commerciaes e muito particularmente as que temos com o Brasil.

O Sr. Zeferino Candido: - Tenho folgado muito em ouvir V. Exa.

O Orador: - No primeiro dia em que, no Ministerio dos Negocios Estrangeiros, falei com o illustre Ministro do

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22 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Brasil nesta corte, a primeira cousa que fiz foi affirmar o meu sincero empenho de podermos estabelecer mais intimas relações commerciaes com a nação que tão dignamente representa; e de que o Brasil quisesse aproveitar-se dos favores especiaes que resalvamos a seu respeito nos nossos tratados de commercio.

Emquanto occupar este logar procurarei alargar as nossas relações commerciaes com essa grande nação que nos é tão querida; mas para isso é necessario que encontremos uma plataforma para essas relações, que não seja em puro detrimento do nosso proprio país. (Apoiados).

Com relação ao assunto em discussão, vê S. Exa. qual foi a orientação do Governo, não digo a minha, porque neste tratado não tenho senão a honra de o vir defender, mas a do seu negociador, que, sendo hoje Presidente do Conselho de Ministros, manterá a mesma orientação politica de então.

Referiu-se ainda o illustre Deputado, a quem estou respondendo, a um ponto especialissimo, á cortiça, e sobre este assunto vou responder a S. Exa. em muito poucas palavras.

A nossa maior exportação para a Allemanha é a cortiça em bruto ou em prancha, simplesmente preparada; a nossa exportação de cortiça em obra é muito pequena. A cortiça tal qual como se exportava, sem preparação, é livre na sua entrada na Allemanha e é claro que nos neste tratado nada mais tinhamos a fazer do que deixar estar as cousas como estavam. Com respeito á cortiça em obra poderemos em seu favor fazer alguma cousa agora, que não poderiamos fazer se não tivéssemos o tratado; porque dora em deante, lutamos com armas iguaes com aquella nações que nos fazem concorrencia, visto que temos a clausula de nação mais favorecida, contra a qual me pareceu insurgir-se o illustre Deputado Sr. Brito Camacho. Nenhuma nação estará em melhores condições do que a nossa. Nem a Espanha, nem nenhuma outra nação poderá lutar vantajosamente comnosco a não ser que tenha de pagar fretes menos elevados ou que disponha de melhores communicações maritimas.

A Espanha terá de fazer passar os seus productos ao longo das nossas costas, porque elles veem do meio dia da Peninsula, e não lhes convém, por mais dispendioso, o transporte terrestre.

As relações entre Portugal e a Allemanha serão cada vez mais estreitas desde que temos a clausula de nação mais favorecida, e nos não poderiamos esperar mais da Allemanha, nem lhe podiamos pedir sobre este assunto qualquer alteração pautai, porque a orientação economica da Allemanba está sendo a mesma de todas as grandes nações. Quando digo grandes nações, quero-me referir ás nações de grande intensidade commercial, que hoje adoptam a politica dos tratados de commercio, a politica das duas pautas - a pauta benéfica e a pauta hostil. Querermos nos que a Allemanha deixasse de seguir a orientação a que me refiro seria um contrasensp, tanto mais que mesmo da nossa parte não acceitámos a discussão sobre reducções especiaes em relação a cada artigo da nossa pauta aduaneira.

Podemos - e este tratado é um exemplo disso - obter favores especiaes para productos que representam um privilegio natural do país. Estão neste caso os nossos vinhos do Porto e Madeira - como acontece aos vinhos italianos de Marsala - e para elles alcançámos favores especiaes e exclusivos.

Esta conquista, que é valiosa, representa o maior dos beneficios que podem dar-se dentro da clausula geral da nação mais favorecida. E é uma verdadeira excepção, porque as outras nações não podem apresentar productos que venham concorrer com aquelles que são especialidade nossa.

Mas o que poderemos nos fazer n'esta ordem de ideias com respeito á cortiça? Nada, porque rolhas de cortiça podem fazer-se em toda a parte, pode faze-las quem tenha cortiça e arte para a trabalhar.

Desejaria o illustre Deputado e nos todos, que somos países corticeiros, proteger, aclimatar e desenvolver o fabrico, já que temos em casa a materia prima; mas não é por meio de tratados de commercio que isso se consegue. Poderia fazer-se por meio de uma aefesa conjunta das nações corticeiras.

