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SESSÃO NOCTURNA DE 25 DE JUNHO DE 1890 869

amanuense, um official de secretaria... não fossem dizer que para isto se exercia!

De maneira que se mudaram os papeis! O meu estimavel contendor incriminava, sem querer, sem cuidar, e tambem, diga-se de passagem, sem dar grandes novidades á camara, o seu partido e o seu chefe, pois que nos haviam deixado as cousas em tal estado; pelas reformas que não emprehendeu, talvez pelas que foz, em todo o caso pelas que deixou de fazer.

E eu então, contemplando tristemente aquelle painel de tão auctorisado auctor, lastimava que os meus amigos politicos, tendo podido n'um traço intrepido de penna ou de dictadura, reformal-o e corrigil-o, se tivessem limitado ao projecto, á reforma modesta que estamos discutindo.

Mas faltaram-nos companheiros que nos eram muito necessarios e nos seriam muito agradaveis n'esta palestra; faltou-nos, sr. presidente, por exemplo, o sr. Elvino de Brito para liquidar com o sr. José Julio Rodrigues a questão orçamental da proposta, porque todos os meus collegas terão notado que ao passo que o sr. José Julio Rodrigues principalmente accusava o projecto e o digno ministro da instrucção publica por uma grande avareza, por uma exagerada modestia orçamental de que francamente elle não tem uma grande culpa...

O sr. Elvino de Brito: - Eu alludi unica e simplesmente á despeza do pessoal da secretaria, como opportunamente terei occasião de demonstrar, e o sr. José Julio Rodrigues referiu-se á despeza com a organisação do ensino nos seus diversos graus.

O Orador: - Lá iremos e lá iremos facilmente, logicamente; mas uma das incriminações do sr. José Julio Rodrigues foi precisamente esta. S. exa. começou mesmo por mandar para a mesa uma moção de ordem que rejeita o projecto em discussão, por insufficiente, por exiguo, porque esse projecto não corresponde ao seu ideal, e ás necessidades de dotação e de transformação do nosso ensino publico.

Mas o que se vae fazer? Simplesmente o ministerio, simplesmente esta cousa secundaria, reles, pelintra, talvez, da organisação de uma secretaria d'estado, mas que é a primeira cousa a fazer, praticamente, porque é o nucleo de toda a disciplina do serviço, de toda a reorganisação funccional, doutrinal mesmo, dos serviços da instrucção official.

S. exa. do que censurava o governo, principalmente, era de elle não trazer ao parlamento uma proposta de lei que dotasse amplamente os serviços da instrucção publica que o illustre professor queria ver largamente subsidiados, duplicados até, na sua dotação actual.

Mas que culpa tem o sr. ministro da instrucção publica, que culpa tem o governo, se s. exa., o sr. José Julio Rodrigues, não conseguiu dos seus amigos a auctorisação necessaria para em vez d'aquella moção que mandou para a mesa, fazer aqui a declaração franca, nobre e patriotica de que o seu partido daria um voto resolutamente approvativo ao governo se elle em vez de pedir apenas uma pequena verba, propozesse o duplo da dotação actual para os serviços da instrucção publica? Mas se o illustre correligionario de s. exa. e meu amigo o sr. capitão Machado, tem e manifesta as mais graves apprehensões de que o unico desejo, o unico impulso, o capcioso proposito do sr. ministro da instrucção publica seja avolumar o orçamento, o até «avolumar as professoras», como nos disse aqui, póde s. exa. incriminar com justiça o governo de não se atrever a pedir o alargamento maior da verba destinada aos serviços da instrucção, reccioso naturalmente de caír sobre a reprimenda severa, austera e implacavel de outro illustre deputado progressista, o meu amigo e collega o sr. Elvino de Brito que vê, já, na verba orçamental consignada á nova instituição, pouco menos que um verdadeiro abysmo financeiro, em todo o caso uma flagrante contradicção com os propositos de economias e de repressão orçamental do sr. ministro da fazenda?

Sr. presidente, dadas as tendencias de abstração doutrinaria que caracterisa a nossa educação e a nossa controversia politica, muito naturalmente prevíra e esperava eu que este pequeno projecto, deixem-me chamar-lhe assim, fosse thema e estimulo para a critica especulativa dos amadores de systemas que entre nós abundam consideravelmente, e dos explicadores professos do que se passa lá fóra, segundo a phrase já um pouco fatigada; contava mesmo que não deixassem de intervir na pequena bulha, dando-lho aspectos de grande batalha, aquelles immortaes principios que cada um forja em sua casa com sua mulher o seus filhos, como costuma dizer o humorismo de um medico illustre, para a salvação da humanidade, que não conseguem endireitar, e por gloria do paiz, que geralmente desconhecem nas condições essenciaes, nas circumstancias necessarias da sua economia, do seu temperamento historico, da sua evolução social. Esperava e era natural isto, embora o projecto tenha uma objectiva muito limitada, restricta, extremamente modesta.

Comprehendia-se facilmente, sr. presidente, que não faltasse a emoldurar o projecto, a vasta e velha questão da instrucção publica no seu aspecto doutrinal, nas suas relações com o estado, ou do papel e interferencia d'elle na preparação e na cultura intellectual dos cidadãos.

Esta questão faz certamente ainda o encanto e a occupação dilecta de muitos politicos, serve excellentemente certas tendencias e processos da nossa educação parlamentar, e posto que os parlamentos pareçam dever antes ser destinados á resolução de questões praticas e concretas, deixando que outras se apurem e resolvam nos laboratorios scientiticos por mãos de pensadores e de estudiosos, nada mais natural e justo do que occuparem-se elles de uma questão de principios em que se entrechocam e contendem os direitos do estado e os direitos dos cidadãos, a autocracia nacional o a autocracia municipal, tantos interesses e tantos termos, em summa, do organismo e do movimento politico.

Contava com isso: contava ver, e não é novo no parlamento portuguez desde as famosas côrtes de 1821, reeditar, a proposito das nossas cousas tão peculiares, e tão nossas, muita oratoria e muita theoria de tribuna estranha, e reproduzirem-se rejuvenescidas, entre nós, as largas controversias que por tanto tempo agitaram certos parlamentos estrangeiros e ainda ha pouco se exhibiram, n'uma grande e luminosa intensidade, no parlamento de uma das nações mais justamente afamadas em materia de instrucção publica.

Mas não foi isso que eu vi sr. presidente, ou antes vi apenas cortar os horisontes da nossa discussão, essas classicas questões com uma rapidez que não as tornava attingiveis ás vistas desarmadas, de simples amadores, que pelos modos somos todos no professo criterio do orador precedente, embora entre nós não faltem os professores que o foram e que o são como elle, e os que, pelo menos, tanto como elle e até muito antes e muito menos recatadamente do que elle têem trabalhado versado estes assumptos.

É até curioso que em muitas cousas que se tem dito e em muitas lições que se tem querido exhibir, n'esta discussão, os simples amadores ou os que se pretende um tanto desceremoniosamente averbar de taes, pareçam estar bem melhor elucidados do que se tem passado lá fóra, do que os mestres que nol-o têem vindo ensinar aqui.

Pois não vimos nós ensaiar-se a idéa do fundo reaccionario do projecto, denunciado pela centralisação ou pela devolução á exclusiva direcção do estado, da instrucção publica ou mais propriamente da instrucção primaria?

Não ouvimos cantar commovidas nenias sobre o sacrilego repudio da lei liberal de Antonio Rodrigues Sampaio