Não ha duvida que muito conveniente seria que nos, associando-nos com as outras nações corticeiras, obtivéssemos protecção para essa industria; mas isso não depende de nos, depende de um conjunto de circunstancias em que não podemos influir directamente.

Escusado é dizer que ha interesse e vantagem em exportar productos fabricados em logar de materia prima, e isso nos levará a promover o desenvolvimento da industria corticeira entre nós quando o queiramos fazer sem prejudicar outros, valiosissimos, interesses.

Muito folgarei eu em que nos, quando vendermos cortiça, obtenhamos o salario dos nossos operarios empregados na sua transformação em rolhas ou outros artefactos.

Mas, repito, não se consegue isso com tratados de commercio, nem da minha pasta dependem alguns dos elementos mais essenciaes para o conseguir.

Referiu-se o illustre Deputado a uma interpretação que S. Exa. julga poder dar se á parte do tratado que se refere á cabotagem. Causou-lhe serio cuidado que o artigo 17.° pudesse dar logar a erradas interpretações e que d'ahi venha um perigoso previlegio para a navegação aliem! contra os interesses da navegação portuguesa, que nós todos queremos defender e melhorar.

Procurarei responder a S. Exa. por forma que não pareça admittir duvidas.
Vou ler successivamente o paragrapho incriminado do artigo 17.° e a disposição correspondente do anterior tratado.

(Leu).

As duas leituras que acabo de fazer são, uma do artigo 17.° do tratado em discussão e a outra do artigo 14.°, do nosso anterior tratado com a Allemanha, o tratado de 1872. Vinte annos esteve este tratado em vigor e durante este tempo não houve uma duvida, não houve uma desin-telligencia a respeito da sua significação! Durante vinte annos se comprehendeu a faculdade que um navio tem, de poder levar a diversos portos a carga que trouxesse de um porto estranho, mas tambem nunca daqui se concluiu, nem antes nem depois, que esse mesmo navio tivesse o direito de receber carga em um determinado porto nacional para o descarregar noutro tambem nacional; esses transportes foram sempre reservados á navegação nacional, pois são esses que constituem a cabotagem.

Aqui está mais um exemplo bem frisante de quanto convém que num tratado se mantenham as clausulas, a doutrina e a forma dos tratados que substitue, quando não haja mudança na essencia, para que assim não vamos encontrar uma interpretação diversa applicada a casos identicos, e fundada numa diversa redacção.

O Sr. Presidente: - Vae entrar-se na segunda parte da ordem do dia. V. Exa. continuará amanhã no uso da palavra.

O Orador: - Peço a V. Exa. que consulte a Camara sobre se permitte que eu continue no uso da palavra, para fazer mais algumas considerações que entendo necessarias e serão brevissimas.

Vozes: - Fale, fale.

O Sr. Presidente: - Os Srs. Deputados que autorizam que o Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros conti-

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APPENDICE Á SESSÃO N.° 49 DE 20 DE AGOSTO DE 1909 23

nue no uso da palavra, preterindo a segunda parte da ordem do dia, teem a bondade de se levantar.

Foi approvado.

O Orador: - Agradeço á Camara a manifestação com que acaba de honrar-me, promettendo eu, da minha parte, roubar lhe o menor tempo possivel, tanto mais que já poucas considerações tenho a fazer.

Outro ponto pendente na discussão deste tratado, consiste no aumento de tributação pautal.

A este respeito, Sr. Presidente, devo notar que a tabella A consigna apenas um direito concedido ao Governo português com relação á pauta portuguesa. Isto é, em vez de fazer a vinculação completa da pauta, como num projecto do tratado anterior se consignava, limita-se a vinculação a um determinado numero de artigos; os restantes dividimo-los em duas partes: uma em que se attende á necessidade ou á conveniencia eventual de se poderem aumentar os direitos actuaes da nossa pauta aduaneira; e outra em que sé fazem reducções reservando-nos ao mesmo tempo a faculdade de modificar redacção e a nomenclatura dos artigos, podendo até desdobrá-los, tendo em vista os progressos da industria mo derna, preenchendo-se as lacunas de que já se recente a nossa pauta de 1892. A Allemanha reconhece-nos este direitos, nada mais.

Assim estabelecem-se pelo tratado faculdades, vantagens e liberdades para nós.

Não preciso explicar a esse respeito o que todos sabem que um tratado não representa senão a alienação parcia da liberdade de uma nação, qualquer que ella seja, a favor de outra e em troca de certas vantagens por essa concedidas. Duas nações ao firmarem um tratada, ficam com a sua liberdade durante um certo tempo, e em de terminados pontos, alienada e com um direito estabelecido.

A tabella A não faz mais do que, não obstante as obri gações preceituadas no tratado á nação portuguesa, dar nos o direito de elevarmos a tributação até o limite mais avançado. É preciso notar-se que o aumento pode ir até onde permitte o limite consignado na tabella A, sem que abra do estabelecido no tratado, mas de nenhuma forma se toma qualquer compromisso de attingir esse limite, que é sempre um maximum e como tal considerado.

Portanto, n'estas tabellas consigna-se uma vantagem e uma liberdade para nós.

Creio ter respondido, senão completaniente, pelo menos tanto quanto me era possivel, aos pontos concretos a que o illustre Deputado se referiu.

Mas deseja S. Ex.ª que eu diga alguma cousa sobre a minha orientação em materia de politica economica. Não serei longo. Quero apenas dizer que, dada a situação em que hoje se encontram as relações economicas dos diversos povos, a tendencia manifesta das mais poderosas nações para o estabelecimento da pauta hostil e da pauta benefica, as nações como a nossa, que não representam um factor economico de importancia primacial, não podem por isso mesmo deixar de infileirar-se com as outras e procurar obter para si a applicação da pauta benéfica concedendo em troca alguns dos favores que pedem as nações economicamente mais poderosas com quem necessita manter relações commerciaes. A politica de tratados de commercio, é hoje o forcado correctivo da politica economica de hostilidade e de protecção, que mais e mais se accentua em quasi todas as nações da Europa.

Ha pouco ainda vimos a America elevar consideravelmente as suas pautas, na intenção certamente de estabelecer pautas convencionaes e conceder favores a quem lhos concedesse. Ainda ha pouco tambem no Parlamento francês se debateu a necessidade de se elevar a pauta proteccionista. A tendencia hoje não é para o livre-cambio, mas para o proteccionismo.

Não viria eu agora, que não desejo cançar a attenção da Camara, discutir em these as duas theorias, mas tenho que discuti-las e aprecia-las na hypothese do que ellas são relativamente á situação actual e aos primeiros annos do vigésimo seculo, que em materia de politica economica estão bem longe dos tempos saudosos e já remotos em que me encontrei nesta Camara com o meu amigo Oliveira Martins. Mas devo dizer que a politica economica então adoptada envolvia no espirito de Oliveira Martins e em muitos dos que o acompanhavam, a ideia num correctivo no estabelecimento de tratados de com-mercio. Circunstancias que não venho agora rememorar e que seria longo trazer para aqui, fizeram com que a maioria desses tratados de commercio não chegassem a realizar se. Criaram-se assim falsas industrias, industrias que não teem na vida economica da nação razão de ser, que são como um producto de estufa, uma espécie de orchideas conservadas com exagerado aquecimento, que morrem quando lhes falta-o amparo de uma pauta extremamente protectora.

Mas essas industrias que não teem raizes, nem rigorosamente teriam razão de existir, nasceram, criaram-se e a ellás se ligaram interesses, que a politica economica dá nação não pode agora nem deve por forma alguma desprezar.

É preciso pensar que os capitaes n'ella empenhados foram applicadps ao abrigo da lei sobre o qual o annos.se foram accumulando, que durante esses annos elles foram dando trabalho e salario a um consideravel numero de trabalhadores: não seria portanto de boa politica sacrificá-las de um momento para outro, ferindo interesses provocando ruinas que aos poderes publicos cumpre evitar.

Modificar a nossa politica economica, alargar as nossas relações commerciaes, é o objectivo primacial do Governo. Mas não depende da nossa exclusiva vontade esse alargamento. A massa da nossa producção não pesa bastante para que possamos impor ás outras nações a necessidade impreterivel de negociar comnosco. É preciso procurar o momento opportuno, a occasião, o ensejo, a razão local momentanea, para se obter a satisfação para os nossos interesses; pois ha quem tenha meios muito mais poderosos do que nos para proteger interesses rivaes dos nossos.

O que posso garantir ao illustre Deputado e á Camara é que no Ministerio dos Negocios Estrangeiros nem um só momento se descura, nem um só dia se passa, sem que eu me occupe de tratados de commercio, não só deste que encontrei como um facto consumado - e por isso não tenho mais do que pedir á Camara que o acolha como elle merece - mas de tantos outros, quantas são as nações com as quaes poderemos vantajosamente negociar.

E folgarei muito que é tempo me permitia celebrá-los e que eu possa trazer á Camara novos pactos commerciaes, dos quaes resulte o alargamento das nossas relações economicas.

Esse alargamento, porem, não depende só dos tratados de commercio.

Outros elementos ha a desenvolver como o das relações de navegação, e do seu alargamento me tenho occupado com frequente cuidado, procurando estabelecer carreiras directas que nos liguem a países com os quaes negociamos actualmente por intermedio de outras nações com os prejuizos inherentes aos successivos traslados.

Sr. Presidente: se podemos alargar as nossas exportações para os Estados Unidos do Brasil com as quaes temos ligações directas e com as outras nações em circunstancias identicas, já não succede o mesmo com os países com os quaes não temos aquellas ligações. Com esses é bastante difficil desenvolver o nosso commercio. Falta-nos o traço de união da marinha mercante.

Quando vemos as mais poderosas nações do mundo dar

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24 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

subsidios largos á sua marinha, para poder concorrer com outras; quando vemos a navegação allemã crescer e lutar vantajosamente com as navegações inglesa e francesa; quando vemos que a tendencia moderna é para os grandes navios, para os navios immensos, com grandes tripulações, como aquelles que diariamente está construindo a Allemanha, não podemos nós - e estimaria muito que pudéssemos - alargar, aumentar o numero dos nossos navios de commercio a ponto de estabelecer para toda a parte navegação sob a bandeira nacional.

O Sr. Pereira de Lima: - Basta imitarmos a Hollanda.

O Orador: - Em todo o caso, e felizmente, o simples facto do alargamento e desenvolvimento da navegação estrangeira que visita os nossos portos é já um factor economico importante. E esse facto está-se dando.

Na escala das nações, em que o movimento da navegação crescreu, Portugal occupa o segundo logar e tem acima de si somente o Japão.

Uma estatistica comparativa ultimamente organizada pelo Governo Allemão e publicada no Boletim Commercial do Ministerio dos Negocios Estrangeiros, mostra que o aumento do movimento de navegação em Portugal foi, de 1888 a 1900, de 290 por cento e apenas o Japão o excedeu, tendo todas as outras nações ficado muito aquém na escala progressiva.

Se soubermos aproveitar estes elementos muito hão de elles concorrer para a desenvolvimento das relações commerciaes.

Para isso é necessario trabalhar, aperfeiçoar os nossos meios de producção, barateá-los e aperfeiçoar os transportes dentro do país, reduzindo as suas tarifas.

E necessario que a politica economica interna auxilie a politica externa dos tratados de commercio, alcançando assim que os productos do solo nacional possam concorrer com os das naç5es que não gozam, como os nossos, do excepcional favor e privilegia da natureza.

Mas, se ha esforços ingentes que é necessario realizar não basta para conseguir o fim desejado o esforço do Governo, nem o esforço do Parlamento, e muito menos ainda poderia alcançar o de um homem; é preciso reunir, coordenar os esforçps de uma nação inteira: unamo-nos todos no estudo dos problemas economicos, deixemo-nos de discussões que nos afastam e nos dividem, procuremos unir os nossos esforços, as nossas vontades, e a nação portuguesa triunfará, como já triunfou, e voltará aos seus dias gloriosos, porque é largo o seu patrimonio e risonho o seu futuro.

Que o nosso patriotismo sobreleve a interesses de facções ou de pessoas, e que não haja na nação portuguesa senão um sentimento commum, um principio:

O bem estar do país!

Vozes: - Muito bem, muito bem.

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